No começo dos anos 90, uma das maiores armas da Nintendo contra a Sega eram os contratos de exclusividade que a Big N possuia. Enquanto a Sega tinha que amargar nunca ver a cor de jogos da Capcom, Konami, Squaresoft, Bandai e qualquer outra empresa que seja digna de você lembrar. Esse acordo foi criado no começo da vida do Nintendinho, e na época não pareceu grande coisa para as empresas, afinal a Nintendo botou o pau na mesa e disse "é do meu jeito ou pode ir para a concorrencia, ah é, opa, não tem nenhuma mwahuahuahaua", ao que as empresas tiveram que concordar.
Qual era a outra opção? Lançar jogos para o Atari? Para o SG-1000 da Sega? Err, melhor baixar a cabeça mesmo...
Havia uma empresa, no entanto, que nunca precisou baixar a cabeça para a Nintendo. Uma empresa tão grande, tão maior do que ela que provavelmente a Nintendo jamais ousou propor tal acordo e na improvavel situação de propor ela apenas arremessaria o Satoru Iwata pela janela e diria "Eu não preciso disso, eu não preciso de nenhum de você porque eu sou rica, RICA, RICAAAAAAAAAAAA!!!!!!!!".
Essa empresa era, é claro, a Disney.
Agora, a Disney por si só não fazia jogos. O que ela fazia era licenciar suas marcas e então ficava fungando no cangote dos desenvolvedores para ver se eles não manchavam o bom nome dos seus produtos. Isso acontece até hoje, na verdade, e a EA levou uma comida de bunda do tamanho da Kessel Run pela patuscada que fez com as microtransações em Battlefront 2. Isso significava que trabalhar com a Disney não era exatamente fácil, mas uma vez feito era uma licença para imprimir dinheiro. Não é surpresa dizer que, salvo raros acidentes (sim Fantasia, estou olhando pra você), os jogos da Disney sempre tiveram um padrão muito alto de qualidade.
E a Sega aproveitou essa oportunidade com unhas e dentes para criar seus proprios jogos licenciados da Disney, os quais foram todos muito bons (sério, qual é o teu problema, Fantasia?) e a Nintendo não podia fazer na a respeito. Bummer, dude.
Neste jogo, Pato Donald contra... ay caramba, mata-le com fuego! |
Entre os jogos criados pela Sega sob a licença da Disney todo mundo vai lembrar facilmente de Castle of Illusion, Quackshot, World of Illusion e a Pequena Sereia (a qual ficou MUITO parecida com o jogo desenvolvido pela Capcom para o Nintendinho e a Sega apenas disse "ops, olha só que coincidencia!"). Um jogo que quase ninguém lembra, entretanto, é um exclusivo do Master System que saiu em 1992: a Patuscada da Moedinha da Sorte de Dez Centavos.
Agora, você pode estar se perguntando: "Espera, quem diabos lança jogos para o Master System em 1992? Essa coisa já não estava morta a essa altura?". Sim. E não. Em 1992 as pessoas no Japão e nos Estados Unidos mal lembravam que a Sega tentou competir com o Nintendinho em um console de 8bits, mas na Europa e no Brasil o console mais barato e de menor qualidade da Sega ainda um sucesso o suficiente para se justificar lançarem jogos exclusivos nesses lugares. Muitos jogos na verdade foram lançados exclusivamente para a Europa e o Brasil, e este aqui é um deles.
A ideia original da Sega era fazer um port de Quackshot para Master System, porém o resultado não saiu como o esperado e eles teriam que mudar tanta coisa para adaptar o jogo que sairia mais simples apenas fazer um jogonovo, e um jogo novo foi o que eles fizeram. Assim, o Pato Donaldo ainda viaja pelo mundo em fases que você pode escolher a ordem, e depois de três fases iniciais mais três abrem. Concluida essa, então a fase final. Igual Quackshot, porém com sérias restrições orçamentárias.
Eu não estava brincando quando disse que Lucky Dime é a versão de Quackshot para o homem pobre |
O primeiro jogo Master System do pato Donaldo é um jogo de plataformas bastante seguro. Você vai da esquerda para a direita, pula em inimigos e coleta bônus. A Sega não foi particularmente a lugares inovadores quando se trata do design geral de Lucky Dime Caper, mas o que eles fizeram foi nos fornecer um jogo de plataforma bastante sólido.
Este é um jogo que exige que você meio que decore a posição dos inimigos nas fases, simplesmente correr através de cada nível em Lucky Dime Caper não vai terminar em sucesso, a menos que você tenha os reflexos de um pombo. O grande problema da dificuldade do jogo é que Donaldo aguenta apenas dois hits, e após tomar o primeiro ele perde sua arma e se torna mais inútil que eu em uma balada. Quer dizer, tecnicamente você ainda pode pular nos inimigos, mas dado o hit detection e a movimentação de Donald, eu não recomendaria contar com isso...
O grande problema do jogo é que a Sega cometeu um PEQUENO erro de programação aqui: durante o jogo você coleta estrelas, e essas estrelas vão acumulando no canto da sua tela - igual a energia em Mario 2. Então sua primeira intuição é achar que aquilo é a sua barra de energia, certo?
Bem, não. Aquilo DEVERIA ser sua energia extra, mas não faz nada. A Sega comeu mosca programando esse jogo.
E como eu sei que isso é um erro de programação e não uma característica intencional do jogo? Porque eles ARRUMARAM isso quando fizeram o port do jogo para Game Gear. Não surpreendentemente, a versão de Game Gear (que foi a versão desse jogo lançada no Japão e EUA) é muito mais agradavel do que a de Master System porque você consegue recuperar energia e aguenta mais do que dois hits (ou um e se tornar mais inutil que horario eleitoral para deputado)
Ô Sega, quando não faz na entrada faz na saída, né? Mas pelo menos o jogo te dá continues infinitos, o que significa algumas boas horas jogando as mesmas fases, mas enfim, paciência é uma virtude, e se você quer que Donald saia com todas as suas penas de cauda, então você terá que colocar sua cara de gamer retro e se comprometer. Os checkpoints no jogo também não são tão bem distribuidos quanto você gostaria, as vezes alguns trechos de níveis duram muito tempo com muito pouco alívio até chegar a uma transição para outra tela.
Dificuldade a parte, os gráficos do jogo são impressionantes: é imaginar que os jogos de Master System possam parecer melhores do que isso. Cores ricas, boa animação, ambientes variados e pequenos pedaços de detalhes interessantes contam o quanto de esforço a Sega colocou na produção desse jogo. Quando você fica parado em lugares quentes, Donald mostra uma animação de calor e quando fica parado no gelo ele passa frio. São pequenos bytes gastos com coisas assim que, enquanto não melhoram a qualidade em termos práticos, aumentam o valor da sua apresentação como um todo.
Pato Donaldo visitando Manaus |
Lucky Dime Caper é um jogo de plataforma sólido. Ele contém sete níveis de plataformas decentes que testarão suas habilidades e lhe darão uma sensação de satisfação quando você terminá-lo. O desafio inerente é aumentado pela coisa de não ter energia extra e pela hit detection meio zoada, mas nada que tire o charme deste título. É bonito, matar as coisas é satisfatório e a jogabilidade geral é envolvente. Para quem, em 1992, ainda tinha apenas um Master System e não um Mega Drive para jogar Quackshot ou um Super Nintendo para sentir que seus pais o amavam, é um jogo bastante recomendável.