Após uma longa pausa de mais de dez dias, estou de volta. Não por causa que eu abandonei este blog, mas porque eu estava ocupado com um jogo particularmente importante para esse projeto, um jogo realmente único e é claro que esse jogo é Earthbound, vc já viu no título acima, dã. Veja, a questão é que os jogos da era 16bits levam em torno de uma a duas horas para serem terminados, já Earthbound...
Então com a autoridade em mim investida de quem passou literalmente um dia inteiro jogando Earthbound, me permitam pular direto para o que eu tenho que dizer sobre esse jogo: não existe, e provavelmente nunca existirá, outro jogo igual a Earthbound. Quer dizer, o mais perto que dá pra chegar é Undertale que é um jogo profundamente inspirado por Earthbound, mas ainda sim não é a mesma coisa.
Então, é, eu diria que Earthbound é o jogo mais único que eu já joguei dessa época até agora.
MAS "ÚNICO" QUER DIZER BOM?
Essa é uma grande pergunta, Jorge. E a resposta é... complicada. Mas então, como de costume, vamos começar pelo começo.
Para começar, o que eu lembro que mais me chamou atenção na Ação Games pra esse jogo é que EB foi um dos únicos (senão o único) jRPG da sua época que se passa nos dias de hoje, quer dizer, "hoje" na metade dos anos 90. Esse jogo se passa exatamente em 1994: tem carros na rua, estradas asfaltadas, você consegue dinheiro no caixa eletrônico, usa telefones ou orelhões, compra comida em lanchonetes e remédios em farmácias, se cura em hospitais etc. Você tem até mesmo um celular que só recebia chamadas, algo raro porém já existente nessa época. Mesmo Final Fantasy VII, cuja ambientação inicial é uma grande metropole, ainda incorporava tons medievais em sua aventura com magias e espadas. Aqui suas armas são um taco de baseball e poderes psiquicos. Diabos, em uma fala um bibliotecário diz pra vc voltar ali só depois de 2001.
A versão BR disso tem o médico dizendo "é virose" |
Só isso já distingue EB de qualquer outro RPG de sua época, e mesmo hoje em que RPGs modernos não são mais nenhuma novidade (Persona s2) ele chama atenção por sua ambientação.
Falando em ambientação, os gráficos são definitivamente abaixo da média para a época e o jogo parece muito um jogo de Nintendinho atualizado. Com efeito, compare os gráficos desse jogo com os da sua prequel, Mother, que saiu exclusivamente no Japão em 1989:
A esquerda o jogo original do NES de 1989, a direita a sequencia para Super Nintendo feita cinco anos depois |
Isso me parece particularmente verdade porque, assim como seu sucessor espiritual moderno Undertale, o jogo se esforça mais do que se dá ao crédito inicialmente. Não há duas cidades iguais em todo o jogo e todas têm características interessantes: o centro da cidade de Onett é repleto de vida, Twoson é um pouco menor e mais silenciosa, Foursides parece uma metrópole, o Summer é uma cidade de praia, Winter está coberta de neve... tem até um deserto com dunas de areia com pirâmides, um enorme pântano e um “Mundo Perdido” com dinossauros gigantes na tela (ou dinossauros de tamanho normal e seus bonecos que são colocados pequeninhos para dar a sensação de tamanho, muito inteligente isso).
Como eu disse, Earthbound é um jogo que se esforça mais graficamente do que se pode dar ao crédito numa primeira olhada e esse é o tom do jogo inteiro.
De igual forma, nos combates o jogo parece quase um retrocesso para a era do NES. Tal como nos primeiros RPGs do Nintendinho você não vê seu personagem nem seus ataques físicos. Você só vê os inimigos que acertou e eles estão completamente imóveis - nem mesmo são gifs animados. Eu disse "quase" porque o fundo está sempre mudando com formas psicodélicas que se movem e também houve alguma atenção dada à magia: quanto mais forte for, mais complexa será a animação. Como eu disse, o jogo coloca mais esforço do pode parecer a uma primeira vista.
É, eu sei... já chegamos a isso. |
Não é reinventar a roda, mas funciona e isso é suficiente.
Mas bem, agora que eu falei dos aspectos tecnicos (a musica será abordada junto com outra parte), vamos falar do que realmente importa: sobre o que esse jogo realmente é?
Bem, uma coisa que eu realmente abomino em jRPGs lançados no ocidente é aquela tradução feita com a bunda em que as frases apenas são jogadas aleatoriamente onde se diz que supermercado não voa porque banana não tem caroço. Muitos jogos são completamente eviscerados na tradução onde lé não soma com cré para conectar duas frases sequer (posso citar os jogos da Quintet como ILLUSION OF GAIA ou ROBOTREK, ou ainda BREATH OF FIRE que a tradução é tão ruim que eu sequer joguei). Existem alguns jogos que realmente parece que a tradução alguém apenas baixou as calças, sentou no teclado e é isso.
Earthbound não é um desses jogos, a tradução é bastante decente até. O problema é que o texto original do jogo é que parece um desses jogos, as coisas simplesmente acontecem do nada por motivo nenhum e é isso. Este jogo é um daqueles que você não consegue "cannot make head or tail", como dizem os gringos.
Você chega em uma cidade e do nada você enfrenta uma seita religiosa, apenas para esse assunto nunca mais ser abordado novamente. Ou então do nada você vai parar em um mundo negativo (onde a paleta de cores é invertida) por razão nenhuma. Ou então do nada agora você tem que viajar para o passado e virar um robo. Tudo é sem construção nenhuma, parece que só na hora o desenvolvedor só colocou a primeira coisa que veio na cabeça dele e é isso. Não me entenda errado, SÃO ideias criativas, mas se qualquer coisa é qualquer coisa, então tudo meio que tanto faz como tanto fez. E esse é o maior problema de Earthbound, as coisas aparecem tão aleatoriamente e do nada que você apenas desliga o cerebro e dá de ombros porque tanto faz, qualquer coisa é qualquer coisa mesmo.
O desenvolvimento de personagens então, nossa, varia entre o inexistente e o "isso não faz nenhum sentido". Tipo seu vizinho do nada se torna um super vilão que te odeia e quer destruir o mundo porque... hã... o jogo precisa de um vilão, i guess? Mas é do nada mesmo e por motivo nenhum. E nem é um recalque moderno meu, é só comparar com um jogo da mesma época: em FINAL FANTASY 6 Kefka é super evil e insano because super evil and insanity, mas a construção de mundo e o jogo se dão ao trabalho de justificar porque ele é do jeito que é. Em Earthbound os personagens ou não tem personalidade, ou apenas fazem uma coisa porque a história precisa que eles façam.
Que diferença isso faz? Muita. No final do jogo quando se passa aquela ideia de que "tivemos uma aventura épica e agora é hora de dizer adeus" eu não consegui parar de pensar "dude, vocês trocaram duas frases entre si durante o jogo inteiro". O ultimo chefe tem o rosto do protagonista, caralho que mindblow twist, qual é o motivo? Hã, nenhum, só colocaram pq pareceu legal.
Isso diminui em muito a epicidade da aventura, não foi uma jornada crescente, foi só um bando de coisas aleatórias que aconteceu. Existe uma grande diferença entre o jogo ser engraçado e espontaneo, e claramente você perceber que os criadores apenas estão improvisando conforme as coisas acontecem. Isso não é épico e aventuresco, é apenas ¯\_(ツ)_/¯
E se narrativamente o jogo é uma bagunça desgraçada, mecanicamente... minha nossa senhora da perpetua dança histérica de Tasha. Dizer que a interface de menus é ultrapassada é uma ofensa a todos os jogos ultrapassados, nem mesmo jRPGs de Nintendinho cometiam as burocracias que Earthbound exige de você.
Pra começar, seu inventário tem apenas 12 espaços - sendo que 4 são obrigatoriamente são os 4 itens que você pode equipar. Então são 8 espaços por personagem, sendo que tem alguns itens são obrigatórios a serem carregados - como o cartão de crédito ou a Sound Stone. Mas ok, espaço limitado de inventário não é o maior problema aqui, eu entendo que essa é a proposta do jogo gerenciar os poucos espaços que você tem, vá lá. O problema é a forma que você faz isso: os itens só podem ser gerenciados um por um, um de cada vez.
Isso quer dizer que para passar um item para outro personagem você tem que fazer a seguinte sequencia: abrir o menu/selecionar itens/selecionar o personagem/selecionar o item/selecionar GIVE/selecionar o outro personagem
Okay, parece bem estranho mesmo |
Isso não seria TÃO ruim não fosse o fato que o menu FECHA após cada item, então você tem que recomeçar o processo todo de novo! Para todo e cada item. Ah, eu quero usar um item de cura pra recuperar vida, beleza, eu uso e não encheu a vida e eu quero usar outro. Só usar de novo, né? NÃO, O MENU FECHOU E VOCÊ TEM QUE REPETIR TODO O PROCESSO DO COMEÇO! ELES QUEREM ME ENLOUQUECER, SÓ PODE!!!
Agora imagine que pra tudo, tudo, mas tudo MESMO nesse jogo tem essa burocracia soviética! Mas é tudo mesmo! Como funciona o dinheiro no jogo? Os inimigos dropam depois da luta? Nah, seria simples demais. Conforme você luta seu pai vai depositando dinheiro na sua conta, aí quando você quiser usar é só ir em um caixa eletronico, falar TRÊS telas de texto, escolher withdraw e sacar a quantia que você quer.
... e olha que eu nem comecei a falar do combate...
Pq o rato se chama Bubble Monkey? Because Earthbound, that's why |
Porque sério, o que esse jogo pode fazer pra vc atirar o controle na parede ele faz. Pico de dificuldade? Esse jogo é o fucking Himalaia! Você está lá, andando numa area em que o seu nível é adequado e você vence as lutas sem muita dificuldade. Aí do nada, sem motivo nenhum, um inimigo surge e tá um crítico, ou coloca um status que te impede de jogar e é isso, game over. Esse jogo é todo desregulado e a quantidade de vezes que você tem que reiniciar porque o jogo quis é enfurecedora - porque os saves costumam ficar lá na caixaprego também, tem isso. Mesmo estando overnivelado - ou seja, enfia grind nesse rabo até não poder mais - é relativamente comum vc tomar TPK numa luta ou pelo menos ficar tão debilitado que tem que abandoanr a dungeon e voltar pra cidade pra curar.
Perto do final do jogo então, os inimigos têm toneladas de ataques que dão instakill e escudos de energia que impedem ataques magias (ou pior, as devolvem), que é sua principal forma de causar dano.
Eu absolutamente odeio esse tipo de dificuldade artificial. É um truque barato para jogar em um jogador. É como ter uma temporada inteira de futebol e, na partida final, anunciar que o gol agora só vale se for feito com a bunda. O jogo treina você para conservar PP em batalhas tradicionais e avançar com ataques físicos ou ataques PP de baixo custo. A viagem final para Onett e Beginning of Time muda tudo sem nenhum motivo e espera que você lance todos os seus ataques mais fortes no início, porque caso contrário, vocês todos serão diamantizados. OH, mas não o faça contra certos grupos de inimigos porque alguns deles podem ter escudos de energia e você será atingido por seus próprios ataques. Ah, e não tem como recuperar mana antes do chefe final e seu inventário não permite carregar muitos itens em primeiro lugar - e mesmo que permitisse vc ainda teria que compra-los um por um/fecha menu/reinicia tudo de novo.
A dificuldade artificial nunca é uma boa característica para se ter em um jogo e Earthbound samba com isso na sua cara até vc não ser nada senão ódio e rancor. Foi o que eu disse, o que esse jogo possivelmente pode fazer para te enlouquecer COM CERTEZA ELE VAI FAZER E MUITO PIOR.
Não é de se admirar que esse jogo flopou tão selvagemente na época e ninguém deu muita bola pra ele, jogar EARTHBOUND É UMA PROFISSÃO DE INSANIDADE, É ISSO QUE ELE É, MALDITO SEJA EARTHBOUND!
HÃ, TERMINOU?
Ainda não, espera...
MEU DEUS DAS SANTAS COXAS DA RIKA, EU ODEIO ESSE JOGO TANTO QUANTO ELE ME ODEIA! E ISSO É INFINITAMENTE MUITO! É UM JOGO QUE VOCÊ SE VOCÊ MORRER VOLTA DO ULTIMO SAVE MAS SÓ VC ESTÁ VIVO E VC TEM QUE PROCURAR UM HOSPITAL E REVIVER UM POR UM DOS OUTROS MEMBROS DO GRUPO E SE VOCÊ NÃO TIVER DINHEIRO ENTÃO TEM QUE IR SACAR DINHEIRO (vc perde todo o seu dinheiro carregado quando morre, por isso vc não pode sacar tudo de uma vez btw) E FAZER TODO O PROCEDIMENTO DE NOVO SÓ QUE O HOSPITAL NÃO RECUPERA MANA ENTÃO DEPOIS DISSO VC TEM QUE IR PRA UM HOTEL QUE RECUPERA HP E MANA MAS NÃO RESSUCITA E AAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHH MKLFLWKDFNKLNFJ PRA QUE JOGO? PRA QUEEE?!? FODA-SE EARTHBOUND, EU PUTA ODEIO EARTHBOUND COM A FÚRIA DE MIL SÓIS AMARELOS!
TERMINOU AGORA?
Na verdade, sim. Ah sim, só mais uma coisa: esse jogo pavoroso também é uma obra prima. É, tem isso também.
NANI?!?
Então, eu meio que gostei tanto de Earthbound o mesmo tanto quanto esse jogo me irritou - se isso faz algum sentido.
NÃO POSSO DIZER QUE FAÇA, NÃO.
Imaginei que não. Mas essa é a coisa de Earthbound: ele me lembra muito Final Fantasy XV. Meu deus mecanicamente esse jogo é uma bagunça, quase um desastre, narrativamente ele é um monstrengo desconjuntado - especialmente por ter sido lançado no mesmo ano que FINAL FANTASY 6.
Isso é um fato inegavel, Earthbound é uma fucking bagunça do inicio ao fim. Porém sabe o que mais esse jogo é? Todo coração. Esse é um DAQUELES jogos, que vc consegue sentir que os desenvolvedores estavam tentando se expressar artisticamente. É sobre um tema, vc consegue sentir isso, embora explicar o que é possa ser uma tarefa mais complicada.
That's sad bro. Mas eu te entendo. |
Por exemplo, o objetivo de Ness é atunar sua Sound Stone com 8 lugares de poder na Terra e assim com o poder do planeta ao seu lado poder enfrentar o último chefe - daí o nome Earthbound. Mas a coisa é, a cada lugar de poder que você visita Ness tem uma visão de um momento simples da sua vida: a primeira vez que o seu pai segurou ele no colo. O latido primeiro cachorrinho que ele teve. O cheiro da sua comida favorita. Sua mãe passando a noite em claro vigiando o seu sono enquanto bebê. São momentos pequenos, mas cara, no fim não é sobre isso que a vida é? Não são essas coisas que realmente importam no fim do dia?
Em determinado ponto você viaja dentro da sua propria mente e encontra vc mesmo criança. O vc criança então pergunta se vc quer jogar bola, bem, consigo mesmo, e vc responde que está ocupado, que tem que fazer outras coisas. O vc criança então pergunta se vc prefere então ler quadrinhos ou jogar videogames, e vc responde novamente que está realmente ocupado. O vc criança então não entende com o que vc pode estar ocupado a ponto de não ter tempo para as coisas que realmente te fazem feliz?
Cara, isso é profundo, vc realmente consegue sentir o desenvolvedor refletindo em que momento ele se tornou esse tipo de pessoa. Em que momento eu parei de ser a pessoa que eu queria ser quando criança e me tornei a pessoa que eu sou hoje? É uma coisa tão sincera, vem de um lugar tão verdadeiro que você não poderia fingir isso mesmo que tentasse.
Os três irmãos serem Pancho, Pincho e... Thomas Jefferson é o tipo de humor idiota que me faz rir |
O pai de Ness, por exemplo, só fala com você pelo telefone - você nunca o vê realmente - porque ele está sempre ocupado trabalhando. Inclusive nos créditos do jogo seu pai é representado com o telefone. Com certeza essa foi a experiencia que os desenvolvedores tiveram com os seus pais, e muito provavelmente essa é a relação que eles tem com seus filhos hoje - especialmente no Japão, porque é assim que as coisas funcionam. E novamente, eu não tenho palavras para expressar o quão verdadeiro isso é. Se isso não é arte, puta que o pariu, eu não sei mais o que seria.
Earthbound é, do começo ao fim, puro sentimento. Mesmo que não faça sentido, mesmo que seja caótico e confuso, Earthbound é uma catarse de sentimentos, ideias, medos, sensações, tudo mesclado junto de uma forma caótica e insana na forma de um jRPG. Explicar Earthbound é como tentar lembrar de um sonho, é confuso e vago, só que esse sonho é composto de todas as aspirações que fez você ser quem você é hoje.
A história mais famosa a respeito de Earthbound é que o diretor Itoi Shigesato conta que quando ele era criança, um dia foi ao cinema e entrou na sala errada. Ele acabou assistindo o filme "Kenpei to Barabara Shibijin" ("O Policial Militar e a Bela Desmembrada"), que como o nome pode dar a pista é um filme de horror. Ele Shigesato nunca mais esqueceu a sensação de assistir um filme desses com 8 anos de idade, e é essa a sensação que ele tenta passar na luta final contra Giygas. Não em plot, não em dialogo, mas puramente em sensação.
Isso é Earthbound, fragmentos de uma vida, pedaços de um ser humano do outro lado espalhados em 16bits.
Não surpreendentemente, em japonês o nome da série é Mother - que é uma relação com os poderes tirados da mãe Terra para enfrentar o mal, mas também é sobre familia, sobre quem você é e quem fez tanto por você. É literalmente sobre sua mãe. É sobre tudo.
E se esses ultimos paragrafos não fizeram nenhum sentido pra vc, então parabéns. Vc está começando a entender sobre o que Earthbound é: sobre algo que não pode ser explicado, mas que todo ser vivo pode sentir. Tanto que o ultimo inimigo, Giygas, em sua forma verdadeira é apenas um rosto descarnado distorcido gritando em agonia e desespero (é sério, acho que é a coisa mais perturbadora de toda biblioteca do Super Nintendo). Giygas não pode sequer ser atingido por ataques fisicos ou mesmo magias, porque ele é uma ideia, ele é um conceito da própria sombra que existe dentro do seu ego. Ele é o você que você não quer encarar.
Isso não é um background, é a forma do último chefe. Because Earthbound. |
Então como se derrota Giygas? Usando o comando Pray de Paula. Para que seu pedido de ajuda chegue a todos os NPCs que você ajudou durante o jogo. Vc não precisa lutar essa luta sozinho, vc não tem como vencer essa luta sozinho. Mas com a ajuda dos amigos que você fez durante o caminho você consegue. Porque assim é a vida, não tem como conseguir sozinho, mas com a gentileza de todos com quem você foi gentil durante sua vida... dá pra fazer.
Traduzir isso em uma mecanica de combate em um jRPG de 1994... cara, isso é arte. Isso é verdadeiramente arte e eu falo isso da forma mais sincera possível.
E talvez a melhor forma de visualizar isso seja justamente através da trilha sonora, que é um bagunça desordenada porém que há um metodo na loucura quando você entende que na verdade ela é sobre um artista compartilhando todas as coisas que se passam na sua cabeça. O que significa que algumas trilhas sonoras são trilhas tipicas de jRPGs (como a famosa "musica de cidade pacifica"), algumas são coisas que o criador genuinamente gosta (como Bossa Nova e Jazz), e algumas são apenas sons cacofonicos eletronicos como se estivesse a beira de um colapso mental.
De certa forma, me lembra bastante o especial super pessoal e intimista do Bo Burnham para a Netflix durante a quarentena que é uma mistura de música, rants e um colapso mental. A trilha sonora de Earthbound é bem nessa pegada, uma mistura de gostos, memórias, caos e sentimento - além de ter uma das músicas mais bonitas (a mais bonita na minha opinião, ao lado do tema da Terra em FINAL FANTASY 6) que é a música tema da cidade de Winters. A memória do cartucho teve de ser duplicada, para um tamanho impressionante de 24 megabit, para caber os grandes mapas e vasta gama de músicas, inspiradas em folk, pop, rock, música clássica, trilhas sonoras de filmes e, até mesmo, metal.
E justamente por isso que Earthbound é um projeto tão desapegado, é tão sua própria coisa que ele joga pelas suas próprias regras que é um jogo que segue seu próprio ritmo no quesito do humor - algo pelo que videogames não são exatamente conhecidos até o dia de hoje.
A seco assim Earthbound parece apenas uma coleção de frases soltas sem sentido, mas quando vc entende que são os fragmentos de uma vida expostos e compartilhados... ainda sim não faz sentido, mas algumas delas são tão absurdas que são genuinamente engraçadas. Tipo, sério:
É realmente chato quando você acidentalmente sequestra alguém |
Dude... |
Mecanicamente e como experiencia o jogo é repleto de falhas e raiva, mas por outro lado não existe outro jogo como Earthbound. É um jogo falho, esquisito e até mesmo quebrado. Mas ao mesmo tempo é isso que faz Earthbound ser Earthbound. E quer saber? Eu não sei se iria querer de outra forma. Talvez uma versão corrigida e funcional de Earthbound seria melhor de se jogar? Talvez seria, mas não seria tão tão, tão visceral, tão sincero... não seria tão EARTHBOUND.
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