Se tem algo que qualquer criança dos anos 90 poderá te dizer com propriedade sobre o maior fenomeno cultural do começo dessa década: Tartarugas Mutantes Adolescentes Ninja. No final dos anos 80 quando os quadrinhos deixaram de ser infantis para serem superseriões, violentos, cinicos e pessimistas com obras como Watchmen ou "O Cavaleiro das Trevas", dois caras tiveram a ideia de fazer uma paródia desses quadrinhos "adultões" com a coisa mais random que eles conseguiram pensar (tartarugas mutantes adolescentes que são ninjas), comicamente se levando super a sério.
Como acontece as vezes, as pessoas não pegaram muito bem a piada e levaram aquele deboche do status quo dos quadrinhos a sério resultando em muito, muito dinheiro sendo feito... até hoje, realmente. Bem, mas a esse ponto você obviamente já sabe tudo sobre Tartarugas Ninja, então pra que eu estou falando sobre isso?
Porque o que você provavelmente não sabe é que mais ou menos na mesma época surgiu uma HQ britanica com a mesma proposta: parodiar a situação dos quadrinhos daquela época. Estou falando, é claro, do "O CARRAPATO".
A principio, The Tick parece uma paródia bastante simples: ele é um herói invencível e arrogante quanto a isso, bem aos moldes das HQs do Superman dos anos 60. Porém o toque é que seu criador Ben Edlund é um legitimo representante do senso de humor cínico britanico e que as vezes lembra um pouco o Doutor: você não tem realmente certeza se o The Tick é inacreditavelmente estúpido, ou se ele sabe o que está fazendo e apenas parece ser idiota.
Frequentemente, uma mistura de ambos. Adicione a isso que as sátiras aos superheróis da época e o quão absurdo é a vida do cidadão comum em um mundo onde superherois existem e temos uma ideia inteligente que deu origem a um cartoon que consegue ser genuinamente engraçado.
Quer dizer, é um desenho que tem um Batman mexicano chamado "Batmanuel" cujo super poder é ter uma opinião realmente elevada de si mesmo, hahaha! O que também não é tanta surpresa, já que seu criador Ben Edlund (que também escreveu o cartoon) posteriormente se tornou conhecido pela sua parceria com Joss Whedon, tendo sido roteirista de vários episódios de Buffy, Angel, Firefly e até mesmo Dr. Horrible Sing-a-long Blog (que possui muito do espírito do The Tick).
Olha, taí um vilão que faz jus ao seu nome, essa É uma boa ideia... |
Em 2016, Ben conseguiu levar sua ideia para um live action da Amazon, porém com uma proposta diferente (e mais barata de ser feita, diga-se de passagem): ao invés de se focar na coisa de ser uma paródia de super heróis, é mais focada em seu sidekick Arthur (sim, Arthur é seu nome de superherói) que originalmente era apenas um contador com uma vida bem merda que um dia recebe um manic pixie dream hero que muda sua vida tediosa.
Na adaptação da Amazon o conceito geral é o mesmo, mas é mais focado em questionar se o Tick é real ou apenas uma ilusão da mente perturbada do Arthur... o que foca bem menos na comédia e mais no drama de alguém perturbado mentalmente que é um merda e por isso mesmo projeta ser um herói incrível. Um tanto mais pesado, eu diria.
A voz do Tick ficou perfeita para o personagem, agora eu perdi mesmo foi no Capitão-Lemingue hahahha
Ainda sim eu acho realmente criativa uma abordagem bastante diferente dentro da mesma proposta, é bacana essa reimaginação do mesmo universo especialmente quando feita pelo mesmo autor. Porém sabe o que não é bacana? Pois é, o bom e velho jogo obrigatório dos anos 90, The Tick para Super Nintendo.
A primeira vista, The Tick para consoles não parece uma proposta realmente ruim. É um beat'm up single player, o que não é exatamente a criação mais inspirada da história da humano mas o jogo é o que o jogo é, como diria a máfia.
O problema do jogo também não são os gráficos ou a adaptação do material fonte, usando até mesmo personagens dos quadrinhos que nunca apareceram no cartoon como o Paul Samurai ... que é um samurai
francês que luta usando uma baguette, porque é o que samurais franceses fazem, todo mundo sabe disso. O jogo é bonito e bem animado, não é esse o problema.
Tampouco o problema são os controles, eles respondem decentemente bem para um beat'm up, a detecção de hit não é muito zoada, tudo funciona como você esperaria que funcionasse em um jogo mediano de Super Nintendo. Nada do qual você sinta vontade de escrever para casa contando a respeito, mas também não é terrível. Funciona e funciona satisfatoriamente bem.
TÁ, FALA LOGO QUAL É O PROBLEMA AFINAL!
Veja, Jorge, eu vou te propor um pequeno exercício de matemática, está bem?
Cada inimigo que você mata vale entre 10 e 50 pontos, com a média sendo cerca de 25. No final do jogo, eu tinha 200.000 pontos. Vou deixar você fazer as contas e deduzir qual é o problema aqui. Adicionalmente, não existem mais que 10 tipos diferentes de inimigos que você vê repetidamente ao longo das TRÊS A CINCO HORAS DE JOGO. QUEM DIABOS FAZ UM BEAT'M UP DE TRÊS HORAS?!?
Além disso, como é próprio do genero você não pode esgueirar-se por eles. O jogo exige que você lute contra todo e cada um deles. Ao longo das TRÊS A CINCO HORAS de jogo!!! Mas vocês querem me enlouquecer, é a única explicação, não pode uma coisa dessas! Não tem como!
Isso ainda seria aceitável se a gameplay do jogo fosse criativa, se o jogo constantemente se esforçasse para manter as coisas interessantes como os beat'm ups da Capcom fazem (como POWERED GEAR ou ALIEN VS PREDATOR fazem, por exemplo), mas... não.
Quem é que faz QUARENTA E QUATRO FASES EM UM BEAT'M UP?!? |
Você praticamente só usa um botão. B pula, mas não tem utilidade na maior parte do jogo, além das fases de plataforma (que duram menos de um minuto). X chama Arthur para um ataque especial ... que são MUITO limitados em número. Não espere usá-lo mais de 10 vezes em 5 horas. Y dá socos e A chuta.
Parece a configuração padrão de um beat'm up, no entanto você aprenderá rapidamente que o chute tem uma hitbox maior, maior alcance e causa mais danos do que o soco. Como resultado, o único botão que você usará durante horas e horas e horas de gameplay é Y.
Mas então você pode pensar que pelo menos o jogo dá uma variada dando itens e armas para o personagem, certo? Bem, se você achou isso... ACHOU ERRADO, OTÁRIO! Em todo o jogo, existem cerca de 3 itens para recuperar vida (nenhum deles é um frangão em um barril) e duas vidas extras. Existem também alguns itens especiais que permitem que você lute contra outro herói (existem cerca de 10 deles) e cerca de 6 itens que você pode pegar e arremessar como arma. E é isso, ao longo de 5 horas de jogo, tudo isso eu quero dizer. Além disso, não tem nenhum item para reabastecer os ataques especiais do Arthur.
O final é bem estranho também, você derrota o último chefe e... o jogo termina. Fim, só isso. Parece meio seco, sei lá. |
E enquanto eu estou nisso, preciso dizer que o jogo tem cerca de 4 músicas neste jogo. Duas são variações do tema principal. As outras duas, que tocam durante 85% do jogo, parecem música de background de série policial dos anos 80. É terrível.
Adicione a isso lutas contra chefes que são aqueeeele tipo de luta contra chefe que eu abomino em beat'm ups: o chefe toma um hit e fica invencível até terminar a sequencia de ataque dele, o que torna a luta desnecessariamente longa e em 95% dela tudo que você faz é esperar o chefe terminar o padrão dele.
Mas oh, que tolice a minha, estou eu aqui falando e falando quando eu posso te mostrar esse jogo! Com efeito, eu vou te mostrar dois, apenas DOIS minutos desse jogo e me diga se você sentiu vontade de permanecer acordado até o fim do segundo número 120:
Que experiência miserável é jogar The Tick. Você provavelmente se divertiria mais recalculando seu imposto de renda enquanto usa luvas de boxe do que lutando contra o tédio que esse jogo causa. Não seria um jogo terrível se ele durasse, sei lá, vinte minutos, mas ser arrastado nisso por mais de três horas é algo que até a igreja católica medieval teria vergonha em usar.
Queimar pessoas vivas porque elas ensinam os outros a lavar as mãos é uma coisa, mas jogar cinco horas de The Tick para Super Nintendo já é ir longe demais.
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 011