Eu vou descrever o jogo e você me diz o que te vem a mente, certo? No grande afã dos jogos com protagonistas animais antropomorficos, um jogo tenta se destacar parodiando essa modinha colocando o animal mais random possível como protagonista, com seus gráficos que puxam o console ao seu limite, o gameplay impressionantemente variado o jogo é lavado de elogios pelo pessoal da época ... só tem um pequeno problema que quase não é citado quando todo mundo fala sobre o quão incrível, maravilhoso e fuderoso é esse jogo: NINGUÉM CONSEGUE JOGAR ESSA MERDA.
Isso te soa familiar de alguma forma?
Os méritos técnicos do jogo da Rare de 1991 são inegaveis, o jogo não apenas é muito bonito como a quantidade de sprites para os personagens jogaveis que eles conseguiram enfiar em um jogo de Nintendinho é realmente impressionante. Adicione a isso um jogo em que cada fase é praticamente um estilo de jogo diferente e temos um jogo que, de fato, é impressionante tecnicamente. Tudo incrível... só faltou dar pra jogar o jogo, tirando isso é incrível!
... algumas culturas acreditam que essa parte é importante, estes loucoshomens!
OKAY, MEIO QUE TODO MUNDO SABE ISSO (embora nem sempre seja dito isso), QUAL O SEU PONTO?
O meu ponto, caro Jorge, é que as inefaveis aventuras do Jim Minhoca são exatamente o Battletoads dos 16 bits. Se você falar com dez gamemaníacos da época, nove vão te dizer que o jogo é chocolatante, crocante, caramelizado coberto com crocantes flocos Nestle (o décimo sou eu). Porém se você continuar perguntando, desses nove pelo menos oito vão te dizer que nunca passaram da primeira fase do jogo! Eis nosso glorioso herói anelídeo em sua essencia.
Mas okay, vamos começar do começo.
Nos anos 90, a fabricante de brinquedos Playmate Toys fez mais dinheiro do que era humanamente possível contar vendendo a linha de brinquedos das Tartarugas Ninja. O problema é que como a turtlemania foi passando, a Playmate queria lançar uma nova linha de bonecos para arrebentar a boca do balão (igual a todo mundo, ninguém lança uma linha de brinquedos pensando "isso vai ser um puta fracasso") e para isso só existe uma forma conhecida e testada: fazendo com que as crianças se importassem com os personagens.
A forma mais comum de fazer isso era associar um desenho animado a coisa toda e tentar repetir o fenomeno Tartarugas Ninja, mas o que eles observaram é que nos últimos cinco anos todo mundo (incluindo eles mesmos) e a mãe de todo mundo (incluindo a mãe deles) tentou fazer isso... e ninguém teve sucesso. Quer dizer, eles tentaram até uma linha de brinquedos do Ataque dos Tomates Assassinos com o cartoon correspondente e eu não estou zoando:
A definição de loucura é repetir as mesmas ações e esperar resultados diferentes, eu te digo.
Okay, talvez tentar socar o milhonesimo cartoon que ninguém lembraria em dois meses talvez não fosse a resposta (e mesmo que fosse, definitivamente seria uma muito cara), mas então o que seria? O que mais os jovens maneiros e descolados de 1994 curtem?
A resposta, como geralmente é o caso para tudo na vida, era... VIDJAGAIMES!
A Playmate também fazia os bonecos do licenciados do Sonic e eles vendiam bastante bem, então eles consideraram que fazer um videojogo seria a verdade e o caminho. Assim eles fizeram o seu designer da linha de brinquedos, Doug TenNapel sentar com os caras da Shinny Entertainment (que era uma empresa recem fundada, formada por ex-funcionários da Virgin que trabalharam em jogos como MICK AND MACK AS GLOBAL GLADIATORS, COOL SPOT e DISNEY'S ALADDIN do Mega Drive) e ninguém podia levantar até que tivesse uma linha de brinquedos... digo, jogo arrasador pronto!
... olhando em retrospectiva, talvez tivesse sido melhor deixar os caras pelo menos irem ao banheiro, como veremos a seguir.
Na história desse jogo, o mercenário intergalático PsyCrow foi contratado pela Rainha Slug-for-a-Butt para recuperar “ultra-high-tech-indestructible-super-space-cyber-suit” criado pelo cientista Monkey-For-A-Head. Nenhum desses nomes é inventado por mim, e todos eles são bastante literais:
A rainha Slug-for-a-Butt...
... e o Professor Monkey-for-a-Head.
O ultra-high-tech-indestructible-super-space-cyber-suit havia sido roubado pelos rebeldes que lutam contra o jugo tiranico da rainha Slug-for-a-Butt, liderados pela irmã gemea da rainha, a princesa What's-Her-Name.
A princesa What's-Her-Name, considerada a mais hediondamente feia do seu povo, que para o seu povo sempre viverá sob a sombra da beleza da sua irmã Slug-For-A-Butt |
... sério, eu não vou nem perguntar. Porém se a história já está estranha o suficiente, enquanto PsyCrow persegue os rebeldes que roubaram o ultra-high-tech-indestructible-super-space-cyber-suit a nave deles é abatida na perseguição e cai na Terra, que é onde caem todas as coisas perdidas espaciais.
ENTENDI, ENTÃO UM CARA NA TERRA ACHA O TRAJE, USA ELE E AGORA TEM QUE DERROTAR O MAL E AJUDAR OS REBELDES E TAL TAL TAL
Hã... quase isso. Alguém acha o traje, de fato, mas não é uma um cara. Ou uma mina. Nem uma cybermaidcatloliparausodoméstico (infelizmente). E sim, bem... o traje cai em cima de uma minhoca.
De alguma forma a radiação do traje mutaciona a minhoca, e agora Jim Minhoca tem que adicionar a sua lista de preocupações derrubar um império maligno do mal logo abaixo de não ser comido por passarinhos.
Não dá pra dizer que Jim Minhoca não é um jogo... hã... criativo, isso tem que ser dado a ele. O jogo mistura paródia (como a princesa que não tem nome porque quem realmente se importa com princesas sendo resgatadas em videogames?) com surrealismo dadaísta. Eu não faço realmente ideia do porque, mas Jim Minhoca tem uma obsessão muito estranha com vacas e elas estão em toda parte durante o jogo todo por nenhum outro motivo que não... serem vacas.
Literalmente a primeira coisa que você faz no jogo é catapultar uma vaca usando uma geladeira porque... hã... catapultar vacas é legal... eu acho?
E essa é a tonica que permeia todo o processo criativo do jogo, Earthworm Jim tem muito a cara daqueles desenhos animados estranhos da Warner como Freakazoid ou Animaniacs, que você olha e se pergunta "o que diabos eu acabei de assistir?"
Cara, o humor dos anos 90 era muito estranho...
O feeling de estar assistindo um cartoon da Warner dos anos 90 não é apenas nas escolhas nonsensicas do humor, mas na própria animação do jogo. Como o jogo foi feito por vários ex-funcionários da Virgin e portanto tinham experiencia na adaptação de animação para jogos com Aladdin, Jim Minhoca usa essa tecnica de ser produzido como um desenho animado de verdade para então ser reproduzido como jogo.
Claro, diferente de Aladdin os sprites do jogo não foram feitos por artistas da Disney, mas ainda sim a sensação de estar assistindo um cartoon é muito grande, e isso faz desse jogo um dos mais bonitos dessa geração. A coisa é realmente vistosa na tela e isso explica muito do sucesso desse jogo na época (com efeito, foi eleito pela EGM o jogo do ano para Mega Drive).
Então qualquer um que assista Jim Minhoca não tem como se impressionar (com razão) pelo que o jogo parece. Quem joga, entretanto, não se sente tão entusiasmado assim.
A sensação de estar jogando um daqueles jogos de plataforma europeus do Amiga é terrivelmente próxima, embora sem tantos dos defeitos. Eu não sei dizer exatamente, mas o design ocidental de jogos de plataforma tem um feeling bastante próprio e eu consigo sentir a essencia dele mesmo quando ele é coberto com uma camada de polimento e bons gráficos como esse aqui.
Talvez sejam o level design que parece apenas jogado na tela, o personagem que não parece ter o peso certo ou os inimigos que voam pela tela sem interação com o cenário. É como diz o ditado: se parece com um jogo de Amiga, se move com um jogo de Amiga e tem sensação de ser um jogo de Amiga... talvez seja apenas um jogo ocidental com valores de produção bons.
O grande mérito do jogo entretanto é, tal como seu predecessor Battletoads, a variedade do gameplay nas fases. Sempre tem algo diferente para fazer, e eu tenho que elogiar a criatividade do pessoal nessa daqui. Tem, é claro, várias fases de plataforma Amiga-like, mas então do nada tem uma fase que se passa inteiramente no escuro...
... tem uma fase que o design explora separar a minhoca do traje...
... e uma luta contra um chefe que é... uma luta de bungee jump contra um monstro de meleca de nariz?
Na maior parte do tempo tem algo diferente e não raramente criativa acontecendo. Como o chefe que é um gato maligno e você tem que lutar contra todas as 9 vidas dele, ou uma fase que rola o clássico "Finish Him" após a luta com o chefe e assim por diante.
Kudos onde kudos são devidos, definitivamente esse é um jogo interessante de assistir se mais nada para ver qual a próxima coisa que eles vão inventar... tal como em Battletoads, que por todos os seus defeitos raramente tem duas fases iguais (o que se eu não me engano não tem mesmo). Só que, como eu disse, é um jogo para se olhar e não jogar porque puta que o pariu como esse jogo é dificil. E eu estou falando "não passar da primeira fase dificil".
Sério, eu aluguei esse jogo algumas vezes quando era criança porque o jogo é realmente bonito e seu senso de humor é ... único... e nunca, jamais, uma única vez consegui passar da primeira fase. Jogando esse jogo novamente como adulto eu até consegui, mas é tão dificil que a experiencia é exaustiva e nada divertido. E esse é o principal problema desse jogo não é nada divertido, é uma experiencia excruciante que suga de você qualquer diversão que jogar videogame supostamente deveria ter.
Espero que você não tenha marcado compromissos, pq isso vai levar um tempo...
O level design de Earthworm Jim é uma confusão hostil de plataformas, chefes que são uma esponja de absorver dano e os caminhos não são nada intuitivos. O jogo é extremamente vertical, pedindo do jogador movimentos estranhos ao longo das fases que muitas vezes são difíceis de visualizar... o que é uma forma chique de dizer "salto de fé". Se Super Mario Bros é sobre ir para a direita de forma constante, Earthworm Jim é sobre... hã... ¯\_(ツ)_/¯
A primeira fase do jogo, "New Junk City", é um labirinto de tirolesas e plataformas que é dificil de se agarrar. Caso de alguma forma você chegue a segunda fase, o que não é provavel, "What the Heck?" é cheio de de muros altos que criam becos sem saída frustrantes. Apesar do personagem ter várias opções de movimento, como molas e a capacidade de usar a cabeça de Jim como um chicote para balançar sobre os buracos, Earthworm Jim não é nada divertido de navegar. Agora, se de alguma forma improvavel você chegar a terceira fase "Down the tubes"... hahahahahaha, se fodeu otário!
Hmm, me pergunto pq será que as revistas falavam tão bem desse jogo que comprava anuncios de duas páginas... |
Lembra da fase da represa do primeiro Tartarugas Ninja do Nintendinho? Uma das fases da água mais ridiculamente dificeis de todos os tempos e que exige precisão pixelar com limite de tempo em controles que são mais frouxos que calça de véio?
Bem, aqui alguém pensou "hmm, será que a gente consegue fazer isso só que MAIS DIFICIL AINDA?"
Vão tomar no cu, na moral. Okay, eu entendo o feeling geral do que eles estavam tentando fazer aqui. Jim Minhoca não é apenas uma paródia dos videogames em conceito com "olha como salvar princesa é idiota, hurr durr", mas no level design. A tentativa do jogo é apontar e dizer "uau, olha como isso que eles fazem é realmente estupido, não é realmente ridiculo?".
Agora o problema de fazer uma paródia é que você tem que traçar uma linha fina para delimitar o que você está se criticando sem se tornar essa coisa. Jim Minhoca tem o mesmo problema que anos depois viria acometer Hyperdimension Neptunia, que era pra ser uma paródia de todos os defeitos e clichés dos jRPGs... e acaba sendo nada senão um compilado de todos os defeitos e clichés dos jRPGs. Da mesma forma, EJ acaba se tornando um compilado de todas as coisas que o jogo queria parodiar e, pouco surpreendentemente, isso não é nada divertido de se jogar.
Quer dizer, quem poderia imaginar que tentar parodiar todos os problemas dos jogos de plataforma da época em um jogo que parece perigosamente com um jogo de Amiga não daria certo? Uau, quem poderia prever uma coisa dessas senão absolutamente qualquer um?
Mas okay, pelo menos Jim Minhoca gerou um desenho animado moderadamente interessante e eu posso dizer que gosto do final do jogo. Quer dizer, lembra daquela vaca que você catapulta logo como a primeira coisa do jogo?
Eu tenho que dar isso a eles, o final consegue passar a mensagem de parodiar os clichés da época sem ofender seus sensos videogamisticos. Se ao menos o resto do jogo conseguisse ser tão inspirado... bem, esse jogo não seria Earthworm Jim. E seria bom, o que esse não é.
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