domingo, 13 de novembro de 2022

[#1002][Nov/96] DISRUPTOR


Uma das coisas interessantes nesse projeto é acompanhar de perto os começos humildes de desenvolvedoras que hoje são titanossauros da indústria dos videogames. Eles já exibiam os traços de design que exibem ainda hoje, ou seu começo foi algo totalmente constrangedor e embaraçoso?

A From Software, que hoje por exemplo só lança jogo se for pra empilhar GOTY, teve seu começo com KING'S FIELD, que dadas as limitações técnicas do Playstation já exibia um bom naco do DNA da empresa. Por outro lado, a empresa mais premiada da história dos videogames, a Naughty Dog, teve um começo beeeeeem menos digno com WAY OF THE WARRIOR.

Eu estou falando isso pq hoje é dia de falar do jogo de estreia de um dos cachorros grandes e quentes do mercado: a Insomniac Games. Caso o nome não lhe seja imediatamente familiar, com certeza seus jogos o são.


Então como foi o começo da carreira desses caras que não dormem? Terá sido um fracasso aterrador ou desde o começo eles já apresentavam um dado potencial para a grandeza? É o que veremos hoje com o INTERROMPEDOR!

Eu normalmente elogio a capa japonesa do jogo mais do que a americana, mas nesse caso eu mal posso explicar para o que eu estou olhando

A primeira coisa que vc vai notar a respeito do INTERROMPEDOR é que esse jogo originalmente foi desenvolvido para o 3DO apenas pq no final da sua vida a 3DO Company estava deseseperada por jogos (e quando não esteve?) e seu kit de desenvolvimento para as produtoras era realmente barato. O que foi exatamente como a Doguinho Safado começou com WAY OF THE WARRIOR... o que não é um bom sinal, tenho que dizer.

Mas como eu sei que esse jogo originalmente foi desenhado pro 3DO? Bem simples, cenas filmadas em FMV. Sendo o sucessor espiritual do Sega CD, o 3DO costumava acreditar que filmar atores baratos com fantasias mais baratas ainda era uma boa forma de aproveitar o espaço extra do disco e diferenciar o seu jogo. O que de fato diferenciava o seu jogo, embora nem sempre de uma forma positiva. Raramente positiva, na verdade.

O presidente Gordon Ramsey IV faz uma transmissão ao vivo, que é assistido em uma tela que economiza em cantos por rejeitados para o elenco de VR Troopers

Então, sim, aqui toda a história do jogo é contada através de FMVs inenarravelmente bregas. A primeira coisa que você vê ao inicializar o disco é um FMV do Presidente Krieger falando sobre a LightStormer Corps que defende a democracia ao redor da Galáxia. Como eu disse, brega e não teria como ser mais anos 90 mesmo que fosse pago pra isso. O que não é necessariamente uma coisa ruim, um pouco de breguice noventista cai bem aqui e acolá.

Verdade seja dita, a atuação na verdade nem é tão ruim durante as cutscenes. Se você viu Starship Troopers, sabe exatamente no que vai se meter com este título. Há algumas atuações exageradas em situações impossíveis com fantasias e cenários ridiculos. No entanto, se vc gosta de frases de efeito que deveriam ser bordões fodões mas que nunca pegaram, então o diálogo é puro ouro.


Porém tem que ser dito que a história é interessante, você joga como o irmão de um oficial da Lightstormer Corps começando na carreira militar. Suas primeiras missões são em um treinamento de RV, onde você aprende como manejar sua arma e como usar os poderes psiônicos. Você continua a subir na corporação até que uma missão o faz recuperar um artefato alienigina que desbloqueia habilidades psionicas únicas e isso atrai a atenção do presidente.

À medida que você faz mais e mais missões para o presidente, entretanto, você percebe que algo está errado. Eventualmente vc descobre que as missões para eliminar terroristas ou inimigos da democracia na verdade eram missões em que você era enviado para enviar inimigos politicos do presidente. Como esse jogo é um produto dos anos 90, é claro que ele descobre isso ao hesitar eliminar uma gatínea rebelde e todos se apaixonam smack smack because anos 90.


De qualquer forma, isso resulta numa reta final de vingança contra o homem que o enganou e que secretamente governava a galaxia com mão de ferro. Como eu disse, não tem como ser muito mais filme de ação anos 90 que isso, mas esse é um dos legais. A história é interessante e contada em sua breguice 90tista, a Insomniac ganha pontos aqui.

Outra coisa pela qual esse jogo ganha pontos... é pela jogabilidade em si. O que é sempre algo bom de se ganhar pontos em um jogo, eu te digo. Esse é um FPS Doom Clone porque apesar dos cenários serem feitos em 3D, você não pode andar e mirar como em QUAKE. Não, a mira é travada no centro da tela dando aquela sensação de 2.5D de DOOM.

Porém não se pode negar que o level design em si aprendeu algumas lições com os FPS verdadeiramente 3D como o já citado QUAKE ou DESCENT. Com efeito, o jogo tem um level design realmente criativo e está sempre se esforçando para te dar missões diferentes de apenas "achar a saída" - como por exemplo a fase onde a estação vai explodir em 30 segundos e vc precisa ir reativando os geradores para ganhar +15 segundos e ter tempo de chegar até a saída. Ou o nível que você tem que evitar destruir refens misturados aos inimigos. O level design é tão interessante, de facto, que ele foi elogiado por John Romero. E se o level designer de DOOM elogiou o seu trabalho, bem, vc basicamente zerou a vida.

Porém o que REALMENTE torna esse jogo interessante é o sistema de poderes psiquicos. Isso pq vc tem um contador de mana que é usado para gastar nos seus poderes psiquicos que vão desde um ataque 1hit-kill a distancia melee, uma bomba que mata todo mundo em area e até mesmo a capacidade de se curar.


O que torna isso interessante, entretanto, é que um dos seus poderes psiquicos é disparar uma rajada mental que não causa muito dano, mas se acertar se converte em uma esfera que regenera sua mana. Então o jogo é construído sobre esse equilibrio de usar seu uso de PP para o que a situação do momento exige (recuperar vida, alguns segundos de invencibilidade ou apenas uma bomba em area) e usar o drain básico para ir recuperando sua mana.

O que isso resulta é um jogo cheio de várias armas e poderes à sua disposição, onde eles tem que ser usados estrategicamente conforme a situação exige. O que poderia ser overwhelming se apenas despejado no jogador, mas o Disruptor faz um bom trabalho de introduzir tudo lentamente. Cada nível oferece uma nova arma ou poder, garantindo que sempre haja algo novo para se ver, e complementa isso com um tipo diferente de objetivo ou tipo de inimigo para enfrentar. 


A variedade vista por toda parte é louvável e faz desse um jogo sólido, mover e atirar é responsivo o suficiente para o jogo ser divertido. O que torna o jogo menos divertido, no entanto, é a dificuldade. Por volta da metade do jogo o desafio realmente começa a sair do controle. 

Os inimigos se tornam cada vez mais difíceis e, como os níveis se tornam consideravelmente mais apertados, você não pode evitar explosões de projéteis com tanta frequência ou mesmo tirso à queima-roupa. Os itens de cura se tornam muito mais escassos, e usar drain para restaurar seus pontos psiônicos é uma dor porque você precisa toca-los fisicamente antes que eles desapareçam (o que é bem rápido) - o que significa que você precisa correr para os inimigos no meio do tiroteio.


Se a dificuldade do jogo fosse melhor polida esse jogo certamente seria uma hidden gem do PS1 pq a jogabilidade, o level design e os poderes estão lá. Só faltou deixar tudo mais divertido. O que é muito mais um problema de inexperiencia da Insomniac do que inexperiencia realmente.

Algo que, felizmente, a Sony percebeu de imediato e trouxe a Insomniac para debaixo da sua asa, convertendo a empresa em uma second party e essa parceria dura até hoje (com efeito, mais tarde a Sony acabou comprando a Insomniac e hoje eles estão desenvolvendo Spider-Man 2 e Marvel's Wolverine exclusivos para o PS5). Disruptor acabou não sendo um grande sucesso de publico, e dá pra ver o pq por causa da dificuldade que mina a diversão do jogo, mas definitamente mostrou esses malucos da California vieram pra ficar!


MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 111 (Janeiro de 1997)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 035 (Fevereiro de 1997)