Visualize, se puder, a seguinte seguinte cena: um cavalheiro vitoriano, exibindo músculos másculos que fariam inveja a um deus grego, besuntados em suor viril que brilha sob a luz do luar, dá um soco tão forte em um vampiro que as leis da física começam a questionar sua existência. Adicione uma dose saudável de estética glam rock, diálogos exagerados e tramas que evoluem do melodrama ao caos total mais rápido do que você consegue dizer "Za Warudo!".
Isto, meus queridos, é o que nós chamamos de apenas mais uma terça-feira em "JoJo’s Bizarre Adventure", uma criação do mangaka Hirohiko Araki, um homem que acredita que piamente que limites são para municipios e desde então o mundo é um lugar melhor por isso. É o que veremos a seguir.
O homem, a lenda, o mito |
Abrangendo oito partes (e contando) desde seu início em 1987, "JoJo" narra a saga multigeracional da família Joestar (sempre com um protagonista cujo nome, de alguma forma ou outra, evoque o termo - como JOnathan JOestar ou KuJO JOtaro) enquanto eles lutam contra inimigos cada vez mais ... hã... eu não acho que o idioma realmente possui uma palavra para descrever os vilões de Jojo, sabe?
QUAL IDIOMA?
Todos eles. Quero dizer, sério:
E-ESSA É A APRESENTAÇÃO DOS VILÕES?
Yep. E daí pra baixo, Jojo em seu jojismo máximo. Mas é mais do que isso, pq Araki não é limitado pelas reles regras mortais de classificar sua obra em generos - com isso eu quero dizer que parte da saga da família Joestar e associados é meio que uma guinada para uma temática inteiramente diferente. Se a parte 3 foi uma roadtrip com os brothers, a parte 4 é um slice of life em uma cidadezinha do interior. E a parte 5 é uma história de mafia, assim por diante, dependendo apenas do que o cara quer realmente falar a respeito e sempre tendo em comum entre si apenas o talento inenarrável de Araki para poses dramáticas, o absurdo e as roupas que fazem a alta-costura parecer prateleiras de liquidação de brechós.
Jojo é um manga que nasceu em 1987, também conhecida a era Charles Bronson dos mangas: a moda então era fazer homões invencíveis que, usando bem pouca camisa, mostravam toda sua homasculinidade épica para garotinhos pubescentes. Essa frase soou melhor na minha cabeça, eu juro. Seja como for, estamos falando da era que deu origem a clássicos do manga-brucutu como Hokuto no Ken, Berserk e Bastard! (com exclamação mesmo, pq esses niveis de testosterona não aceitariam menos que isso). Alias o autor de Hokuto no Ken adotou o nome artistico de BURONSON justamente em homenagem ao seu ídolo Charles Bronson, era assim que as coisas rolavam naquela época
Era uma época que até as leis da física se rendiam a testosterona |
Sim, o Japão é um país meio culturalmente isolado do mundo (especialmente nos anos 80), mas mesmo lá o mosquito da Canon Films acabou picando, contagiando toda cultura pop com homens que eram medidos pelo tamanho dos seus musculos e por quantas frases de efeito eles soltavam ao matar seus inimigos
Então um jovem mangaka iniciante, Araki tinha uma visão bem... única, vamos colocar assim... do que essa cultura representava. Se a moda era fazer homens ultramasculos exaltando toda sua ultramachosidade, foi isso que ele deu ao mundo, oras.
Agora, a coisa é que mente de Araki opera em frequencias que nem mesmo Isaac Newton conseguiu atingir, e logo aquilo ficou sem graça. Especialmente com o advento dos anos 90 a era de ouro dos homões musculosos ficou para trás, e com ela Araki decidiu que ia tentar um conceito novo, ia tentar... ser criativo.
Quando a maioria dos autores pessoas tenta "ser criativa", nós temos coisas como explorar um cenário histórico pouco explorado ou então imaginar uma possibilidade de realidade alternativa, coisas assim. Como é um de um alienígina cuja genialidade não pode ser medida em kilotons de que estamos falando, o "criativo" de Araki passou a envolver os poderes dos personagens se maifestarm na forma de balas sencientes com problema de personalidade, uma torre de rádio homicida ou um poder que permite que você... transforme as pessoas em lesmas gigantes pq vc consegue manipular o clima então cria microprismas nas gotas de umidade na atmosfera e usa isso para convencer as pessoas que elas são lesmas gigantes
ESPERA, O QUE?!
O "Bizarre" em JoJo's Bizarre Adventure não é usado levianamente, acredite. Eu não estou brincando quando digo que a mente de Araki opera em níveis que a ciencia não é capaz de catalogar, estamos fando do homem que disse: "Nah, vamos dar músculos aos músculos do nosso herói e fazê-lo posar como estátuas gregas enquanto ele tem conversas cotidianas. Então, na metade da série, vamos mudar para figuras andróginas esbeltas ostentando conjuntos inspirados na linha Gucci.” O resultado é que JoJo parece ser uma janela para um mundo onde museus de arte e shows de drag são a mesma coisa.
O que, obviamente, se tornou um dos pilares da cultura moderna. Se você já viu um personagem de anime moderno fazendo uma pose, há uma boa chance de que ele esteja pegando emprestado de JoJo. A série praticamente inventou a pose extravagante como uma forma de prontidão para o combate. Ele também é o avô dos memes: “Fui eu, Dio!” e “Ah? Você está se aproximando de mim?”, que são lendas da internet.
De jogos como REVELATIONS SERIES: Persona que devem seu conceito de manifestações sobrenaturais do ego de seu usuário, até mesmo criadores ocidentais , jojo se tornou um juggernaut da cultura pop pq... honestamente, como não seria?
Se você não ouviu ORAORAORAORAORAORA na sua cabeça, você já está morto por dentro |
Agora vamos falar sobre o (Stand em forma de elefante na sala): a vibe gloriosamente homoerótica. JoJo é sobre homens hipermusculosos envolvidos em um combate que parece estar a uma coxa de se transformar em um tango de salão e, no entanto, tudo é entregue com tanta sinceridade que em nenhum momento soa como um deboche ou uma galhofada.
O grande segredo da coisa é que tudo, absolutamente tudo aqui é entregue com um nível rídiculo de intensidade. Os vilões são não são maus, eles são cartunesca ridiculamente maus, os personagens não ficam tristes, eles sofrem tão profundamente que fariam as atuações de Troll 2 ficarem constrangidas. Tudo, o estilo, as poses, sempre opera na décima potencia equilibrando no mesmo prato a breguice pulp, o dramalhão mexicano e os temas de um shonen habitual, fazendo com que não exista nada remotamente parecido com isso em nenhum outro lugar.
Em qualquer lugar um personagem pode revidar um golpe, mas apenas em JoJo eles fazem isso TÃO dramaticamente assim |
Se JoJo’s Bizarre Adventure fosse uma banda de rock, então Stardust Crusaders (a parte 3) seria seu single maior de sucesso. É aqui que a série introduz o conceito de Stands e, com eles, o formato de monstro da semana de alta octanagem que define o JoJo moderno. Stardust acompanha Jotaro Kujo, o adolescente mais estoico do mundo, enquanto ele e seus companheiros viajam pelo mundo até o Egito para dar um soco tão forte em Dio que ele explode. E depois dizem que animes não são arte...
A popularidade desse arco em particular é incomparável. Mesmo aqueles que não estão familiarizados com JoJo provavelmente já viram algum meme, imagem ou cena de Stardust Crusaders. É o arco que lançou mil memes, desde o "Yare yare daze" de Jotaro até as palhaçadas de parar o tempo de Dio. A luta final em especial por si só é um marco cultural, tem sacrificios, tem controle do tempo, tem rolo compressor sendo arremessado, absolute cinema. Dizem que Scorcese chorou ao assistir, true story.
De toda forma, o arco dos Cruzados da Poeira Estelar é tão popular que em 1998, a Capcom pegou toda a energia caótica de JoJo e a canalizou para um dos jogos de luta 2D mais estilosos já feitos. O jogo de arcade JoJo’s Bizarre Adventure capturou a essência de Stardust Crusaders, completo com habilidades de Stand e um estilo de arte que deu vida aos visuais extravagantes de Araki.
Ora, o que você tem quando coloca os homões fabulosos de Araki na engine de MARVEL VS CAPCOM: Clash of Superheroes? Fabulosidade turbo plus, é claro. Quero dizer, onde mais você poderia colocar um vampiro divo lutando contra um cachorro com uma manifestação fantasmagórica de sua força interior?
A mecânica do jogo foi bem feliz em traduzir as stands para um jogo de luta, enfatizando o gerenciamento das stands tanto quanto as habilidades de luta tradicionais. Não se trata apenas de quem consegue dar mais socos, mas de quão criativamente você conseguia usar as habilidades únicas da seu Stand. Isso, é claro, e o fato que ter num jogo da Capcom a representação em fidelidade do “Za Warudo!” de Dio ao "ORAORAORAORAORAORA” de Jotaro em uma época muito antes disso ser adaptado para o anime foi o sonho molhado de uma geração.
Bem, verdade que o jogo está mais preocupado em reproduzir todo o estilo dos personagens - o que ele faz com sucesso, porém isso vem ao custo do jogo ser desbalanceado horrivelmente onde mais de um personagem é quebrado, e alguns são tão quebrados que não tem nem como lutar contra eles. Sim, Pet Shop, eu estou olhando pra você.
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 061 (Abril de 1999)
EDIÇÃO 034 (Setembro de 1998)