domingo, 14 de fevereiro de 2021

[3DO] GUARDIAN WAR ("Powers Kingdom" no Japão) [Novembro de 1994][#634]



 Olá amiguinhos e amiguinhas, no episódio anterior de nossa retumbélica saga através do tempo e do espaço na história dos videogames haviamos chegado ao epopeico jogo verdadeiramente incrível de 3DO, o único port para consoles de um dos melhores jogos que eu já joguei, STAR CONTROL 2. Seria esse então o inicio de uma nova era para o 3DO? A auspiciosa primavera de bons jogos exclusivo para o console que marcaria de vez o seu nome em um lugar glorioso na história dos videogames?

A resposta é... não. Claro que não.

Aparentemente as coisas voltam ao normal na casa da 3DO Company, e quando se fala em "normal" para o 3DO estamos é claro falando de "meu deus taca qualquer merda de qualquer jeito só pra fazer volume porque essa merda custa 700 dolares e não tem jogo!!". O que não é uma coisa boa, caso você não tenha pego a deixa ainda... ou lido minha review de praticamente qualquer coisa lançada para o 3DO que não seja STAR CONTROL 2.

Bem, a boa noticia é que esse Guardian War sobe um pouco essa regua, a noticia ruim é que é necessário muito para subir esse parametro. Mas suponho que eu deva explicar melhor: Guardian War não é, felizmente, a milhonesima coleção de minigames para o 3DO, o que é bom. O que Guardian War é, no entanto, é um jogo que potencialmente seria incrível mas que claramente foi lançado incompleto no pavorio de lançar jogos de qualquer maneira para o 3DO. O que é menos bom.


GW é um RPG Tático, um dos meus generos favoritos porque como não amar o combate de jRPGs só que em um tabuleiro como um boardgame, né? Diferentes tipos de unidades, estudar até onde você pode se mover, usar o cenário a seu favor, como diria o logo do Mcdonalds, amo muito tudo isso.

E nesse aspecto, no cerne de seu gameplay, Guardian War entrega exatamente isso: você tem um tabuleiro 3D, cada unidade anda tantas casas por turno e tem seus próprios poderes especiais. Além isso, na verdade, cada classe possui uma arvore de progressão e você pode evoluir para a versão Dark ou Light dela. Por exemplo, o Archer pode evoluir para Death Archer (a versão Dark) ou Bow Knight (a versão Light), cada qual com ataques diferentes.


Melhor ainda é que você pode equipar até duas subclasses, seja para não perder os ataques que aprendeu com a classe anterior, seja para ter novos poderes complementares. Então se você evoluir seu Knight para Paladin, você pode equipar Knight como subclasse para não perder os poderes exclusivos de Knight. Ou então equipar Priest como subclasse, para ter poder de cura. Ou melhor ainda, os dois.

A subclasse não sobe de nível ou aprende novos poderes, mas dá um poder de customização formidável ao personagem. Outra coisa que dá pra fazer é usar itens para "capturar" um monstro e faze-lo membro da party, bem ao estilo Pokémon, e ele até ganha de experiencia e sobe de nível. 

O que como dá pra ver como são realmente bacanas as ideias sobre como construir um tRPG que esse jogo tem - com efeito, alguns anos depois Final Fantasy Tactics fez mais ou menos isso e é celebrado até hoje como um dos maiores jogos do genero de todos os tempos.


Se a ideia de customização dos personagens não é nada ruim, o mesmo pode ser dito do gameplay em si. Tudo funciona como deveria funcionar: a movimentação no grid funciona, os ataques são satisfatórios, a variedade de poderes entre as classes é interessante, enfim, tudo rola bonitinho. Se você fizer uma aula introdutória do que é RPG Tático, Guardian War é um exemplo decente de como um jogo desse genero deve ser feito em todos os aspectos. Ninguém pode realmente acusar GW de ser um jogo ruim realmente no que o genero se propõe a fazer.

... E AGORA É A HORA QUE ENTRA O "MAS", EU SUPONHO.

Sim, é. Mais precisamente, é a hora que entra o "fator 3DO". Enquanto é verdade que esse jogo não faz nada particularmente errado no quesito gameplay, tudo que cerca o jogo foi feito numa correria e falta de cuidado que até assusta mesmo quando você sabe qual era a realidade do 3DO naquela época.

Quer dizer, sério, olha a abertura dessa coisa:



... que merda é essa que eu acabei de assistir?

Meu nome é Oswaldo Ferreira y Montenegro se essa merda não foi feita em 15 minutos no Windows Movie Maker! Não, olha esse "globo" que é retangular porque dá mais trabalho editar imagens circulares do que retangulos no Paint!


E o que comentar da "deusa" que é uma das fotos mais mal recortadas que eu já vi na história dos videogames?


Na boa, isso não é uma abertura, isso é um trabalho de escola que roubaram do filho de um dos programadores! E embora eu goste dos bonequinhos baixinhos e fofinhos, o tom da narração querendo fazer parecer que é um super épico trevoso - algo muito anos 90 isso - acaba fazendo ficar mais tosco do que precisaria ser.

Tá, mas porque eu estou pegando tanto no pé da abertura se ela é só... bem, a abertura né? Porque esse tom de "pegaram o trabalho de escola de alguém" é o valor de apresentação do jogo inteiro. Quando eu disse que esse jogo foi lançado sem estar inteiramente pronto because 3DO, era sério. 

O que mais eu posso dizer de um jogo que o minimapa dele não é uma imagem, como você poderia esperar de um videogame, e sim parece algo que alguém fez no bloco de notas?


Isso é niveis de amadorismo que eu nunca tinha visto na minha longa carreira de mais de trinta anos de gamemaniaco. Todo o jogo tem essa apresentação tosca, a sensação que você esta jogando o beta de um jogo não acabado é bastante incomoda e diminui muito a experiencia geral da coisa.

Isso e essa dublagem que eu nunca tinha ouvido algo assim nem em audiobook de aprender inglês de escola pública:


Sei lá cara, tudo parece feito tão de qualquer jeito, tão na correria que realmente quebra a vontade de jogar o jogo. Porém o que definitivamente joga esse jogo um patamar abaixo de onde ele deveria estar é que ele simplesmente não tem história. Tipo não tem mesmo! 

Tem uma cutscene na abertura e depois disso são apenas 30 lutas uma atrás da outra que até onde me consta poderiam ter sido geradas por um algorítimo! Meu deus, um RPG sem história, onde esse mundo vai parar? 

Poxa, que bom pra vocês que vocês acharam seu sistema de combate tão bom que não precisam de resto nenhum, mas não é assim que funciona. Os RPGs não tem história apenas porque os desenvolvedores estão entediados e com tempo sobrando, e sim porque socar 30 batalhas contra inimigos aleatórios a seco uma atrás da outra é pra testar a fé de qualquer cristão!


,,, se bem que eu entendo porque as coisas foram feitas desse jeito. Quando seu tempo está apertado, a primeira coisa a entrar no machado é a história. Não apenas porque fazer cutscenes leva tempo (também por isso), mas ter uma direção narrativa limita o que você pode colocar na tela. Cada minuto que você não está criando uma luta contra o Lord Farquaad Jr com suas próprias mecanicas de combate, animações e modelos 3D, é um minuto que você não está gerando 5 fases com esqueletos de inimigos mais uma vez e foda-se.

Ter uma história dá trabalho não apenas pela história em si, mas porque ela te obriga a fazer coisas especificas ao invés de só encher com filler que dá pra fazer rapidão. O que, mais uma vez, considerando a natureza dos jogos do 3DO e o "vamo vamo vamo lança qualquer coisa vamo vamo" que a Panasonic tava (esse jogo foi distribuido por ela própria), explica muito do resultado final que vemos aqui.



O que é uma pena, porque se tivesse sido feito com calma, bonitinho e com valores de produção decentes, Guardian War seria um dos RPGs memoraveis da sua época e talvez fosse lembrado até hoje com carinho, porque o material base do jogo é realmente sólido. Pena que tudo ao redor precisaria ser refeito, ou pelo menos verdadeiramente polido. 

Ou então ser lançado em um console que não fosse o 3DO, isso resolveria também.

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 008