O primeiro VANDAL HEARTS foi uma das gratas surpresas que eu tive nesse blog. Quer dizer, eu já sabia que esse é provavelmente o RPG Tático mais violento de todos os tempos dado que os personagens jorram sangue como se tivesse sido descoberto petroleo porque tinha visto no Stargame, mas o que eu NÃO sabia sobre o jogo foi bem mais interessante que isso.
Numa situação rara de acontecer, a capa japonesa é igual a americana, sendo a europeia a única diferente |
A boa notícia é que o segundo jogo dá um passo ousado à frente ao focar em temas mais pesados e introspectivos. Ele se aprofunda nas realidades vividas por camponeses e plebeus, explorando seu sofrimento e resiliência diante da guerra e da indiferença da aristocracia. Essas cenas são sinceras e muitas vezes ressoam com um senso corajoso de autenticidade, lançando uma luz interessante sobre o custo humano do cidadão comun durante as lutas pelo poder em um cenário medieval.
É uma perspectiva narrativa muito interessante ver a história contada pelos olhos do cidadão comum que não realmente se importa se o rei sentado no Trono é o João Pirocudo VI ou Zezínho Pega-Geral III, ele vai ter que trabalhar, pagar impostos e submeter aos caprichos dos nobres de qualquer forma. De igual modo, não faz tanta diferença se o reino se chama Berigenlandia do Leste ou do Oeste, nada disso resolve os seus problemas diários que são ter o que comer e trabalhar até não aguentar mais - "nacionalismo" é um luxo para nobrezinhos entediados que não tem problemas reais para lidar.
ISSO SOA REALMENTE ÓTIMO, SABE? É UMA ABORDAGEM INTERESSANTE E SOA BASTANTE COM THE WITCHER 3, MAS... ENTÃO QUAL É A NOTÍCIA RUIM?
Como assim?
UÉ, SE VOCÊ ABRE DIZENDO "A NOTICIA BOA É QUE...", ENTÃO DEVE TER UMA NOTÍCIA RUIM TAMBÉM
Ah sim, certo. Então, é, a notícia ruim é que.. bem, como eu vou colocar isso senão que a Konami não é realmente muito boa nisso, sabe? Quer dizer, não me entenda errado, o retrato das dificuldades dos plebeus é muito interessante... só que ela uma subtrama menor em comparação com o conto extenso e pouco inspirado de casas nobres, intriga política e uma narrativa de guerra muito longa. Infelizmente, esse foco prolongado no trono e na política de guerra não tem o respaldo de uma escrita interessante o suficiente pra te manter prestando atenção, o que faz o ritmo ser arrastado, e muitas batidas da história parecem filler, prejudicando os momentos genuinamente impactantes enraizados na situação das classes mais baixas.
De alguma forma, o jogo ficou mais pesado ainda. Embora os personagens não sangrem mais como uma esquete do Monthy Python, os temas são mais pesados. Visualmente, se o primeiro VANDAL HEARTS já era o RPG Tático mais brutal da quinta geração, a sequencia vai ainda mais ousada em direção a um território temático mais sombrio, ultrapassando os limites do que era típico de um jogo da era PS1. Saem os esguichos de sangue que pareciam saídos de uma esquete do Monthy Python e entra uma representação mais realista do que era um dos saques que aconteciam direto na idade média quando um exército tomava uma vila: fogo em tudo, homens mortos e mulheres estupradas
ESPERA, MULHERES O QUE?
Isso mesmo que eu disse, Jorge.
TÁ, DE FATO ISSO ACONTECIA FREQUENTEMENTE NA IDADE MÉDIA E EU NÃO ESTOU DUVIDANDO DISSO, MAS... ELES COLOCARAM ISSO EM UM JOGO DE PLAYSTATION 1?
Se não acredita em mim, veja com seus próprios olhos jorgicos:
Então... infelizmente essa gravitá da situação, mais uma vez, acaba prejudicada pelo ritmo e foco da narrativa. Embora o jogo comece com um forte impacto emocional e mostre o devastador preço humano da guerra, ele rapidamente muda sua atenção para um conto excessivamente longo e pouco envolvente de política medieval e lutas de poder nobres. O contraste entre a abertura angustiante e o enredo principal lento é gritante e frustrante, em vez de se aprofundar nas consequências pessoais e sociais de tal brutalidade, a narrativa fica atolada em intrigas políticas que não conseguem parecer tão impactantes ou interessantes.
O resultado é um jogo que tem o potencial de entregar uma história poderosa e emocionalmente ressonante, mas a desperdiça em um enredo principal que se arrasta . Os temas sombrios e os momentos chocantes são memoráveis, mas parecem isolados em vez de integrais à experiência geral. "Vandal Hearts II" merece crédito por sua ambição e disposição para explorar os cantos mais sombrios da guerra, mas luta para sustentar o peso emocional que inicialmente configura, deixando os jogadores com uma história que é bem menos do que o seu próprio potencial.
Mecanicamente, VH2 não se afasta muito da base de seu antecessor, mas seu sistema de classes personalizado customizaveis é... bem, estranho, para dizer o mínimo. Em vez de depender de um sistema de classes tradicional, o jogo vincula habilidades a armas em vez de personagens. Isso significa que a própria arma "aprende" as skills, e estas podem então ser transferidas para novas armas do mesmo tipo. Por exemplo, você pode transferir as skills de um arco antigo para um novo ou de uma adaga para outra.
Isso quer dizer que qualquer personagem que esteja equipado com a arma pode usar as skills, o que dá um certo grau de customização e liberdade a sua party - se você quiser um time só de casters, é só dar cetros para todo mundo, por exemplo. Eu não acho que isso é uma ideia ruim per se, mas não tem ocmo negar que introduz uma camada desnecessária de microgerenciamento. A necessidade frequente de transferir habilidades entre armas se torna uma tarefa incômoda, especialmente quando você adquire novos equipamentos. Não é nada que quebre o jogo, mas toda vez que você chega numa cidade nova a sensação de adquirir novos equipamentos e deixar seus bonecos mais fortes é frustração e não de alegria, dada a burocracia envolvida.
Mas, como eu disse, nada disso realmente quebra o jogo - pode ser esquisito, mas whatever, não vai matar ninguém. O que VAI matar alguém (e por alguem eu quero dizer seus bonecos no jogo, é claro) é a grande mudança minima que pra mim matou a diversão do jogo inteiramente. Esta na hora de falar do grande elefante branco na sala: o sistema de movimento simultâneo de Vandal Hearts II.
Essa mecânica única é talvez o aspecto mais divisivo do jogo e fundamentalmente remodela como as batalhas acontecem em relação a qualquer outro RPG Tático que eu conheça. Ao contrário do que é padrão em um RPG Tático, onde cada lado se reveza para mover suas unidades - ou no máximo os combatentes seguem uma ordem de iniciativa já determinada por atributos - aqui cada vez que você mexe um boneco seu o computador move um inimigo ao mesmo tempo. E você nunca sabe qual. Embora isso possa parecer inovador no papel, na prática, parece completamente em desacordo com os princípios básicos de um RPG tático — o que definitivamente não é uma coisa boa.
O problema que pode não ficar tão claro no papel mas devia ser óbvio no primeiro turno de jogo está na imprevisibilidade inerente que esse sistema introduz. RPGs táticos vivem e morrem pela estratégia, posicionamento e planejamento cuidadoso, mas essa mecânica de movimento simultâneo joga tudo isso na privada. Você pode tentar adivinhar para onde o inimigo irá, ou em que casa ele vai parar, mas não há garantia de que ele se moverá como esperado, muitas vezes resultando em ações desperdiçadas, unidades mal posicionadas ou até mesmo situações cômicas em que personagens e inimigos se movem desajeitadamente um ao redor do outro sem engajar. O que deveria ser um desafio de estratégia se torna um exercício de frustração, pois o sucesso depende mais de acertar no chute em como o adversário vai agir do que um planejamento habilidoso.
Quando você se move para acertar um adversário e dá o comando, tudo se resume a torcer para não ser esse o cara que vai agir ao mesmo tempo que vc e o nepomuceno não estar mais lá quando você chegar |
Esse sistema tira a graça justamente do aspecto mais satisfatório do gênero: a capacidade de controlar cuidadosamente o campo de batalha. Em vez de se sentir como um general fazendo movimentos calculados, você está apenas chutando a tentando adivinhar quem vai se mover para onde e reagindo a situações que nem sempre fazem sentido. Para um jogo que já é mecanicamente denso com seu sistema de habilidade com armas, essa camada de imprevisibilidade adiciona um nível de complexidade que, francamente, é bem contraproducente ao genero.
Em suma, embora o sistema de movimento simultâneo seja uma tentativa criativa de diferenciar "Vandal Hearts II" de outros RPGs táticos, ele não funciona bem no gênero. Ele sacrifica clareza e precisão — justamente as coisas divertidas do genero — em prol de um gimmick que torna o sistema de combate mais frustrante do que divertido.
Essa mecanica é tão sem pé nem cabeça, tão sem lé com cré, e transforma um jogo que deveria ser absolutamente delicinha - dado que mantem o ótimo esqueleto do primeiro jogo - a tal ponto que um usuario fez um MOD para tirar isso do jogo.
Você sabe que pisou muito no alpiste quando alguém se obriga a fazer um MOD para tirar a mecanica exclusiva que você inventou para esse jogo, e ainda sim esse é o jogo que VH2 é. É um jogo terrível, injogável? Não, pq como eu disse o esqueleto ainda é muito bom. Mas some essa mecanica pavorosa, uma história arrastada que esmaga as cenas interessantes e um sistema de microgerenciamento... bem, não é realmente surpresa que essa franquia ficou ONZE anos na geladeira antes de ganhar um jogo novo, e só ganhou pq o primeiro VANDAL HEARTS realmente é um dos melhores RPGs Táticos do PS1.
Como eu disse, não é um jogo caquético injogável, mas não tem como classificar Corações Vandalos 2 como outra coisa que senão um tremendo desapontamento.
MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 040 (Abril de 1999)
EDIÇÃO 043 (Agosto de 1999)
EDIÇÃO 053 (Fevereiro de 2000 - Semana 3)