quarta-feira, 31 de maio de 2023

[#1117][Nov/97] TOMB RAIDER 2 Starring Lara Croft


Guess who's back, back again?
Laura's back, tell a friend!
Guess who's back, guess who's back,
guess who's back, guess who's back,
guess who's back, guess who's back,
guess who's back...

Nah nah nah nah nah na na nah!
Nah nah nah nah nah na na nah!

Sim, meninos, meninas e poneis peludos do meu Brasil baronil, cento e dezesseis reviews depois de sua prosopopeica estreia (parece que foi ontem, o tempo voa quando estamos nos divertindo, hã?), nossa querida saqueadora de tumbas (vulgo pior arqueologa do mundo) Laurinha está de volta... como o subtítulo do jogo deixa bem claro.
Mesmo nos jogos ocidentais, a capa japonesa ainda sim é mais melhor de legal

E o título do jogo não é aleatório, saiba você, pq no final de 1997 a Laura já era realmente uma figura maior do que o seu próprio jogo - como eu comentei na review de TOMB RAIDER.

Ela estava em todos os comerciais conhecidos pelo ser humano, em capas de revistas, na Playboy, em outdoors, no intervalo do Superbowl, em capas de revistas, ganhou seus próprios quadrinhos era uma deusa uma louca uma feiticeira. Com efeito, ela se tornou a primeira personagem de videogames conhecida pelo publico geral que não era um mascote infantil como Sonic ou Mario.

Esses comerciais, yo

Se o Playstation precisava de um simbolo maior que videogames não eram mais apenas brinquedos, dificilmente poderia desejar mesmo em seus sonhos mais molhados por um sucesso maior do que Lara Fucking Croft.

Então como é inevitável na indústria dos videojogos - e no entretenimento como um todo, sejamos honestos - uma sequencia seria tão inevitável quanto o Thanos. Especialmente pq sequencias em videogames são radicalmente diferentes de sequencias em filmes ou livros: você já fez todo trabalho pesado criando a engine do jogo e os assets, você já carregou o piano. Tudo que resta agora é refinar algumas coisas e, em uma verdadeira boa sequencia, gastar todo seu tempo no departamento criativo.


Sério, marketing dos anos 90...

Vê, você já fez o jogo funcionar no jogo anterior (espera-se, mas isso é verdade para o TOMB RAIDER original) e isso é o que consome a maior parte do tempo de desenvolvimento de qualquer jogo. Agora todo tempo livre que você tem é apenas para polir uma coisinha que outra e ideias, ideias, ideias!

Por isso não é raro que - diferente de qualquer outra mídia - continuações em videojogos tem muito mais chance de superar o original. O problema, entretanto, é que esse é jogo complicado de se jogar: por um lado você não precisa fazer um jogo novo do zero na continuação, no outro você tem que implementar ideias e conceitos que justifiquem um jogo novo existir.

Faça pouco e você terá nas mãos algo que parece apenas um pacote de expansão do jogo original - o mesmo jogo apenas com novas fases. Não, o equilibrio que uma verdadeira grande sequencia tem que atingir é dar ao jogador a sensação que ele está jogando o 2 de um jogo que ele gostou anteriormente, mas não jogando apenas fases extras do mesmo jogo.

Parece dificil de fazer, hã? Bem, e é. Ainda sim, quando as estrelas estão certas e o vento sopra corretamente, aqui e acolá acontece. DONKEY KONG COUNTRY é um tremendo jogo, mas então DONKEY KONG COUNTRY 2: Diddy's Kong Quest explode a coisa toda para fora d'água a um nível infinitamente superior usando a engine do jogo para expandir o conceito com dois personagens que na verdade são estilos de gameplay bastante diferentes um do outro.


Vê? Essa é a parte das ideias para uma continuação que eu me refiro. Uma continuação tem que ser pensada como um projeto inteiramente novo, você tem tem que ter algo para fazer com ela que não seja apenas gerar mais fases do jogo anterior. O que nos leva a pergunta pertinente aqui: Tomb Raider 2 é um desses casos?

Os tiozinhos britanicos da Core Design tinham uma proposta de projeto novo para nossa querida Laurinha, ou eles apenas ligaram o foda-se e decidiram fazer uma continuação anual da sua franquia de sucesso para pagar os boletos?


Bem, as duas coisas. Tomb Raider se tornou DE FACTO uma franquia anual que a Core Design fazia apenas para pagar os boletos e foi lançado um jogo por ano entre 1996 e 2003. Isso mesmo, OITO jogos na sequencia, batendo ponto todo ano. E ainda foram lançados mais dois ou três jogos soltos antes do verdadeiro reboot da série em 2013 - quando tanto TR foi transformado em uma franquia inteiramente diferente quanto Lara virou uma personagem diferente, mas isso é história para outro dia.

Então a pergunta que tem que ser feita é: eles tinham conceitos novos o suficiente para justificar um jogo novo todo ano? Ou apenas estavam imprimindo novas fases para o mesmo jogo because money?

A respeito disso, eu tenho boas notícias e más notícias. A notícia ruim é que, sim, eventualmente Tomb Raider se tornaria um cadaver sem alma gerando jogos anualmente apenas because money, dando origem a uma penca de jogos que variam entre o absurdamente esquecível e o abertamente terrível.


A boa notícia, na verdade a excelente notícia é que nessa primeira continuação de 1997 não era o caso ainda. Com efeito, os nossos m8 da Core Design estavam estalando de ideias que eles não conseguiram fazer no jogo anterior e agora com um ano livre pela frente sem precisar gastar tempo fazendo o jogo funcionar era um excelente momento para tirar essas ideias do papel.

Que tipo de ideias, você pergunta? Bem, me permitam ilustrar o caso falando de uma fase que é indissociavel desse jogo: 40 Fathoms.


40 Fathoms é um conceito de level design incrível, tão incrível de fato que se você assistir um vídeo dele no Youtube, ou rejogar sabendo o que fazer, ele não vai ter metade do charme. Isso porque 40 Fathoms é realmente como um truque de mágica - você só pode realmente experimentá-lo como deve ser experimentado uma vez. 

Sabe o que eu frequente digo sobre videogames funcionarem de uma forma que a mesma experiencia não funcionaria em um filme ou um livro? 40 Fathoms é um exemplo perfeito disso. Ela é uma experiencia única que só funciona em toda sua magia quando jogado como um videogame e quando jogado pela primeira vez.

Esses efeitos de luz são realmente lindos

Eis como as coisas rolam aqui: Lara Croft, nossa querida aventureira e matadora de de T-Rex, está rastreando uma antiga relíquia chinesa pelo mundo e sua busca a levou a uma plataforma de petróleo abandonada no meio do oceano. Como você pode imaginar, as coisas sairam de controle, a porra toda explodiu e a plataforma afundou no oceano.

Que é onde você realmente começa: na fase anterior Laurinha escapou da plataforma na última hora se encondendo como clandestina em um submarino de emergencia. Mas como desgraça pouca é bobagem, o piloto do submarino se assusta ao tentar desviar de um fodendo tubarão branco e o submarino bate um penhasco subaquático. É onde 40 Fathoms começa.

Seu submarino afundou, você não tem equipamento de respiração, você está cercado por tubarões, não faz ideia de para onde ir e está a 40 braças de profundidade no meio do oceano. Boa sorte.


Ah, e você está ficando sem oxigênio a partir do momento em que tem o controle na mão. Boa sorte mesmo, vc vai precisar.

Tá, mas o que é que esse nível tem de tão espetacular assim e pq eu fiquei tão encantado por ele? Bem, veja as coisas da seguinte forma: Lara Croft, a personagem, está desorientada, perdida no meio do nada e sem perspectiva de sair dessa.


ISSO, um livro ou um filme ou uma coleção de sudokus em ordem alfabética poderiam fazer. Te dizer como um personagem se sente e, em uma boa obra, fazer sentir empatia por ele. Porém o que apenas videogames podem fazer é transferir essa experiencia para o jogador. Não é Laura que está perdida e desorientada, é VOCÊ que está perdido e desorientado, sua barra de oxigenio está acabando e tudo que você vê é escuridão. Ah, e tem tubarões rodeando que você vê de soslaio entrando e saindo do seu campo de visão.

Fodeu, heim?



E essa é a grande magia de Tomb Raider 2: os desenvolvedores arregaçam com os limites do PS1 para te passar essa grande experiencia imersiva. Um dos grandes - se não o maior - problema do PS1 é que ele tem pouca memória RAM. O que quer dizer que seu mundo de jogo 3D só pode ter um numero limitado de elementos na tela e o que quer dizer mais ainda que o console URRA EM DESEPERO E DOR ao tentar renderizar espaços abertos amplos.

Como eu falei na review do primeiro TOMB RAIDER, essa característica do PS1 foi usado a favor do design do jogo focando ele em espaços fechados (como cavernas e tumbas) para criar o cenário do jogo. Um ano depois a Core Design estava se sentindo muito mais confortável com o hardware do PS1 e tentou algo MUITO mais ousado: usou cada truque que ele eles conheciam para criar os maiores cenários que o PS1 já havia visto até então.


Ao contrário do primeiro jogo, a maior parte das fases aqui se passa em espaços abertos e a Core Design usa isso em todo seu favor para dar uma sensação de maravilhamento como nunca antes na história dos videojogos. 40 Fathoms (e as três fases que compõe o arco dos destroços do navio Maria Doria) usam esse espaço amplo para dar uma sensação de claustrofobia.

Jogando essas fases nunca, em momento algum, eu jamais pensei qualquer coisa que senão que eu estava em um navio naufragado no meio do oceano, lutando para encontrar bolsões de ar e atirando em caras que tiveram a mesma ideia. Quer dizer, você literalmente pode olhar pelas janelas do navio de cabeça para baixo e ver os peixes nadando lá fora, e se você for lá você vai se afogar.

Sério Laura, que obsessão é essa em garantir que os dinossauros estejam realmente extintos?

Tenha em mente que eu não estou falando de Bioshock fazendo isso no Xbox 360, eu estou falando do PS1 fazendo isso em 1997! A fase de Veneza, a mesma coisa: em nenhum momento eu duvidei que estava pulando pra lá e andando de lancha nos canais da cidade italiana e trocando pipocos nos bastidores de uma casa de opera.

São cenários tão amplos, tão bem construídos que você jamais duvida da sua autenticidade.  Não é como, por exemplo, em STAR WARS: Dark Forces que entendia que eles estavam usando a engine de DOOM para tentar emular a arquitetura de Star Wars. TR2 não "tenta", ele de facto te entrega os cenários fantásticos que ele se propõe a fazer. Hoje eu entendo mais de level design do que eu entendia em 1997 e eu tenho uma noção de como eles fizeram aquilo acontecer. O que só faz meu apreço pelo jogo aumentar, pq eu sei o quão dificil é fazer cenários tão complexos e tão grandes assim no PS1.


Quando eu digo que o level design aqui é tão grande e tão ambicioso que faz o console urrar em desespero, eu não estou usando uma figura de linguagem: nenhum outro jogo até então tem tanto wobbling nas suas texturas, quando você chega perto de uma parede não é incomum os poligonos tremerem como se a arquitetura toda estivesse colada e prestes a desabar a qualquer momento pq o console está suando em bicas para renderizar tudo aquilo.

Ainda sim, não desaba. O videogame urra (você literalmente pode ouvir o canhão de leitura do PS1 correndo de um lado pro outro em desespero), as texturas tremem, mas o jogo é sólido quanto sólido pode ser e eu não encontrei um bug sequer. A Core se desafiou a fazer o maior jogo que eles conseguiram fazer para entregar os maiores e mais ambiciosos cenários que poderiam ser concebidos, e é exatamente isso que eles fazem. Seja em um templo no Himalaia, seja em Veneza, seja no fundo do mar, seja na ampla mansão Croft.


A outra parte do que faz esse jogo tão imersivo é que TR2 gasta um generoso esforço em iluminação dinamica: agora todas as coisas são iluminadas de acordo com fontes de luz disponíveis. Isso quer dizer que uma caverna depende de claraboias para entrar luz do sol ou ter tochas, por exemplo.

Isso faz o jogo muito mais bonito (iluminação é uma coisa seriamente subestimada quando se discute o que faz um jogo parecer bom, e pra mim é a coisa MAIS importante), porém o que torna esse toque particularmente brilhante, no entanto, é que TR2 transformou isso em uma mecanica de jogo. TR2 não apenas usa a iluminação para fazer o jogo parecer bonito (e faz), como gerenciar o uso dos Flares é uma mecanica de jogo indispensável a sua navegação.


O que eu disse? Usar mecanicas de jogo para transformar algo que seria apenas estético em outra mídia em algo que apenas um videogame pode proporcionar, isso é videogame no seu melhor.

Mas falando em bonito, não tem como não comentar que o jogo, sim, recebeu um tremendo banho de loja e um ano do lançamento anterior para cá fez maravilhas a arte de programação no PS1. Em especial ao modelo da Lara: não apenas os seus seios estão menos triangulares como ela tem mais curvas e o que eu achei particularmente impressionante de verdade nesse jogo: seu cabelo se mexe de acordo com a física dos seus movimentos. 

Parece uma coisinha boba, mas cara pra um jogo de 1997 é algo impressionante. Se em 2023 a maioria dos jogos sequer ousa bulir com física de cabelos, imagine gastar recursos do PS1 (que, novamente, já estavam no limite) para fazer isso em 1997.


E enquanto toda jogabilidade foi aprimorada (até certo ponto, TR ainda é o "jogo de ação matemático" que todos conhecemos e amamos e que depende muito mais de você contar os passos do que ter reflexos rápidos), a coisa que REALMENTE salva esse jogo pra mim é o seu sistema de salvamento (pun not intended). 

Sim, agora você pode salvar a qualquer momento, permitindo que a dificuldade do jogo se foque onde ela realmente tem que estar em um jogo de Tomb Raider: você descobrir o que tem que fazer, ao invés de ter repetir a ultima meia hora de jogo pq entendeu o que tem que fazer mas errou na execução. Em videojogos desafios no campo das ideias são mais interessantes do que nas ações, e isso é algo que Tomb Raider entende maravilhosamente bem

Eu gosto também como a Laura troca de roupinha a cada set de fases, nice

Enfim, é isso sobre o que videogames são, no fim do dia. Gerar uma experiencia não ao personagem, mas ao jogador. Usar suas mecanicas e física para passar sensações que o usuário não poderia ter em nenhuma outra mídia. 

Claro, um verdadeiro grande jogo hoje em dia faz ambos ao mesmo tempo: você tem o arco do personagem enquanto ele vive e sente coisas ao mesmo tempo que o jogador tem seu próprio arco de emoções e sensações causada na natureza única do gameplay (o que faz de The Last of Us um jogo tão incrível, por exemplo), mas a Core Design ter feito pelo menos a parte do jogador em 1997 com todas as massivas limitações do PS1, cara isso é fodendamente impressionante.

Trancar Winston no freezer da mansão Croft, essa é a lei

Como aspecto negativo, o que realmente me incomodou nesse jogo foi a grande quantidade de inimigos humanos. Isso é um problema pq o jogo não realmente oferece uma mecanica para desviar de tiros, então você não tem o que fazer senão aceitar o dano e tentar mata-los o mais rápido possível. Quando o inimigo é um animal ou um monstro que ataca corpo a corpo, você pode desviar dos ataques. Ergo, inimigos humanos são incrivelmente sem graçade um ponto de vista de gameplay e apenas consomem seus recursos sem oferecer um combate interessante.

Mas também não é um problema tão grande assim, não é como se o jogo fosse particularmente mão de vaca com itens de cura, é mais um inconveniente do que um problema realmente. É claro, existem outras visões de coisas que não funcionam nesse jogo além da minha, como a desse cara na Steam: 


Arrisco dizer que ele se impressionou com o jogo bem menos do que eu.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 118 (Agosto de 1997)


Edição 122 (Dezembro de 1997)


Edição 123 (Janeiro de 1998)


Edição 124 (Fevereiro de 1998)


Edição 125 (Março de 1998)


Edição 126 (Abril de 1998)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 118 (Agosto de 1997)


Edição 046 (Janeiro de 1998)


Edição 047 (Fevereiro de 1998)


MATÉRIA NA GAMERS
Edição 021 (Agosto de 1997)


Edição 026 (Janeiro de 1998)

Edição 027 (Fevereiro de 1998)