domingo, 14 de outubro de 2018

[AÇÃO GAMES 013] THE FLINTSTONES: The Rescue of Dino & Hoppy (NES, 1992) [#163]



Desenhos animados, qualquer adulto responsavel poderá te dizer, são coisas para crianças. Sabe, eu sempre achei essa afirmação (e outras do tipo) muito curiosa. Por que? Quem decidiu isso? Como? Essa é uma daquelas coisas que todo mundo "sabe", mas pouca gente sabe porque realmente "sabe".

Mas bem, eles não estão de todo errados. Desenhos animados realmente foram coisas para crianças durante muitos anos, até que um desenho em especial mudou todas as regras do jogo. Como de costume, vou aproveitar a deixa do jogo de hoje da Ação Games ser dos Flintstones para contar a história desse desenho e de como as coisas nunca mais foram as mesmas depois dele (enquanto falo do jogo nos comentários das imagens)

A história dos desenhos animados começa no cinema, obviamente. Como eu já havia comentado no post sobre Tom e Jerry, os desenhos se popularizaram como fillers entre as sessões dupla de cinema. Desenhos focados no humor fisico e entretenimento ultra violento para adultos responsaveis dos anos 40 curtirem entre uma propaganga de chutar nazistas e outra.

No joguinho de hoje, nossos amigos da idade da pedra estavam aproveitando os prazeres de ter a idade de quase o dobro da expectativa de vida humana da época quando o terrível Dr. Butler irrompe diretamente do século 30 para roubar os mascotes da família Flintstone e Rubble... para a coleção de dinossauros e... seja lá que bicho seja esse pet do Barney... do zoologico dele. Ou seja, ou ele tem algo especificamente contra o Fred e o Barney e queria a todo custo foder com a vida deles, ou Bedrock tem o melhor sistema de abrigo de animais que eu já ouvi falar, pq ele não encontrou um único dinossauro de rua para pegar no lugar deles.
Felizmente os Flintstones contam com os favores de um alienigina capaz de viajar no tempo, infelizmente o Dr. Buttler sabe disso e destrói a máquina do tempo do Jump the Shark em forma de personagem (mais sobre isso no texto) para que ele não seja seguido até o futuro, felizmente ele não é tão diligente nisso e as peças da máquina do tempo de Gazoo apenas ficam espalhadas pelas fases
Agora Fred e... bem, só o Fred mesmo, aparentemente mais ninguém liga se o dinossauro da família foi sequestrado pelo Edgar Alan Poe do século 30 (sério, olha a foto acima) então nosso rabugento amigo partirá nesta missão. FOR THE PUPPIES!!!


Porém quando a televisão começou a tomar corpo como o grande canal de entretenimento da nação americana, os desenhos animados tiveram um problema muito grave pela frente: desenhos animados são caros de se fazer, são lentos de se produzir. São, comparativamente, muito mais caros de se fazer do que shows live action. Isso é verdade mesmo hoje, com o dinheiro que a Nick gastou para produzir um Avatar eles fariam 5738 séries esquecíveis tipo I-Carly ou qualquer em que adolescentes sem graça falam qualquer coisa para esperar o claque de risadas gravadas. Alias, faça o teste agora mesmo: ligue em qualquer canal infantil, boas são as chances que estara passando alguma série com atores do que um desenho animado simplesmente porque é mais fácil e barato fazer.

Esse jogo dos Flintstones é uma coleção de várias inspirações de jogos do NES, algumas mais óbvias do que outras. Aqui, temos o mapa do mundo jogo com as fases para escolher que claramente é inspirado em Mario 3. Exceto que em Mario 3 isso era o mapa de UM mundo, aqui é o jogo todo

A alternativa para desenhos animados conseguirem competir nesse mundo corrido e de poucos recursos (comparando com o cinema, claro) da televisão foi algo que anos depois os japoneses se tornariam mestres supremos: cortar custos. Cenários repetidos, animações repetidas, efeitos repetidos, nada disso acontecia quando você tinha o orçamento e tempo de curta metragem de um grande estúdio para trabalhar. Agora quando você entra no ritmo da televisão, bem, isso...

... acabam virando isso:



Então seria justo pensar: "uau, esse novo padrão de qualidade é idiota. As pessoas não vão aceitar isso!", e de fato, não aceitaram. Nenhum adulto perderia seu tempo vendo uma coisa tão tosca, eles teriam que achar um publico sem absoluto padrão de qualidade nenhum para empurrar essa merda goela abaixo...

... o que foi exatamente o que eles fizeram. Foi assim que desenhos animados viraram "coisa de criança", pq crianças aceitariam um baixissimo padrão de qualidade e achar ótimo. E foi o que aconteceu.

Vencendo as partidas de basquete (sim, não pergunte) você desbloqueia "habilidades de dinossauro" como Fly, Jump e posteriormente Dive para serem usadas uma única vez ou então mantidas gastando recursos. Se isso parece estranhamente similar ao Rush na série Mega Man... saiba que é chupinhado na cara dura mesmo.

Achou que eu estava brincando?

William Hannah e Joseph Barbera, os criadores de Tom e Jerry, foram uns dos que melhor  dominaram esse cenário. Seus desenhos animados tinham o orçamento de duas caixas mascadas de Plets, mas ele empilhavam sucessos com a garotada da época. Jambo & Ruivão, Dom Pixote, Plic, Ploc & Chuvisco, Zé Colméia, Pepe Legal, Bibo Pai e Bob Filho, Olho Vivo e Faro Fino foram todos desenhos que eles produziram nessa época com menos dinheiro do que o que você gasta na Summer Sale da Steam.

Isso fez de Hannah e Barbera muito ricos, verdade, mas a pergunta que realmente devia ser feita é: isso os estava fazendo felizes?

Como adultos altamente criativos, se limitar a produzir desenhos animados por quantidade e não qualidade certamente era um modo de viver, mas não era tudo que eles podiam ser. Como artistas, eles queriam mais do que isso. E foi assim, dessa necessidade de se expressar que só nasce quando você tem um emprego muito abaixo da sua capacidade intelectual que eles tiveram uma ideia ousada. Alguns diriam maluca, até.

O plano dos dois era fazer um desenho animado para adultos. Não, seu doente, não ESSE tipo de desenho para adultos! Mas puta merda... o que eu quis dizer é que eles queriam fazer algo tão respeitavel quanto qualquer série que passasse no horário nobre. Com efeito, a meta deles ERA fazer um desenho animado para passar no horário nobre. O que fez muitos donos de emissoras rirem na cara deles.

Durante as fases você encontra armas especiais que são usadas gastando o recurso que você encontra na fase. Você usa elas apertando para cima e ataque... o que é exatamente igual a Castlevania, até as armas tem ataques iguais só com sprites diferentes. No lugar da faca você tem um estilingue, no lugar do machado você tem... um machado de pedra... e ao invés de água benta Fred larga é um... ovo explosivo. É, eu sei.

Outro ponto de usar as armas Castlevania é que a detecção de hit do seu porrete é meio zoada, sendo um dos pontos irritantes do jogo - mais até do que a escorregadice do Fred, que parece que toda fase é uma fase de gelo do Mario...

... exceto a fase de gelo desse jogo aqui, que parece o seu pior pesadelo do quanto o Fred escorrega e não tem nada que você possa fazer enquanto ele está escorregando. Embora bem basiconas (tem a fase do gelo, a fase da agua, a fase da lava com a plataforma que se mexe...), ao menos as fases desse jogo tem distinção entre si e nunca parecem muito uma com a outra

Hoje nós somos, literalmente, uma geração que cresceu com Os Simpsons passando as oito da noite, e qualquer um pode te apontar desenhos famoso que não são feitos "para crianças" como Futurama, South Park, Bojack Horseman ou os próprios Simpsons. Em 1960, desenhos animados na televisão não eram mais respeitados do que o Discovery Kids é hoje.

Por isso mesmo Hannah e Barbera tiveram que bater em muitas portas e ouvir muitos MAS NEM FODENDO UMA MARIA-MOLE até encontrar uma emissora que comprasse a sua ideia um desenho animado no horário nobre. Essa seria a ABC, então uma emissora iniciante que procurava coisas diferentes para chamar atenção sobre a concorrência.

Para desbloquear os usos do Rush dinossauros, você precisa vencer partidas de basquete contra esse cara chamado criativamente de "Inimigo". Cara, e eu achando que eu tem tinha pais que davam Master System é que tinha problemas... Seja como for, a forma de fazer isso é roubando a bola através de bundadas. Eu não faço ideia de que jogo eles roubaram isso, mas estou feliz que exista a possibilidade de jogar como a Imperatriz do Amanhã no NES.

E assim nascia "Os Flagstones" (depois rebatizada como "Os Flintstones" pq Flagstone já era o nome de uma família de uma tirinha da época), que era um sitcom sobre duas famílias vizinhas que tinham problemas que qualquer cidadão suburbano dos anos 60 poderia se identificar como lidar com o chefe, atender os caprichos da esposa, dar aquela escapadinha para "jogar boliche", ou lidar com um eletrodoméstico novo que não funciona. O elemento fantástico é que eles eram famílias da "idade da pedra", então todas as conveniências modernas tinham seu equivalente improvisados com dinossauros e pedras. 


Foi um sucesso avassalador. Os adultos adoraram essa sitcom parodiando situações do cotiano, coisas com as quais eles podiam se identificar e as crianças... bem, era animação e isso já era mais do que suficiente porque criança aceita qualquer merda mesmo.

A série foi bastante revolucionária para o seu tempo também, sendo a primeira vez que mostrou um casal dormindo na mesma cama, mesmo nas séries live action isso não era tão comum (resquício de regras de censura dos anos 30 que acabaram se fixando na cultura mesmo depois que as leis em questão já tinham ido). Também foi o primeiro desenho animado a retratar uma mulher grávida (Pedrita não é inicialmente parte da família, Wilma fica grávida durante alguns episódios da terceira temporada antes dela nascer), infertilidade, adoção e brigas conjugais.
 

Claro, hoje em dia não é nada espetacularmente notavel, mas para um sitcom dos anos 60, os Flintstones era tão a frente do seu tempo quanto se podia ser. Tanto que a série seguinte de Hannah-Barbera para o horário Nobre, pegava bem mais pesado no tema "para um cara casado classe-média suburbano que tem um emprego bosta se identificar". Só ver pela abertura:


... o que levanta algumas questões interessantes, mas os Jetsons já é assunto para outro jogo.

Esse final é uma das coisas mais Flintstones que eu poderia imaginar. Tipo, é um homem das cavernas que viajou através do tempo um milhão de anos no futuro, que consegue navegar dentro de uma perigosa fábrica de robôs com tecnologia milhões de anos à frente de seu tempo e derrotando uma espécie de sósia futurista de Hitler que usa três tipos de futuristas armas contra ele, incluindo uma bazuca e um TANQUE MECHA FUTURISTA, com apenas um porrete martelos e ovos explodindo. Eu repito. Um homem das cavernas viajando no tempo indo para o futuro conseguindo vencer muitos robôs, incluindo um tanque apenas com um porrete pré-histórico. Te desafio a pensar em algo mais Flintstones que isso. Impossível.
Os Flintstones ficaram seis temporadas no ar, sendo que por volta da quinta temporada os roteiristas já haviam completamente pulado o tubarão ao ponto de colocar um marciano com poderes mágicos na série. Sim, isso realmente aconteceu, e você achando que o macaquinho do Ross que era falta de ideias... mas o que importa é que os Flintstones foram pioneiros em vários aspectos, como ser o primeiro desenho da televisão a ter episódios de vinte minutos (até então, os desenhos tinha a duração de 5-10 minutos e eram exibidos um depois do outro). A duração maior de cada episódio possibilitou a criação de histórias mais elaboradas – o que fez com que os Flintstones fossem também a primeira série de desenhos a ter um “arco” na TV).


Exceto talvez a fase que se passa na China com bambus, caratecas e lutadores de sumo. Chamado carinhosamente pela Ação Games de "Terra do Chá". Vocês totalmente pegaram um jogo aleatório que tinham pronto e só tacaram os sprites dos Flintstones em cima, né Taito?

Então se hoje nós assistimos desenhos mais complexos do que seria necessário para entreter crianças de até 7 anos de idade, agradeça ao Yaba-daba-doo - um desenho que moldou a televisão mais do que normalmente recebe o crédito.