quinta-feira, 4 de abril de 2024

[#1264][Out/98] NINJA: Shadow of Darkness

Analisar um jogo é meio que uma arte: você joga o jogo, tem sentimentos a respeito dele e então transforma isso em argumentos usando pontos tecnicos. Não é suficiente dizer que o jogo te deixa atirar o controle na parede e chorar copiosamente, você precisa explicar porque a jogabilidade te faz se sentir assim, que elementos em particular do jogo vão de encontro a sua vontade de continuar vivendo.

Então, como eu disse, fazer uma analise não é algo que você pode simplesmente bater o olho na capa de um jogo e saber exatamente que tipo de experiencia terá...


... exceto, é claro, que o jogo tenha escrito na capa "dos criadores de". Sério, se alguma coisa tem escrito isso na capa (ou no poster, ou seja o equivalente a isso) é pq os produtores totalmente sabem que não tem nada de especial em mãos e tem que procurar de fora pra dentro uma justificativa para embuxar o consumidor com esse negócio.

Ou seja, esse vai ser um dia daqueles...

Sabe, eu sou um homem de poucas crenças e uma delas é que eu sempre acreditei firmemente que você pode pegar qualquer cenário e torná-lo melhor instantaneamente com a inclusão de ninjas. Casamentos, aniversários, inauguração de um Burger King, cerimonias de posse presidenciais, sequestros presidenciais… qualquer coisa!

... exceto talvez o ninja genérico e americanizado, ou seja, os idiotas que correm em plena luz do dia com pijamas de cor escura e levam uma surra de alunos do 3º ano no estilo Home Alone. 3 NINJAS KICK BACK, por exemplo, é a prova que nem tudo pode ser salvo com ninjas. as divago. 

Entra Ninja Shadow of Darkness, desenvolvido pela Eidos Entertainment e Core Design em 1998 - que, de facto como a capa prometeu, os estúdios que nos trouxeram TOMB RAIDER, porém não foram feitos pelas mesmas pessoas dentro do estúdio. Agora, o curioso disso tudo é que por mais que eu goste de TOMB RAIDER (e muito mais ainda TOMB RAIDER 2 Starring Lara Croft), não tem como não reparar que os outros jogos da Core/Eidos são medíocres na melhor das hipoteses.

Seja CHUCK ROCK ou FIGHTING FORCE, qualquer coisa que a Core/Eidos fez que não seja especificamente TOMB RAIDER é no máximo... meh. E eu vou te dizer que dificilmente vc encontrará um jogo mais meh do que Ninja: Sombras das Trevas (como se o nome desnecessariamente edgy anos 90 já não tenha dado a deixa). Mas pouta que me pareo de tanga la catchanga, que jogo putamente meh!

Mas vamos começar do começo: para um jogo que ostenta "dos criadores de TOMB RAIDER" na capa, você poderia esperar algo parecido apenas apresentando mais combate ninja baseado em corpo a corpo do que Laurinha metendo o pipoco. Esse não é remotamente o caso.

A primeira coisa que vc tem que saber sobre esse jogo, é que ele é um hack'n slash: vc anda com o bonequinho e dá espadadas, o genero que é o sucessor 3D dos beat'm ups. A segunda coisa que você tem que saber sobre esse jogo é que Ninja realmente não gosta dos seus jogadores. Na verdade, eu chegaria ao ponto de sugerir que ele os odeia ativamente. Não acredite em mim? Basta olhar para os primeiros segundos do jogo: um jogador curioso corre direto para o primeiro baú provavelmente será atacado por abelhas que tiram cerca de metade de sua barra de saúde e, se tiver ainda mais azar, o baú também vai ter armadilhas, praticamente te matando no primeiro baú do jogo. NO. PRIMEIRO. BAÚ. DO. JOGO.

Ninja: Sombras das Trevas, senhoras e senhores!

Então desde o seu primeiro minuto, o jogo já faz o jogador ficar traumatizado com todo e cada elemento do jogo, e o jogo está repleto delas. Porém é pior que isso: não apenas o jogo tem os obstáculos ambientais como plataformas móveis, raios laser, espinhos, pedras rolando e muito, muito mais em abundância ao longo do jogo, porém diferente dos baús-armadilhas que apenas causam dano praticamente todos os obstáculos aqui te matam com 1 hit instantaneamente. Bem vindos a hit-kill, the game.

Mas qual é o problema? Armadilhas são comuns em jogos. A questão realmente reside em quão poucas vidas e continues você tem. Sim, vc pode salvar o jogo no começo da fase, mas acredite em mim quando eu te digo que você não vai realmente muito longe tendo um save no começo da fase com apenas duas vidas - se isso acontecer, é bem provavel que vc não tenha outra opção senão reiniciar o jogo

Cabe explicar que você só tem um arquivo de save, e que você salva não apenas com o numeros de vidas como o HP atual, então pode recomeçar a fase com não apenas duas vidas mas também apenas 10% de HP pq foda-se você, apenas por isso.

Claro, as armadilhas são apenas uma parte do jogo. A maior parte é ocupada por lutas e emboscadas a cada passo. Os inimigos começam relativamente educados: no início do jogo, mesmo quando te atacam em grupos você normalmente luta com um de cada vez, enquanto os outros correm em círculos aleatórios nas proximidades antes de decidirem se juntar a eles - como dita a etiqueta dos filmes de ninja, afinal. Porém não demora muito para o jogo tacar em vc um samurai e um monge enquanto demônios bombardeiam você com bolas de fogo e foda-se.

Colocando as coisas da forma que eu coloquei até agora, esse jogo soa como um dos jogos mais dificeis e injustos da história do PS1... o que não está errado realmente, porém a coisa não é TAO feia quanto pinta também, dado que o jogo por exemplo não é totalmente tacanho com itens de vida. Claro, o drop é aleatório e muitas vezes vc vai percorrendo longos períodos sem energia, enquanto em outras vezes vai estar com o HP cheio e abrir dois baús com item de cura. Esta é uma das razões pelas quais passei a apreciar o sistema de medipack do Tomb Raider original, onde você pode economizar itens de cura para gastar quando realmente precisar deles, porém como eu disse não é o fim do mundo também.

No entanto, a coisa pela qual definitivamente todo mundo NÃO vai lembrar de Ninja é justamente aquilo que você vai fazer durante 90% do jogo: para um jogo com temática de artes marciais e um tipo de personagem famoso por sua agilidade e furtividade, Ninja não tem sucesso em nenhum dos dois.  E por isso eu quero dizer que minha nossa senhora do passaquatro molhado, como o combate desse jogo é DESINTERESSANTE!

Como nos antigos beat'm ups, existem combos de 3 socos ou 3 chutes que você pode dar, e você não pode nem misturá-los. Quero dizer, você anda e soca relativamente okay, a hit detection e os aspectos tecnicos do jogo funcionam funcionalmente e não é como se fosse um jogo mecanicamente quebrado nem nada, é mais o problema que com 15 segundos de jogo vc já viu tudo que Ninja tinha a oferecer... e você vai continuar fazendo isso pelas próximas 10 horas. Isso soa como diversão pra vc? Pois é...

Para um jogo que te faz lutar tanto, o combate é absurdamente genérico e chato, sem nada realmente digno de ser lembrado. Quero dizer, existem bombas de fumaça e magia, because ninja, e a magia é até interessante no papel: inspirado em GOLDEN AXE 2, você tem um medidor de energia que preenche com pergaminhos e quando você usa gasta a barra de magia. Quanto mais magia acumulada até a hora que você usa ela, mais forte ela será. Como eu disse, GOLDEN AXE 2 em uma casca de noz.

Infelizmente, na prática esse sistema tem dois problemas: primeiro, apenas não existem tantos itens desses assim, segundo, as magias são abusivamente roubadassas contra os chefes, podendo matar eles com 3 ou 4 spells. Isso quer dizer que o melhor uso que você faz para a magia durante o jogo é nunca jamais em hipotese alguma e guardar tudo para usar nos chefes. Parabens a todos os envolvidos.

Eu acho que, no fim do dia, lembrar os beat'm ups do passado  é a sua maior força e fraqueza ao mesmo tempo. Não tem nada de errado em atravessar de um lado a outro da fase distribuindo tiro, porrada e bomba, o que mais de errado é o quão cruel e punitivo esse jogo é em sua dificuldade - especialmente nas armadilhas e sessões de plataforma, que como eu disse, tudo te causa hit kill e seu estilo de tentativa e erro se torna  bastante problemático.

Perder na fase 6 de GOLDEN AXE 2 é muito menos doloroso quando você tem apenas cerca de 20-45 minutos de jogo até lá. Em Ninja, entretanto, estamos falando de várias horas aqui. Como mencionei anteriormente, é perfeitamente possível salvar o jogo numa posição que não tem mais como vencer - começando a fase com 10% de HP e apenas uma vida.

SE isso fosse o preço a se pagar pelo jogo mais ultradinamico combolente frutífero, ainda vá lá. Mas esse não é o caso aqui, Ninja te bate mais do que tapete em dia de faxina e não te dá muita coisa por isso - CERTAMENTE não um sistema de combate interessante, isso com certeza.

Enquanto o jogo escapa por um triz de ser catastroficamente ruim apenas pq, no fim do dia, tudo mais ou menos funciona como deveria... apenas que o que ele faz com isso varia entre o abusivamente medíocre e o abertamente cruel contra o jogador. Ou seja, é um joguinho ruim e existe uma boa razão para ninguém lembrar desse jogo hoje.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 134 (Dezembro de 1998)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 047 (Fevereiro de 1998)


EDIÇÃO 054 (Setembro de 1998)


EDIÇÃO 057 (Dezembro de 1998)


MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 036 (Dezembro de 1998)