domingo, 17 de fevereiro de 2019

[AÇÃO GAMES 015] XARDION (SNES, 1992) [#188]



Videojogos dependem bastante de ter algo que os diferencie dos 8 octilhões de jogos que foram lançados antes dele no mesmo genero, senão qual é o ponto de comprar algo que é apenas igual aos outros? Esse diferencial pode ser os gráficos, a narrativa ou mesmo o próprio conceito do jogo.

No começo dos anos 90, entretanto, suas opções de variedade eram bem mais limitadas. Basicamente o que você podia mexer era apenas no gameplay, salvo raras exceções, e a essa "mecanica diferenciadora" dos jogos eu chamo de gimmick.

Bem, e o que acontece então quando um jogo tem um gimmick até certo ponto criativo mas então devota toda e qualquer energia para não faze-lo funcionar? Esse é o caso de Xardion, mas antes disso - como de costume - vamos ver a história horrível por trás desta aventura!



Sete décadas atrás, no ano de 208C, ou 2108AD para os terráqueos, um raça de seres altamente inteligentes construiu a arma definitiva do do juízo final para proteger seu planeta. Esse dispositivo foi nomeado Xardion e já adianto que era um robozão gigante. Porque, claro, se você vai construir uma máquina com capacidades apocalipiticas é claro que tem que ser um robozão gigante, oras! Mas divago. 

Não, Panthera, não faz xixi em cima do prédio em ruinas!


O ser de inteligencia artificial foi construído no planeta Fiera, o planeta de fogo do Sistema solar Alpha-1. Em Fiera, a ciência havia evoluído há muito tempo para o que o manual chama de "estado de super teoria". O que é uma "super teoria" é algo que o manual nunca explica, mas eles chegaram lá. Imagine como lhe convir.

O ponto é que a comunidade científica daquele planeta descobriu que um esgotamento da camada de ozônio causaria uma mudança drástica na o planeta no futuro e acabaria inviável em aproximadamente 285 anos. Esse é um prazo estranhamente especifico para uma previsão climática global, mas suponho que nossos cientistas não sejam tão capazes quanto os de Fiera. Por outro lado, o buraco na camada de ozonio era a grande preocupação ecologica nos anos 90 (mais ou menos o que o aquecimento global é hoje) foi mais ou menos resolvido pelos nossos cientistas (ou substituido por problemas muito maiores, se você quiser ser pessimista), então chupem fieranos! Mas, novamente, divago.

Enquanto isso, no outro extremo da galáxia, um professor, o Dr. Sim U. Late (sim, esse era o nome dele mesmo) estava trabalhando em sua teoria da vida e ambientes onde ela pode se desenvolver. Seu objetivo era rejuvenescer um único planeta e construir um ecossistema artificial. Uma vez que sua teoria estava completa e ele conseguiu um planeta morto para testar, ele deixou um humano no planeta para testar seu projeto "New Frontier". Seu objetivo era controlar o eco-sistema e permitir que as pessoas da Fiera se mudassem para este planeta seguro quando chegasse a hora de Fiera não ser mais habitavel aos fieranos (por causa da camada de Ozonio, losers).

Infelizmente, o doutor Sim U. Late ficou doente e na antecipação de sua morte ele programou os super computadores do planeta NGC-1611 para controlar todas as funções de a ecologia, incluindo sua defesa. Os super computadores deram defeito 12 anos depois (mais uma vez, parece um número completamente arbitrário e sem relevancia nenhuma na história) e o único habitante do planeta foi deixado para sobreviver a própria sorte.

Os dispositivos de segurança do planeta tentaram proteger a cobaia humana e ecosistema. Os computadores interpretaram mal suas instruções como "procurar e destruir". Sem o controle dos computadores sobre os guardiões do planeta,  eles logo se tornaram bestas de raiva e fúria, mutando muitas vezes além de seu design original. Esses novos mutantes entenderam que qualquer coisa que não fosse o próprio mundo de NGC-1611 era uma ameaça, e em seu banco de dados eles descobriram os mundos originarios do Sistema Solar Alpha 1. Logo, um exterminio lhes pareceu necessário.

Durante um mês o Sistema Solar Alpha 1 sofreu com a guerra sem saber porque estava sendo atacado, mas em um ato de desespero, os líderes dos três planetas rapidamente resolveram suas diferenças e juntaram forças para lutar contra os invasores de NGC-1611, cada planeta enviando seu mecha mais poderoso até NGC-1611 e acabando com o inimigo em sua própria raíz.

O plano é simples: passar pelos três planetas e deter a invasão para só depois ir até o planeta deles e destrui-los onde eles moram... mesmo que ir direto ao planeta deles possivelmente terminaria a guerra mais rapido, mas o que eu sei?


Imediatamente "Triton: King of the Sea" foi comissionado pela oceanosfera, Aquata. O mundo oco, Zikar, enviou Panthera - o leopardo cibernético e Fiera enviou Alcedes, o Beastybot telecinético. Assim, os três mechas viajarão até NGC-1611 onde tentarão recuperar Xardion, a arma definitiva e com ela por um fim a guerra!


Uau, é uma história realmente elaborada para um jogo de SNES, não?  Bem, não é tão surpreendente já que todo design do jogo foi criado por veteranos da industria de animes, como Hajime Katoki (da série Gundam) e Yasuhiro Moriki (responsavel por animes domo Zeoraimer, Nadesico e Detonator Orgum), assim como parceria com o estúdio Gainax.

Se isso parece muito com a descrição dos bastidores de Alisia Dragoon, bem, é parecido mesmo. Xardion é o Alisia Dragoon do SNES - um jogo com sistema de níveis como um RPG onde você alterna entre um dos três mechas, cada um com habilidades distintas.

Só que se Alisia Dragoon é um jogo ruim com boas ideias, Xardion tem os mesmos defeitos de Alissia porém nenhuma das suas boas ideias.

Me permita explicar: ambos os jogos você controla um personagem muito grande na tela e muito lento (embora uma certa noção de peso possa fazer com que o personagem responda de acordo,  já que estamos falando de um robô gigante, os personagens de Xardion lidam como se estivessem perpetuamente na água até a cintura, avançando desajeitadamente sem nunca ganhar impulso), que é abalroado por uma infinidade de projeteis dos inimigos. O jogo te ataca muito e não te dá nenhuma ferramenta ou meios de se defender. A sua melhor - e francamente, única, aposta é destruir os inimigos antes que eles disparem uma barragem de tiros em você.

Você está vendo na tela todos os ataques deste boss


E nesse aspecto, Alisia possui seu raio teleguiado que é uma boa arma, e uma criativa no mundo dos games. Xardion não. Os três robôs que você pode alternar tem um ataque ridiculamente patético e uma batalha contra boss dura em média uns DEZ MINUTOS.

Não porque ela seja super complexa ou tenha muitas fases, nada disso. Os bosses tem apenas um padrão de ataque que normalmente é bastante simples. O que faz levar dez minutos é que o seu tiro é tão insignificantemente fraco que é necessário muitos e muitos e muitos tiros para derrotar um boss. Com efeito, o que normalmente te mata em uma luta de chefe nem é tanto a dificuldade dela, mas sim que você tem que repetir os mesmos movimentos tantas vezes que eventualmente você vai acabar errando. É um jogo que te vence pelo cansaço, e isso é o oposto de ser divertido.

Sem mentira, no tempo que você luta contra um único boss em Xardion dá para fazer um boss rush contra TODOS os chefes de Megaman X. Sério, eu contei!


Agora, isso não pode estar certo. Um dos dois jogos tem que estar fazendo algo errado e eu realmente não acho que seja o jogo do bombardeiro azul - um dos melhores jogos do SNES, alias.

Mas va lá, esse jogo ainda seria qualquer coisa menos do que mortalmente tedioso se o seu gimmick diferenciador fosse interessante, certo? E é aqui que eu reassumo o que eu disse no começo do texto, porque esse jogo é tão ruim que ele sequer parece perceber que ele destrói o seu gimmick em seu próprio conceito.

Vamos lá, qual é o gimmick desse jogo? Ora, assim como em Alisia Dragoon o charme aqui é que você pode alterar entre três personagens diferentes como o Mega Man troca de arma (em Alisia você troca o seu familiar, mas a ideia é a mesma). Ok, legal, legal - como diria o Velberan - mas o que esse jogo faz de tão errado assim?

Da esquerda para direita: Triton, Panthera e Alcedes


Ora, bem simples: os três robos tem capacidades diferentes. Triton tem a habilidade de atirar em todas as direções (para cima, para os lados e para baixo), Alcedes apenas um ataque corpo-a-corpo que pode virar um projetil que atira para frente depois de evoluido (mas não é particularmente mais forte que o ataque de Triton) e Panthera... tem a vantagem de ser mais baixo que os outros porém atira só para frente.

Então espera um pouco aí... eu tenho três robos... um atira em qualquer direção e os outros não... porque eu usaria qualquer outro robo que não Triton? Bem, a resposta é simples: não usa. Com efeito, a mecanica de experiencia do jogo transforma isso em um efeito bola de neve, porque como você vai ganhar experiencia só com o robo que estiver usando em poucos minutos Triton já vai estar muito mais upado que os demais, eliminando por completo qualquer esperança de usar outro robo que não seja ele.

É um conceito que derrota a si mesmo.

O jogo tem tão pouca auto-consciencia do que esta fazendo de errado que o ponto mais baixo é, tragicamente, a aquisição do próprio Xardion, no qual a arma suprema capaz de destruir civilizaçõe... começa no nível um e requer que você revisite os estágios anteriores para coletar itens que não estavam presentes na primeira vez que você visitou. O que deve parecer um momento culminante acaba fazendo nada além de matar o ritmo e fazer você upar a "arma definitiva", que coisa tosca.

E isso realmente é uma pena, porque a Gainax e os figurões dos animes fizeram um puta trabalho criando os cenários para esse jogo. Os três planetas de Alfa 1 e  NGC-1611 parecem genuinamente distintos um do outro, e seus respectivos robôs parecem extensões naturais de seus ambientes. O Triton, estilo Gundam, está em casa no elegante navio de guerra cinzento que forma a peça central de Aquata, e o design do escaravelho de Acledes e o cajado solário enquadram-se nos desertos da Fiera. O mais impressionante, no entanto, é Zikar, uma “Terra Oca” com uma superfície congelada e uma selva tropical ocupando o interior.

A história também tem momentos que indicam como Xardion tinha potencial de ser bom. O diálogo entre os personagens é freqüente, escrito com competência e não diminui o ritmo do jogo. O único problema é que nunca fica claro qual personagem está falando, mas para um jogo de SNES ainda é muito acima da média. As revelações sobre o que realmente aconteceu em NGC-1611 são surpreendentemente mórbidas para um jogo SNES de 1992, e o final, que se passa cem anos depois da batalha final, reflete sobre o significado da história e revela que Xardion se transformou em uma árvore, parece algo que veriamos em um RPG da Squaresoft. 

O maior momento, porém, é o chefe do estágio seis. Depois de escalar até o topo da tela, nossos heróis encontram "Hell Gunner", um mecha invencível que lava o chão na frente deles com balas ... fazendo com que o chão desmorone e Hell Gunner caia da tela. Os personagens, então, expressam aborrecimento pelo fato de não terem tido a chance de lutar contra ele e passam para o estágio sete. 

Honestamente, Xardion é uma bosta de jogo. Mas teria sido um anime de mecha do caralho.