segunda-feira, 29 de novembro de 2021

[#930][PC] ALONE IN THE DARK 3 [Março de 1995]

O ano é 2523. Após anos de avanços cientificos, a humanidade finalmente atinge o ápice da evolução possível para a espécie: é reconhecido publicammente que eu sou um gênio. Isso porque eu posso ter muitas limitações na vida, mas uma coisa que eu sei fazer é analisar videogames. Também né, depois de 780 reviews alguma coisa a gente aprende a fazer, né?

Exemplo em caso: eu disse que ALONE IN THE DARK 2 não é apenas um jogo ruim, é uma deformidade no espaço-tempo em que nenhuma realidade possível isso tem como dar certo. Você pega o point'n click 3D troncho que é o primeiro ALONE IN THE DARK e transforma em um jogo de ação, pew pew pew. Não tem como isso dar certo, a física simplesmente não permite.


Entretanto se você ler sobre o jogo por aí só vai ver "nostalgia, mimimi, lembro do cheiro de bolinho de fubá da minha vó, mimimi", se for uma review brasileira então, pff. Apenas eu sou a voz sã na internet, eu te digo. Ah, exceto por sabe quem mais concorda comigo que ALONE IN THE DARK 2 é um crime contra os videogames? O criador/diretor de ALONE IN THE DARK, Frederik Raynal e seu principal programador Franck de Girolami, que após a ideia desgracenta da Infogrames de obrigar a lançar outro jogo menos de um ano depois pediram as contas da empresa. Sim, nem o criador de ALONE IN THE DARK 2 e seu braço direito aguentaram aquela merda.

O que nos leva então a Sozinho no Escuro 3, porque isso não impediria a Infogrames de lançar outro jogo menos de um ano depois. Vamos ser honestos, uma empresa que lançou FANTASIA é imune a bom senso. Com o criador da série e seu programador chefe tendo dito que não trabalhavam mais nessas condições, o que eles fizeram então?

Simples: promoveram a programadora com mais experiencia na série que sobrou a diretora. Assim a bomba caiu no colo de Christiane Sgorlon (que além de ser programadora do segundo jogo, ela coordenou todo o port para 3DO, de modo que não tinha ninguém que entendia mais de AitD do que ela realmente). E o que a menina Chris fez? O que qualquer um de nós faria: se trancou no banheiro e chorou. Porém quando lembrou que isso não pagaria os boletos do mes, ela limpou o rosto e foi trabalhar - o que quer dizer consertar o DESASTRE TERMONUCLEAR que é ALONE IN THE DARK 2. E como você remenda esse trem descarrilhado?

Bem, a primeira coisa é adereçar o elefante branco na sala: Alone in the Dark não serve pra ser um jogo de ação. Isso é óbvio, DEVERIA ser óbvio a qualquer um, mas então não é realmente surpreende as coisas que a Infogrames consegue ignorar. Então a primeira decisão que Chris tomou foi que Alone in the Dark voltaria a ser um jogo com foco em puzzles, eventualmente com alguns pipocos mas okay, não é sobre isso que o jogo seria.


A segunda coisa que ela fez foi aproveitar as ideias boas que o segundo jogo teve (mas que foram soterrradas pela mecanica monstruosa): fazer uma história com ideias lovecraftianas mas que não se leva tão a sério. Quer dizer, zumbis gansgters liderados por um fantasma pirata? Isso é idiota, mas o tipo bom de idiota, o tipo engraçado de idiota. Okay, isso pode funcionar.

Qual é o tema de Alone in the Dark 3? Bastante simples: um faroeste zumbis . Claro que sim, como não? Olha, isso é realmente, realmente idiota... mas novamente, é o tipo certo de idiota. Okay, isso pode funcionar.

Então quando você considera essas tão necessárias correções de curso que a série tomou no seu terceiro jogo, ele é bom? Err... "BOM" é uma palavra forte, mas definitivamente é o menos pior dos três, eu tenho que dar isso a eles.

Uma prova que o jogo tenta "voltar as raízes", é que ele trás de volta os personagens jogaveis do primeiro jogo: depois de libertar Grace Saunders das garras do pirata imortal One Eyed Jack, o detetive Carnby ainda é um detetive sem um tostão. Felizmente, um dos nababos de Hollywood o colocou em um novo caso: toda uma equipe de filmagem desapareceu em uma cidade fantasma na putaquepariu do oeste no meio do deserto de Mojave chamada Slaughter Gulch. Hmm, não vejo o que poderia ter dado errado se metendo em um lugar desses...


Para piorar as coisas, Emily Hartwood (a segunda personagem jogável do primeiro episódio), agora uma atriz, estava entre a equipe, e então Carnby acaba no meio do nada, tentando salvá-la. Claro, a cidade fantasma está cheia de cowboys mortos-vivos, espiritos raivosos de nativos americanos e minério mágico radioativo. O que é um setting legal, de verdade.

Outra coisa bem legal é que eles desenvolveram de forma interessante a história de Slaughter Gulch através de diarios, cartas e gravações em audio. Hoje, claro, isso é apenas padrão em survival horror mas então estamos falando de 1995 - não havia padrão nenhum, na verdade. 


Como explicado antes, a Infogrames trouxe a série de volta ao gênero de aventura, e as sequências de combates foram reduzidas e melhor distribuídas. A maioria dos cowboys mortos-vivos que você encontra não podem ser mortos a menos que um quebra-cabeça específico seja resolvido. Um desperado maligno só pode ser morto por uma bala de ouro, por exemplo. Embora a ideia estivesse presente no segundo jogo, aqui ela é aplicada a quase todos os principais inimigos. Existem vários capangas bucha de canhão no meio, mas eles geralmente são encontrados em ângulos de câmera favoráveis e caem com bastante facilidade. Alone in the Dark 3 também é o primeiro jogo a introduzir configurações de dificuldade na versão original para PC, e é possível ajustar a saúde e os danos de Carnby, bem como a saúde dos inimigos separadamente. A configuração mais baixa torna o combate dificilmente um problema, você nem vai precisar de itens de cura.

Então embora é frequentemente dito que Resident Evil se inspirou em Alone in the Dark e você consegue entender os conceitos, porém aqui Alone in the Dark 3 REALMENTE parece um beta do primeiro Resident Evil com você rodando pela mansão resolvendo puzzles, coletando diários que contam a história e metendo pipoco em zumbis.

Claro, se Resident Evil tivesse gráficos piores, jogabilidade pavorosa e puzzles que não fazem nenhum sentido. Porque apesar de AitD3 ser o "menos pior" dos três, ainda sim é um Alone in the Dark.


Em um esforço para apimentar mais as coisas, como as sequências costumam fazer, os quebra-cabeças aqui são mais obtusos do que nunca - só que com menos contexto suplementar. Um exemplo de um dos muitos puzzles ridículos: encontrou uma porta trancada? Por que não atirar nela com tiros de sua metralhadora Gatling recém-adquirida? Por que não? 

Bem, talvez porque isso só funciona em UMA porta, UMA vez durante o jogo inteiro, como que do nada você vai tirar da bunda que NESSA porta em especifico tem que dar tiro até ela morrer - especialmente quando o jogo não dá nenhum feedback diferente quando atira na porta, apenas parece que você está desperdiçando balas. 

Ou então tem uma seção que exige que Carnby atravesse um precipício. Há um caminho seguro para no ar, como no filme do Indiana Jones, mas o caminho não é explicado, nem que você tem que apenas tentar caminhar no ar do nada, como se fosse um fucking cartoon. A melhor abordagem, então, é salvar, dar um passo, salvar de novo. Novamente, isso quando vc sequer faz ideia que tem que "se jogar" no penhasco. Porque isso é a marca do bom game design, claro. Estranheza é uma marca registrada de Alone, mas a estranheza sempre esteve enraizada em alguma linha tênue de lógica adequada ao mundo do jogo. Não aqui.


O mindset do design de puzzles aqui é "tente tudo em seu inventário e, se isso falhar, compre uma revista com um detonado (ou se estiver jogando em 2021, procure um guia online)". Wonderful, just so subarashi. Just so.

Mas créditos onde créditos são devidos, ao menos o jogo tem puzzles bons também. O ponto alto do jogo para mim foi morrer e voltar como um puma, o que foi original, divertido e interessante. Como você luta contra um lobisomem (que só pode ser morto por prata) quando não tem mãos para segurar as coisas? Pena que o jogo não tenha apenas puzzles assim.


Ainda sim, os puzzles do jogo meio que se salvam de um "the worst of" ali ali, scrapping by. Some a isso um lore que te deixa curioso para saber o que aconteceu ali, o combate que foi mais ou menos "resolvido" pela diminuição da frequencia e adição de níveis de dificuldade e voce tem um esqueleto de um jogo quase jogavel. Tanto que alguém poderia imaginar como seria uma versão de Alone in the Dark 3 com gráficos melhores, combate melhor, controles melhores e cutscenes menos tronchas (ao contrário do jogo anterior que não tem como imaginar como salvar aquele acidente de trem!).

Oh, não, espere, esse jogo existe e ele se chama Resident Evil!

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 017