As coisas boas vêm em três. Ou será que as coisas boas vêm em pares e as coisas ruins vêm em três? Ou o oposto disso? Três é um numero onde tem um par e uma vela? ... você mata dois coelhos com uma cajadada só? ... tá, eu admito que não sou exatamente brilhante em ditados populares. Mas deixando de lado os chavões do povo, o que eu sei é Shining Force é uma dupla de trilogias: esse é o terceiro jogo da séri, ergo esse é o SF3, mas também é o terceiro jogo da trilogia que o próprio SF3 é.
MAS OI?
Pois é. Recapitulando a ideia: dado a falta preocupante de jRPGs no Saturn para concorrer no Japão, a Sega decidiu que tiraria até a última gota de Shining Force 3 dividindo o último jogo da série em três. Só que ao invés de meter um hobbitão da massa e dividir um unico produto em tres partes com muita encheção de linguiça, o que a Sega fez aqui até que foi uma ideia sagaz: Shining Force 3 conteúdo consiste em três jogos contando uma história sob três pontos de vista.
A ideia geral da coisa é que a Republica se separou do Império e viviam em relativa harmonia até a Republica supostamente sequestrar o Imperador - acredita-se que devido as dificuldades economicas da Republica. Na verdade tudo foi uma armação do Império que orquestrou a farça como justificativa para a guerra, sendo que a razão real disso tudo é que o Império estava sendo manipulado por um culto maligno que queria sangue derramado a rodo para despertar um Deus mais maligno ainda adormecido. História cool, thou.
SHINING FORCE 3: Scenario 1 - The Titan of Aspia conta a história contada pelo cavaleiro Synbios - filho do principal general da Republica e que estava como lider da guarda republicana quando a suposta tentativa de sequestro aconteceu.
SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God mostra a história pelo ponto de vista do principe do império Medion, que comaça a jornada como inimigo de Synbios mas descobre que tinha caroço nesse angu e durante o caminho se alinha a Synbios para enfrentar o culto maligno.
O cenário 3 de Shining Force III é contado da perspectiva de Julian. Ao contrário de Synbios e Medion, Julian não é privilegiado e não é ninguém particularmente importante na verdade. Nos jogos anteriores, Julian aparece brevemente como nada senão como líder de um grupo mercenário querendo cumprir a missão que lhe pagaram e embolsar uma graninha. Julian aparece pela primeira vez para ajudar Synbios a embarcar em um trem perto de Railhead no Cenário 1 - sendo que nessa hora Synbios queria caçar um vândalo.
Os vândalos são os demônios da lenda, os governantes do Reino dos Mil Anos que se desfez 1000 anos antes. E nesse pequeno desvio que começa em SHINING FORCE 3: Scenario 1 - The Titan of Aspia e continua em SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God, Julian na verdade queria um vândalo em particular, Galm. O entendimento de Julian é que Galm matou seu pai 10 anos antes, e Julian jurou vingar essa morte. Em SHINING FORCE 3: Scenario 1 - The Titan of Aspia aliado a Synbios, eles derrotaram o vândalo de que Julian tinha ouvido falar, mas não era Galm. Galm apareceu no dia seguinte e jogou Julian no rio por ter a ousadia de desafiá-lo. Em SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God, sabemos que Julian de alguma forma acordou mais tarde, quando Medion estava marchando sobre Barrand.
Sem muitas opções, Juliano decidiu ser contratado por Medion e o auxiliou durante toda a campanha contra os cultistas de Bulzome nas terras de Elbesem. Em dado ponto de SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God, o caminho de Julian se separa de Medion quando Medion teve que voltar para Saraband, e é aqui que começa esse jogo.
Como dá pra ver, esse é definitivamente o projeto mais narrativamente ambicioso da Sega em todos os tempos, e não posso dizer que foi com pouca surpresa descobrir que todo o ponto dos jogos anteriores na verdade acabaria sendo introduzir Julian sem muito alarde - ele não parece particularmente importante nos jogos - para então concluir a trilogia sob o ponto de vista dele. Uma surpresa, para ser honesto, mas uma bem vinda.
Visualmente, os gráficos do cenário 3 de Force III são mais ou menos a mesma coisa que os cenários 1 e 2, apenas vagamente melhorado – mas então não é como se desse para tirar do Saturn muito mais do que isso, então esse resultado é okay. O que realmente muda é que existem algumas novas invocações e ataques mágicos, juntamente com vários novos ataques especiais para personagens individuais. Auditivamente, a trilha sonora é okay como no SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God, mas nada de outro mundo. E como esse jogo nunca foi lançado fora Japão, existe apenas a dublagem japonesa que é muito boa.
Mecanicamente, você pode importar o save dos seus jogos anteriores, o que importa a lista de equipamentos e o nível de experiência de cada personagem transportado desta forma para o capítulo final, alem existem numerosos momentos nos Cenários 1 e 2 que afetam eventos nesse jogo aqui. Por exemplo, em uma luta de SHINING FORCE 3: Scenario 2 - Target: Child of God se Medion matar a esposa de Produn, Stella, no início do jogo, Produn jurará vingança contra Medion e será seu inimigo no Cenário 3. Por outro lado, se vencer a luta sem matar Stella, Produn pode ser recrutado para seu grupo. E assim vai, itens, personagens recrutaveis, inimigos, várias coisas podem ser herdadas das versões anteriores e isso é bem legal na real.
Claro, os jogos podem ser jogados separadamente (como de facto o são vendidos no Japão), mas não posso dizer que cada vez que um momento desses de herdar uma escolha ou um item, eu sentia isso ser muito maneiro. Suponho que exista algum incentivo para o replay na trilogia, fazer escolhas diferentes, mas então é uma trilogia que facilmente passa de 150h de jogo... eu passo, mas respeito quem faça a empreitada.
Uma observação interessante sobre as batalhas do Shining Force III (especialmente nesse capitulo) é que muito poucas delas são simples batalhas em campo aberto. Normalmente as batalhas têm algo mais acontecendo. Vários personagens devem ser recrutados no campo de batalha e, se morrerem antes que o jogador os alcance, o personagem estará morto para sempre. Uma batalha permite a furtividade real em um RPG tático, por meio de faróis que iluminam a equipe do jogador a cada dois turnos, mas nos turnos opostos deixam o inimigo efetivamente cego. Variedade é o nome do jogo e tem sempre algo acontecendo de diferente no cenário - seja a entrada de personagens no meio do combate, itens do cenário interagiveis ou algo do tipo
A grande mudança desse jogo na franquia, entretanto é que o Cenário tem duas pessoas vitais em cada batalha. Usualmente você tinha o lider que se morresse era game over (todos os demais podiam ser ressucitados nas cidades depois), aqui temos dois personagens "lider" que não podem morrer por luta - sendo que um deles, Gracia precisa de ajuda pq ele é mais um mago do que um lutador da linha de frente e sua defesa reflete isso.
E de modo geral, a opção de composição do grupo é bem interessante: alem dos já citados Julian e Gracia, você tem um Pégaso e uma Fada em sua equipe, com potencial para um Dragão opcional também. Edmund e Produn são generais com arsenais únicos de armas e magia: se Synbios não a matou, Spiriel é outro general sem magia, mas que usa as variantes mais poderosas do triângulo de armas. Jubei é um Samurai com uma invocação que só ele pode usar, e por aí vai
O Cenário 3 também apresenta algumas alterações em relação a evolução de personagens é que o jogo começa no meio da narrativa de ambas as partes, os personagens da equipe de Julian já estão promovidos e o poder dos inimigos é consideravelmente maior no início. Apenas Gracia tem o poder de promover uma segunda vez (tornando ele menos morrível como Apóstolos da Luz).
Mas bem, no fim do dia esse jogo não foge muito ao que experimentamos desde SHINING FORCE: The Legacy of Great Intention de 1993. Não dá pra dizer que essa é uma franquia que evoluiu, isso tem que ser dito, porque mecanicamente o jogo é o mesmo desde o Mega Drive - cinco anos atrás. Entretanto isso não chega a ser um grande problema dessa vez em particular, dado que não apenas a mecanica é sólida como ela é complementada pelos gimmicks do jogo ser uma trilogia e contar uma história por tres pontos de vista diferentes.
Muitos anos depois a série Mass Effect ficaria famosa por fazer justamente isso - importar seus itens e escolhas para os jogos seguintes da série - porém aqui já dá pra dizer que a Sega fez satisfatóriamente em 1998. Isoladamente SF3S3 não é a ultima coca cola do deserto, é apenas um RPG Tático comum. Mas quando jogado como o gran finale de um projeto ambicioso da Sega, bem, vou te dizer que não tem como tirar muito mais do Saturn que isso tanto mecanica quanto narrativamente.
...
Sim, eu sei. Eu passei o texto todo elogiando a decisão e a execução da Sega. É estranho, e esse mundo do novo normal assusta tanto a mim quanto está assustando a vocês, se querem saber!
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER