quinta-feira, 23 de abril de 2020

[AÇÃO GAMES 042] SUPER MARIO ALL-STARS and SUPER MARIO WORLD (SNES, 1993) [#354 a #357]


Em 1993, a Nintendo percebeu que demoraria um pouco mais do que eles imaginavam até o próximo jogo do Mario ficar pronto. O próximo jogo seria Super Mario World 2: Yoshi's Island, que só seria lançado em 1995 e por isso eles acharam que precisavam de algo para manter a franquia viva no mercado - ainda mais porque a essa altura a Sega estava despejando jogos do Sonic como se sua vida dependesse disso (Sonic Chaos, Sonic CD, Sonic 3...). Porque estava, mas enfim.

Então Shigueru Miyamoto teve outra daquelas ideias que moldaria o mercado de games pelos próximos... bem, até hoje na verdade, e sem previsão de acabar um dia. Essa ideia foi relançar os jogos do Mario do Nintendinho para o console atual. Sim, a Nintendo inventou os remakes nos videogames, saiba você.

Remakes are TIGHT, mas não tanto quanto a nova barriga sarada da Tifa
Assim, os quatro primeiros jogos do Mario do NES (sim, 4) foram refeitos para o SNES e compilados no mesmo cartucho. Posteriormente (no fim de 1994) a Nintendo lançou outra versão desse jogo contendo Super Mario World e esse passou a ser o jogo que vinha na compra do Super Nintendo. Ou seja, ao levar o SNES para casa você saia com cinco, eu disse, CINCO jogos iconicos para se divertir-se a si mesmo e toda família.

E neste dia a Sega a margem do Rio Pedra, sentou e chorou.

Mas bem, verdade seja dita que não existe muito que eu possa dizer sobre esses jogos que já não tenha sido dito, afinal são cinco dos jogos mais seminais na história dos videogames. Por isso vou fazer outra coisa: vou contar toda história da Nintendo, das suas origens até Super Mario World. Esse será um post longo, então sugiro que se tiver que piscar que o faça agora (referencia cult obrigatória para eu me sentir muito melhor do que todos vocês).

Então, sem mais delongas... eu vos apresento as delongas!

SUPER MARIO BROS (1985)





Nossa história começa em 1984, o famigerado ano negro da história dos videogames. Num piscar de olhos, o consumidor deixa de se interessar pelas máquinas de jogar joguetes. As vendas de consoles caem vertiginosamente. 

Mas... por quê?


Em menos de um ano, o mercado de games encolheu assustadores 97%!

Ao contrário do que o seu amiguinho bolsominion acredita, todos os grandes eventos da vida tem respostas mais complexas do que cabem em um meme e são uma combinação de várias coisas. Em primeiro lugar, a ascensão dos computadores domésticos.

Por que alguém gastaria US$150,00 num videogame, se um computador custa US$200,00? O computador também serve para atividades educacionais e muitas outras coisas. Além disso, as revistas especializadas ofereciam 4 ou 5 programas novos, inclusive jogos, a cada edição.

Outro motivo foi a saturação de lixo no mercado. No final de 83, empresas não ligadas ao mundo dos jogos de videogame começam a entrar em contato com softhouses para criarem jogos promocionais. Até barraca de cachorro-quente quer um jogo que valorize a marca para usar como material de divulgação. Mas os games produzidos eram horríveis e o público faz a conta básica:  se de cada 10 jogos que eu comprar, 9 serão lixos intragaveis... então eu não quero mais brincar disso.

Felizmente os videogames aprenderam sua lição e isso
jamais voltou a acontecer.
Era um tempo sem internet ou revistas especializadas, então as pessoas só tinham o boca-a-boca para saber se estavam levando lixo para casa ou não. E quase tudo era lixo. Ou seja, não tinha como dar certo.

As pessoas diziam em 1984, não sem uma boa dose de razão, que quem fosse em investir em algo sem futuro como videogames deveria ser um doido varrido que também faria coisas de doido como escrever da esquerda para direita ou tomar banho sentado. E eles não podiam estar mais certos.

Não que a Atari tenha ajudado, tomando decisões que empalideceriam a Sega - do tipo fabricar mais cartuchos de um jogo do que haviam consoles vendidos

Vamos pegar nosso aviãozinho imaginario do Street Fighter II e viajar no tempo e no espaço até o outro lado do mundo. Vou fazer uma pausa para você lembrar o som. Mais precisamente, vamos viajar até 1889. Por quê 1889?

Bem, duas coisas muito importantes aconteceram na última semana de setembro de 1889: a Convenção Geral de Pesos e Medidas definiu como “metro” a distancia entre duas linhas em uma barra padrão de aluminio com 10% de irídio, medidas na temperatura do ponto de derretimento do gelo. Agora você sabe, e saber é metade da batalha.

Sede original da Nintendo em 1990...
... e o mesmo espaço hoje.

A outra coisa importante que aconteceu foi que no dia 23 de setembro do ano de 1889 em Kyoto um japa muito simpático chamado Fusajiro Yamauchi abriu uma loja de cartas para um jogo chamado Hanafuda. Naquela época os japoneses eram uns babacas xenofobos (totalmente diferente de hoje, claro) e uma das consequencias é que jogos de cartas estrangeiros eram completamente banidos, incluindo aí o Hanafuda (que era uma variação do jogo chinês Zanga, que é um jogo tão complicado que mesmo RPGistas com seus livros de regras de 300 páginas não se metem com ele).

Acontece que Fusajiro viu aí uma oportunidade de fazer dinheiro onde ninguém mais via: sua loja vendia cartas de Hanafuda artisticamente pintadas a mão, assim mesmo que você não jogasse o jogo ainda poderia comprar as cartas para decoração ou impressionar sua gueixa favorita e prometer tira-la dessa vida, algo assim.


E sabe de quem caiu no gosto por essas cartas? A Yakuza. Ora, uma reunião de mafiosos não é uma reunião de mafioso em nenhum lugar do mundo sem gangsters tatuados mal encarados jogando cartas em uma sala mal iluminada. E se estas cartas forem pequenas obras de arte de um jogo proibido pelo governo, bonus de estilo gangsta! E a mafia é tudo sobre estilo, afinal. E tomar dinheiro das pessoas por intimidação, eu acho. E atender telefone com muita intensidade, se eu aprendi alguma coisa com Yakuza Zero...



E assim graças a Yakuza (a mafia, não o jogo) os jogos de Hanafuda voltaram a moda e por tabela a loja de Fusajiro se popularizou imensamente. Porque você acha que isso de pagar pau pras modinhas dos "vidaloka" é coisa de hoje?

Seja como for, videogames só existem hoje graças a máfia japonesa, quem diria, não?


Durante os próximos 80 anos a Nintendo procurou sem sucesso um ramo para expandir os seus negócios, e olha que eles tentaram: a Nintendo tentou com uma rede de TV, uma companhia alimentícia – que tentou vender arroz instantâneo, no estilo do macarrão instantâneo – e até mesmo uma cadeia de motéis. Eu simplesmente não sei nem por onde começar com a quantia de piadas que podem ser feitas disso, mas tenho fé na sua inteligência.

Nos anos 60 a Nintendo estava praticamente falida afinal era uma fucking empresa que vendia baralhos, o quão financeiramente saudável pode ser esse negócio? (Você fique quieta, Copag). O primeiro grande e verdadeiro sucesso da empresa veio com a Ultra Hand, uma mão bionica bagaceira desenvolvida por um dos seus engenheiros de manutenção nas horas vagas. O sucesso da Ultra Hand fez a Nintendo acreditar que o futuro para sua salvação estava no setor de brinquedos – e pelos antigos deuses e pelos novos, não é como se eles não tivessem tentado de tudo mesmo até aquele ponto.

É Nintendo ou nada!

Como a política da Nintendo era topar qualquer coisa desde que a mantivesse viva, não foi sem surpresa que ela decidiu arriscar e ser a distribuidora do Magnavox Odyssey no Japão - o primeiro videogame do mundo. O Odyssey tinha um pequeno problema, entretanto: ele era uma merda, e nem mesmo o gosto altamente ... peculiar dos japoneses dava conta de absorver essa tralha.



Entretanto a Nintendo acreditou no potencial do gosto que os japoneses tinham por tecnologia e continuou batendo nessa tecla de “tralhas eletronicas para a família” e você já pode começar a imaginar onde nisso vai terminar. Após muitas tralhas que fariam qualquer loja de 1,99 sentir vergonha (como um infame “amorometro”), a Nintendo acabou se metendo a fazer arcades.

O que também tinha um grande problema nisso: a Nintendo possuia tanto talento para fazer jogos quanto tinha para gerenciar uma rede de moteis, de modo que seus arcades eram notoriamente HORRÍVEIS.

Quando você é rejeitado em um país em que existe a calcinha jeans,
você sabe que não era para ser.
Ok, você pode achar que eu estou exagerando, então me pertmita te apresentar o EVR RACE, que era um "jogo" onde tinha uma duzia de corridas pré-gravadas e até 5 “jogadores” podiam apostar em quem ia ganhar. Uau, exatamente o que as crianças estava esperando para torrar o dinheiro de suas mesadas, hã? Depois esses putos vão a falência e não sabem o porque…

Esse era o nível da coisa...
O destino da Nintendo no ramo de games era tão brilhante quanto havia sido em tudo até então, não fosse o fato que o destino certo dia olhou bem para os caras e disse: “Ah, quer saber? É hoje!”.

Aconteceu que na época Hiroshi Amauchi era o presidente da Nintendo e um amigo de um amigo dele conseguiu um carteiraço para que o filho dele, recém-formado em artes, tivesse uma boquinha na empresa – e você achando que os japoneses não faziam esse tipo de patifaria, né?

Bem, o que uma empresa que se focava em arcades e brinquedos eletrônicos faria com um cara recém-formado em, pff, design industrial? Sério, pra que diabos contrataram um wannabe artista, além do fato do presidente fazer uma média com seus chegados? Por isso colocam o cara para pintar as laterais dos arcades da empresa, já que ele era um “artista”, né?


Sabe, até aquela época jogos eram feitos por nerds cabeçudos quase individualmente de forma técnica. Você tinha uma ideia, ia lá, programava, e tava feito o seu jogo. Não existiam coisas como “arte conceitual” ou um pensamento mais profundo de um artista de verdade, ninguém nunca havia feito algo assim antes, literalmente. De toda forma, agora a Nintendo tinha um artista na sua folha de pagamento de qualquer maneira…

Como o cara estava de bobeira por lá mesmo começou a dar sugestões nos conceitos de jogos que via seus colegas trabalhando – idéias que só podiam vir de alguém que não entendia absolutamente nada de programação. E os palpites dele começaram a fazer com que os jogos ficassem exponencialmente melhores e isso fez com que ele fosse levado para o departamento de planejamento.



Naquele ano, em 1980, a Nintendo estava embuchada com dezenas de arcades de um clone genérico de Space Invaders que eles havam feito chamado Radar Scope que havia sido mais um “próximo grande sucesso fracassado” da empresa. Como não tinha mais o que fazer com aqueles arcades o presidente decidiu tentar não ter uma perda total e converter o equipamento em algum outro jogo para arrancar o maximo de lucro daquelas porcarias com o menor esforço possível, mas como não era um projeto realmente importante (era mais um “ah, melhor que nada, né…”) a Nintendo jogou para o único noob vadiando que tinha por lá, justamente o nosso “artista” em questão.

Um tal de Shigeru Miyamoto, alias.

Que totalmente será interpretado pelo Willem Dafoe na
biografia da sua vida
E mesmo que fosse um projeto da décima oitava prioridade de uma empresa pequena - na verdade, justamente por causa disso - pela primeira vez Miyamoto tinha carta branca para criar qualquer coisa que ele quisesse. Ele finalmente poderia fazer “arte”, e efetivamente “arte” ele fez.

Juntando meia dúzia de conceitos diferentes (King Kong, Popeye, A Bela e a Fera) e trabalhando com as limitações técnicas da época (o herói teria que usar um boné porque não tinha como fazer a animação do cabelo dele balançando quando ele pulava, por exemplo), Miyamoto dirigiu (e aqui pela primeira vez se usou a palavra “diretor” para um jogo, porque Miyamoto pessoalmente não entendia muito de programação e ele mais coordenou a equipe do que outra coisa) um arcade que viria a ser conhecido como “Donkey Kong”.

BOOM.

Conhece o Jumpman?

Sucesso. Fama. Iates. Mansões. Mulheres. Cem mil dolares.

Pela primeira vez o mundo parava para ver quem diabos eram esses japoneses dessa tal de Nintendo porque o jogo deles não era nada como havia sido visto até então. Não era um jogo de tiro, não era um labirinto nem nada do tipo, era… era… o que diabos era aquilo? Era um novo gênero de jogo? E podia se fazer isso?

Bem, não importava realmente: Donkey Kong foi primeiro grande sucesso da Nintendo.

O protagonista do jogo, o carpinteiro pulador, era chamado apenas de “Jumpman” (por motivos obvios) e a princesa a ser resgatada não tinha nome. Como a Nintendo da América achou isso bastante pouco atraente decidiu chamar a princesa de Pauline (em homenagem a esposa do presidente da Nintendo of America, Pauline James) e o carpinteiro saltador foi rebatizado em homenagem ao dono do depósito que a Nintendo usava para armazenar suas coisas, Mario Segale. Assim nasceram Pauline (que posteriormente viraria “Peach”) e Mario.


Após trabalhar em mais algumas continuações de Donkey Kong (Donkey Kong Jr é o meu favorito, em que você controla o filho do gorila para salva-lo das garras do terrível Mario) Miyamoto foi chamado para conversar pelo presidente da Nintendo: a companhia tinha um projeto ambicioso e precisam de seu melhor homem para faze-lo dar certo.

A Nintendo tinha a idéia de lançar o seu próprio videogame, um computador para a família (daí o nome “Famicom” que é como o console foi lançado no Japão) mas sabia que o projeto não iria para a frente se não tivesse como carro chefe um jogo diferente de qualquer coisa que as pessoas sequer houvessem imaginado em seus sonhos mais loucos (e olha que os anos 70 mal tinham terminado, as pessoas imaginavam coisas bem loucas ainda).

Sou só eu, ou essa propaganda do Famicom parece... errada?


Em outras palavras, o Famicom só iria pra frente se tivesse algo único e inovador, sua única chance era apagar a imagem ruim que a Atari havia deixado com um jogo tão bom que faria as pessoas implodirem só de ve-lo.

O que eles precisavam era apenas o melhor jogo de todos os tempos já feito até então. Apenas isso. 

Felizmente, eles tinham o homem certo para o trabalho…



Então diante dessa ousada tarefa de conquistar o mundo ou nada, a Nintendo então fez o que um bom asiático faria sobre o assunto: estudou bastante sobre o tema e chegou a uma solução genial. Porque você não tem como saber o que fazer exatamente para ter um console de sucesso, mas a Nintendo sabia o que NÃO devia fazer para acabar igual a Atari. Comece pelo começo, como diz o ditado.

O primeiro passo que eles tomaram foi criar o “Selo Nintendo de Qualidade”: apenas jogos previamente aprovados pela própria Nintendo poderiam ser jogaveis no seu Famicom – isso impediria a enchurrada de jogos asquerosos que foi uma das causas-mortis do Atari.

Assim eles inventaram o primeiro chip de bloqueio, mais ou menos como usado hoje em dia para combater a pirataria porém na época o objetivo da Nintendo era combater a lixaria mesmo. Outra medida para impedir a avalanche de jogos ruins foi que a Nintendo limitou as outras empresas que fariam jogos para o Famicom a apenas 5 titulos por ano dessa forma eles teriam que lapidar bem os seus jogos porque eram poucas balas na agulha para gastar.


Com tudo armado e engatilhado, o Famicom foi um grande sucesso no Japão. Porém o Japão não era suficiente, pois a Nintendo tinha a missão de salvar o resto do mundo de um horrível futuro distópico onde não existiriam videogames e apenas jogos de Amiga! Não, tudo menos isso!

Enfim, era hora do Famicon ganhar o mundo! E o mundo foi tentado quando na CES de 1984 (obviamente não havia uma E3 em 1984… meio porque não haviam videogames ainda, na verdade os videogames só vieram a ter a sua grande feira própria, a tal da E3, lá por volta de 96/97, até então eles usavam o espaço da Consumer Eletro Show de Los Angeles que ainda hoje é a maior feira de novidades eletro-eletronicas do mundo) o videogame foi apresentado e o inevitavel aconteceu!

Fama? Mulheres? Iates? Hmmm, não, tente mais… indiferença.

O AVS apresentado pela Nintendo na CES de 1984
As pessoas não queriam saber de videogame, não importava o quão bom ele prometesse ser ou quanto de controle de qualidade a Nintendo prometesse impor. O Famicon passou batido na feira e a Nintendo se reuniu em seu esconderijo em Hokaido (aprendi no Jaspion que todos os esconderijos ficam em Hokaido) para traçar seu plano maligno de dominar o mundo.

Eles precisavam vender videogames para um mundo que não queria ouvir falar na palavra videogames, como eles fariam isso? Bem, haviam duas abordagens que eles poderiam tentar:

A reação das pessoas perante o monstrengo que a Nintendo apresentou na CES 84

A) Fazer um jogo tão incrível, tão estupendo, tão maravilhoso, tão genial que as pessoas esquecessem porque elas não gostavam de videogames 

B) Vender videogames para as pessoas sem que elas soubessem que estão comprando videogames.

A Nintendo fez os dois.

E por incrível que pareça, a primeira parte era a mais fácil. Bem, talvez fácil não seja a palavra mas a verdade é que eles tinham um genio como Shigeru Miyamoto no seu time, tudo que eles precisavam era dar a tela e a aquarela para Miyamoto-san e não encher o saco dele. Como resultado, a Nintendo obteve sua obra prima.



Mesmo passados 30 anos desse jogo, Super Mario Bros é um jogo perfeitamente jogavel e gostoso mesmo pelos padrões de hoje e mesmo se desconsiderarmos o fator “nostalgia”. Sabe, existem realmente poucos momentos como esse na história da humanidade. Quando Beethoven compos a 9a sinfonia, quando Michelangelo pintou a Capela Sistina, quando Maradona driblou sozinho todo time da Inglaterra, quando Michael Jackson gravou o album Thriller. E quando Shigeru Miyamoto fez Super Mario Bros.

São momentos assim que os planetas se alinham, os céus se abrem e o universo inteira ressona positivamente com um momento de uma obra-prima sendo criada. Momentos de pura arte e qualquer idiota que acha que a humanidade não faz nada de bom e que o mundo seria melhor aproveitado dominado pelas vacas é um coitado que nunca jogou a fase 1-1 de Super Mario Bros.



De fato, já era 1985 quando a Nintendo começou seu longo e cansativo processo de bater de porta em porta dos grandes varejistas americanos para vender o seu videogame (agora remodernizado para o gosto americano e rebatizado de Nintendo Entertainment System, o NES) era convencer o gerente a jogar pelo menos a primeira fase do jogo mais fantástico de TODOS OS TEMPOS (até ali, pelo menos). 

A reação das pessoas que experimentavam Mario era mais ou menos essa:



Eu sei que a minha foi. 

Mas de modo geral Super Mario Bros era algo diferente de tudo que as pessoas já haviam visto até então, a diferença do Atari para o NES era quase um salto do Super Nintendo para o Playstation 2. As cores, a trilha sonora, o sistema de fases, a jogabilidade (com personagens com peso e inércia), os itens escondidos, o sistema de power-ups, até então ninguém jamais havia visto nada como aquilo e pela primeira vez podia-se dizer que estavamos diante do que entendemos hoje.



Seja como for, Super Mario Bros ajudou a vender o NES para os lojistas americanos mas nem todos. Muita gente ainda não confiava em colocar a palavra videogame na vitrine. Felizmente, a Nintendo estava preparada para isso.

– Então, seu japonês, seu videogame é muito bom e tal, mas no momento nós não estamos trabalhando com… 
– Oh, no, no, Nintendo non videogame, né? No, Nintendo é acessódio de brinquedo-san, né?
– Não é um videogame? Como assim? 
– Este é Rob, o roboto, né? NES ser apenas acessório para brincar com Rob Roboto, hai?
 – Hãn… se é assim então… 

E em uma jogada de marketing que humilharia Bill Gates, a Nintendo criou um robozinho chamado R. O. B. para disfarçar o NES como um acessório para brincar com o Rob, o Robo. Assim o NES não era um videogame, não, não, era só um acessório de um brinquedo!

"Compre esse robo incrível e super legal,
e essa arma de laser pew-pew-pew…
e de brinde vem esse sistema de entretenimento,
que totalmente não é um videogame,
mas já dissemos o quando o nosso robo é super legal?"
Esse migué extraordinário que Nintendo deu pode ter sido muito safado, mas serviu que foi uma beleza para colocar o NES nas prateleiras das grandes lojas como um brinquedo e não um, eca *cospe no chão* videogame.

Apenas dois jogos acabaram sendo desenvolvidos para o Rob, mas sua missão como cavalo de Troia já estava cumprida.

Houve um terceiro passo, esse o mais arriscado de todos. Se tudo mais falhasse, a Nintendo se propunha a recomprar todos os NES que não fossem vendidos assim o comerciante não estaria arriscando muita coisa. Essa era uma proposta ousada e perigosa, que poderia muito bem ter levado a Nintendo a falencia. Mas os japoneses sabiam o que estavam fazendo e a Nintendo nunca precisou desembolsar um único centavo com isso. Pelo contrário: o NES se tornou um dos maiores sucessos comerciais de todos os tempos e se esgotou rapidamente nas prateleiras.

E claro que se voce ver a biblioteca do NES vai perceber que 70%
dos jogos são lixos intragaveis. Aí voce começa a imaginar os jogos
que não foram aprovados pelo selo de qualidade da Nintendo,
e é aí que voce começa a ficar com medo.
Com o rígido controle de qualidade da Nintendo, e tendo Miyamoto embalando uma obra-prima atrás da outra (Zelda foi lançado em 1986, Metroid em 1987) o Nintendinho se tornou rapidamente o fenomeno economico e cultural que todos nós conhecemos hoje. Sendo abastecida por jogos como Megaman, Castlevania, Ducktales e Contra a Nintendo poderia apenas se deitar em cima dos louros e ver sua grana empilhar cada vez mais alto. Entretanto eles realmente sabiam o que estavam fazendo e decidiram trabalhar em cima de outro problema que havia destruído o Atari: no fim da era do Atari haviam tantos jogos sendo lançados que as pessoas não tinham como dizer se um jogo era bom ou não apenas pela capa, e esperar que os compradores comprassem na sorte … bem, todo mundo sabe como isso acabou para a Atari.




A Nintendo resolveu isso criando uma revista dedicada exclusivamente aos videogames: a Nintendo Power. Agora pela primeira vez a molecada podia ler sobre um jogo, ver fotos, opiniões e tudo mais para saber o que eles iriam querer. Adicionalmente a revista prestava um serviço de fanbase oferecendo suporte com detonados e dicas (sim, os macetes nos jogos foram incluidos nos jogos a pedido da Nintendo para vender revistas, daí nasceram os códigos) alem de posters massivamente foderosos. A Nintendo Power nos deixou em dezembro de 2012, quando se juntou ao NES e ao R.O.B como a Santíssima Trindade que criou a indústria de games nos moldes que conhecemos hoje. 


Os videogames haviam novamente tomado o mundo, baby, e dessa vez para ficar! Em 1990 mais de 30% dos lares americanos possuiam um Nintendinho, ao passo que apenas 23% das famílias tinham um computador. O sucesso do NES foi tão avassalador que seu último jogo licenciado foi em 1995 (quando já estamos na era do Playstation!) mas o aparelho continuou sendo produzido até 2003, sendo que a assistencia técnica no Japão defendeu o aparelho até 2007.

O NES pode descansar em paz hoje pois seu legado é nada menos que a própria existencia dos videogames.

SUPER MARIO BROS 2: THE LOST LEVELS (1986)



Após seu sucesso estrondoso mundial em 1985, o próximo passo da Nintendo era popularizar ainda o seu produto. Você jogaria videogame, sua mãe jogaria videogame, a mãe dela jogaria! E existe uma forma universalmente conhecida de fazer isso: tornar a coisa mais barata ainda.

E a melhor forma de fazer isso era cortar custos nos cartuchos, os elementos mais caros da coisa toda - cinco jogos já custavam o mesmo que o console, pra vc ter uma ideia. Se pudesse, a Nintendo usaria uma midia mais barata e com maior capacidade de memória do que um cartucho, mas tal coisa simples não existia. Ou será que não?

Tinha que ter uma forma mais barata de fazer um jogo do que montar um minicomputadorzinho toda vez...
CDs já existiam em 1986, mas a tecnologia para roda-los não era nem um pouco economicamente acessível para se colocar de leitor em um videogame popular, então a Nintendo pensou em outra coisa que poderia baratear o custo de produção dos jogos, algo que era bem difundido na época e fácil de fazer:


Disquetes, ora pois! Nascia assim o Famicom Disk System!

Os disquetes tinham uma capacidade de 64K com (56K utilizáveis) por lado, somando 112k, um tamanho impressionante para a época (o Famicom Disk System recebeu vários RPGs por causa disso), e alguns deles utilizavam os dois lados do disquete, avisando ao jogador para virar o disquete quando necessário. Alguns jogos até utilizavam mais de um disquete, e isso ainda sim saia mais barato do que montar um cartucho! Yay!

Vai Weegie, é tua hora de se consagrar meu filho!

Você também podia comprar, por um preço inferior, disquetes virgens, que podiam ser gravados com um jogo à sua escolha, nos quiosques Disk Writer. Lá você podia levar o seu disquete (já gravado com um jogo ou não) e tê-lo gravado (ou regravad0) com o jogo que quisesse.

Tal procedimento tornava os jogos MUITO mais baratos, pois você só pagava o preço da gravação, cerca de 1/5 do valor de um disquete gravado de fábrica. Tais máquinas não eram operadas pelos próprios compradores, mas sim por funcionários treinados (a máquina era cedida à lojas pela Nintendo em formato de leasing, e monitoradas por ela), que te entregavam os disquetes propriamente re-etiquetados e com o seu respectivo manual.


Uma característica bem bacana era que os jogos podiam ter agora savegames (cartuchos com bateria ainda eram muito caros para serem produzidos), já que os jogos gravavam seus savegames no próprio disquete. Isso permitiu à Nintendo fazer campeonatos nacionais no Japão, onde os jogadores podiam levar seus jogos (com seus savegames) e enviar os dados diretamente para a Nintendo, utilizando os quiosques Disk Fax.

Parece incrivelmente bom demais para ser verdade, então porque essa tecnologia nunca chegou ao ocidente?



Basicamente, durabilidade e pirataria. Os disquetes do Disk System eram apenas disquetes no fim do dia, e por isso eram incrivelmente fácil de serem pirateados - ao que as pirateiras chinesas agraderam enormemente.

Além disso, estes disquetes não continham quaisquer sistemas de controles de erro e redundância, sendo que se um único setor do disquete fosse danificado, o jogo todo não poderia ser mais lido – a única solução seria regravar o disquete (pagando a Nintendo para isso) ou se o dano fosse pra valer, jogando fora u disquete. Os disquetes também tinham um capacidade pequena (56k por lado) e o cartucho de RAM tinha menos ainda (32K – o cartucho tem um slot de expansão de memória, que nunca foi usado) o que causava loadings de 10 segundos ou mais ao se iniciar o jogo, e ocasionalmente tinha telas de loading no meio do jogo – tal coisa pode não parecer problema aos olhos de hoje, onde todos os consoles tem DVD/Blu-Ray ou mesmo os jogos de PC são tão gigantemente enormes que o HD não dá conta de acessar tudo imediatamente, mas para uma geração que estava acostumada com cartuchos, parecia um incômodo desnecessário.



Outro motivo pelo qual o Disk System nunca foi lançado no ocidente é que o maior problema que levou a criação do sistema acabou sendo resolvido pela tecnologia - o preço dos chips se tornou tão barato que fazer os jogos em disquetes já não era tanta vantagem assim sobre os cartuchos, afinal.

A Nintendo estava ciente das vulnerabilidades do Disk System, e por isso mesmo sabia que precisava lançar o acessório com um jogo exclusivo que faria as pessoas dizerem "foda-se esta merda, eu vou pular nesse barco mesmo assim porque eu PRECISO jogar isso!". Né SEGA QUE NUNCA OCORREU FAZER O MESMO COM O SEGA CD!!!




E qual jogo seria esse que separaria os meninos cools dos moleirões que não tinham Disk System? Ora qual, que outro senão Super Mario Bros 2!

A essa altura, Shigeru Miyamoto estava deveras ocupado com outros projetos (Zelda e depois Metroid) de modo que o protagonismo coube ao seu best wingman Takashi Tezuka. Ciente de que não era nenhum gênio como Miyamoto, Tezuka optou por não se arriscar muito de modo que o jogo  é essencialmente o mesmo que o primeiro só que com um novo desafio.

E por "novo desafio", eu quero dizer que esse jogo é brutalmente, dolorosamente, monstruosamente dificil!


Nesta fase, por exemplo, você precisa dar essa voltinha senão a fase não termina! Só que os blocos estão invisiveis, você tem que bater neles para revela-los e então circular no sentido horário para conseguir terminar a fase!

Mas como caralhos voadores mutagenicos alguém saberia disso! Qual é o seu maldito problema, Nintendo?!?


Ou nessa fase, por exemplo, que você tem que derrubar a plataforma para só então poder fazer um salto de fé e a verdadeira plataforma estar ali invisivel! E isso é só a terceira fase do jogo, vão se foderem!


Não apenas as fases tem soluções cripticas indecifráveis, como o jogo todo é apinhado de momentos injustos que estão ali apenas pelo prazer de ferrar o seu dia. Como, que tal pegar um warp zone no mundo três... e voltar para o primeiro?!?

Mas que?


Não apenas o jogo aplica todos os truques baratos que consegue pensarm como pulos de precisão pixelmetrica e cogumelos venenosos inescapaveis, como exige que você tenha conhecimento prévio de blocos invisiveis. Enfim, é um jogo tão dificil como se tivesse sido feito por um coreano no Mario Maker.


O curioso, entretanto, é que a dificuldade do jogo não é acidental e sim uma decisão deliberada da Nintendo, como pode ser visto no comercial acima. A ideia era dizer para as crianças "hey crianço, você que já jogou o Mario de trás para frente, que tal um novo desafio espertaço para mostrar que você é o fodelão da fodelagem?".

O que se provou uma decisão acertada no fim das contas, já que Mario 2 vendeu mais de dois milhões e meio de jogos. Apenas no Japão.



E é importante ressaltar isso porque esse jogo nunca foi lançado no ocidente - não até Super Mario All-Stars, pelo menos - por motivos que fazem bastante sentido. Veja, o mercado americano não é como o mercado japonês. No Japão nunca houve realmente um "crash" dos videogames, as pessoas migraram do Atari para o Nintendinho com naturalidade.

COME FUCKING ON!!!

Ja no ocidente a Nintendo fez todo um trabalho para recuperar a imagem dos videogames, então lançar um jogo que não é nada senão um grande exercicio de frustração seria a pior coisa que ela poderia fazer. Adicionalmente, o jogo é basicamente o mesmo do anterior o que só faria disparar nas pessoas todo tipo de alarme de "ai meu deus, eles só querem tirar nosso dinheiro com qualquer merda, é o Atari tudo de novo, corre judite!"

Assim sendo, Super Mario Bros 2 nunca foi lançado até que entrou na coletanea de 1993, quando então saiu com o titulo "The Lost Levels". Mas isso não quer dizer que não houve um Mario 2 no ocidente.

Howard Phillips, o homem que vetou Super Mario 2 nos Estados Unidos e inadvertidamente salvou o futuro da empresa. Em 1991 ele deixou a Nintendo e se juntou a Lucas Arts, onde participou de perolas como Secret of Monkey Island e Day of Tentacle, o homem tá on fire  yo!


SUPER MARIO BROS 2 (ou Super Mario USA, no Japão) - 1987




A TV Fuji é conhecida por duas coisas: primeiro, por ser uma das maiores emissoras do Japão. Segundo, por ter aquele prédio esquisito com a bola em Odaiba que aparece em Digimon.


A Fuji TV era tão grande que para sua programação anual do ano seguinte ela não fazia apenas uma chamada nos comerciais, não, ela fazia um fucking massivo que durava dias, com transmissões ao vivo de várias cidades, chamado de Yume Kojo (algo como "A Fabrica de Sonhos").

A mega-transmissão era esperada com expectativa durante meses e rapidamente se tornou um fenômeno nacional. Do jeito que Fuji divulgava a sua Dream Factory, você juraria que eles estavam sediando as Olimpíadas. Ele ainda tinha seu próprio mascote: Imajin e sua família.


Esses personagens alias foram criados por ninguém menos do que Shotaro Ishinomori, mais conhecido pelo cara que teve a ideia de uma série sobre um motoqueiro mascarado que se transformava para lutar pela justiça!


Mas então, a Dream Factory era uma coisa enorme que faria inveja ao que a Comic Con é hoje. Mais de setenta apresentações, dez pavilhões, quase um milhão de visitantes, coisa grande mesmo. E, como não poderia deixar de ser, o marketing da coisa toda era tão grande quanto: comerciais na TV, rádio, idols gravando singles, linha de brinquedos, manga, camisetas, mascaras... tudo que você pode imaginar, eles fizeram.


E entre as muitas coisas que foram feitas para promover esse evento, não podia faltar um joguetim porque ninguém é de ferro, né? Assim a Fuji TV bateu um fio para a Big N e pediu para a Nintendo pensar em alguma coisa.

Nascia assim então o título exclusivo para o Disk System do Nintendinho (mais uma vez, SEGA, é assim que você vende o seu acessório!) Yume Kojo: Doki Doki Panic (algo como "Fabrica de Sonhos: Tum-tum Panico!", onde "doki doki" é a onomatopeia japonesa para batida do coração).


Como é a Nintendo que estamos falando aqui, saiu que Doki Doki Panic é um jogo muito bom no fim das contas. Não apenas a mecanica de poder subir em cima dos inimigos e usa-los como arma é inédita e criativa para o jogo, como você pode escolher entre quatro personagens com jogabilidade diferentes.

Imajin, o mascote simbolo da Dream Factory é o personagem padrão: ele é mediano em tudo. Sua namorada Lina pula menos do que ele, mas se você segurar o botão de pulo ela pode voar flutuar algun segundos no ar. A mãe de Imajin, Mama, é um pouco mais lenta porém compensa dando pulos bastante altos e por fim o pai de Imajun, Papa, tem saltos menores mas é o personagem mais baixo sendo um baixinho pistola.

Da esquerda para direita: Lina, Mama, Imajin e Papa

Enfim, Doki Doki Panic era um jogo mais do que decente para o Nintendinho, e isso deixou a Nintendo com dois grandes problemas para resolver.

O primeiro, e mais óbvio, é que ela não iria portar o jogo para o ocidente do jeito que estava. Não apenas não fazia sentido lançar um produto licenciado que os ocidentais não ouviriam falar até a era da internet, como personagens com uma tematica arabe não daria certo nos US and A dado que já naquela época arabe era sinonimo de terrorista (só lembrar de De Volta para o Futuro).

Na verdade a Dream Factory tinha uma temática do mundo todo, como personagens arabes, simbolos do carnaval de Veneza como Pierrots e Arlequinas, e por aí vai. Alguma coisa no sentido de "o mundo inteiro na sua casa", eu vejo uma emissora de TV fazendo um slogan assim.

Então, é, mesmo que Doki Doki Panic fosse um jogo muito bom, eles teriam que adaptar o jogo de alguma forma.



O segundo problema que a Nintendo tinha,  na mesma época, é que a Nintendo da América havia decidido não portar Super Mario Bros 2 para o ocidente pelos motivos citados anteriormente. E a Nintendo gostaria muito, muito mesmo de ter um jogo do Mario para alavancar as vendas do seu console recem lançado.

Dois problemas bem sérios a serem resolvidos na mesma época, que coisa terrível e...


Foi então que as estrelas se alinharam e a Nintendo percebeu que um problema na verdade era a solução do outro! Doki Doki Panic seria portado para o ocidente como Super Mario 2, claro que sim, como não?


Assim, como a descrição das habilidades sugere, Imajin virou Mario, Mama virou o Luigi, Papa virou o Toad e Lina virou a Princesa Peach. Badabim badabam, problem solved!


O resultado foi que Super Mario Bros 2 rendeu dez milhões de cópias vendidas e foi o terceiro jogo mais vendido lançado para o Nintendo Entertainment System na época. A Nintendo Power listou Super Mario Bros. 2 como o oitavo melhor jogo para o Nintendinho, mencionando que apesar de não ser um jogo do Mario de origem - com elementos bem diferentes na verdade, foi capaz de se manter com seus próprios méritos.

Mais interessante ainda é que esse foi o primeiro jogo a ter gráficos diferentes para o Mario e para o Luigi, e de certa forma isso moldou até hoje a personalidade do irmão menos famoso dado que seu movimento de pulo era meio goofy com suas pernas loucas balançando no ar.

Esse jogo também inspirou o mais famoso desenho do Mario, que tinha uma esquete em live action com o wrestler Capitão Lou e o famoso Toad pistola que quer eleição e o desgraçado do Koopa.


Verdade seja dita, esse showzinho ficou melhor que o filme do Mario. O que também não é tão dificil assim, né?

SUPER MARIO BROS. 3 (1988)





Super Mario 3 é um jogo que surgiu em um momento completamente inédito na história da Nintendo: pela primeira vez o seu Nintendinho estava tomando pressão da concorrencia. Em primeiro lugar, o PC Engine era um console de 8 bits, como Nintendinho, mas com elementos de 16 que o faziam ter gráficos muito mais bonitos do que o console da Big N era capaz de fornecer.

Isso é gráfico de um console de 8 bits, o PC Engine
Pouco surpreendentemente, a Nintendo estava tomando um calor da NEC com seu PC Engine e em pouco tempo a Sega lançaria o seu console de 16 bits. Claro que a este ponto a Nintendo já estava trabalhando aloucadamente no seu próprio console de 16 bits, o Super Nintendo, mas ele não estaria pronto nenhum momento próximo.

Logo, a Nintendo precisava ganhar tempo. O que significa que eles precisavam de um fodendo, massivo, colossal jogo do Mario.

Once again, a capa japonesa é bem mais legal
E foi exatamente o que foi feito. Shigeru Miyamoto foi puxado de volta para fazer um jogo do encanador italiano depois de não ter muito envolvimento com o segundom e trouxe consigo toda equipe original do primeiro jogo. Porém isso foi tudo que foi trazido do primeiro jogo: todos os gráficos foram refeitos, a música foi criada nova do zero e todo gameplay foi rebalanceado para uma experiencia mais fluída ainda.

Entretanto fazer apenas o mesmo jogo com gráficos melhores não resolveria nada, era necessário fazer um jogo tão seminal, tão definidor de genero quanto o primeiro. E foi exatamente o que Miyamoto e sua gangue fizeram.

Mais precisamente, Miyamoto levou os seus boys magias em uma viagem ao lugar mais mágico da Terra, a Disneylandia. Só que como bons japoneses que eram, essa foi uma viagem a trabalho e não para ficar procurando cosplay da Geninha do Tico e Teco

Esses furries, amirite?

Caham... furries obscuros a parte, todos ficaram bastante impressionados com a estrutura do parque. Para quem não conhece, a Disneylandia tem uma area central, e então cada area adjacente é um mundo temático próprio, com um feeling próprio e atrações únicas aquele local.


Miyamoto e os outros (virou anime isso) ficaram pensando em como tranmitir essa sensação de magia e aventura que é o Disney World para um videojogo... que foi exatamente o que eles fizeram.

Quer dizer, hoje ter jogos de plataforma divididos em mundos temáticos com mapas é algo que nós tomamos por garantido, mas Super Mario 3 foi o primeiro jogo a criar algo que hoje é apenas o básico de como se faz um jogo do genero!


A concepção de overworlds temáticos únicos (mundo do deserto, mundo da água, mundo dos gigantes, etc) não foi a única contribuição de Mario 3 para o genero, entretanto. Um sonho que Miyamoto tinha desde o primeiro jogo do Mario era fazer com que o Mario tivesse um dinossauro de montaria, e que esse dinossauro tivesse movimentos próprios - que parecesse algo vivo ao jogador.

E acho que não é necessário explicar porque alguém iria querer ter um dinossauro de montaria, esse conceito é bastante autoexplicativo. Entretanto o Nintendinho não tinha capacidade para gerenciar essas duas coisas na tela, e o dino-parça do Mario ainda teria que esperar mais um pouco.

Entretanto, se não tinha como ter um pet autonomo no jogo, o que a equipe podia fazer era fazer com que Mario se transformasse em animais e foi assim que nasceu a mecanica definidora do jogo. A este ponto a Nintendo sabia que não podia fazer somente um jogo sobre pular e ir para a esquerda, isso já havia feito suficientemente bem no primeiro jogo e repetido ao ponto da insanidade no segundo (a versão japonesa eu me refiro, The Lost Levels). Não, era preciso algo novo, algo que definisse o jogo só de bater o olho e essas são as transformações que os power ups dão.

A Nintendo sabia que o Tanooki não faria nenhum sentido para quem não fosse japones, mas foi mantido assim mesmo na versão ocidental do jogo porque eles realmente gostavam da ideia
Ter diferentes formas de encarar o jogo era legal, porém uma coisa que Miyamoto havia aprendido com Zelda e Metroid é que desafio para os dedos poderia divertir o jogador, porém é no desafio para a cabeça que você realmente ganha o seu publico.

Assim, Super Mario 3 é o jogo com mais segredos, colecionaveis e inimigos variados já feitos na história do videogame até aquele ponto. Com efeito, em meados de 1990 a Nintendo Power (a revista oficial da Nintendo) lançou uma edição de 81 PÁGINAS exclusivamente falando todo e cada segredo desse jogo. Sério, imagine isso, um jogo de plataforma de 1988 ter 81 PÁGINAS de assunto entre segredos, gameplay e estratégias para inimigos!

A maioria dos RPGs da época não tinha tudo isso de conteúdo!


Como dá para ver, Super Mario Bros 3 foi um jogo realmente especial em que os desenvolvedores sentaram e fizeram com calma o melhor que era possível fazer. E refazer quantas vezes fossem necessárias até ficar absolutamente perfeito.

Tanto tempo, entretanto, não veio sem um custo: a sua época, Mario 3 custou 800 mil dolares - fazendo dele o jogo mais caro de todos os tempos já produzido até então. O que é um número ainda mais impressionante de se gastar, porque esse jogo só seria lançado no ocidente mais de um ano e meio depois. O jogo foi lançado no Japão em fevereiro de 1988, mas só viria a ter um lançamento no ocidente no final de 1989.

FUN FACT: os boos foram ideia do diretor do jogo, Takashi Tezuka e foram inspirados na sua esposa que era timida em publico, mas feroz dentro de casa - por isso os boos viram modo full pistola quando você vira as costas para eles
Mas por que essa demora toda? Diversos motivos.

Em primeiro lugar, o timing para lançamentos era ruim. Mario 2 havia sido lançado nos Estados Unidos no final de 1987, e ainda estava vendendo incrivelmente bem. Colocar outro produto para competir com ele faria os consumidores terem que escolher um ou outro - ao invés de comprar os dois, o que seria uma estratégia preferível (NÉ SEGA?!?).

Mas é o que, meu amigo?

Também para aquele ano a Nintendo estava lançando o Gameboy nos Estados Unidos e mais uma vez a Nintendo optou por não segmentar o poder de compra do seu publico. Porém talvez um dos maiores motivos para a demora foi que em 1989 a Sega lançou aquele que viria a ser o maior concorrente da Nintendo: o Mega Drive e a Nintendo queria ter uma carta na manga para abafar o lançamento do rival. Vendo o jogo que eles tinham em mãos, a Big N não duvidou que teria sucesso nisso...

"Vá Nintendo, eu segurarei eles enquanto houver vida em mim!"
... e totalmente teve. O Mega Drive passou completamente batido até que a Sega colocasse esforço e marketing (mais o segundo que o primeiro, mas enfim) em um grande e colossal jogo exclusivo. Porque sério, antes de Sonic o jogo que vinha junto com o Mega Drive era Altered Beast.

Eu dificilmente classificaria isso como uma ameaça para a Nintendo...

Isso não quer dizer que a Nintendo passou esse um ano e meio de braços cruzados, entretanto. Ao longo desse ano ela despejou mais de 25 milhões de dolares em publicidade para ir criando um hype nunca antes visto na história dos videojogos. Sério, imagine durante mais de um ano as revistas anunciando com pequenas fotos e frases de uma linha que o maior jogo de todos os tempos já existia no Japão e que você tinha que esperar por ele (antes da Internet, importar jogos não era uma coisa facil ou na maioria das vezes sequer fazível, saiba você).

A Nintendo Power recebia enchurradas de cartas perguntando quando o jogo sairia, os correios americanos reportam que "Super Mario 3" foi a coisa mais pedida pelas crianças em cartas ao papai noel em 1988, a coisa estava doida assim.



Para piorar, não existia internet na época então você não tinha como VER o jogo em movimento - apenas fotos nas revistas aqui e acolá. Exceto que o marketing da Nintendo tinha isso em mente também. Quando as crianças estavam babando por Mario 3, quando um riot infantil era inevitavel, aconteceu o maior evento videogamistico dos cinemas dos anos 80.

Em uma parceria com a Universal Studios, a Nintendo licenciou vários de seus jogos para serem usados no filme "The Wizard" ("O gênio do videogame", por aqui), sendo que o filme é um grande comercial da Nintendo e do Parque da Universal na Flórida. Se você não está ligando o nome a pessoa, o filme é mais lembrado pelo meme da Power Glove

"I love the Power Glove! It's so bad" - palavras mais verdadeiras jamais foram ditas no cinema
A história do filme é basicamente Rain Man versão PG13: um menino tem um irmão autista com uma capacidade muito especifica incrível, só que invés de ser o Tom Cruise levando o Dustin Hoffman para ganhar dinheiro em Las Vegas, é o Fred Savage levando o irmãozinho para ganhar dinheiro no campeonato Videogame Armageddon. E de alguma forma a Emma Watson se junta e eles no caminho.

Enfim, o filme é muito ruim e tem coisas nivel Ghostbusters 2016 de não fazer sentido, mas todos nós estavamos nessa só por ver games da Nintendo na tela grande.


Bem, como esperado o menino é realmente o Gênio do Videogame (quer dizer, ele fez 50 mil pontos em dois minutos de jogo, quando mesmo zerando perfeitamente é dificil atingir essa marca) e vai para o VIDEOGAME ARMAGEDDON.

E é aí que acontece a magia. O evento final do filme é um jogo novo e não lançado, ao qual mesmo toda genialidade do menino ou do Lucas com sua Power Glove estão preparados. E esse jogo é nada menos que...


Pela primeira vez as crianças na América viam em ação o jogo mais esperado da década, o hype era real!

Um fato interessante é que Mario 3 foi um jogo tão popular que alguns caras se animaram a portar ele para o PC. John Carmack e John Romero tiveram seu primeiro projeto juntos adaptando Mario 3 para computadores, e apresentaram a ideia para a Nintendo.

California é uma palavra mais dificil de dizer do que as pessoas dão o crédito
A Nintendo gostou do resultado, mas ela realmente não estava interessada em desenvolver toda uma infraestrutura de distribuição para entrar no mercado de PC games, nem pretendia dar suporte a isso com outros jogos, então deixou pra lá.

Os Johns, entretanto, continuaram trabalando juntos e no ano seguinte fundaram a ID Software, que revolucionou o mundo dos videojogos com um jogo que provavelmente você já ouviu falar:


No fim, Mario 3 acabou atingindo todo o hype insano criado para o jogo, tanto que esse jogo sozinho ficaria entre as 5 empresas de brinquedos mais lucrativas daquele ano. A Nintendo se tornou a empresa mais lucrativa do Japão e Mario teve sua despedida com chave de ouro para passar o bastão para a próxima geração de consoles.

SUPER MARIO WORLD (ou Super Mario Bros 4, no Japão) [1990]




Shigeru Miyamoto afirmou certa vez que este é o seu jogo de Mario favorito (essa declaração foi antes de Super Mario Odyssey, thou) e é dificil não concordar com ele. E enquanto eu posso afirmar que é o meu jogo de Mario 2D favorito, a história dele não é tão interessante assim quanto os outros.

Capa japonesa, you know the drill...
Originalmente a ideia da Nintendo era fazer um remake de Super Mario 3 como titulo principal de lançamento do seu novo videogame, o SNES de 16 bits. Entretanto eles aboliram a ideia, lançar um remake como carro chefe do seu console novo é uma ideia horrível que ninguém jamais ousaria cogitar fazer em situação alguma!


A ideia foi abandonada, mas nem tanto já que Super Mario World parece uma continuação direta de Super Mario 3, usando a mesma estrutura de jogo apenas com power-ups novos e gráficos infinitamente melhores graças ao poder do novo console.

Em uma das versões beta do jogo existem imagens do Mario voando até mesmo com o rabo de rapozinha do Mario 3, embora posteriormente isso tenha substituído pela capa. Comparado com o jogo anterior, Mario World tem até menos power-ups porque a equipe estava ocupada aprendendo a fazer o jogo funcionar no novo hardware - o que é muito diferente de um jogo feito no final da vida de um console, quando você já sabe programar para ele com uma mão nas costas.

Imagem do protótipo com Mario usando a cauda de raposa

Isso não quer dizer que o jogo não tenha um tema ou uma identidade, entretanto. Eu comentei anteriormente que Miyamoto queria que o Mario tivesse uma montaria autonoma desde o primeiro jogo, alguém que o jogador sentisse que era uma entidade a parte e um companheiro.

Infelizmente devido as limitações tecnicas do Nintendinho isso nunca foi possível, porém agora estamos falando não de um Nintendo qualquer mas de um SUPER Nintendo e Miyamoto finalmente realizou o seu sonho de ter o tão sonhado dinocompanheiro para o Mario. Porque se você pode ter qualquer montaria que quiser, é obvio que tem que ser um DINOSSERO. Isso sequer é uma questão!

Conceito criado para o primeiro jogo do Mario, 5 anos antes

O DINOSSERO que leva peteleco do Mario é o grande tema do jogo, tanto mecanicamente quanto narrativamente: a história é que o Bowser sequestrou a princesa Peach, mas também prendeu os Yoshis dentro de ovos.

Eu não posso sequer conceber que tipo de drogas o Bowser anda tomando a essa altura, mas devem ser bem doidas. Seja como for, como a este ponto ninguém mais liga pra loira aguada que a esta altura já devia ter aprendido defesa pessoal ou pelo menos andar com um spray de pimenta, a sua grande motivação emocional para terminar o jogo é salvar os DINOSSEROS. O que é toda motivação que qualquer jogo poderia usar, na verdade. Se The Last of Us fosse sobre usar o sangue da Ellie para salvar os DINOSSEROS seria um jogo melhor ainda, eu te digo.




Enfim, Super Mario World é uma versão maior e melhorada de Super Mario 3, e embora não seja inovador (a exceção do Mario 2 japones, é o único jogo que é uma continuação direta das ideias do anterior) é super em todos os aspectos: mais fases, mais segredos, mais inimigos, mais bosses, um mapa melhor, controles melhores, enfim uma versão turbinada do jogo anterior.

Se existe alguma forma melhor de mostrar que o seu videogame chegou nessa geração de voadeira com os dois pés, ainda não foi inventada.


E essa foi a história dos cinco jogos que, de uma forma ou outra, mudaram para sempre a história dos videogames! Não me ocorre mais nada dizer, dado que esse deve ser o maior texto do blog, exceto meu trabalho aqui está feito!

It's a-me, vazei!




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