sábado, 25 de setembro de 2021

[SNES/MEGA] PHANTOM 2040 (Junho de 1995) [#763]


Nos anos 30, uma coisa fazia bastante sucesso nas bancas de jornal: as histórias de detetives noir temáticos ("O Espirito", "O Sombra", "O Batman" - esse último to sentindo que pode pegar, heim). Homem sérios resolvendo crimes numa cidade corrupta, comumente com uma fantasia sombria because comics.

Outra coisa que fazia bastante sucesso na época eram as aventuras em selvas exóticas e selvagens, um lugar misterioso do qual o cidadão comum da cidade grande não fazia a mais remota ideia de como poderia ser esse lugar tão longe da sua realidade. Robinson Crusoé, Tarzan, THE JUNGLE BOOK (Mowgli) e outros menos populares e hoje esquecidos (como "Jim das Selvas") atulhavam as páginas das revistas pulp (que, como o nome sugere, eram HQs de um material de papel de qualidade baixissima e que compensavam mais pela quantidade do que pela qualidade).


Foi aí que o cartunista Lee Falk viu uma oportunidade que ninguém estava explorando: e se houvesse uma HQ que fosse sobre um detetive noir E ao mesmo tempo sobre aventuras exóticas na selva? Juntando os dois generos mais populares da época, nascia assim "O Fantasma".

Do ponto de vista político, o Fantasma é um herói bastante ambíguo. A primeira vista, ter o "herói branco que vai se meter numa cultura ancestral e "ensinar pra eles como se faz" não é uma trope que eu não curto muito.


Mas eu entendo que é assim que as histórias nessa época rolavam, se ia ter um herói na Africa ou na Asia ou em algum lugar assim a HQ só venderia se o herói fosse um "salvador branco". Porém, ao mesmo tempo várias aventuras mostram o herói como um defensor da soberania dos povos africanos e asiáticos, lutando contra vilões colonialistas britânicos.

Como era muito comum a época (e ainda é hoje), a ambiguidade do personagem se deve ao fato do roteirista depender da percepção do público á sua época ao longo das decadas. Inicialmente, nos primeiros anos da série, prevalecia o caráter super colonialista e os estereótipos racistas em relação a africanos (quase sempre mostrados como selvagens, imaturos, ignorantes e supersticiosos) e asiáticos (mostrados quase sempre como sádicos e maquiavélicos, mesmo quando na forma de sensuais vilãs). 

Após a Segunda Guerra e com a desintegração dos impérios coloniais europeus na África e na Ásia, passou a prevalecer uma caracterização mais favorável dos povos asiáticos e africanos, especialmente após os movimentos civis dos anos 60/70.


Mas bem, apesar do nome, o Fantasma nada tem de sobrenatural. Na verdade essa é uma sacada inteligente do autor: embora o personagem não tenha nada de sobrenatural, os inimigos sabem tão pouco sobre ele que eles pensam que ele é de fato um fantasma. Tipo "não pode ser, eu tenho certeza que acertei um tiro nele!", quando o herói desviou ou está aguentando o ferimento. Essa ideia do Fantasma ser mais uma ideia na mente dos inimigos que um superpoder foi a grande inspiração para o Batman, lançado apenas três anos depois.

Conhecido como o “espírito que anda” ou o “homem que não morre”, o Fantasma na verdade é trata-se de uma dinastia de justiceiros mascarados que existe a mais de 400 anos e quando um Fantasma morre, ele é sucedido pelo seu filho (obviamente que os inimigos não sabem disso, e acham que ele é o mesmo espirito a 400 anos protegendo o reino fictício de Bengalla (que mais ou menos ficaria em algum lugar da India, embora a partir dos anos 60 Bengalla passou a ser descrita como ficando na Africa).


Os quadrinhos contam as aventuras do 21º Fantasma, Kit Walker (como os Phantoms encontraram 20 noivas dispostas a morar em uma caverna no meio da selva é uma pergunta que jamais foi respondida, entretanto).

Em 1996 O Fantasma ganhou um filme estrelando Billy Zane, e se vc acha que o vilão almofadinha de Titanic é uma escolha estranha para um filme... é pq é mesmo. Mas não é um filme ruim, contudo. Tem aquela ação meio brega/espalhafatosa Indiana Jones, as vezes é meio cringe, mas geralmente é um filme okay. Com efeito, “The Phantom” foi escrito por Jeffrey Boam, que escreveu “Indiana Jones and the Last Crusade" e isso é algo que dá pra notar de longe.

Se alguma coisa, a única coisa que eu realmente não gosto nesse filme é que a fantasia tirada literalmente dos quadrinhos realmente não encaixa em um filme live action, fica muito fora de esquadro quando ele é a única coisa fantástica no filme inteiro. Mas meh, é um filme okay pra Sessão da Tarde ou pra Temperatura Máxima.

Mas bem, agora que você já tem uma ideia de quem é o Fantasma, eis aqui uma pergunta pra vc bonitão: como você vende um herói de quadrinhos de 1936 para crianças de 1994? Ora, é muito simples na verdade, eles simplesmente fizeram o Fantasma... DO FUTURO!


... hã, não, não ESSE "Fantasma do Futuro" (meu deus, que tradução horrível pra Ghost in the Shell), e sim ESSE Fantasma do futuro:


A principio a ideia parece estranha, afinal o Fantasma é uma série sobre aventuras na selva. Colocar ele numa metropole cyberpunk parece o exato oposto do que o personagem se propõe, porém quando você pensa sobre isso na verdade faz sentido sim.

No ano de 2040, desastres ambientais, guerras e o fim dos recursos naturais no início do século 21 dizimaram o frágil sistema ecológico, tendo como saldo uma Terra vazia de vida. Em Metropia (antes conhecida como New York), a maior e mais poderosa das cidades-estado, a única esperança para a salvaguarda da humanidade é a selva com milhares de milhas quadrados de vegetação mutante capaz de sobreviver nesse solo hostil.


Então a questão da natureza na verdade é central para a série, porque o Fantasma literalmente luta para defender o que restou dela. Por exemplo, na trama do jogo (que eu falarei a seguir) o objetivo é resgatar o último exemplar de uma pantera negra do mundo - o que se desdobra em uma grande conspiração emrpesarial. Então, sim, é uma ambientação cyberpunk com foco na natureza, taí algo que não se vê todo dia.

Meu maior gripe com esse cartoon é que, bem, ele não é muito bonito de se olhar. Quer dizer, o estilo dos desenhos não é algo que eu acho legal, parece que esticaram a imagem pq eles são muito altos e magros, não é uma coisa esteticamente maneira.


Apesar dos meus problemas com o visual, o cartoon Phantom 2040 de 1994 é talvez o mais memoravel dos produtos com o nome do Fantasma graças aos seus enredos inteligentes e designs de personagem bizarro

Isso foi algo que me chamou atenção no jogo para SNES, pq eu achei um jogo bom gráficos bem feios e esticados - apenas para descobrir que a culpa não é do jogo, ele é baseado em um cartoon feio e esticado. 

Isso sendo dito, esse jogo Fantasma é normalmente apontado como um dos melhores jogos licenciados dos 16 bits... o que considerando que ele não foi feito pela Ocean, não é algo tão dificil assim também.

Em termos de gameplay, a comparação mais próxima que pode ser feita para explicar Phantom 2040 é provavelmente SUPER METROID. Isso não é algo muito comum, porque metroidvanias são um genero muito raro nessa época - se mais nada porque desenhar mapas organicos assim é um trabalho do cão. 

Bem, claro, com a diferença óbvia sendo que SUPER METROID é infinitamente superior em atmosfera, apresentação do cenário, música, controles, level design, power ups, chefes, inimigos... tá, okay, ser comparado com um dos melhores jogos de todos os tempos também é complicado.


Mas okay, comparações com Super Metroid de lado, meu ponto é que a proposta de Fantasma 2040 é bastante semelhante. Vc tem um grande mundo que pode visitar varias partes e conseguir power ups para desbloquear outras, e você vem equipado com um gancho que permite que você explore esses níveis enormes. 

Tem toneladas de armas adicionais e power ups nesse jogo (14 pra ser exato), além de veículos que você pode operar, te dando uma ampla gama de opções sobre como superar os obstáculos. Melhor que isso, na verdade, esse jogo tem um total de VINTE finais diferentes dependendo dos lugares que você desbloqueou e os itens que conseguiu.


Isso é uma abordagem bastante ambiciosa para um jogo de Super Nintendo, eu te digo. Com efeito, é uma abordagem bastante ambiciosa para qualquer jogo em qualquer tempo, então esse crédito tem que ser dado.

Falando em ambição, a história aqui se passa em Metropia em 2040 como no cartoon. Uma pessoa rica em particular nessa cidade é Rebecca Madison, cabeça de uma fábrica de robôs e inimiga pessoal do Fantasma porque ela acredita que o herói matou seu marido. O curioso é que como isso foi com o Fantasma anterior, o atual Fantasma não sabe se o seu antecessor é realmente culpado ou não. 

Seja como for, ela quer construir um exército robo para matar o Fantasma e como um bônus acabar com a habitabilidade da Terra para sempre, para construir no lugar cidades incrivelmente caras de se sustentar de modo que apenas pessoas ricas poderão viver, finalmente realizando o sonho de Caco Antibes e se livrando de todos os pobres do mundo.


De qualquer maneira, Madison quer encontrar a última Pantera Negra do mundo que por causa de alguma coisa na sua mutação tem o poder de reviver o seu marido. Obviamente que existem outras facções de gente não legal interessadas no animal também, então o plot é uma corrida Madison, outras corporações e o Fantasma para por as mãos na última Pantera Negra.  Ao conseguir a Pantera, o Fantasma tem que fazer uma coisa escolha em manter a Pantera para que Madison não possa obtê-la ou a trocar por informações para que ele possa encontrar seus amigos perdidos, e isso é apenas o começo do jogo. Como eu disse, é um jogo bastante ambicioso.

Então a pergunta que realmente tem que ser feita é: o jogo tem qualidade para executar suas premissas ambiciosas?

ME OBRIGUE!

Hã... não exatamente. Tanto na história, mas especialmente na jogabilidade, tenho que dizer que o principal problema do jogo é que ele é muito confuso porque não te dá direções do que fazer a seguir, onde ir. Um jogo como Super Metroid, por exemplo, tem um level design fluído, quando você pega um novo power up sua mente já faz a ligação do que você não conseguia fazer antes e agora consegue.

Em Fantasma, em primeiro lugar, você tem noção de que pegou um item especial pq eles são iguais a munição ou energia. Grande erro. Mas mesmo que você saiba o que tem, o próximo passo é passar algumas horas vagando por aí sem rumo tentando coisas diferentes para ver o que funciona e o que não funciona.


Não é organico, não apenas flui e de bonus envolve caralhadas de backtracking, o que obviamente fica irritante depois de um tempo. Quer dizer, acho que isso é esperado em jogos de exploração desta natureza, mas o jogo é criptico demais nesse aspecto.

E outra coisa ruim é que o jogo não salva em bateria, ele apenas oferece passwords quando você chega em determinadas milestones do jogo. Eu entendo que baterias de save deixa o cartucho caro, mas esse genero de jogo realmente não pode se dar ao luxo de vc morrer e perder o seu progresso.


Enfim, Fantasma 2040 é um jogo licenciado melhor do que você poderia esperar porque ele é ambicioso e tenta de verdade coisas novas. Eu não acho o jogo tão agradavel de se jogar porque a apresentação é bagunçada, matar os inimigos não é satisfatório e a exploração é mais acidental do que um design bem feito.

É jogavel e vale como curiosidade, especialmente porque não existem muitos metroidvanias para essa geração. Não se compara ao Super Metroid, claro, mas então o que realmente se compara?

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