quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

[SNES] DEMON'S CREST (ou "Demon's Blazon" no Japão) [Novembro de 1994][#627]

 


Hmm, eis aí um jogo que eu tinha alguma curiosidade em jogar a algum tempo já. Demon's Crest é um jogo que eu vi na locadora para alugar alguns bazilhões de vezes, mas nunca cogitei seriamente a ideia porque... cara, sério, olha que capa feia da porra! 

Eu nunca realmente tive uma fazer trevosa dumauuu anos 90, de modo que o jogo ter "Demon's" na capa não realmente significava nada pra mim, e essa ilustração é realmente broxante, sempre achei melhor deixar pra lá e alugar um Sim City que eu ganhava mais. 


Claro que se estivessemos falando da capa japonesa a história seria outra, porque essa é bem mais legal. Mas como esse nunca foi o caso e só tinha a capa americana na locadora que eu ia, então pra mim Demon's Crest sempre foi um jogo com a capa feia.

Pois bem, imaginem então vocês minha surpresa ao chegarmos na época da internet e eu vejo que o consenso sobre esse jogo é que ele é uma perolas escondidas do SNES. Bem, eu entendo a parte do hidden porque parece que mais gente é como eu e nunca passou por essa capa horrível, mas será que ele realmente merece o título de "gem"? É o que veremos a seguir.

Demon's Crest é o terceiro jogo da trilogia Gargoyle's Quest, que como era praxe da Nintendo na época teve uma edição no Game Boy, outra no Nintendinho e o terceiro capítulo da série no Super Nintendo (o mesmo que aconteceu com a série Metroid, por exemplo). Mas o que exatamente é a série Gargoyle's Quest? É aqui que as coisas ficam estranhas.

Todo mundo conhece GHOULS'N GHOSTS, o clássico do arcade que foi o primeiro grande sucesso ever da Capcom. Também mais conhecida como a franquia onde o Rei Arthur atira lanças no Satan e fica de cueca se tomar um hit.


Então, Gargoyle's Quest é um spin-off de Ghost'n Goblins

MAS COMO, SE O REI ARTHUR É O ÚNICO PERSONAGEM DESSE JOGO? VOCÊ JOGA COM A PRINCESA RAPTADA? OU COM O SATAN?

Quase. Na verdade você joga com o demonio Firebrandt, que é o primeiro subchefe do jogo de 1985 e que durante o jogo volta varias vezes pra te atazanar e tentar deixar o Rei Arthur de cueca. Não necessariamente nessa ordem.


Parece meio forçado fazer uma série spin-off de um jogo que em 1994 já tinha quase dez anos, mas então é da Capcom que estamos falando. Era isso ou fazer a 18a versão de Street Fighter 2, não é como se eles fossem fisicamente capazes de sentir vergonha.

E já que estamos falando nisso, vamos ver que história é essa, afinal.


Era uma vez um mundo em que existiam duas raças, os Capirotos e as Virgens Marias. Ou seja, esse realmente é um mundo extremos. Além disso imagino que as Virgens Marias tem dificuldade em manter uma população estável, dado que a coisa de depender de partenogenese divina como forma de reprodução não é um metodo reprodutivo exatamente eficiente.

Porém ao contrário do que se poderia imaginar, apesar de suas diferenças os Capetosos e as Virgens Marias viviam relativamente em paz, cada um nas suas terras e por um tempo foi bom. 


Porém tudo isso mudou no dia que a Nação das Jóias do Infinito atacaram. Seis crests de poder inenarravel desceram dos céus, ao que deu inicio a Guerra do Infinito entre os Demonios. As Virgens Marias nunca mais serão citadas e não realmente fazem parte dessa história, não sei porque se deram ao trabalho de cita-las...

Mas enfim, onde eu estava?


Isso, guerra de demonios pelas jóias de poder. Bem, acontece que no fim um demonio chamado Firebrandt deitou todo mundo na mão e conseguiu reunir 5 das 6 jóias do infinito. Faltava apenas a última gema, que era guardada por um dragão infinitamente poderoso. Ao que Firebrandt baixou o modo full Kyoshi e disse "vem pro pau, lagartão!".

A boa noticia para nosso herói é que ele conseguiu vencer o Dragão e adquiriu a última jóia que faltava. A notícia ruim é que isso não realmente ele ser menos feio. E a notícia pior ainda é que ele ficou todo descumcumbelado por essa luta, o que é particularmente num mundo repleto de dois demonios numa moto.


Assim sendo o demonio Phalanx se aproveita do enfraquecimento do nosso herói e na encoxada surpresa ataca Firebrand na traição e fica com a jóias do infinito para ele. As quais ele imediatamente usou para lançar uma magia e aprisionar tanto Firebrand quanto o Dragão.


Você pode se perguntar porque o próprio Firebrand não usou as jóias quando teve todas elas, e a resposta é que i need to you get off my back on this whole thing! Seja como for, Firebrand é aprisionado por mil anos enquanto Phalanx dominou o mundo dos demonios e das Virgens Marias! Oh noes!


A boa notícia para nosso herói é que após mil anos reinando sem oposição, Falange acabou ficando entediado e decidiu colocar Firebrand e o Dragão pra lutar porque a ideia pareceu divertida. 


O que acaba saindo menos melhor que o esperado para o Falange-boy, porque ele não sabia que Firebrand conhecia a poderosa magia do "Furo de Roteiro" de modo que de alguma forma ele manteve a jóia do jogo. Assim não apenas Firebrand vence a luta, como o combate abre uma brecha para o nosso capetoso favorito fugir e começar sua jornada em busca de vingança e das jóias do infinito. Preferencialmente na ordem contrária, vai ser mais fácil assim.

MAS ESPERA, O QUE ESSAS JÓIAS FAZEM AFINAL? ELAS DÃO PODERES OU APENAS CONCEDEM DESEJOS E DEPOIS SE ESPALHAM COMO AS DRAGON BALLS? E POR QUE PHALANX NÃO ESTÁ COM ELAS?

Olha, Jorge, vamos apenas imaginar que esse jogo é a predecessor espiritual de Mulher Maravilha 1984 e aceitar que as regras de como as coisas funcionam apenas são inventadas conforme a cena precisa delas, ok? Dito isso, vamos então ao jogo.

Bem, se eu entendo alguma coisa de videojogos - e eu ouso dizer que sei uma coisa ou duas sobre esse tema - posso dizer que faço uma boa ideia de como esse jogo veio a existir. Muito provavelmente a Capcom estava brincando com algumas ideias para usar no jogos futuros do Mega Man - especialmente com power ups e mecanicas novas - e viu que o resultado final não tinha exatamente muita cara de Mega Man, mas também não quis jogar o material fora e decidiu reaproveita-lo como em uma franquia diferente.

Uma das ideias testadas pela Capcom nesse jogo foi transformar a seleção de fases em um mapa de mundo aberto para você escolher a fase que quer entrar

O que é algo que a Capcom faz com certa frequencia, diga-se de passagem. Devil May Cry começou seu desenvolvimento como sendo Resident Evil 4, DARKSTALKERS: The Night Warriors começou como ideias a serem testadas para o próximo patch de SUPER STREET FIGHTER 2 TURBO e até mesmo Mega Man já passou por isso já que algumas ideias rejeitadas para o jogo bom bombardeiro azul acabaram virando o DARKWING DUCK do Nintendinho.

Isso fica muito claro jogando Demon's Crest, porque em essencia esse jogo é basicamente MEGA MAN X se o nosso robo azul favorito tivesse power-ups de armaduras diferentes. O que é uma coisa ótima se quer saber minha opinião dado que MEGA MAN X é um dos meus jogos favoritos de todos os tempos, mais desse jogo só que com ideias novas não é algo do qual eu vou reclamar... exceto que eu vou, mas voltarei a esse tema daqui a pouco.

Por padrão, além de pular e atirar nosso demonio das artinhas Firebrand tem alguns movimentos exclusivos, sendo a mais iconica a habilidadede voar e que é bem simples de usar: aperte B uma vez para pular, aperte uma segunda vez para ficar parado no ar e poder avançar pelo tempo que você quiser:


Essa ideia  é muito algo que eles eles pensaram para ser uma armadura do Mega Man, tanto que o air hover foi usado posteriormente como power-up no Mega Man X3 ou no X4 - não lembro de cabeça agora. A diferença é que a versão "final" desse power-up dura apenas alguns segundos nos jogos do Mega Man, aqui você pode atravessar a fase inteira voando se tiver altura o suficiente para avançar sem nada barrar seu caminho. Guru Lahima aproves!


A segunda habilidade muito própria desse jogo é a habilidade de grudar nas paredes no melhor estilo  NINJA GAIDEN (há!). A principio poder grudar nas paredes pode parecer desnecessário quando você voa, mas então existem várias fases em que o objetivo é subir para cima (enquanto em outras é descer para baixo, ou até mesmo sair para fora) e as habilidades escalativas tem seu lugar ao Sol, afinal.


A terceira mecanica desse jogo é velha conhecida dos fãs de Mega Man: ao derrotar chefes você ganha habilidades, existe um total de 10 power ups para serem colecionados: 5 modificam o seu tiro, 5 dão novas formas ao Firebrand. Nesse GIF acima, por exemplo, você pega a forma da terra na qual ele perde a habilidade de voar mas em troca ganha um ataque mais forte e a capacidade de dar um dash que destrói objetos.

Essa é a parte onde mais coisas foram experimentadas para depois serem reaproveitadas na série do menino alvo do Dr. Pedo, como por exemplo a modificação de tiro que transformar o seu ataque em um criador de plataformas (para subir), ou a forma da agua que permite, bem, andar embaixo dágua ou mesmo a forma do ar que permite voar livremente pela tela.

Embora os chefes não tenham o carisma dos mestres robos de Mega Man, são grandes, vistosos na tela e gostosos de bater neles - o que é meio que o proposito da coisa toda afinal

E tal como na série principal, apenas metade desses power ups são obrigatórios para terminar o jogo - a outra metade exige rejogar as fases para encontrar caminhos alternativos e derrotar chefes secretos, em especial os melhores power-ups são opcionais como a transformação que reduz seu dano pela metade e dobra o poder do seu ataque.

Além dos power-ups principais existem vários outros colecionaveis nesse jogo, sendo que vários deles exigem revisitar as fases com as novas habilidades adquiridas. A mais útil delas são vários talismãs dos quasi ele pode equipar apenas um, e que que lhe dão várias habilidades como maior dano ou defesa, maior velocidade de ataque ou - o melhor na minha opinião - maior probabilidade dos inimigos droparem itens de cura. Firebrand também pode coletar potes e pergaminhos, que permitem que ele use poções (para curar, aumentar o dano ou dar invencibilidade temporária) e feitiços que limpam a tela. Adicionalmente a tudo isso, Firebrand também pode estender seu medidor de vida coletando heart containers.

Esses blocos, por exemplo, podem ser quebrados mas só depois que você tiver o power up do tiro que quebra blocos. Então você tem que voltar nesse fase depois que tiver esse ataque para quebrar a parede e pegar um aumento das bolinhas de vida

Então Demon's Crest é basicamente Mega Man X com novas fases, novas habilidades e muitos colecionaveis e se isso não faz dele um dos melhores jogos do Super Nintendo, então eu não sei mais diferenciar um ornitorrinco de uma sandalia velha!

HMM, SINTO QUE TEM UM "MAS..." VINDO AÍ

Então... recentemente eu andei trocando uma ideia com minha assistente para propositos gerais e ela me lembrou que o fato de existirem jogos piores não deveria ser motivo para um jogo não receber um "The Worst of", porque sempre vai existir alguém pior e se for pensar assim em algum ponto nenhum jogo terá o selo de terrível abominação da humanidade. É algo bastante fácil de perder de vista quando você está tão afundado em jogos ruins como é a minha rotina.

Aproposito, depois de 10 anos fazendo jogo a Capcom desaprendeu a fazer jogo com Password, foi? Porque porra, o que é que custava não obrigar a jogar o jogo todo numa sentada só? Tá certo que pelo menos tem vidas infinitas pra tentar, mas ainda sim...

Pois bem, eu estava pensando nisso porque o contrário também se aplica. O fato de existirem jogos melhores não deveria diminuir um jogo que é, como eu disse, definitivamente um dos melhores jogos do Super Nintendo. Demon's Crest é um jogo espetacular e recomendadíssimo, mas não tem como não falar esse jogo e não lembrar que Mega Man X é melhor.

Todo mundo que joga esse jogo consegue sentir isso, mas bem poucas pessoas podem colocar o seu dedo sobre a questão e explicar o "por que". Felizmente para vocês, eu não sou o seu gamer usual e possuo respostas a perguntas que você sequer sabia que tinha.

Um toque legal é que o chefe final - e por consequencia o final do jogo - muda conforme quantos itens você pegou. Existem três finais, e o final completo e o último chefe (que é um dos mais dificeis da história dos videogames) apenas se você coletar 100% dos itens

A questão que realmente precisa ser respondida então é... pq Mega Man X parece melhor que Demon's Crest? Em uma palavra: planejamento.

Ao longo desse texto eu ressaltei várias vezes que esse jogo nasceu como uma plataforma de testes da Capcom para coisas que eles usariam ou não em Mega Man, e isso é porque dá pra sentir isso nesse jogo. Não há um planejamento para o game design, apenas coisas foram testadas e depois deixadas ali de qualquer jeito. O que é  problemático, porque gera vários momentos como esse:


Como por exemplo, essa sessão de plataformas com espinhos no fundo e quando você pula nelas, elas desabam depois de alguns segundos. Isso deveria fazer uma sessão de saltos precisa e tensa - porém justa, dado que entregar controles excelentes é meio que a coisa da Capcom. Deveria, porque o level design apenas parece esquecer que você é capaz de voar desde o inicio do jogo!

O jogo é repleto de trechos assim que são facilmente ignorados pelas suas habilidades mais básicas. A sensação que dá, e eu ficarei muito chocado senão foi EXATAMENTE isso que aconteceu, é que as sessões de plataforma foram desenhadas para um jogo do Mega Man e nunca levaram em conta que o personagem poderia apenas voar. 

Quando você ganha o power-up do ar então, e pode voar pra qualquer lugar na tela - o que nem é tão pro final do jogo assim - fica pior ainda, fases inteiras que claramente foram desenhadas para ser um desafio simplesmente perdem qualquer proposito de existir!


Po cara, olha um negócio desses! Novamente, isso nem é na finaleira do jogo, lá pela metade você já pode fazer isso!

Pior ainda é que não apenas o level design não foram talhados de acordo com as suas habilidades, as suas próprias habilidades não foram planejadas afrente porque existem várias delas redundantes ou que simplesmente não são utilizadas. 

Por exemplo, em determinado ponto você ganha uma habilidade chamada "Claw" que permite você atirar em espinhos e temporariamente os transformar em plataformas agarraveis - o que é útil para usar sua habilidade de grudar nas paredes e subir. O problema é que a esse ponto você já tem a forma do ar, então você pode simplesmente voar para cima e não precisar de parede nenhuma.

Ou então um dos power-ups de tiro "deixa seu tiro mais forte", eles só não levaram em consideração que a forma que diminui seu dano pela metade (e que você tem logo em seguida) já faz isso também.

Level design e seleção de poderes em um jogo não é uma coisa que você pode fazer de qualquer jeito e atirar qualquer coisa lá, tem que ter um planejamento para a coisa ser harmonica combinar sinergias entre os poderes e as mecanicas, do contrário você só faz o que a Sega costuma fazer com Sonic e taca qualquer coisa porque qualquer merda é qualquer merda mesmo e tanto faz.

Não cara, não tanto faz! De forma alguma tanto faz!

Os potes (existem 5 espalhados pelo jogo) podem ser preenchidos com poções de cura e isso torna o jogo mais fácil, porém ao preço de ter que ficar farmando dinheiro para comprar as poções nas lojinhas que tem nessa fase

Enfim, como eu disse esse jogo é muito bom porque ele foi construído sobre algo incrível, mas não tem como não reparar que ele é mais um depositório de ideias do que um jogo planejado do começo ao fim. Não é algo que estrague o jogo, mas é a razão pela qual esse jogo é uma "perola perdida" e não um clássico atemporal do SNES.

O que definitivamente seria se fosse feito com cuidado, porque colocar a mecanica de Mega Man com a atmosfera de Castlevania (acho que esse é o jogo de SNES com mais cranios e ossadas que eu já vi a´te hoje) seria tipo um greatest hits da quarta geração. Ou como bem disse certa vez um grande mandaloriano:


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