sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

[#1055][Dez/96] PARAPPA THE RAPPER

Hoje é dia de mais um daqueles jogos especiais: aqueles que eu lembro de ter chamado minha atenção quando eu vi na Ação Games, mas eu nunca realmente tinha jogado até agora. Nesse caso, em particular, é mais ainda pq enquanto hoje jogos de ritmo são bem conhecidos e estabelecidos, na época era algo completamente inédito e eu sequer podia conceber como seria um jogo de ritmo musical.

Honestamente, me senti incrivelmente velho agora pensando que eu vivi em um mundo que não existia Guitar Hero ou máquinas de Just Dance (ou algum equivalente disso) em todos os shoppings do mundo...

Como de costume, a capa japonesa do jogo é bem mais dorgas larilarila colorida que a americana

Mas será que Parappa, o rappeador - um dos primeiros jogos de ritmo musical de todos os tempos, e certamente o primeiro desse blog - é bom ou suas mãos viram espaguetti da mamãe?

A REFERENCIA É BOA, MAS A LETRA NÃO É... EU NEM SEI PQ EU TENTO AINDA...

O que eu achei realmente curioso a respeito desse jogo é que ele é estruturado essencialmente como um cartoon que totalmente passaria no Disney CRUJ: Parappa tem o seu grupo de amigos, e um crush pela mina Sunny Funny. Como um cachorro e uma flor ambulante funcionariam como casal eu não sei, e não devemos julgar. O jogo mostra o dia-a-dia de Parappa tentando impressionar sua crush, e para isso ele frequentemente recorre ao poder da sua imaginação.


Ou seja, é essencialmente a versão videogame de cartoons como Doug ou O Fantástico Mundo de Bob onde o protagonista tem uma vida normal e a série adiciona um elemento fantastico com a criativa imaginação do protagonista.

Por exemplo, na primeira fase Parappa e seus amigos são acossados por alguns bullys e então Parappa imagina que se ele tivesse tido lições de karate ele poderia defender sua galere. E por "lições de karate", eu quero dizer obviamente uma batalha de rap contra uma cebola, é claro.

Essa sensação de "dafuq eu estou vendo" é, de longe, o melhor aspecto do jogo. Isso é muito material de um excelente cartoon dos anos 90, e eu totalmente assistiria the shit out Parappa como um desenho animado.

Alias Parappa teve, de fato, em um anime em 2001 porém ele é mais voltado para vender brinquedos para crianças e não captura exatamente o feeling zany do jogo. Eu ainda gostaria de ter vivido em uma realidade que Parappa virou um cartoon bem aos moldes de Doug mesmo, mostrando o dia-a-dia de um adolescente relacionavel onde ele "resolve" seus problemas através de imaginação e rap nervoso. Mais ou menos.

A produção do jogo tem uma história bastante curiusa também: em 95/96, a Sony queria uma grande quantidade de jogos para sustentar o PlayStation, obviamente. Isso quer dizer que eles tinham equipes trabalhando dia e noite em FPSes, jogos de corrida, jogos de plataforma, RPGs, você sabe, o básico de um videogame.

Só que a Sony também tinha outra divisão, uma equipe pequena que internamente era chamada de "Divisão Zero", onde eles tinham liberdade para fazer jogos experimentais e ideias menos ortodoxas. E uma delas era a do musico Masaya Matsuura, de fazer um jogo musical onde um avatar cantasse. 


Dizem as lendas que Masaya amava a musica, mas gostava bem menos de aparecer diante das cameras e disso videogames foram o casamento perfeito, dado que a nova mídia traria o melhor dos dois mundos para ele - ou seja, Parappa nasceu como uma espécie de Gorillaz alguns anos antes de Gorillaz ser uma coisa.

TÁ, TUDO ISSO É MUITO INTERESSANTE, MAS PARAPPA NÃO É UM CD E NEM É UM DESENHO ANIMADO, E SIM UM VIDEOGAME. ENTÃO NA HORA DE APERTAR OS BOTÕES... ESSA COISA FUNCIONA?

Err... então... vamos dizer que a parte cartoon da coisa é o seu maior charme, e o motivo pelo qual nosso carismatico amigo doguinho ainda é lembrado hoje. A parte de "jogar" o jogo, entretanto... isso não funciona nada bem.


O que rola aqui é que Parappa tem apenas seis músicas, o que quer dizer que ele poderia teoricamente ser terminado em meia hora. O que a Sony fez então? O truque mais velho do livro e que é usado para extender a duração de jogos desde os tempos do Nintendinho: FEZ ESSE JOGO SER DIFICIL PARA UMA CARALHA, é isso que ela fez!

Depois da primeira fase, boa sorte com esse jogo pq ele veio pra fazer o crime e a sua bundinha é a próxima coisa da lista!


Por causa do nível insano de dificuldade, as seis músicas demoram muito mais que a sanidade recomenda. Vc pode passar meses fazendo rap pela supremacia de poder usar o banheiro de um posto de gasolina (sério, isso acontece na fase 5). Eu nunca achei isso divertido no Nintendinho e, pouco surpreendemente, isso nõa mudou de lá pra cá. Então esse método de estender a jogabilidade dificilmente é o que eu chamaria de uma vantagem.

O que rola aqui com a dificuldade é que simplesmente apertar os botões conforme solicitado na tela não é suficiente. Cada botão que você pressiona faz PaRappa falar uma palavra e seu rap tem que ser musicalmente harmonioso - o problema é que seguir o timing da tela não faz isso e mesmo a versão de PSP não conseguiu resolver esse problema. 

Então vc tem que meio ignorar o que aparece na tela e só apertar os botões de ouvido, no ritmo pretendido. O que tem um resultado tão bom quanto a proposta soa, especialmente quando vc tem que fazer ISSO de ouvido:

É realmente maneiro quando você realmente acerta uma rima, mas a verdade é que isso só vai acontecer depois de dezenas e dezenas de horas de prática. E mesmo que vc calhe de acertar, boa sorte com isso, na maior parte do tempo o que vai acontecer é que em vez de "Dashing through the snow", você normalmente vai ouvir algo como "Da Da Dashing Dashi Shing Shing Dashi Throuth the Through the Dashi Through the Sno the Sno the Snow Sno Sno the Snow". Definitivamente não é um resultado final tão bom assim.

Supondo que você seja bom o suficiente para tocar a música conforme instruído (não que vc vai ser), você teoricamente pode adicionar palavras fazendo freeform rap - é pra isso que as estrelas servem na barra de timming, o que dá alguns pontos extras. Novamente, isso é apenas teoricamente pq na prática vc vai suar lágrimas de tungstenio apenas para acertar o ritmo pretendido.


E para adicionar sal a ferida, esse é um daqueles jogos que o "easy mode" só te deixa jogar até a metade do jogo.

O que é uma pena, pq as músicas do jogo são realmente charmosas e cativantes. Não que vc vá aprecia-las pq vai estar chorando em desespero, mas se vc parar pra ouvir vai ver o quanto elas são realmente legais , e os vários rappers as entregam com tanta convicção que é difícil não amar. Em especial a fase do reggae é fantabulinda.

Espera, vc é um traficante, Sr. Camaleão?

Então a proposta do jogo é incrivelmente charmosa na sua ideia de cartoon, as músicas são cativantes... só jogar o jogo é que não é realmente divertido. PaRappa the Rapper funciona muito bem como obra de arte para ser assistido, mas não funciona bem como jogo de ritmo.  E considerando que Parappa é um jogo e não um desenho animado, eu diria que o fato dele não funcionar bem enquanto jogo é meio que a definição de um problema, não?

A boa notícia é que esse jogo foi um sucesso estrondoso no Japão: foi o sétimo jogo de PS1 mais vendido de 1997, o que é um feito absurdo para um jogo que era de prioridade zero da Sony. Isso significa que Parappa voltará em outras iterações, e eu espero que no futuro seja um jogo melhor pq todo o resto é maravilhindo.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 117 (Julho de 1997)


MATÉRIA NA GAMERS
Edição 019 (Junho de 1997)

Edição 026 (Janeiro de 1998)