domingo, 14 de abril de 2019

[AÇÃO GAMES 014] BUBBLE BOBBLE (Dragon Maze) [#208]



Fukio Mitsuji era um visionário. Mentes menores dirão que Cristovão Colombo era um visionário, ou Isaac Newton, mas não, eu digo que Fukio Mitsuji é que foi o verdadeiro visionário da raça humana. Nossa história começa quando Fukio, então funcionário da desenvolvedora de jogos japonesa Taito nos anos 80, estava fazendo uma ronda pelos fliperamas de Hokkaido - para onde o Jaspion despachava todo mundo que não ia mais aparecer na série - quando ele teve uma epifania. Uma revelação.

Se um fodendo anjo do Senhor tivesse descido até ele e lhe dito palavras divinas de sabedoria, não seria uma revelação tão profunda, tão fundamentalmente humana. O que Fukio viu, vocês perguntam? Simples: ele olhou o fliperama onde a Taito lançava seus arcades...


... e entendeu tudo.


Antes dos shoppings dominarem o cenário de arcades, os fliperamas eram antros mal iluminados, sem janelas que cozinhavam um indistinto aroma de maconha, caras suando a 5 horas e a 3 dias sem tomar banho e mijo (pq onde houverem homens sem fiscalização, haverá um canto mijado, essa é uma verdade fundamental da vida). Fukio viu aquela cena que faria até o cast de Mad Max sair correndo, um antro onde poucas eram as chances de você sair com seus dois rins de tal incursão, e pensou as mais sábias palavras de sabedoria jamais proferidas antes:

"Ta faltando mulher nessa porra, caralho!!!" - Mitsuii, F.

Gênio. Sublime. Arte.

E de fato, estava. Os anos 80 completamente faltavam tecnologias modernas que hoje nós temos para atrair o publico feminino as casas de jogos, como máquinas de Just Dance ou circulação de ar.

Fukio não podia tornar mais rigidas as regras da vigilancia sanitária que permitia o funcionamento de tão inconspícuos lugares, onde cada ida custava 8 meses de vida aos seus pulmões devido a quantidade de cigarro e maconha em um espaço tão reduzido!

É sério, os arcades vinham até com aqueles cinzeirinhos de ferro com três pontas! Isso quando não botavam o cigarro apoiados nos botões, em cima para não escorregar. Ai ficava aqueles paineis derretidos e a gente respirava além da nicotina o plástico. Por isso até hoje que eu não consigo subir três degraus sem perder o folego!

O que ele podia fazer para mudar essa situação era desenhar um jogo que apelasse  ao senso feminino. Agora, sendo um homem inteligente, ele sabia que jogo algum no mundo faria uma mulher livre e voluntariamente entrar em uma bocada dessas (nem nós entrariamos se tivessemos opções de entretenimento melhores), essa era uma batalha perdida. A expectativa de vida das mulheres ser, em média, dez anos maior do que a dos homens certamente envolve o fato que elas não frequentavam tais lugares, abençoadas sejam.



Não, isso não serviria. O que serviria era a ideia de um jogo projetado para ser jogado por casais, já que nos anos 80 o grande deficit de natalidade ainda não tinha atingido o Japão e as mulheres tinham que entrar nessas roubadas para agradar os seus respectivos mancebos. Alguns meses depois foram lançados vibradores na forma de Doraemon e elas nunca mais precisaram falar com um homem na vida - situação que define o Japão até hoje. Seja como for, é aqui que Bubble Bobble entra na história.

Visualmente, o jogo foi criado para atrair namoradas dos anos 80 - caso elas não estivessem sendo sequestradas por gangues de punks, se os videogames me ensinaram alguma coisa. Os personagens são adoravelmente fofinhos e a música é uma das coisas mais grudentas na sua cabeça que os anos 80 foram capazes de produzir até... bem, até o fim dos anos 80, é assim que funciona, sabe?



O segundo grande atrativo de Bubble Bobble era seu modo cooperativo. Na época já existiam jogos cooperativos, claro, mas mesmo os mais cooperativos dos jogos ainda tinham um espirito de competição neles. Quem fazia mais pontos, quem pegava os melhores itens, quem ficava com a mocinha no final (alguns jogos terminavam em um duelo entre os jogadores pelo direito de agasalhar o croquete na mocinha raptada, não importando de quem ela fosse namorada originalmente... because anos 80!). Embora BB tenha um marcador de pontos individual, em sua essência é necessário que ambos os jogadores trabalhem juntos para alcançar plataformas mais altas, para que cubram todos os lados da tela onde escorrem inimigos ou apenas consigam fazer todas as coisas a tempo.

A mecanica principal do jogo é disparar bolhas que embolham seus inimigos, mas o truque aqui é que essas bolhas podem ser usadas como plataformas também para subir aos andares mais altos da fase. É possível disparar bolhas e usar suas próprias bolhas como plataforma? Sim, é. Mas jogando de dois é TÃO MAIS FÁCIL usar as bolhas do coleguinha que a versão single player desse jogo deve ser sido lançada apenas na Coréia do Sul.

Se você não tem o número mínimo de amigos (1) para jogar este jogo, talvez seu tempo seja melhor empregado em outras atividades...


Porém mesmo que por um milagre da natureza mutagenica você conseguisse terminar o jogo jogando sozinho, bem, o final verdadeiro do jogo só seria revelado terminando o jogo no modo cooperativo de qualquer jeito. Por isso sua melhor aposta era treinar sua waifu 3D (tempos loucos aqueles, não?) para ser a melhor cuspidora de bolhas que ela poderia ser!

Enquanto isso seria suficiente para a maior parte dos arcades, Fukio não estava nem começando. Em primeiro lugar, Bubble Bobble não tem um final, nem dois, mas OITO finais diferentes - que variam conforme forem atingidos alguns critérios no código do jogo, como completar fases em determinado tempo, ter tantos pontos, achar salas secretas e jogar em dupla.

Enquanto Pac-Man tinha quatro inimigos com programações de padrões de movimento diferentes, Bubble Bobble ostentava um impressionante número de DEZ inimigos diferentes, cada tipo de inimigo tendo um padrão de movimento único. Como Fukio conseguiu expremer isso em um arcade de 1986 é algo que apenas muitas noites em claro e semanas se alimentando apenas do resto da agua de miojo podem explicar.

Ah sim, e as bolhas que você cria também se comportam de forma errática porque são fucking bolhas. Brilhante.


Mas se você acha que isso é tudo, está enganado: adicionalmente, o jogo ainda conta com 20 POWER UPS DIFERENTES!

Estourar bolhas com letras - que juntas soletram a palavra EXTEND - resulta em uma vida extra. Colecionar um guarda-chuva permitirá que você pule alguns níveis. Pegue uma cruz vermelha e você poderá cuspir fogo. Existem dúzias de outras armas e itens para aumentar a pontuação e além disso, atacar toda uma cadeia de inimigos de uma só vez. Depois, tem salas secretas, cheias de mensagens codificadas e tesouros, e bônus ocultos que aparecerão se você tiver dois dígitos iguais em sua pontuação. Enfim, chances grandes são que você não verá todos os segredos desse jogo antes de gastar todo PIB de Tangamandápio em fichas!



É realmente muito conteúdo para um fliperama dessa época!

Agora que falamos sobre os aspectos tecnicos mais marcantes do jogo, me permita os brindar com a maravilhosa história desse jogo. Porque é claro que ia ter uma história maravilhosa, vocês estavam pensando o que?

"Em uma terra muito distante, viviam dois casais de amigos. Um casal era o menino Babby e a menina Betty, o outro era Bobby e a menina Patty (que devia sofrer bullying por ter um nome começando com outra letra). Em muitos dias eles brincaram juntos e tiveram grandes diversões juntos.


Mas, um dia eles foram brincar na floresta e antes que percebessem, tinham adentrado a floresta da bruxa malvada onde Ninguém vai (no manual está "ninguém" com letra maiúscula, então suponho que Ninguém deva ser alguém nessa história)

Oh não, e agora! A bruxa malvada pegou as meninas e as trancou na caverna de mamutes a vinte andares de profundidade! Não apenas isso,  mas ela transformou Babby e Bobby em dragões-bolha. Ela mudou os nomes deles para Bubblen e Bobblen 


(eu não sei o que eu gosto mais nisso: se o manual errou o nome dos personagens, ou se acertou e Bubble e Bobble são apelidos para Bubblen e Bobblen!)

Agora você controla esses dragões-bolha. Você deve ir até a caverna dos mamutes e tentar resgatar Betty e Patty. A conclusão dessa história? É com você!

Mas calma que as perolas não terminam por aí. Quando a Tec Toy trouxe o jogo para o Brasil, para ser lançado no Master System, achou que essa coisa de "bolinhas" não ia pegar bem. Não, aqui videogame é coisa de machão rapa, e macho que é macho não joga porra de jogo de bolinhas o que, caralho! Macho que é macho só joga jogo de dragão, tá ligado?



E foi assim que, apenas exclusivamente no Brasil, Bubble Bobble foi lançado como Dragon Maze. Brasil acima de tudo, vergonha acima de todos.