sábado, 29 de julho de 2023

[#1144][Nov/97] ONE


Ok, eu tenho que abrir essa review dizendo isso: na hora de nomear os generos de jogos videogame, as pessoas não tentavam inventar a roda ou ser poéticas. Beat'm up é literalmente "bata neles", pq é um jogo de bater neles (no Brasil a gente chamava de "briga de rua", pq era uma briga na rua". jRPG é um RPG, só que japonês. FPS é jogo de tiro em primeira pessoa, um jogo onde vc atira com visão em primeira pessoa. Como eu disse, ninguém está tentando ser poético aqui.

Isso sendo dito, entretanto, eu tenho que dizer que os criadores de One foram um pouco literais demais quando decidiram fazer um run'n gun: quero dizer, é um jogo cuja primeira fase é só correr e atirar. Sim, eu sei que é isso que vc espera, mas eu estou falando que é LITERALMENTE isso por vários minutos!


Quero dizer...


Pq mano, sério...


Achou que eu tava brincando?

Verdade que depois o level design dá uma variada, inclusive com algumas ideias bem interessantes (como o poder da sua arma vem de destruir o cenário), mas eu queria que o primeiro contato que vocês tivessem com esse jogo fosse o mesmo primeiro contato que eu tive, já que eu nunca tinha ouvido falar desse jog na minha vida.

Bem, sim, tecnicamente ele saiu na Ação Games e em algum momento eu li sobre ele, eu suponho, mas algum juri do mundo realmente me condenaria por não lembrar de um jogo chamado ONE? 

Para minha grande decepção, no Japão o jogo não se chama Ichi

Sério, pouta que le pareo, eu achava que nomear um jogo de luta como VS. era uma ideia preguiçosa e ruim isso EMPALIDECE com a ideia de jirico de nomear um jogo como "One". Vocês fazem a mais remota ideia do quão dificil é pesquisar a respeito dele? E como diabos as pessoas pediam pra comprar esse jogo, "i want a one PS1 game"?

Não tem como isso dar certo. E obvio que não deu certo, esse jogo foi um fracasso de vendas tão retumbante que após isso a sua produtora - a Visual Concepts, mundialmente conhecida por ... CLAYFIGHTER, eu acho? - só voltaria a lançar um jogo autoral dali a QUATRO ANOS, esse tempo todo eles apenas fariam ports ranquias anuais de esportes pra não correr riscos (tipo NHL 2K, NHL 2K1, NHL 2K2...)


Bem, considerando que eles decidiram nomear o seu jogo com um nome que é terrivel de falar sobre ou mesmo problemático encomendar o jogo, que surpresa, né...

E sabe o que é pior? Uma vez que eu finalmente joguei o "Um jogo"... voltamos a primeira cena do corredor run'n gun literal, e olha, eu tenho que dizer que pareceu interessante. A cena do herói sendo perseguido por um helicoptero é bastante frenética para os padrões do PS1, e tem um feeling bem CONTRA III: THE ALIEN WARS de perseguições insanas na assim.

É uma primeira boa impressão, e isso pelo menos visualmente Um entrega. "Se ao menos  eles resolverem esses bugs de jogabilidade, vai ser um ótimo jogo", eu disse para ninguém em particular. Imagine minha decepção quando joguei até o final e descobri que os "bugs de jogabilidade" ERAM a jogabilidade.


Um se passa 40 anos no futuro (se essa frase pareceu estranha, vc está começando a entender o quão ruim é o nome desse jogo), onde o protagonista John Cain acorda em um prédio de apartamentos desconhecido com seu braço esquerdo substituído por uma arma enorme, confuso e razoavelmente chateado em se descobrir um cyber-maneta. E também porque dispararam um míssil nele, isso pode chatear algumas pessoas.

Ao ser explodido pra fora do prédio, ele é perseguido por militares desconhecidos empenhados em matá-lo. No que diz respeito às premissas do jogo, esta é perfeitamente okay. Agora, se vc espera que o jogo vai fazer algo com isso... não vai. Não tem uma única cutscene no jogo inteiro, o que é estranhamente pouco mesmo para jogos de ação da época.

Nenhuma CGzinha, nada necas, niente. Estranho, e meio paia, mas sigamos.


Mas enfim, as explosões são efeitos incríveis para o PS1 (especialmente pq eu já joguei FANTASTIC FOUR), os lasers são nítidos e os movimentos de John são ágeis e realistas. O que são predicados incríveis para um jogo de ação, suponho que eu não precise explicar isso. O que eu preciso explicar, infelizmente, é aqui que as partes boas de One param.

Correr por um corredor é okay, mas controlar John em qualquer outro cenário é um desafio. Em plataformas, é uma profissão de fé. Seu movimento é solto demais, esse jogo tem um distinto feeling de plataforma europeu nele (o que nunca é uma coisa boa, Jesus no pogobol, jamais) resultando em pulos errados que teoricamente deveriam ser incrivelmente fáceis. Depois de morrer inúmeras vezes em algo que não deveria ser um problema, o jogo começa a ficar frustrante.


O que me leva ao principal problema de Um: é muito difícil. Tá, okay que run'n guns são conhecidos por serem dificeis, mas Um abusa da amizade. Qualquer jogo bem desenhado tem uma curva de aprendizado compreensível: é fácil no começo, então você conhece o controle e como o jogo funciona, e então fica cada vez mais difícil. Um começa difícil e fica pior. 

Veja, não é o jogo ser dificil que o torna ruim. Existem jogos ridiculamente dificeis que são ótimos, tanto hoje (com jogos como Cuphead e a série Souls), como mesmo na época que CONTRA III: THE ALIEN WARS mesmo é um bom exemplo de como um jogo ridiculamente dificil pode ser divertido. 


Não, não é esse o problema, o que realmente entrega Um é a maneira como você morre. Quando Um decide colocar um novo tipo de desafio no jogo, então você tem que morrer 20 vezes para entender como passar pq as coisas apenas explodem na tela caoticamente sem dar tempo pra vc reagir. E os checkpoints são espaçados incrivelmente distantes, então você tem que começar de novo. Observação para futuros desenvolvedores: isso não é divertido.

O que me leva ao grande problema do jogo: One aparentemente foi projetado para tornar impossível ver o que está acontecendo. Sempre que algo grande explode (o que é frequente), a tela treme como em um filme. Isso parece impressionante o suficiente para a pessoa que está assistindo você jogar, mas torna difícil para a pessoa com o controle na mão ver o que está acontecendo. Adicione a isso algumas explosões que preenchem a tela e a tendência da câmera de ficar presa atrás de objetos sólidos, e quando você não estiver tomando tiro sem saber de onde você vai estar caindo de passarelas estreitas à esquerda e à direita.


Alias a coisa da camera virar para onde o personagem está atirando pode ser uma resposta para uma época que ainda não haviam duas alavancas analógicas (ter uma só para controlar a camera, como é hoje, teria ajudado horrores), mas torna entender o que está acontecendo uma desgraça pq vc está sempre girando a tela para atirar ou tentar entender de onde está tomando tiro. Não é para as pessoas facilmente enjoaveis, eu posso te dizer isso.

Enfim, Um poderia ter sido um grande jogo. Ele tem a ideia básica okay, bons gráficos e destruir o cenário sempre é divertido. Mas quando o jogo sai de seu caminho para tornar sua vida miseravel com a dificuldade - especialmente para esconder a sua curta duração de cerca de uma hora, o que não era muito para essa época - é menos fácil gostar desse jogo.

Mas então, talvez eu não devesse ter expectativa nenhuma de um jogo chamado "Um" em primeiro lugar. Se os caras não pensaram bem sobre o nome do jogo, pq eles haveriam de pensar melhor sobre qualquer outra coisa nele?

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 125 (Março de 1998)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 047 (Fevereiro de 1998)