domingo, 15 de dezembro de 2019

[AÇÃO GAMES 020] SUPER MARIO KART (SNES, 1992) [#291]



A sociedade japonesa, como é bastante comum nas sociedades do leste asiático, é bastante estruturada em torno de tradição e continuidade. Isso quer dizer que se uma empresa é especializada em determinada area, caso ela queira se meter de pato a ganso e tentar sua sorte em outro ramo ela será muito mal vista.

Como quando a Honda, tradicional fabricante de motores e motos, passou a fabricar carros nos anos 80 e obviamente não demorou até um pudim de saque encher a cara e se matar com um carro dela (felizmente foi só ele e um poste, mais ninguém ficou ferido nisso). A opinião publica massacrou a empresa pelas próximas semanas com coisas como "era o que ia acontecer com uma fabricante de motos fazendo carros, obvio" até o relatorio da policia divulgar que o cara estava tão bebum que o bafo dele deve ter pego uma corrente de ar e embriagado metade da Polinésia. É apenas assim que o senso comum japonês funciona.

As vezes isso é, obviamente, extremamente nocivo. Como quando a Sony decidiu entrar no mercado de games, a Nintendo não se preocupou tanto quanto hoje nós sabemos que ela deveria ter se preocupado. Eles acharam que por mais expertize que a Sony tivesse na produção e em fazer contratos (eles são uma das maiores gravadoras do mundo, afinal), e por mais que eles tivessem dinheiro para fazer contratos de exclusividade com números que a Nintendo jamais ouvira falar de tão altos, tinha a seu favor que eles não tinham experiencia no ramo de videogames e isso equilibraria as coisas a favor deles tanto com o publico como para com os desenvolvedores (os japoneses se preocupam muito mais que os americanos de como a marca da sua empresa estara associada ao hardware que ela rodar, e isso sempre custou muito caro a Sega por exemplo).


FUN FACT: a Sega seriamente considerou não colocar o seu nome estampado na carcaça do Dreamcast (ultimo console lançado por ela) porque sabia que a recepção do publico japones a sua marca seria um tiro no pé do aparelho. Isso é o quanto legado e tradição fazem diferença para os japoneses.
O que normalmente é verdade, normalmente é assim que as coisas funcionam mesmo. Pense só, os estúdios de cinema americanos ou mesmo as publishers de jogos ocidentais não tem tanto esse problema de variedade (a Eletronic Arts faz de FIFA a Star Wars, por exemplo), mas as empresas japonesas são focadas naquilo que eles sabem fazem e deu.

A Square-Enix faz RPGs. A Arc System Works faz jogos de luta. A Bandai faz adaptações de anime. A Konami... ligou o foda-se a muito tempo e hoje quer saber só de máquinas de Pachinko. E por aí vai, quando uma dessas empresas sai da area do que "ela sabe fazer", ela tem que vencer não apenas a falta de expertize no ramo como o ceticismo dos japoneses.

Claro que toda regra tem uma exceção e as vezes você é tão bom, tão incrível que as regras não se aplicam a você. No exemplo citado anteriormente, por exemplo, a Sony lançou um videogame tão incrível, tão do balacobaco que não fez a minima diferença que eles tivessem nome ou não.

Outro exemplo disso é a Nintendo. A Nintendo pode fazer basicamente qualquer jogo sobre qualquer coisa e ninguém pode dizer que não tem como isso não ficar bom. Qualquer outra empresa que se arriscasse tanto seria muito mal vista no Japão (que era um dos problemas da Sega não ter prestigio, eles meio que faziam o que desse dinheiro e foda-se e não é assim que as coisas funcionam por lá).

Mas a Nintendo pode tudo, porque eles entregam.

Clone de Tetris?


Board Game?


Jogo educativo a la Carmen Sandiego?


Eu poderia continuar por horas. Nada é tão absurdo que a Nintendo não consiga tirar um jogo foda disso, nada é tão ridículo que a Nintendo não faça bem feito, não importa que eles não tenham nenhuma experiência no ramo.

E isso nos leva, é claro, a um jogo de kart.

Espera, o que?!


Dito isso, vamos ver essas duas velocidades: FAST AND TOO FAST!


De todos os jogos para brincar com a turma do Mario em atividades extra-curriculares que existem, Mario Kart foi o primeiro a nos dar essa possibilidade. Na verdade, é o primeiro jogo que você pode jogar com o Bowser! (alias a história da criação do jogo eu já contei no post sobre F-Zero, é uma bem interessante)

Os personagens não tem atributos explicados na tela, mas jogando você percebe que eles tem jogabilidades diferentes. Koopa Troopa e Toad aceleram rápido mas não tem velocidade final alta, e são leves, qualquer batida os empurra, Bowser e Donkey Kong Jr são o contrário: aceleram muito devagar, melhor velocidade final do jogo, empurram para o lado qualquer um que bater neles.

Confesso que nunca soube explicar a diferença entre Mario/Luigi e Peach/Yoshinho do Cerrado, mas posso garantir que eles são diferentes jogando.


Como era comum na época, o jogo roda em tela dividida mesmo quando você joga sozinho (expliquei isso pq no post de Top Gear, estou bibliográfico hoje!) mas o jogo teve um toque esperto de te dar um mapa da pista com o padrão Nintendo de qualidade. Se você apertar X o mapa vira um retrovisor, como esperado da Big N!

Os comandos também são o esperado de um jogo de corrida: acelerar, freio, um botão para usar nitro/itens especiais. E dois botões para pular, porque é claro que se é um jogo do Mario é obvio que tem que ter um botão para pular .


O jogo tem uma mecanica interessante que envolve o uso de moedas: cada vez que você encostar em alguém perde uma moeda. Se não tiver moedas para perder, roda. Então mesmo as moedas sendo o "item inutil" do jogo, ainda sim são importantes de certa forma.

Mais uma vez, como esperado da Nintendo!


Agora, o grande diferencial do jogo são os itens. Ao passar por um dos "?" tradicionais do Mario abre uma roleta de itens que servem para apimentar a corrida. O jogo inclusive controla o rate dos itens sorteados, de modo que você só pega os melhores itens se estiver nas ultimas posições, enquanto se você estiver nas primeiras provavelmente vai pegar moedas ou cascos verdes (os itens mais sem graça)


Isso significa que Mario Kart foi projetado com um unico objetivo: zoeira never ends! Claro que nos próximos jogos da série isso seria melhor elaborado, mas por hora o resultado já é divertidissimo.

Agora, de todos os itens, você pode perguntar para que serve especificamente a pena. Ok, ela te faz pular, no que isso ajuda em um jogo de corrida? A resposta é bem simples:


Atalhos, ora pois! Não são todas as pistas que tem atalhos, mas é uma boa diversão do jogo ficar procurando atalhos nas pistas. Eles definitivamente pensaram em tudo, cada uma das 20 pistas do jogo tendo uma sensação única sempre com algo interessante para ver ou evitar, seja um atalho, seja um risco situacional como trechos com água, pistas sem beiradas que você pode cair ou...


... uma pista com lava e que tem blocos que tentam te esmagar. Vish, até o weegie achou meio hardcore demais essa.

Talvez Mario Kart não seja tão friendly para iniciantes como um jogo desse tipo deveria ser, mas honestamente eu não consigo pensar em nenhum outro nenhum outro título dos 16btis que faz um trabalho tão completo de transmitir a ideia que a Nintendo queria passar com o seu console: "Os jogos SNES são simples, mas ainda assim muito divertidos."

 Tanto quanto eu ame jogos antigos e tendo a voltar para eles quando eu preciso de um cobertor digital para me aninhar, eu tento evitar romantizá-los. Os "bons e velhos tempos" dos jogos de 16 bits eram atulhados de problemas. Até mesmo jogos clássicos da época são atormentados por problemas de balanceamento, bugs que quebravam o jogo e que não podiam ser corrigidos com o download de um patch (sim, Final Fantasy 6, estou olhando para você)



Isso sendo dito, tendo jogado todo o jogo recentemente, Mario Kart é tão bom quanto eu lembro dele. É divertido, rápido, as corridas são imprevisíveis por causa dos itens e sempre tem algo interessante para ser descoberto na pista, os gráficos são o melhor uso possível de rotação e escalonamento que o mode7 do SNES era fisicamente capaz de fazer. E você pode jogar com o Yoshinho do Cerrado.

Tem pistas desbloqueáveis, tem um modo versus muito divertido, até o time attack é divertido de se jogar! (quando você faz o recorde da pista a sua corrida fica gravada, então nas próximas tentativas você tem que tentar vencer o seu "fantasma" que fez o recorde)

Não tem nada que Mario Kart faça de particularmente errado, apenas ideias que seriam melhor polidas ou dadas mais opções em instalamentos futuros (mais pistas, mais personagens, mais itens, mais atalhos, etc!). Mas para uma primeira ideia da série, SMK foi o melhor que podia ser feito em seu tempo!


Ao longo dos anos praticamente toda marca que possui um roster de personagens carismáticos se inspirou nessa ideia e tentou fazer o seu próprio Mario Kart. Sério, tem "Mario Kart" da Sega, de Crash Bandicoot, de Muppets, do Cartoon Network, de... M&M?!


Entretanto, passados quase trinta anos do seu lançamento apenas Mario Kart é Mario Kart. Porque?Bem, porque SMK é apenas tudo que um jogo de corrida possivelmente poderia sonhar ser, só que com o polimento do padrão Nintendo de qualidade.