sexta-feira, 20 de outubro de 2023

[#1174][Out/97] RIVEN: The Sequel to Myst

Eu levo uma vida bastante simples, sabe? Eu acordo de manhã, coloco as coisas do trabalho em dia, passeio com os cachorros e então uso o resto da manhã para ver que surpresas o joguim de hoje me reserva. Essa é minha vida, é uma vida tranquila e não é ruim.

Mas então, de tempos em tempos, eu paro e me pego pensando que "espera, está tranquilo demais, uma coisa terrível está prestes a acontecer, né?". Definitivamente essa semana eu senti que algo horrível estava prestes a acontecer - fui olhar e tava lá, o último jogo the worst of que eu joguei nesse blog foi no começo de setembro. Hmm, quase dois meses de paz, é óbvio que isso não ia durar.

O marketing dos anos 90 é um mistério que as civilizações futuras jamais decifrarão

E com efeito não durou, o próximo jogo das revistas sequer tentou esconder isso. Quer dizer o nome do jogo é LITERALMENTE "A sequencia para MYST". Pelo amor de todos os deuses pagãos de chumbalaia, o que eu fiz pra ser punido dessa forma?

Eu entendo que as leis do universo não permitem que a minha vida bucólica e pacifica permaneça assim por muito tempo, mas precisava o jogo se chamar "A Sequencia de MYST"? Não podia ao menos me dar esperança que o jogo de hoje será qualquer coisa que não miséria e desgraça?

É, suponho que não...


Vamos lá: para surpresa de absolutamente todos os envolvidos, em 1993 MYST se tornou o jogo de computador mais vendido de todos os tempos (por razões que eu expliquei naquele texto). Isso deu a Broderbund mais dinheiro do que eles sabiam o que fazer com ele e por essa exata razão, a continuação de MYST teve um ciclo de desenvolvimento mais longo que o normal para a época - simplesmente pq eles podiam bancar isso.

Quatro anos de desenvolvimento hoje, para um jogo AAA, é até um jogo meio rushado. Porém, nos anos 90? 4 anos eram quatro vidas e meia mais do que uma empresa podia se dar ao luxo de parar em um jogo só.

E no que esses quatro anos foram usados, você pergunta? Bem, pra começar Riven é um jogo muito mais bonito que MYST. O que é esperado, são computadores 4 anos depois renderizando as imagens paradas que compõe o mundo do jogo, porém aqui eles são ousados e se permitem até mesmo animações. OZADO.

O que eles não se permitem, entretanto, é rodar o jogo em tela cheia - mesmo que o "jogo" em si sejam apenas uma sequencia de fotografias conectadas e não um jogo rodando numa engine 3D em tempo real, ainda sim ele só rodava originalmente em janela, algo bem abaixo do que mesmo os jogos mais modestos de computador já faziam nessa época.

Porém gráficos mais bonitos não sao tudo que esse jogo melhorou nesses 4 anos: no jogo anterior, as únicas criaturas que você encontrava eram alguns pássaros em uma tela de um caminho na floresta. Bem, Riven tem muito mais criaturas e você pode interagir com algumas delas. E mais ainda, algumas dessas criaturas são pessoas ... que você quase pode interagir com elas. Quase.

COMO SE "QUASE" INTERAGE COM ALGUÉM?

É a história da minha vida, Jorge. Mas falando desse jogo em particular, toda a interações com pessoas são através de clipes FMV pré-gravados (e atuações péssimas, como é a lei dos FMV dos anos 90). E assim que eles terminam de rodar e ele falou tudo que queria falar, o personagem sai de cena para não voltar mais. Ainda sim, esses encontros são raros e assim como Myst, Riven é um mundo árido e em grande parte despovoado... ainda que estranho e bonito. O que é de longe o ponto forte dessa franquia.

Falando em falar com os personagens, suponho que calhe falar um pouco sobre a história do jogo. Considerando que Riven é uma continuação imediata de onde Myst termina, ajuda bastante que o jogo tenha sido dublado em português pela Tec  Toy para a versão de Saturn!


... pensando bem, não ajudou tanto assim... mas enfim, a ideia geral da coisa é que existe um pequeno grupo de semideuses que cria mundos inteiros ao escrever livros, e Riven é um desses mundos. Seu criador, Gehn, está preso dentro da própria história há 33 anos e lá ele governa seus habitantes com mão de ferro. 

Gehn é o pai de Atrus, o autor do livro de Myst, do jogo anterior, e de alguma forma Gehn mantém a amada Catherine como prisioneira, e você é enviado para resgatá-la. Gehn está enlouquecendo e Riven está morrendo pq seu autor não está mais escrevendo sua história. E por "está enlouquecendo" eu quero dizer que ele literalmente fuma sapos no seu cachimbo (ou pelo menos parece isso). Não é dito sapos de qual marca, infelizmente.

Na teoria, a história é essa. Na prática, a teoria é outra.

O problema aqui é COMO você deve descobrir esse enredo intrigante. Antes de Atrus mandar você para Riven, ele lhe dá seu diário de Riven - que vai estar no seu invfentário e obviamente você vai ler na primeira chance que tiver. O que, se você jogou Myst, sabe qu que livros dentro do jogo não é algo que automaticamente associar com diversão. Muito, muito mais tarde no jogo, você também encontra o diário de Gehn (que também tem a resposta para um puzzle, mas vc precisa ler para entender a história) além da vários outros documentos que contam o que aconteceu aqui.

O que, como você pode imaginar, é muito, mas muito tedioso. Você não apenas tem que ler páginas e páginas de fanfic ruim, como ler coisas escritas à mão na tela do PC em uma resolução que não é sequer HD não é exatamente como eu recomendo passar suas tardes de sabado. E, finalmente... digamos que a caligrafia de Catherine não é a melhor e deixemos por isso mesmo. Mas hey, pelo menos toda história aqui não é contada através de livros ficticios ruins, só parte dela! Olha se isso não é um upgrade, eu não sei mais o que seria...

Porém se entender o que acontece é feito de uma forma ruim, mas não tão ruim quanto foi no jogo anterior... dos puzzles pode-se dizer o contrário. Oh deus, os puzzles desse jogo... os puzzles de jogo... quando eu fecho meus olhos, eu ainda consigo ver eles...


Os quebra-cabeças desse jogo funcionam basicamente como no jogo anterior: puxar uma alavanca, nada acontece, acionar um interruptor, ouvir um clique em algum lugar que você não sabe onde, girar uma manivela que só vai fazer algo se você adivinhar do nada que precisa girar um número de vezes igual as arvores impares na floresta carmezim... você sabe, o velho raguru que desafia sua sanidade em MYST e que eu falei suficientemente naquela review.

O que eu posso adicionar é que as coisas não realmente ficam melhores aqui, e na verdade elas pioram. Exponencialmente. Sim, eu sei, não parecia fisicamente possível, mas os puzzles que já induziam ao suicidio por insanidade conseguem piorar milhares de vezes. Como isso é sequer fisicamente possível?

Bem, aqui está o pulo do gato: muitos dos puzzles estão inter-relacionados. Isso quer dizer que não apenas o mapa de Riven é pelo menos 3x maior, como você vai precisar de doses inumanas de backtracking para realizar as coisas e se já era dificil entender o que e como fazer com os puzzles no mesmo mapa, imagine quando vc precisa lembrar de um mapa que passou 3, 4 horas atrás.

Um exemplo bem iconico que me vem a mente é quando vc precisa de decodificar o sistema numérico usado pelos habitantes de Riven, que é necessário para decifrar os códigos escritos nos diários de Gehn e Catherine. A solução disso vem na forma de um jogo que você joga na escola, que fica em um dos cantos mais distantes do mapa do jogo. Então pra resolver o o puzzle dos livros, você tem que atravessar o mapa que é grande pra porra pra ir lá na casa do caralho... sem saber que vc precisa atravessar o mapa e ir lá na casa do caralho!


Sério caras, agora imagine isso o jogo todo. O mapa é do tamanho do Maranhão e agora ao invés de ter que adivinhar uma combinação de cofre tateando no escuro com as informações de uma ilha, vc tem que adivinhar que precisa contar arvores ou pingos de chuva ou a porra que for a várias e várias telas de distancia, baseado apenas no poder de tirar as informações do toba!

Mas que caralha! Eles querem me enlouquecer! ELES-QUEREM-ME-ENLOUQUECER!!


Sério, vocês não tem noção do quanto eu odeio os puzzles de MYST, e aí os caras vão e me espalham as coisas em 150 hectares. Num dá, cara, num dá! SIMPLESMENTE NUM DÁ! E sabe o que é pior? SABE O QUE É PEOR? Não, vc não sabe o que é peor! Pq é claro que fica peor! SEMPRE FICA PEOR EU ODEIO ESSA FRANQUIA DO INFERNO QUE SÓ PIORA!

Mas tá, como fica pior? Bem, saiba você que esse jogo vem em 6 discos (5 no Saturn)... o que por si normalmente não chega a ser um problema, exceto que a forma que o jogo é disposto nos discos não é linear. O que significa que a quantidade de vezes que você tem que trocar o CD é absurdamente irritante, papo sério mesmo.


É meio dificil imergir no jogo quando vc precisa trocar o disco pela sétima vez em uma sentada de jogo. Deus o ajude se você conseguir avançar algumas salas depois de trocar o CD, apenas para perceber que precisa trocar de novo. Sério, esse é um dos jogos mais mal programados que eu já vi na vida na questão de dividir o conteúdo em vários CDs, é um exercicio de insanidade que vocês não tão entendendo!

Então, vamos recapitular o que temos até aqui, sim?

  • A primeira coisa que o jogo apresenta é um quebra-cabeça que você não consegue resolver até o final do jogo.
  • A segunda coisa que ele apresenta é um quebra-cabeça no qual você aparentemente pode progredir, mas não consegue resolver até chegar ao final do jogo.
  • Tem dois quebra-cabeças "principais" que são muito complicados, mas têm as pistas espalhadas por todo o jogo de maneiras desconexas em cantos aleatórios e MUITO afastados dentro do jogo. Que você nem sabem que existem e que vc deveria estar procurando por elas.
  • Você tem que aprender um sistema de numeração estrangeiro baseado em "pistas" escondidas em um paragrafo de livros de 30 páginas que são chatos pra caceta, escritos em caligrafia ruim e pixelados até a alma por causa da resolução do jogo.
  • E você tem que levantar e trocar de CD a cada 4 salas, na média.

Sério, eu desisto. Parabéns, vocês venceram. Apenas venceram. 


Sério, tem dias apenas... tem dias que são mais dificeis que outros, sabe? Mas bem, se tem alguma coisa boa disso tudo é que esse jogo se chama "The Sequel of Myst" e não "Myst 2", então eles não estão realmente pensando em fazer desse exercicio de insanidade uma franquia, né? NÉ?


Eu odeio a minha vida.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 122 (Novembro de 1997)


Edição 128 (Junho de 1998)


Edição 138 (Abril de 1999)



MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 045 (Dezembro de 1997)


Edição 049 (Abril de 1998)


Edição 052 (Julho de 1998)


Edição 060 (Março de 1999)


MATÉRIA NA GAMERS
Edição 024 (Novembro de 1997)


Edição 027 (Fevereiro de 1998)


Edição 035 (Novembro de 1998)