Ao longo de sua vida, 1.757 jogos de Super NES foram lançados oficialmente: 717 na América do Norte (mais 4 cartuchos de campeonato), 521 na Europa, 1.448 no Japão, 231 no Satellaview e 13 no Sufami Turbo. E desses 1757 jogos, chegamos hoje a tamborizante marca de 400 reviews de jogos de Super Nintendo. Uau, QUATROCENTOS jogos reviewzados, isso é realmente uma marca que me deixa bastante feliz.
E para celebrar o jogo 400 de SNES nesse blog, temos um jogo bastante tradicional. Eu digo isso pq Ys é (discutivelmente) a terceira série mais tradicional de RPGs do Japão (atrás apenas de Final Fantasy e Dragon Quest, obviamente). Originalmente lançado para o PC-88 em 1987, YS: THE VANISHED OMENS rapidamente se tornou um dos RPGs fundamentais no Japão.
Combinando jogabilidade rápida usando poucos com uma apresentação que superou em muito qualquer outro jogo da época, Ys se solidificou como um gigante entre seus contemporâneos. Ao longo de mais de 25 anos (com o último jogo sendo lançado agora em 2023, Ys X: Nordics), Ys pode nunca ter replicado seu sucesso no ocidente mas no Japão é um dos grandes jogos do genero.
Curiosamente, nesse tempo todo apenas um único jogo da série nunca foi lançado no ocidente e este vem a ser justamente esse Ys 5 - tanto o jogo original de 1995 quanto o remake que foi feito para o PS2 em 2006.
Mais curiosamente ainda, esse único jogo não portado para o ocidente é o mais diferente da série. Eu digo isso pq a esse ponto a mecanica iconica de Ys é que o personagem tinha um auto-ataque: ele estava sempre com a espada empunhada e vc tinha que dar sarradas nos adversários para causar dano.
Na quinta edição da série, foi adotada uma abordagem mais tradicional em que um botão dá espadada e outro ativa o escudo, o bom e velho ruguru do Action RPG. Muita gente reclama que isso faz o jogo não ter "cara de Ys", mas como eu não tenho conexão emocional com a série (o único que eu joguei foi o port de YS: THE VANISHED OMENS para Master System) meu problema com o jogo não é muito esse...
... e sim que é bastante claro que a Nihon Falcom estava tentando uma mecanica com a qual eles não tinham nenhuma experiencia. Como eu sei disso? Ora, muito simples: A HIT DETECTION DESSE JOGO É PAVOROSA!
Se esse segundo golpe não pegou, meu nome é Toninho Bacalaca!
Sério, eu cansei de contar quantas vezes eu vi a espada atravessar o inimigo sem acontecer nada, e outras vezes acertar quando o gráfico a espada estava longe pra caceta do bonequinho "atingido". Sério caras, a hit detection desse jogo é tão ruim que frequentemente eu me senti jogando SECRET OF MANA de novo. O que NÃO é um elogio, como qualquer um que já tentou acertar um bonequinho naquele jogo pode te dizer.
A outra coisa que NÃO funciona nesse jogo é o sistema de magias. No papel a ideia é simples: vc coleta cristais que depois pode levar a um alquimista nas cidades para vc aprender magias. Existem 18 magias possiveis combinando os cristais que vc coleta (tipo Fire + Fire + Earth te ensina a magia Heat Sand ) e enquanto ter 18 magias diferentes com elementos diferentes é legal, a execução disso não é.
Em primeiro lugar, vc tem que ficar bombeando o botão R para encher o contador de magia, assim que ele estiver cheio então o próximo ataque vc der não será com a espada e sim uma magia. Pq não apenas ter um botão para magia eu não sei, dado que tem botão suficiente no controle do SNES, mas o que eu sei é que ficar bombeando o R o tempo todo não é confortável.
Mas o problema real nem é esse e sim que por algum motivo, causa, razão ou circunstancia vc não pode usar magias contra os chefes. Sim, vc só pode usar magias contra os inimigos comuns e nas lutas contra chefes essa habilidade é desativada, algo que eu nunca vi antes em todos esses anos nessa industria vital (provavelmente eles fizeram isso para as lutas não ficarem muito faceis, mas porra, se SECRET OF MANA deu um jeito, vcs conseguem também caras!).
E isso é terrivelmente problemático por causa de como a experiencia do jogo funciona: vc tem niveis de experiencia separados para os ataques fisicos e as magias, depende de como vc matar o inimigo. Isso quer dizer que se vc matar um inimigo com magia vc não ganha XP para seus ataques físicos, e como nas lutas contra chefes (que é onde vc realmente precisa de todo nível que puder upar) vc só pode usar ataques fisicos, é meio que um atraso para a sua progressão usar magias. Mesmo que a hit detection seja ruim, ao menos vc ganha XP que pode usar contra os chefes.
Então, uau, parabéns Nihon Falcom, eu nunca na minha vida vi alguém colocar tanto esforço para criar um sistema complexo de magias cuja mecanica te desencoraja a usar. Jogar XP fora é a coisa que mais dói em um RPG, e é exclusivamente para esse objetivo que esse sistema foi criado. Parabéns a todos os envolvidos.
Falando em coisas inuteis, apenas a titulo de curiosidade os inimigos não dropam dinheiro ao ser derrotados e sim jóias que podem ser trocadas na cidade por dinheiro. As jóias não servem para outra coisa e vc troca elas por dinheiro no mesmo lugar que compra os itens, então é apenas uma burocracia sem proposito, não seria mais simples apenas dar o dinheiro logo? Não é nem que seja algo que atrapalhe, apenas... pra que?
Visualmente, o jogo abandona a paleta de cores contrastante das edições anteriores e adota uma tentativa de emular os jRPGs da Square. Com efeito, o jogo tem aquele feel de RPG Maker e enquanto não é ruim para 1995, também não chama particularmente atenção.
Narrativamente, Ys V tem uma premissa interessante: o jogo começa quando o herói titular da série, Adol, desembarca na região de Xandria, no reino de Afroca. A reputação do aventureiro ruivo o precede, e assim Adol é contratado por um rico comerciante chamado Dorman para caçar alguns cristais. Diz-se que esses cristais desvendam os segredos de Kefin, uma cidade no deserto que desapareceu há mais de quinhentos anos.
E isso é particularmente importante porque nos ultimos anos o deserto tem se espalhado misteriosamente, até mesmo engolindo algumas das cidades da área. Logo, desvendar o mistério de Kefin pode ser a solução para deter o avanço do deserto... e claro que os tesouros de uma cidade perdida são um grande motivador para várias partes interessadas, como de costume.
Enquanto eu gosto dessa premissa, porém na prática isso quer dizer que a maior parte do jogo é um enredo bastante padrão de "encontre os cristais". Vc sabe, o bom e velho "colete X mcguffins" que os RPGs adoram fazer para dar volume nas horas de jogo.
A história só desenrola mesmo na sua hora final, quando Adol chega a Kefin e descobre não apenas os vilões como o que realmente aconteceu com a "cidade perdida". Verdade que o reino perdido tem histórias e personagens interessantes, mas o problema é que essa galera cai de paraquedas apenas na última hora do jogo.
Tá, eu entendo que o jogo é mais focado em ação, mas essa rata final onde todos os personagens se tornam relevantes, mostra que o cenário original e os personagens tinham muito potencial, mas foram deixados de lado para manter o foco do jogo em ação. É uma escolha que eu entendo, mesmo que não possa plenamente recomendar essa parte também.
E não é como se a parte de ação e exploração do jogo fosse particularmente incrível também. As dungeons em geral são muito simples, tanto que muitas vezes encontrei os chefes por engano, apenas me perdendo nos lugares por alguns minutos. Para adicionar, os próprios chefes geralmente morrem antes que você possa entender completamente o que eles fazem, o que eu acho que explica por que uma versão "expert" do jogo (ou seja, uma versão hard mode) foi lançada apenas alguns meses depois.
Para um jogo que abandona a narrativa para focar mais na ação, não posso dizer que ele faça um bom trabalho tanto no combate quanto na exploração. Como mencionei antes, adicione a isso que a hit detection não é incrível e temos um jogo menos agradável do que ele poderia ser.
Ys 5 é frequentemente visto como a ovelha negra da familia pelos fãs, e embora eu não seja um grande expert na franquia, totalmente posso entender da onde isso vem já que o jogo é meio que um pato: um animal que anda, nada e voa, só que ele não faz nenhuma dessas coisas particularmente bem.
Esse jogo é a mesma coisa: tem uma premissa interessante, mas não a executa de forma interessante. Tem um sistema de combate interessante, mas não o executa bem. Tem um sistema de magias curioso, mas o executa de forma terrível.
Isso dito, embora tropece em vários níveis, é um Action RPG okay. Certamente não é nenhum THE LEGEND OF ZELDA: A LINK TO THE PAST, mas também não faz vc atirar o controle na parede. No máximo coçar a cabeça confuso pelas escolhas que faz, mas não é doloroso.
Lost Kefin acabou sendo um alerta amarelo que colocou uma franquia até então consagrada em hiatus por oito anos, mas - assim como um certo reino de areia - é é uma história que também demonstra que um único fracasso no passado não significa que toda a esperança está perdida.
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER Edição 012 (Março de 1995)