segunda-feira, 3 de agosto de 2020

[ANTIGA GAMERS 002] ESCAPE FROM MONSTER MANOR (3DO, 1994)[#452]



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Meninos, meninas e dogolitos do meu Brasil baronil, hoje é um dia muito especial. Hoje, neste blog, começa a lendária, épica, chocolatante saga da quinta geração de videogames. Uma era de emoções, frustrações, alegrias e ranger de dentes inicia hoje e acompanharemos tudo aqui, a partir de agora!

Portanto não se pode falar da 5a geração de consoles sem falar daquele que abriu a porteira deste admiravel mundo novo, o inesquecível, o lendário, o tão aguardado, aquele console fabricado por uma produtora japonesa de eletronicos que entrou no ramo dos consoles e que tem “SON” no nome!

Estou falando, é claro, do grande e único...


PANASONIC 3DO!

ESPERA, QUEM?


Sim, o 3DO. Achou que eu estava falando de quem?

EU LITERALMENTE NUNCA VI UMA COISA DESSAS, NEM NUNCA OUVI FALAR DE ALGUÉM QUE SEQUER TENHA VISTO UM PESSOALMENTE. COMO ISSO PODE SER TÃO GRANDE COISA ASSIM?

Ah, mas o 3DO foi realmente uma grande, enorme, colossal coisa para a história dos videogames. Apenas... não exatamente da forma que seus criadores gostariam que fosse. Veja, nossa história começa, como muitas outras, no tenebroso e sombrio ano de 1983, o nefasto ano em que o mercado de videogames da Atari veio abaixo. A boa noticia é que nos ano seguintes duas coisas espetaculares para a humanidade aconteceram: a) eu vim ao mundo; e b) a Nintendo reconstruiu sozinha todo mercado de games ocidental.

E uma das primeiras coisas que a Nintendo se preocupou ao renascer os videogames no ocidente era evitar repetir os mesmos problemas que mataram a Atari: uma quantidade indescritivel de jogos lixo atulhando as prateleiras sem controle nenhum da fabricante ao ponto que os jogadores simplesmente pararam de se importar já que pegar um jogo não fosse uma aberração tão ruim que distorcia o espaço-tempo era uma possibilidade bem baixa.

Para evitar isso, a Nintendo tomou duas medidas: a primeira foi a criação da Nintendo Power, uma revista de videogame dedicada a cobrir extensivamente os jogos de modo que os consumidores pudessem saber o que estavam comprando e assim não se frustrar (e assim nasceu toda industria de revistas de videogames que são a razão de existir desse blog), e a outra foi o “Selo Nintendo de Qualidade”. Mas o que era esse selo, exatamente?

Escape from Monster Manor foi lançado no Japão com o nome de Virtual Horror: Norowarate Yakata, e ironicamente uma capa bem menor horrorosa 
Bem, esse selo era um conjunto de medidas que a Nintendo tomou de forma a garantir que ela tivesse total e absoluto controle do que entrava no seu aparelho. Isso quer dizer que ela tinha um controle draconiano da produção dos jogos: ela fabricava os cartuchos ela mesma, ela tinha que aprovar os jogos que as softhouses mandavam para ela, as softhouses então compravam lotes de cartuchos dela e pagavam uma taxa para a Nintendo fabricar os jogos.

Digamos, por exemplo, que você quer fazer um jogo para Nintendinho chamado “Lolis Homeopáticas Ninjas”. A primeira coisa que você tem que fazer é mandar seu jogo para a Nintendo, que vai escrutina-lo com um filtro family-friendly e mandar você tirar toda violência gráfica, simbolos religiosos e outras imagens polemicas (a versão de Rocketeer de NES, por exemplo, tem os simbolos nazistas - que são os inimigos do jogo - retirados). Qualquer coisa que pudesse incomodar a qualquer um era retirado do game.

Em seguida isso sendo aprovado, você tinha que comprar um lote de cartuchos da Nintendo, sendo que esses lotes eram padrões de 10 mil. “Ah, mas eu estou fazendo um jogo pequeno de baixo orçamento, acho que não vai vender muito mais que mil cópias, é uma coisa indie mesmo”, ao que a Nintendo responderia “Ema ema ema cada um com seus pobrema. Não gostou vai pra concorrencia, e boa sorte lançando jogos no Master System...”


EFMM é um clone de Wolfenstein 3D, só que sem passagens secretas, sem música e sem outras armas além dessa aí
Mas não termina aí. Depois de pagar pelo cartucho, você ainda tinha que pagar para a Nintendo o preço dela fabricar o jogo e mais uma taxa de licenciamento para o jogo rodar no sistema dela. O resultdo final disso era que dos 60 dolares que um jogo de Nintendinho custava na prateleira para o consumidor, cerca de 15 ficavam com a Nintendo. Isso era quase o mesmo que ficava para o desenvolvedor do jogo, uma vez descontados custos de distribuição e a comissão do vendedor e tal.

Era um sistema que funcionava, e puta merda, como funcionava para a Nintendo e o principal motivo para ela posteriormente não adotar CDs quando do Nintendo 64. Ser pago TRES vezes para cada jogo que os OUTROS faziam sem correr risco nenhum? (pq se o jogo encalhasse nas prateleiras, o problema era da publisher e não dela) Puta merda, que negócio bom!

Então, é, a Nintendo estava muito feliz com esse sistema. As publishers, entretanto, estavam... consideravelmente menos felizes. Mas então, qual era realmente a outra opção?


O jogo não é ruim, apenas leva ao pé da letra demais se contentar em ser um clone de Wolfenstein 3D e não tenta nada disferente
O Master System era uma piada de vendas, o PC Engine nunca deu certo fora do Japão, e quando o Mega Drive chegou, todas as grandes desenvolvedoras estavam presas em contratos de exclusividade com a Nintendo. Quando esses contratos acabaram (por volta de 93/94, que foi quando a Capcom e a Konami começaram a lançar jogos para o Mega Drive), o Mega Drive era uma pedra afundando nas vendas ao ponto que não compensava realmente. Elas podiam sonhar a noite dar com a cara da Nintendo numa pedra com tanta violencia que faria o final de God of War 3 passar no Discovery Kids, mas a verdade é que elas não tinham realmente muito para onde correr realmente.

Exceto que um homem em particular não estava realmente satisfeito com essa situação. E esse homem era Trip Hawkins, então CEO da Eletronic Arts. Para os gamers de hoje, essa informação por si só já é mais do que suficiente para entender várias coisas. Afinal quando se pensa em Eletronic Arts em 2020, a primeira coisa que vem a mente é a imagem do executivo babaca que vai pisar em quem for necessário para atingir as metas dele. Mais precisamente, uma sala de reuniões repletas de fratboys fisicamente incapazes de demonstrar qualquer empatia humana seria uma visão adequada. Se “O Lobo de Wall Street” tem um correspondente no mundo dos videogames, a Eletronic Arts é essa imagem.

Sério, eu estou falando de uma empresa que anunciou que Star Wars Jedi Fallen Order não ia ter microtransações, que você não ia ter que comprar itens com dinheiro real dentro do jogo para progredir e que o jogo que já custa 60 dolares não seria focado em um multiplayer pago como se isso fosse um ato enorme de generosidade e consideração por parte dela. Esse é o nível da cultura empresarial dentro da EA.



E dentro de toda essa cultura de toxidade (além de inumeros casos comprovados de assédio moral e outros tantos não comprovados de sexual), Trip Hawkins era o macho alfa quarterback de colegial que tinha orgulho de estar no topo. Então, como você pode imaginar, ele não estava nada, mas nada contente mesmo em ter que baixar a cabeça para um bando de japoneses.

Mas, novamente, não é realmente como se a EA tivesse realmente para onde correr (e Risette-chan é testemunha que eles tentaram outras opções, eu já joguei mais que a minha cota para uma vida inteira de jogos deles para Amiga e Mega Drive), não é como se eles pudessem simplesmente fabricar um novo consoles e serem eles a próxima Nintendo e...

... espera, por que eles não podiam fazer isso mesmo?


Infelizmente o jogo tem muita pouca munição para ser chamado de bom tb, e vc tem que constantemente ficar reabastecendo

Agora, veja, fazer videogaes é caro. É inacreditavelmente caro. Pensa só: já reparou que não existe uma fabricante de “computadores”? Você tem empresas focadas em fazer peças individuais: placa de video, placa mãe, coolers, processadores, memória, etc. Mas porque ninguém teve a ideia de juntar tudo isso numa fábrica sé e ser uma grande fabricante de “computadores”? Porque não é economicamente viavel, é por isso. Isso só passou a existir a partir dos notebooks apenas porque era mais inviavel ainda vender as peças separadas ao consumidor final, mas se pudessem eles totalmente fariam isso (e ainda sim notebooks são muito, mas muito mais caros que PCs que configurações similares). E videogames não são nada além de computadores, só que dedicados a uma única função (quer dizer, naquela época, hoje um console tem quase as mesmas funções que um smartphone).

Então Trip Hawkins sabia que não era um negócio viavel para a empresa dele se a própria Eletronic Arts construísse um parque industrial, uma linha de montagem e desembestasse a sair fabricando consoles, definitivamente isso não daria certo. MAS, veja bem, MAS se ele conseguisse convencer uma grande empresa de eletronicos a embarcar nessa e fazer os videogames dele pra ele vender os seus jogos...




Trip podia ser um executivo babaca de marca maior, mas também era um puta homem de negócios. Se alguém no mundo podia convencer uma empresa a entrar nessa brincadeira, era ele. Não que fosse algo tão dificil assim, por volta dessa época os videogames começavam a desbancar o cinema em lucratividade no mundo, com a diferença que quem mandava no cinema eram estúdios macacos velhos cheios de todas as manhas de quase um século de negócios e nos videogames o terreno era controlado por duas empresas de fundo de quintal (sendo que uma delas não fazia a mais remota ideia que estava fazendo, vulgo Sega).

Era apenas uma questão de tempo até uma grande empresa de verdade perceber que havia muito, mas muito dinheiro a ser feito nesse admiravel mundo novo. Trip apenas precisava levar essa proposta a porta certa. E foi o que ele fez.

Sua primeira tentativa foi com a Sony, mas estranhamente a Sony não pareceu muito interessada no assunto apesar de fazer muito sentido para ela. Ela apenas respondeu sem abrir a porta direito que tava ocupada com “umas paradas aí” e que não estava interessada no negócio.



Nos anos seguintes se descobriu que era porque eles já haviam percebido que videogames eram um oceano inteiro sem nenhum peixe grande nele, e eles estavam se preparando para nadar de braçada nessas aguas. A segunda empresa que Trip procurou foi a maior concorrente da Sony na Asia, a Panasonic. E aí sim deu negócio. Nascia assim, finalmente, o primeiro videogame da quinta geração lançado internacionalmente: o Panasonic 3DO.

Lançado no final de 1993, o 3DO era o sonho molhado de qualquer desenvolvedora basicamente porque ele era um console desenhado por uma desenvolvedora. Imagine um carro que fosse projedo a partir dos desejos do piloto e não a partir da realidade logistica da fabricante, o 3DO era basicamente isso. Isso quer dizer que era insanamente fácil programar para o 3DO e que o seu hardware atendia todas as necessidades que as produtoras da época sequer sabiam que tinham. Para ter uma ideia de como o 3DO era tão bem construído e tão bem pensado de um ponto de vista tecnico, basta dizer que suas especificações não deixam nada a desejar para o Playstation - lançado um ano depois e que durou no mercado até 2001.




Ou seja, do ponto de vista tecnico o 3DO era um esbugalhamento de tudo que o Super Nintendo e o Mega Drive jamais poderiam sonhar em fazer mesmo nos seus dias mais loucos. Considere também que haviam muitas, muitas empresas desesperadas pra mandar a Nintendo a puta que o pariu e estavam mais do que dispostas a abraçar um novo player com uma politica de negócios nova, o que significava que muita, mas muita gente mesmo queria fazer jogos para esse novo sistema.

Adicione a isso uma campanha de marketing daquelas beeeeeeeeem agressivas e babaconas, bem do jeitinho que os americanos gostavam nos anos 90 (Sega #beijomeliga) e o hype era real. Adicione mais ainda funções multimidia (incluindo ler os recem criados cartões de memória de cameras fotograficas digitais, tecnologia de ultissima novidade) e o 3DO figurava como o eletrodoméstico mais esperado do natal de 93, não apenas escolhido por revistas de games mas também por revistas de tecnologia e até mesmo a Time!

HMM, SABE COMO TUDO ISSO SOA, EM SE FALANDO DE 1993?

Absolutamente incrível?

BEM, SIM. TAMBÉM. MAS ALÉM DISSO, ISSO TUDO SOA CARO. MUITO, MUITO CARO.

Você não está errado, Jorge. Tudo isso era muito caro de se fazer e ter tecnologia um ano afrente da concorrencia não é algo que sai barato. Adicione a isso que videogames são produtos deficitarios de produzir, e dá pra começar a entender onde o 3DO deu errado. Como eu já disse, videogames são basicamente computadores e computadores sendo, não dão dinheiro para serem feitos (novamente, se desse a Intel ou a NVidea te venderia o PC pronto e não apenas o chip). O Nintendo Wii, em 2006, foi o primeiro videogame da história a ser vendido com lucro para o fabricante. Até então os consoles eram feitos com prejuízo para o fabricante (por volta de 100 a 200 dolares por unidade), que depois era recuperado com o licenciamento de jogos.

Lembra aquele esquema da Nintendo de ficar com cerca de 15 dolares de cada 60 que um jogo custava? Então, a Nintendo fazia isso porque era o único modelo de negócios viavel a ser feito. Era isso ou vender o Super Nintendo por 400 dolares, e isso significaria não vender porra nenhuma. O próprio modelo de negócios da Sega não era tão diferente, ela ficava com cerca de 12 dolares de cada 60. Ainda hoje é como você financia esse negócio, e esse é um dos motivos pelos quais a Microsoft está dando graças a Deus cada jogo de XBOX ONE SERIE X XIRIBELA CONTROLE COM PILHA que você joga no Windows e não no console.


Eu ia dizer que essa fase que se passa em Twin Peaks foi loka, mas nada realmente é muito loko nesse jogo não
A 3DO Company (empresa fundada pela EA para gerir o aparelho) resolveu o lado dela desse problema licenciando o aparelho, o 3DO era na verdade uma franquia de videogames. Isso quer dizer que quem quisesse podia fabrica-lo desde que seguisse algumas especificações e não tirasse nada dele (mas podia acrescentar, se eu quisesse lançar o 3DO DOGOLITO QUE FAZ CAFÉ COM CREME por exemplo eu poderia). A Panasonic foi a primeira a comprar essa ideia, mas não a única - por isso o 3DO é frequentemente chamado de “Panasonic 3DO”, mas houveram modelos de outras empresas. No sistema que funcionava essa franquia, a Panasonic ficava com as vendas do console, a 3DO Company com as licenças dos jogos. 

O que era ótimo para as desenvolvedoras de jogos, porque como a 3DO Company não precisava recuperar o lucro em cima do aparelho, ela podia oferecer licença de jogos a preços que a Nintendo e a Sega jamais cogitariam oferecer - cerca de 3 dolares por jogo, ao contrário de 15 e 12 da concorrencia.

NÃO, MAS ESPERA. ESSA CONTA NÃO TÁ FECHANDO. VIDEOGAMES NÃO SÃO VENDIDOS A UM PREÇO ACESSÍVEL A MENOS QUE SEJAM SUBSIDIADOS PELA FABRICANTE.

Sim.

E ELA RECUPERA ESSE DINHEIRO DEPOIS COM OS JOGOS.

Exatamente.

MAS SE A FABRICANTE NÃO VAI FICAR COM O DINHEIRO DOS JOGOS, ELA TEM QUE RECUPERAR TODO O DINHEIRO EM CIMA DO APARELHO. O QUE QUER DIZER QUE O PREÇO DO 3DO...

Sono toori.


SETECENTOS DOLARES EM 1993!!!


Mas calma que piora.

O 3DO era, a sua época, de fato o videogame mais avançado do universo - como as propagandas prometiam, totalmente indiferentes ao lançamento do Plution X Plus em Alfa Centauri. O que era algo realmente incrível, algo que nunca tinha sido feito nesse nível e nessa escala antes.

Hoje, quando um videogame novo é lançado, meses antes do lançamento do console as desenvolvedoras recebem kits de desenvolvimento, que nada mais é do que o nucleo de processamento do aparelho sem a carcaça comercial  para quando do lançamento oficial do produto ter jogos prontos já. Todo mundo deve ter visto o modelo "PS5 fritadeira do Bobs" que rodou na internet, aquele era o kit de desenvolvimento que as empresas receberam para ir preparando jogos para ele.


Então, hoje isso é senso comum e todo mundo faz isso. Em 1993 não havia essa experiencia, e os jogos para SNES e Mega Drive eram simples de programar. Qualquer softhouse tinha em seu escritório um computador com as configurações de memória e processamento dos consoles, usa aquilo e taca ficha.

A partir da quinta geração com jogos em 3D a programação ficou muito, muito, mas MUITO mais complicada e você precisaria de um dev kit para conseguir emular as condições do aparelho com precisão. Mas como eles iam saber disso aquela época? Então a Panasonic achou que só passar as especificações para as empresas era suficiente.

Não foi. O resultado é que o console foi lançado em outubro de 1993 com apenas UM jogo disponível. Eu disse UM. Todos os outros jogos do 3DO atrasaram. Mas TODOS. Agora imagine isso, você pagou 700 dolares (o equivalente hoje a quase uns 1500) por um videogame de ultima geração... e tem UM jogo pra ele!

Ação Games 050 de janeiro de 1994
O único jogo de 3DO disponível no lançamento foi o jogo de corrida Crash 'n Burn, que nem da Eletronic Arts era. Sim, até a própria EA se embananou em fazer jogos para o seu proprio console porque a falta de dev kit para third partys era um dos problemas, mas nem de perto o único.

Outro problema bem grave era que o 3DO foi feito por duas empresas que não entendiam porra nenhuma de fazer hardware videogames - por mais estrutura que a Panasonic tivesse em outras areas. O resultado foi que a 3DO Company fez atualizações contínuas no hardware do console quase até o lançamento do sistema, em alguns casos em menos de um mês antes do lançamento. Então nem a própria Eletronic Arts tinha as especificações para fazer jogos para o console, que dirá empresas terceiras. 

Adicione a isso que a Panasonic achou que manjava dos paranaues de produção e logistica mais do que ela realmente entendia, porque videogames tem necessidades inteiramente diferentes de distribuição e varejo do que televisões e videocassetes. O resultado foi que no dia do lançamento a maioria das lojas de varejo recebeu apenas uma ou duas unidades. Em meados de novembro (um mês depois do lançamento), o 3DO havia vendido 30.000 unidades no mundo todo. Em comparação, o Super Nintendo esgotou seu lote inicial de 300 mil unidades em poucas HORAS. Apenas no Japão.

UAU, O LANÇAMENTO DESSE VIDEOGAME FOI UM FESTIVAL DE DESGRAÇA. MAS A ELETRONIC ARTS NÃO FEZ NADA PRA RESOLVER OS PROBLEMAS DELE?

Então, ela fez.

Eventualmente as coisas se acertaram e vários jogos foram lançados para ele. Jogos até mesmo bons que todo mundo conhece como Myst, Road Rash, Policenauts do Hideo Kojima, e Wing Commander. Alguns até mesmo são franquias que continuam existindo até os dias de hoje como Need for Speed

Não foi exatamente esse o problema.

ENTÃ ELES RESOLVERAM O PROBLEMA DO PREÇO?

Na verdade, sim. A sacada da EA de transformar o 3DO em uma franquia acabou se provando um golpe de mestre. Isso porque eles sabiam que 700 dolares era um preço absurdamente alto para um videogame, mas sabe o que mais eles sabiam? Que só existe uma única coisa que derruba preços no mundo.

REGULAÇÃO DO GOVERNO?

Não, meu caro latino-americano amigo que não entende nada de economia e depois se pergunta pq é pobre, o mais oposto disso na verdade: livre concorrencia. Em 1994 a fabricante de videocassetes norte-americana Goldstar lançou o seu 3DO, e mais pra frente a japonesa Sanyo também lançou o seu. O resultado foi uma guerra de preços entre os modelos de 3DO, e quem ganhou com isso foi o publico. E a Eletronic Arts que recebia pelos jogos.

O 3DO chegou a ser vendido por U$299 no fim de 95, o que era um preço bastante aceitavel. No final das contas a estratégia da EA não estava de todo errada. Como eu disse, Trip Hawkins podia ser um babaca, mas entendia de negócios.

MAS ESPERA, SE OS PROBLEMAS FORAM RESOLVIDOS... PQ O 3DO VIROU APENAS UMA NOTA DE RODAPÉ NA HISTÓRIA DOS VIDEOGAMES E NINGUÉM NUNCA FALA DELE?

Em uma palavra? Timing. A estratégia da EA não estava errada, mas levou muito tempo para dar certo. Em especial, levou todo o ano de 1994 para emplacar e se tem algum ano na história dos videogames que você não poderia ficar dando mole, esse ano era justamente 1994.

Isso porque após um começo hediondo e digno de piada, eventualmente alguns jogos interessantes começaram a surgir... mas não apenas tirar uma primeira impressão ruim beira o impossível, como a concorrencia já havia se movido.

A Nintendo já havia anunciado que estava trabalhando em um novo jogo do Mario... em 3D para o Nintendo 64. A Sony anunciou seu Playstation para ser lançado no natal daquele ano e a Sega... estava fazendo alguma das patetices dela, quem liga?


Provavelmente a 3DO Company imaginou que a Sony estivesse fazendo o seu proprio videogame, mas ela não imaginou que eles estivessem tão avançados a ponto de rejeitar a parceria do 3DO. Se o Playstation tivesse sido começado a ser desenvolvido seis meses depois, a história dos videogames poderia ter sido totalmente outra

E a coisa que tornava o Playstation, um console desconhecido de uma empresa novata no ramo, tão importante assim, é que a Sony assistiu quieta tudo que o 3DO tentou fazer e falhou. Então ela foi lá e fez direito. 

Isso significa que ela se aproximou das empresas que estavam instisfeitas com o modelo de negócios da Nintendo e ofereceu divisões de lucros que apenas ela tinha bolsos fundos o suficiente para bancar. Como era a ideia original do 3DO.

Ela também percebeu o quão problemático era lançar um console sem um lineup pronto, ainda mais quando você é uma empresa sem nome no ramo. Graças a experiencia mal sucedida do 3DO com isso, a Sony enviou kits de desenvolvimento para seus parceiros meses antes do videogame ser lançado, de modo que quando chegou o dia do lançamento os jogos estavam nas prateleiras das lojas e rodando redondinhos no aparelho.

Outra coisa que a Sony meio que já desconfiava, mas tirou a prova real com o 3DO foi que o publico prefere um console ok mas barato do que um console monstrão mas caro. Como consequencia disso, a Sony cortou ainda mais o preço de final do PS1 e ele foi lançado a um prejuízo de 200 dolares por unidade para a Sony.



Então dá pra dizer que o 3DO foi um beta para o Playstation, e ensinou como não fazer diversas coisas no mundo dos videogames. Já diz o ditado que o homem esperto aprende com os seus erros, mas o sábio aprende vendo os erros dos outros. Fazendo tudo absolutamente certo, não foi realmente surpresa que o publico migrou em massa para o Playstation tão logo teve a oportunidade de faze-lo. 

E com o publico foram os desenvolvedores, eventualmente todos os titulos exclusivos do 3DO acabaram sendo lançados no Playstation. É por isso que ninguém lembra dos jogos do 3DO realmente, porque todo mundo jogou esses mesmos jogos no Playstation algum tempo depois. Mesmo aqueles da Eletronic Arts. Sim, a própria criadora do console deu a batalha por perdida e passou para o lado que estava vencendo, decretanto assim a pá de cal em um console que foi varrido da história dos videogames.

Mas, claro, esse é o final da história. No comecinho de 1994, onde estamos agora, ninguém sabia ainda no que isso ia dar e vamos ver ainda o 3DO por um bom tempo nas páginas das revistas. E dito isso, comecemos então a quinta geração de consoles! As coisas ficarão loucas daqui pra frente... embora eu não possa prometer que será do jeito bom.

Antiga Gamers Edição 002


Edição 001