sábado, 30 de julho de 2022

[#934][Abr/96] METAL SLUG: Super Vehicle-001


Recentemente eu falei sobre o fim deprimente porém previsivel fim melancólico do 3DO, que no caso foi sobre seu último jogo analisado em revistas que foi o CAPTAIN QUAZAR. Porém nessa época da meiuca de 1996 havia outro console que também já estava nos pés da égua: o Neo Geo. 

É preciso esclarecer, entretanto que o final do Neo Geo não foi tão melancólico quanto o do 3DO pq a lista de bons arcades que sairam com ports excelentes é bastante satisfatório - especialmente porque a sua desenvolvedora, a SNK, tinha como jogos de luta seu principal ofício.

Então não dá pra dizer que é um zero a esquerda na história dos videogames algo que era essencialmente um arcade para jogar em casa THE KING OF FIGHTERS 95 ou SAMURAI SHODOWN 2. O problema é que o Neo Geo é um hardware de 1990 e enquanto ele era léguas afrente do que o SNES e o Mega Drive eram capazes de sonhar, em 1996 era absolutamente fora de questão competir com o Playstation, Saturn e o Nintendo 64. E enquanto é verdade que o Neo Geo CD foi um upgrade, foi mais um patch de upgrade que só colocou CD no hardware antigo - nada diferente do que o Sega CD tinha feito pelo Mega Drive.

Ou seja, não tinha pra onde correr pq continuava não sendo suficiente. Mas e aí, a SNK ia fazer o que? Chorar? Pedir ajuda para o Recruta Zero? Postar um textão no Twitter? Bem, não. O que eles fizeram foi jogar com as forças do seu hardware e tentar tirar até a última gota da onde aquele equipamento datado podia ir.

Isso quer dizer usar a capacidade maior de memória RAM do sistema para exibir jogos 2D filhadaputamente bonitos, com uma quantidade de quadros de animação que poutaqueopareoselokovéi. Como por exemplo ART OF FIGHTING 3: The Path of the Warrior, que exemplifica o máximo que dava pra tirar desse setup.

Ou então o shmup IN THE HUNT, que era muito bom em mostrar o que ainda dava pra tirar do sistema.


Mas eu não estou mencionando IN THE HUNT aleatoriamente, pelo menos dessa vez, e sim pq depois de fazer esse jogo a Irem continuou no processo de espremer cada quadro de animação para fazer jogos bonitos para Arcade/Neo Geo e é aqui que entra o jogo de hoje. Metal Slug é o sucessor espiritual de IN THE HUNT, só que como run'n gun em que você joga com um tanque no lugar de um shmup que você joga com um submarino. 

Quer dizer, originalmente a ideia do jogo era que o tanque (apelidado de "Metal Slug", daí o nome do jogo) fosse o personagem que você joga o tempo todo, mas por fim decidiram que seria mais legal o tanque ser uma arma especial que você adquire na fase. Hã, okay, essa parece uma ideia que torna mais especial mesmo, nada a reclamar aqui.


E considerando como esse attract mode ficou bonito pra caralho, definitivamente nada a reclamar mesmo. Outro ponto que prova o que eu estava dizendo, de como o proposito desse jogo era tirar a xepa do que era possível do hardware ultrapassado do Neo Geo é a tela de tutorial de comandos que aparece tão logo você começa o jogo:

Este tutorial é um ótimo recurso, porque significa que não preciso escrever sobre os controles... embora eu tenha gasto mais palavras escrevendo esse comentário do que eu gastaria descrevendo os botões

Como dá pra ver, o sprite do nosso herói é um dos melhores desenho em pixel animado nos videogames. Não apenas o desenho é bonito e vistoso aos olhos, como tem uma quantidade deliciosa de quadros de animação disponíveis. Mas o que eu queria realmente mostrar aqui nem era tanto isso e sim essa explosão.

Reparou que tem uma caveira escondida nela?


Uau caras, vocês realmente estão colocando esforço nisso DE VERDADE, heim? Então, se tudo mais falhar definitivamente Metal Slug é um jogo que ainda sim merece ser jogado apenas para ver as pixel arts maravilhosas que foram colocadas nele.

Só porque o Neo Geo velho de guerra não aguentaria rodar jogos 3D sem implodir em uma bola flamejante de carbono e guelras anfíbias, não quer dizer que não tinha como explorar seus limites de outra forma - é o que eu sempre digo!

VOCÊ (NEM NINGUÉM) NUNCA DISS-- DEIXA PRA LÁ, EU NÃO SEI PQ EU TENTO AINDA...

Seguindo adiante, aqui nossa história é que os heróis Marchrius Dennis Rossi e Tarmicle Roving III são os rebeldes que lutarão pela resistencia para derrubar o maligno general do mal que odeia o bem Donald Morden. E não, caso você esteja imaginando, eu não inventei nenhum desses nomes.


O jogo não realmente dá muitos mais motivos pelos quais Marco e Tarma (que só aparece no modo coop, não existe seleção de personagens aqui) estão lutando contra o maligno general Morden, mas...


... o exército do Morden está fazendo uma fogueira com mendigos logo abaixo do que é uma versão que parece ainda mais maligna do banner nazista (aparentemente isso é possível, quem diria), então eu suponho que isso já é explicação o suficiente do pq vc deve fazer algo a respeito desse cidadão.

De qualquer forma, agora que estamos falando dos mendigos que são resgatados saiba que eles são a assinatura mais característica da série Metal Slug já que eles na verdade são prisioneiros de guerra que te dão power-ups através das suas... cuecas boxer de um metro e meio de altura...


Eu não realmente tenho uma resposta do pq os prisioneiros de guerra estão carregados de armas e munição dentro de suas cuecas gigantescas, e temo que se há uma resposta para isso eu não vou querer ouvi-la... o que eu sei dizer, entretanto, é que os prisioneiros aqui funcionam como as... hã, seja lá o que forem as abominações lovecraftianas que são os power-ups em Contra.


É verdade que você não pode ir muito longe no genero run'n gun sem esbarrar em alguma referencia ao clássico seminal do Nintendinho que definiu o genero em 1987, mas é mais verdade ainda que Metal Slug sequer tenta ir muito longe disso. Se não está quebrado não conserte, diz o ditado.

Então vc corre, atira e pega power-ups na forma de letras que modificam o seu tiro. Tal como era em 1987 é agora, com a diferença que os tiros melhorados não são infinitos e depois de um tempo vc reverte para sua pistolinha normal - o que quer dizer que não rola o que acontece em Contra de pegar "a melhor arma" e depois ficar evitando os power-ups pelo resto do jogo. Isso é um upgrade no design, definitivamente.


Outra coisa que esse jogo faz diferente de Contra, e faz melhor, é que uma vez por fase você encontra o Super Veículo 001 do título. O Metal Slug melhora sua vida em dois sentidos: primeiro que com ele vc pode atirar nas diagonais - algo que intencionalmente não é possível enquanto seu personagem está a pé, e segundo que com ele você tem uma barra de energia e não morre mais com apenas um hit.

Então pegar o Metal Slug não é apenas uma questão estética, ele realmente melhora sua vida no jogo e isso é muito cool. Criar uma fragilidade no gameplay (não poder atirar na diagonal e morrer com apenas um hit) que será sanada pelo elemento diferenciador do jogo (tanto que é o nome da joça) é bom game design 101.

Adicionalmente, ele também parece muito maneiro:


Cacete como esse jogo é bonito, parece aqueles quadrinhos europeus que cada vez que você olha percebe um detalhe novo na cena, sabe?

Mas voltando a programação, existe ainda uma outra forma como esse jogo melhorou a formula dos run'n gun que é algo que sempre me incomodou nesse genero desde sempre: encostar nos inimigos não te mata. O que, considerando como os personagens são grandes na tela, poderia transformar esse jogo em um atoleiro de merda sem fim.

Felizmente, algo muito mais legal foi pensado aqui: encostar em um inimigo só te mata se ele tiver tempo de fazer a animação de sacar a faca e te acertar no melee. Isso é a solução ideal pq permite o jogo se focar em ser dificil (e Metal Slug é dificil pra caceta) sem chegar a parecer injusto. O melhor de dois mundos, se quer saber minha opinião.


Metal Slug frequentemente é mencionado no topo de listas dos melhores run'n gun de todos os tempos, o que faz sentido para mim. Realmente não posso discordar disso.

Run'n gun não é exatamente o meu gênero, mas ao que ele se propõe a fazer Metal Slug faz tudo certo. Atirar nos inimigos dá uma sensação satisfatória, é difícil sem sentir injusto, e como os inimigos normalmente morrem em um tiro o jogo é sempre fluído, sempre tem algo acontecendo - além de isso permitir vc poder passar por eles se for habilidoso o suficiente para evitar todas aquelas balas, bombas e granadas no seu caminho. Tirando os chefes e subchefes nada de balas aqui, e isso é outro check positivo para esse jogo. 



Além, é claro, do já citado A+ no departamento de aparência, esse não é apenas um dos jogos mais bonitos do Neo Geo (o que já é dizer muita coisa), é um dos jogos que você estuda se quiser aprender a fazer pixel art. 

A quantidade de detalhe a atenção colocada em tudo é impressionante e sempre tem algo para se ver - embora você frequentemente vai estar ocupado tentando sobreviver no jogo para ter tempo de assistir o cenário. Como por exemplo essa animação de quando vc destrói um banheiro (e sempre tem muito cenário para ser destruído, algo que eu também gosto aprecio em um jogo):


A imensa maioria dos jogos não gastaria tempo colocando tanto esforço que muita gente vai sequer notar como isso, mas é justamente essa atenção aos detalhes que faz de Metal Slug algo realmente grande. Quer dizer, vc está fazendo um jogo de um genero super simplório para um console ultrapassado, se você não vai colocar seu máximo esforço nos detalhes então qual é o ponto desse jogo sequer existir?

Os defeitos do jogo são o que vc poderia esperar de algo do genero: ele foi feito com aquele design arcade de comer fichas, então se você quiser ver o final, tudo o que você precisa fazer é continuar colocando os créditos, você chegará lá eventualmente, mas você tem que continuar metralhando o botão para manter as balas saindo. Tap tap tap tap tap tap tap por 2000 segundos seguidos. Definitivamente não é um jogo longo, mas parece longo especialmente porque você nunca pode perder sua concentração por um segundo sequer. Isso foi corrigido nas versões modernas do jogo, que colocam uma opção de disparo automático para facilitar sua vida e torná-lo muito menos doloroso de jogar.



Enfim, Metal Slug foi criado para ser um epitáfio de tudo que o Neo Geo era capaz de fazer... e eu acho que teve amplo sucesso em tudo que tentou fazer. Com efeito, a versão de Saturn do jogo precisa de uma expansão de RAM e o port do PlayStation sofre com o carregamento no meio da fase, então kudos ao velho Neo Geo por aguentar o tranco. 

De qualquer forma, meu veredicto final é que se você quer jogar um run'n gun raíz e filhadaputamente bem desenhado, mas com as melhorias que você não lembra que gostaria que Contra tivesse e que só lembra que não tem quando pega pra jogar... Metal Slug é o jogo que você está procurando.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 121 (Novembro de 1997)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 029 (Agosto de 1996)


Edição 040 (Julho de 1997)


Edição 041 (Agosto de 1997)


MATÉRIA NA GAMERS POWER
Edição 12 (Outubro de 1996)


Edição 019 (Junho de 1997)


Edição 023 (Outubro de 1997)