[SNES/MD] PITFALL: The Mayan Adventure (Novembro de 1994)[#632]
O jogo de hoje é outro que eu vi inúmeras vezes na locadora quando criança e nunca aluguei porque, sério, Pitfall? Sério mesmo? Embora eu nunca tive um Atari, eu joguei alguns minutos de Pitfall na casa de primos e coisas assim e se você jogou um jogo de Atari alguns minutos você já jogou todo ele, de modo que ver um novo, super, master, mega, blaster pitfall não realmente fazia muita coisa mim.
Quer dizer, uau, uma nova versão de um clássico do Atari... who da fuck cares?
Bem, o que eu não sabia na época, em minha pueril ignorancia da juventude, é que eu devia sim me importar porque Pitfall é um jogo tremendamente importante para a história dos VIDJAGUEIMS!
Eu realmente falho em ver como esse slogan me faria querer jogar esse jogo
Nossa história começa no outono de 1979, quando todas as folhas estão marrons e o clima está cinzento nos céus da Califórnia. Quatro homens não estão felizes, e seu descontentamento mudará para sempre a história dos videogames. Estes caras são David Crane, Larry Kaplan, Alan Miller e Bob Whitehead e até então eles eram funcionários da Atari.
O que estava pegando é que naquele ano o fundador da Atari, Nolan Bushnell, havia vendido a empresa para a Warner e ido aproveitar seus milhões no caribe enquanto esperava pelo desenvolvimento de cybercatmaidlolis para uso doméstico
NÃO, ISSO É O QUE VOCÊ FARIA SE FOSSE MILIONÁRIO
Verdade, nem todos os homens são abençoados com finesse, eu suponho. Mas o ponto é que Bushnell pulou fora e a Atari foi entregue a um bando de executivos que não sabiam nada realmente sobre videogames... até porque estamos em 1979, poucas pessoas NO MUNDO podem realmente dizer que sabem alguma coisa sobre videogames, porém mesmo sob esses critérios a Atari estava sendo administrada pelos executivos mais executivescos que você poderia executivar. Imagine um episódio de The Office, só que a corporate é composta basicamente por Michaels.
QUÉ?!
O que nos leva aos nossos protagonistas infelizes, e eles estavam infelizes por uma razão: naquela época como programadores da Atari eles ganhavam cerca de 1500$ por mês... fazendo jogos que rendiam a Atari cerca de 20 milhões de dolares cada (o que, convertendo para os valores de hoje, daria cerca de 400 milhões de reais). Hmm, essa conta não estava batendo no ponto de vista deles.
Mas não era apenas sobre dinheiro realmente, embora também fosse. David Crane e os outros queriam reconhecimento pelo seu trabalho, queriam o seu nome na capa dos jogos, queriam o mesmo reconhecimento que músicos e autores tinham porque do ponto de vista deles, eles estavam fazendo um processo criativo. E do ponto de vista do publico também, se você gostou de um jogo do David Crane seria do seu interesse procurar pelo próximo jogo dele - que é como funciona hoje, um jogo não precisa muito mais do que "A Hideo Kojima Game" na capa para vender.
É tudo que eu realmente preciso saber
Então essas eram as exigencias dos programadores da Atari para os seus chefes: royalittes pelos jogos e seu nome na capa, como qualquer artista tem sobre sua obra. Ao que, como você pode imaginar, os chefes dele na Atari responderam da seguinte maneira:
Faz sentido de um ponto de vista corportativo, certo? Quer dizer, porque eles iriam conceder uma coisa dessas? Não é como se esses quatro caras, sozinhos, tivessem sido responsaveis por 79% do lucro da Atari nos últimos anos e... hey, espera... talvez você não queira realmente bater de frente assim com seus melhores programadores, eu suponho.
Oh, mas tudo bem, não é como se eles pudessem sair e fundar sua própria empresa para fazer jogos para o Atari porque esse tipo de coisa simplesmente não existia em 1979. Todos os jogos da Atari eram feitos pela própria Atari e fim de papo. Mas... pq eles não podia mesmo?
Então assim, nossos quatro protagonistas disseram "tomate cru é vitamina", pegaram suas coisas e foram fundar sua própria empresa de fundo de quintal para fazer jogos para o Atari. Nascia assim a Activision, a primeira third party (ou softwarehouse, como as revista dos anos 90 chamavam) do mundo. Ao que a Atari, obviamente, respondeu de uma forma bastante profissional:
A Atari processou a recem-fundada Activision por quebra de patente, mas a verdade é que não havia nenhuma base legal para isso. Desde que eles não usassem segredos industriais da Atari, não é ilegal você na sua garagem fazer um jogo para o Atari - o que foi uma das lições que a Nintendo aprendeu com a Atari, o Nintendinho lançado dali a alguns anos tinha uma trava de codificação que para você conseguir fazer um jogo rodar no NES sem a permissão da Nintendo você teria que efetivamente quebrar uma patente deles, o que deu a Nintendo controle total sobre o que era ou não lançado para o seu console.
O Atari, entretanto, não tinha essa tecnologia e qualquer um que entendesse como o Atari funcionava poderia fazer o seu próprio jogo. O que meio que foi o começo do fim da Atari, porque de fato todo mundo percebeu que podia sim fazer o seu próprio jogo e ... bem, a gente sabe como essa história termina.
Porém o crash dos videogames não foi culpa da Activision, pelo contrário: se alguma coisa manteve os jogos vivos mais tempo do que deveriam foi justamente o trabalho desses quatro ex-funcionários da Atari que conheciam o sistema melhor que a própria empresa. Com pouca surpresa, os jogos da Activision eram muito, mas muito, MAS PUTA MERDA MUITO MESMO, melhores que os da Atari.
Esse era um jogo da Activision...
... e essa abominação era um jogo da Atari
A Activision levou o hardware do Atari ao seu limite, tirando cada gota de capacidade que aquele maquinário que hoje não serviria nem como calculadora era capaz de fazer. E de tudo que a Activision fez para o Atari, sua obra-prima foi um jogo que muitos julgavam impossível ser feito.
Veja, até então os jogos de Atari eram sempre com naves, carros, tanques ou objetos quadrados assim porque... bem, como é que você ia representar um ser humano usando 8 pixels? Porém David Crane estava obsecado por que quebrar essa barreira, ele faria um jogo com um protagonista humano mesmo que ele tivesse que fazer o Atari suar lágrimas de tungstenio. E foi exatamente o que ele fez: após semanas, semanas e semanas programando, ele conseguiu codificar uma completa série de movimentos para um bonequinho humano formado por 8 pixels. Nascia assim o primeiro protagonista humana de um videogame: Pitfall Harry.
Eu preciso lembrar que estamos em 1982, até então o melhor que o Atari tinha a oferecer como gráficos era... bem, algo tipo isso:
... seja lá o que isso for...
Mas bom, após perder uns 5 anos de vida apenas pela privação de sono, David Crane então tinha o seu personagem! Agora ele só precisava ... ter um jogo para ele. Ao que nosso Davizão da massa respondeu "Super easy, barely an inconvenience!"
Naquela época o grande sucesso do momento era Indiana Jones, então David pensou em uma aventura na selva, caçando tesouros, escapando de crocodilos, escorpiões, cobras - você sabe, selva stuff... e só porque ele podia, se balançar em cipós com o grito do Tarzan.
Então David tinha tudo: seu personagem, seus desafios, só faltava... bem, o jogo. Quer dizer, o que você ia fazer nesse jogo, afinal? Até então o modus operandi da época era ter uma única tela e os inimigos vindo até você, ou você ter um desafio dentro da própria tela (como chegar até o topo ou algo assim).
Donkey Kong, de 1981, para Arcade (ou seja, anos luz a frente do que o Atari poderia fazer) parecia ser o limite do que dava pra fazer até então. Falando nele, hmm, me pergunto que fim levou esse encanador italiano de macacão vermelho, esse tal de Jumpman... acho que não virou grande coisa na vida não
Naquela época a Activision já tinha um jogo chamado Adventure, que era sobre você andar numa masmorra trocando de telas. Claro que era um dungeon crawling incrivelmente primitivo e precário, mas para a época era algo sem precedentes. E então Crane viu aquele jogo e ficou pensando...
... E SE, veja bem, E SE eu usar essa tecnologia de ficar trocando de tela para ao invés de fazer uma dungeon, fazer uma pista em linha reta? Como ir apenas para frente e para trás é muito mais simples do que navegar por qualquer lugar, eu posso fazer telas muito mais complexas do que as de Adventure!
E foi o que ele fez, um jogo de ir para frente ou para trás trocando de tela em espantosas 255 telas! Eu não posso sequer conceber como ele fez isso caber num jogo de 4k de tamanho, apenas escrever essa frase com letras coloridas e o background que você está vendo agora já ultrapassou e muito os 4k de espaço que ele tinha pra trabalhar!
Mas seja qual foi o pacto arcano que Crane fez para fazer isso funcionar, ele o fez. E nascia assim o primeiro jogo de ir para o lado trocando de telas até chegar ao final do jogo (que terminava quando você coletava todos os tesouros). Sim, era um jogo que você podia terminar! Olha que ideia louca, chegar ao final de um jogo! Uau!
... em outras palavras, ele havia acabado de criar o primeiro jogo de plataforma do mundo!
E, como não poderia deixar de ser, explodiu corações e mentes por onde passou. O primeiro jogo de plataforma de todos os tempos se tornou mania mundial, foi o segundo jogo mais vendido da história do Atari (atrás apenas de Pac-Man porque apesar de ser um port pavorosamente ruim do arcade... bem, todo mundo queria jogar Pac-Man né?), gerou brinquedos, ripoffs safados e até mesmo um desenho animado.
Gerou, inclusive, um comercial que foi o primeiro trabalho como ator de um garoto chamado Thomas Jacob Black, Jack Black para os intimos.
Porém a história do legado de Pitfall não termina aqui. Felizmente não. Porque do outro lado do mundo um cara ficou incrivelmente impressionado com Pitfall, e não um cara qualquer. Mais precisamente, esse cara:
Usando o brilhante hardware desenhado por Gunpei Yokoi, Shigeru Miyamoto elevou a formula de Pitfall a um status de arte, e quando o ocidente não queria mais ouvir sequer falar de videogames mas nem pintados de ouro, ele criou o jogo mais importante de todos os tempos, sem os quais sequer estariamos discutindo videojogos hoje.
Um jogo tão bom, tão inacredivalmente incrível que as pessoas apenas disseram "hã, pensando bem a gente não vai poder viver sem isso não. Tipo nunca mais.". Estou falando, é claro, DESSE jogo:
E tudo isso só foi possível porque, em uma tarde nublada de outono de 1979, um executivo decidiu que meros programadores não eram artistas e não deviam ser remunerados como tal.
O finl dessa história é que hoje a Atari sequer existe mais (bem, tecnicamente existe como nome fantasia da Infogrames, que depois da marca rodar pela mão de muita gente acabou nas mãos de uma empresa que DEFINITIVAMENTE precisava de um nome melhor), enquanto a Activision dificilmente poderia ser maior mesmo que tentasse:
Quando você é dono de Call of Duty, da Blizzard e do fucking Candy Crush, honestamente eu não acho que exista alguém nesse mundo criativo o suficiente pra conseguir gastar esse tanto de dinheiro que é ganho
Parece que David estava certo sobre essa coisa de reconhecimento, afinal.
E agora que você conhece a história de Pitfall e do que ele representou para a história dos videogames, consegue compreender porque foi feita uma tentativa em 1994 de ressucitar essa marca um dia tão importante. Teve sucesso nessa empreitada?
Hã... vamos colocar assim, eu sou um cara que acredita que qualquer coisa que a resposta não for imediatamente "sim" então é porque é "não". Porém não dá pra dizer que foi um fracasso porque esse jogo foi lançado para... inspira profundamente... Super Nintendo, Mega Drive, 32X, Jaguar, Sega CD, Game Boy Advance e PC. Ufa, foi bastante coisa mesmo.
Mas o jogo é bom?
"Não é ruim" é o melhor que eu posso fazer nesse caso. Curiosamente, esse Pitfall lembra muito, muito mesmo outro jogo que eu acabei de jogar: THE LION KING. Se Lion King tivesse sido feito sem ódio pela raça humana e com a missão de induzir suicídios coletivos com sua dificuldade, isso é.
Esse Pitfall parece muito com os jogos da Disney lançados nessa época, para o melhor e para o pior. Por exemplo, os controles meio floatsy e o feedback meio frouxo que você recebe dos inimigos dando a sensação que nada tem peso na tela e aproximando perigosamente dos jogos de Amiga - que é uma marca registrada de jogos como DISNEY'S THE JUNGLE BOOK, DISNEY'S ALADDIN (a versão de Mega Drive, a do SNES feita pela Capcom não tem esse problema) e, é claro, THE LION KING.
Esses jogos tem sérios problemas de interação com os inimigos, e você nunca tem certeza realmente que o seu ataque está fazendo alguma coisa, você meio que flutua pela tela com um peso que não parece certo e torce pelo melhor. O que, como dá pra ver, não é um elogio da minha parte.
Por outro lado, ele tem também as qualidades de um jogo da Disney e, cara, como a animação desse jogo é boa e fluída! Não, sério, ele é muito melhor animado que os jogos da Disney! A única vez que eu vi animações tão boas assim em um console da quarta geração foi em puzzle plataformers como OUT OF THIS WORLD e PRINCE OF PERSIA, só que nesses jogos seu personagem se movia a meio km/h na tela.
Pitfall: A Aventura Maia tem uma animação tão boa quanto esses jogos, só que seu personagem se move rapido e graciosamente como em um jogo de plataforma normal. É um efeito realmente impressionante como esse jogo roda bem especialmente num console conhecido por não lidar tão bem assim com coisas rápidas na tela como é o caso do SNES.
Oh, obrigado por apontar o caminho, muito gentil da sua parte, seu Checkpoint!
O level design é okay, thou. Esse é um daqueles jogos que você tem que achar a saída, não meu favorito mas ele é feito sem ódio no coração contra o jogador então tudo bem. E os checkpoints, que tem uma frequencia decente, apontam para que direção você tem que ir, o que é um toque legal da parte do jogo.
De modo geral eu gostei do level design, meu problema não foi muito achar a saída e sim chegar vivo até ela, porque esse jogo é bastante dificil. Mesmo sem ser deliberadamente babaca como O Rei Leão, ele já é dificil o suficiente apenas pela própria natureza floaty dos pulos e os inimigos que não tem um knockback decente dos seus ataques - o que só prova o quanto a Disney não precisava ter ferrado a porra toda, esses jogos já são bastante dificeis por si só.
Iiiuuppiii
Porém se a dificuldade do jogo é, no minimo, desafiadora, as lutas de chefes são onde o jogo definitivamente caga fora do penico depois de comer chipotle mexicano.
HÃ, VOCÊ TEM COMENTADO ISSO POR ALGUNS ANOS JÁ E ACHO QUE VOCÊ NUNCA REPAROU, MAS SABIA QUE PENICOS NÃO SÃO FEITOS PARA DEFECAR, CERTO?
Espera, o que? Então, eu... oh... oh, eu definitivamente então preciso pedir desculpas a algumas pessoas... o que vai ser bem awkward
HONESTAMENTE, EU NÃO VOU NEM PERGUNTAR.
... mas então, voltando a falar do jogo. O level design é okay, sempre tem algo interessante ou útil para coletar mesmo que você se perca (né SONIC & KNUCKLES ?!?) e tirando as batalhas de chefe que são completamente cagadas, é um titulo até gostosinho de se jogar. É um mediano aceitável.
Cara, olha a velocidade desse chefe! Achou que eu tava de sacanagem quando eu disso que isso quebra o jogo? Então espera até a parte que tem que enfrentar DOIS desses com metade do espaço!
Porém a coisa que eu mais gostei nesse jogo, de verdade, foi a história dele. Mais especificamente o final, que é o melhor final de um jogo de SNES que eu já vi até hoje. A história não é particularmente complexa: você é Harry Pitfall Jr., filho do lendário Harry Pitfall do primeiro jogo para o Atari e seu coroa desapareceu enquanto vocês estavam explorando ruínas maias.
Então você precisa ir até lá salvar o velho, coletar tesouros no caminho, você sabe, os negócios da família. Simples e elegante, certo?
Porém o que torna o final desse jogo genial é que, bem, no fim do jogo você finalmente resgata o seu pai... e ele é o Harry Pitfall do Atari. Quer dizer, ele é literalmente o carinha do jogo do Atari!
Puta merda, eu ri de verdade com essa sacada, algo que não é tão comum assim em jogos dessa época. E no fim Harry Pitfall Jr. indo embora com seu coroa de Atari ao por do sol é de um senso de humor que faria bem a mais jogos dessa época. Uma despedida digna para um herói que representou tanto para os videogames.