Estamos naquele que pode ser considerado como o ano mais sombrio da história da humanidade. Esqueça a peste negra, esqueça a segunda guerra mundial, esqueça o comunismo. O ano é 1983 e os videogames estão mortos. Pesado, né?
Dali a dois anos, em 1985, um grupo de japoneses incriveis salvaria o dia com encanador saltitante, mas neste momento, no coração pulsante de 1983, a palavra "videogame" causa brotoeja nas pessoas e essa é uma moda tão morta quanto skates de dedo. O que, em qualquer cenário possível, é a coisa mais terrível que poderia ter acontecido. E talvez fosse.
Mas onde muitos viam apenas desgraça, um homem viu oportunidade. Rick Dyer viu aquele cenário catastrófico e pensou que esse seria o momento perfeito para algo inovador, algo diferente de tudo que já havia sido feito antes. Hey, as pessoas não queriam mais ouvir falar de videogames tradicionais, mas isso apenas queria dizer que elas estariam abertas a novas ideias, certo?
E uma nova ideia ele teve. Sua ideia era de um jogo de adventure de texto que se passasse não em uma tela, mas fosse sendo impresso naqueles rolinhos de papel de extrato bancário, assim após jogar o jogador poderia levar sua aventura para casa! Que ideia nova e excitante, certo?
Bem, não exatamente. Não apenas Rick não conseguiu vender a ideia, como em uma reunião com investidores os representantes da Ideal Toy Company (a empresa conhecida pelo Cubo Mágico) sairam no meio da apresentação. Supostamente, eles lhe disseram "escuta, amigo, se eu quisesse um jogo de computador eu teria um jogo de computador, não importa como você imprima isso".
Muitos ficariam chateados, desanimados, até mesmo desmotivados. Mas Rick Dyer se sentiu inspirado por aquelas palavras. Eles estavam certos, não estavam? A sua ideia ainda era apenas um jogo igual aos outros, apenas com um gimmick diferente. Não, ele precisava ir mais além, ele precisava pensar mais fora da caixa ainda!
E foi então que lhe ocorreu. Uma das ideias para executar o seu adventure de texto imprimivel seria armazenar o jogo em Laser Discs - mais ou menos um CD em tamanho de LP - porque, apesar de serem mais caros inicialmente, bastava apenas trocar o disco para ter uma nova aventura - ao invés de ter que montar outro arcade do zero. O que não Rick não tinha pensado inicialmente, mas agora lhe saltava aos olhos, é que a capacidade de armazenamento do Laser Disc era enorme comparada ao HD de um computador da época. De fato, cabia um filme inteiro nessas coisas...
... e um filme é o que ele faria. Um filme jogavel, não menos do que isso!
Tudo bem, Dirk, isso acontece com muitos homens |
Agora, Rick sabia que só tinha uma chance e uma chance apenas para fazer isso dar certo. Os videogames respiravam por aparelhos nos Estados Unidos e a cada dia mais e mais fliperamas fechavam as portas ou se transformavam em lavanderias. Por isso ele tinha que gastar seu unico tiro com uma precisão cirurgica, e isso significava não poupar despesas.
Ele levantou o total de um milhão de dolares - muito para um jogo da época, mas um valor risivel para uma animação de qualidade - e contratou o nome mais talentoso da animação ocidental que cabia no seu orçamento: Don Bluth.
Agora, aquela altura Don Bluth não era tão famoso quanto a veio ser posteriormente, quando em uma parceria com Steven Spielberg ele dirigiu "Em Busca do Vale Encantado", "Fievel: um conto americano" e "Todos os cães merecem o céu". Não é claro o quanto Rick era um visionário do talento potencial do animador ou o quanto ele apenas teve sorte, mas isso não é relevante agora. O que importa é que ele pediu que Don Bluth dirigisse o jogo, ao que Don respondeu que não entendia nada sobre fazer videogames. E é aqui que a genialidade de Dragon's Lair entra.
Dragon's Lair, na verdade, é uma animação de 10 minutos. É sobre um cavaleiro - Dirk, o Destemido - entrando em um castelo para resgatar a princesa Daphne das garras do terrível dragão Singe que raptou a princesa no antigo castelo do mago Mordroc. Freneticamente, a animação espera que você aperte comandos na tela e se você falhar em faze-lo, o Laser Disc então exibe uma animação de morte. Se você inserir os comandos com sucesso, a história continua avançando.
Do ponto de vista de gameplay, é uma bosta. É um Quick Time event altamente punitivo que mais frequentemente do que não, envolve mais decorar os comandos do que deduzir que botão apertar com base do que está na tela. Mas o publico não se importou com isso. A ilusão de ter controle sobre um desenho animado valeu a pena pagar o então arriscado preço de cinquenta centavos (quase todos os jogos de fliperama na época custavam apenas 25). Afinal, de um ponto de vista como produto, era uma sacada genial.
Quando seus concorrentes tinha arcades assim...
... Dragon's Lair era assim:
Não tinha nem como comparar. Na verdade, o orçamento de Dragon's Lair foi tão apertado que a AMS não podia contratar modelos para os artistas desenharem, então foram usadas revistas Playboy como modelo para a animação. O que acabou funcionando tão bem quanto soa dito em voz alta, if you know what i mean
Com um orçamento de um milhão de dolares, Dragon's Lair arrecadou mais de cinquenta apenas na época, isso sem contar ter inspirado um desenho animado para TV, mercadoria
que ia desde um jogo de tabuleiro a adesivos e guardanapos, e um
legado que alcançaria décadas com ports (incluindo um jogo TERRÍVEL para NES), e mesmo hoje o jogo é vendido na Steam, revivals e até mesmo um
projeto de crowdfunding do próprio Don Bluth para criar um teaser na que possa impressionar os investidores com a
esperança de financiar um longa metragem completo de Dragon's Lair, com um
orçamento estimado de US $ 70 milhões.
Outro grande produto que bombou graças a Dragon's Lair foi a manutenção de Laser Discs, porque os players foram criados para executar filmes, eles não foram projetados para trabalhar continuamente e constantemente acessando dados do
disco laser, buscando mudanças de cena. Combinado com a alta popularidade que o jogo estava
experimentando na época, muitos deles acabaram tendo que ser reparados
ou substituídos aumentando os custos.
No ano seguinte, Don e Rick repetiram a parceria com Space Ace. Depois disso Bluth foi ser um grande diretor de animação com Spielberg e Rick provavelmente ficou anos soterrado sobre a pilha de dinheiro que ganhou. O que seria um excelente fim da história, exceto que não foi.
Em 1991, após o fracasso de critica e comercial da animação dirigida por Don Bluth - Chanteclair: O Rei do Rock - Rick achou que era um bom momento para mandar um "oi sumido" para Don. E assim nascia Dragon's Lair II: Time Warp
E sobre o que é Dragon's Lair 2? Bem, basicamente sobre o que quer que tenha passado na cabeça de Don Bluth. O provavelmente implicou no consumo de toda produção de cerveja da Irlanda daquele ano.
Tenho que dizer, para quem acabou de ter dez filhos Daphne está surpreendentemente com tudo em cima |
Após fazer dez filhos com Daphne, nossa história começa com Dirk sendo perseguido pela sogra porque ele foi um moloide e deixou a sua esposa ser raptada DE NOVO. Dessa vez o vil perpetrador é o próprio mago Mordroc, que decidiu que se um dragão podia usar o castelo dele para abater uma novinha, porque ele não podia fazer o mesmo?
Assim, perseguido pela sogra... Dirk vai ao castelo de Mordroc e acaba encontrando uma máquina do tempo que o leva a lugares históricos acurados como a pré-história, o País das Maravilhas...
... o jardim do Eden ...
Aquele momento constrangedor que Eva tem um crush em você |
... o Egito antigo e a sala de um Beethoven gigante.
Dragon's Lair 2 é mais longo que seus predecessores, e ainda muito menos coerente. Como já deu para pegar uma ideia da coisa, é uma das animações mais estranhas já produzidas no ocidente (embora o Japão tenha um anime sobre a Hitler loli, então não entra nem nas 5 coisas mais estranhas que eu já vi animadas). Penssando bem, o enredo segue Dirk (ainda um idiota silencioso) tentando resgatar
Daphne (ainda uma caricatura super-sexualizada) de um bruxo malvado, que
quer colocar um anel de casamento amaldiçoado em seu dedo que vai
transformá-la em um monstro. Ele faz isso roubando uma máquina do tempo
futurista (que fala com a voz abafada de um velho inglês) de uma cobra
escocesa e usando-a para perseguir o bruxo ... que é irmão da máquina do
tempo!?.
Ok, talvez entre nas cinco coisas mais estranhas que eu já vi animadas.
Eva, naaaaaaaaaoooooooo!!!! |
As cenas individuais são muito mais longas aqui do que no jogo anterior, ou seja, se você errar (e você via), é melhor estar preparado para reproduzir novamente toda a sequência de cinco minutos apertando botões. Esse jogo faz um trabalho melhor de telegrafar quais botões apertar e quando do que seu predecessor, porém isso pode se tornar uma armadilha porque se você focar apenas nos brilhos na tela vai perder a mecânica de "tesouros", onde existem vários tesouros escondidos em cada cena que você deve coletar para poder acessar o final do jogo. Se você chegar à última cena sem todos os tesouros, isso fará você começar tudo de novo. Eles são um pesadelo para encontrar sem ajuda e os prompts de botão nunca solicitam que você os pegue.
Após ter que começar o jogo pela oitava vez, você apenas desiste e acaba pegando a opção "watch the game" para ver como terminava sem ter que repetir a coisa toda mais de doze vezes. Não é uma ótima mecânica. Na verdade, aqui vai uma experiência mais divertida do que jogar Dragon's Lair II: Time Warp. Vá até o ponto de ônibus mais próximo e peça a um sem-teto que tire RS$ 20 (o preço do jogo na Steam) de sua carteira e, em seguida, passe a socá-lo nos testículos. Isso é a experiencia de "jogar" Dragon'ss Lair II em poucas palavras, um jogo concebido para roubar o seu dinheiro em fliperamas que a Digital Leisure achou que seria uma boa ideia levar todo o processo para casa, para que se possa sentir roubado na segurança do seu próprio sofá.
Se você acha que esse tipo de coisa era “ok naquela época”, então provavelmente você está certo, já que em 1983 as pessoas não tinham opções muito melhores. Porém Dragon's Lair II foi lançado em 1991. Sid Meier tinha acabado de Civilization, a EA estava trazendo Road Rash para o mercado, e o Sonic The Hedgehog seria lançado no mesmo ano. Na verdade, Sonic The Hedgehog seria lançado apenas 10 dias depois do primeiro lançamento do jogo nos arcades. Então, é, em 1991 nós tinhamos opções melhores que essa, sim.
Em resumo, Dragon's Lair 2 é uma experiencia de animação válida para se assistir pela qualidade da animação e pela criatividade de Don Bluth (principalmente nas death scenes). Para jogar, no entanto... apenas assista, sério.
VERSÃO PARA PC
EDIÇÃO 024