Amigos, cidadãos, romanos, estamos aqui hoje para celebrar a coisa realmente importante dessa vida. Aquela coisa mágica e especial pela qual impérios caem e dancinhas celebrativas são criadas, o alfa e o omega da existencia. E essa coisa, é claro, é a confirmação que eu estava certo.
OH BOY, ESSE VAI SER UM DIA DAQUELES...
Veja, eu já disse uma, já disse, duas, já disse dezenas de vezes aqui que quando eu critico um jogo não é pq eu quero ser o descoladão metido que se acha muito foda achando tudo ruim e nada presta. Não. Quando eu critico um jogo, especialmente quando eu fico desapontado com um jogo, é pq eu sei que aquele jogo, naquela época e naquele contexto, podia ser melhor. E então quando sai uma continuação muito tempo depois adereçando os exatos pontos que eu levantei, é como se os produtores estivessem dizendo "ó, aquele cara tava certo".
Bem, hoje, mais uma vez, esse cara tava certo.
EU DISSE QUE IA SER UM DIA DAQUELES.
Quando eu falei sobre QUAKE, eu disse que o jogo era um acontecimento tecnico dentro do seu genero (e portanto na história dos videojogos), mas que o time estava tão ocupado em fazer o jogo funcionar que tudo mais na experiencia foi feito na base do "tanto faz, mete qualquer porcaria aí, ninguém liga, pewpewpew". O que pode ganhar o prêmio de abordagem mais USA-anos-90 de todos os tempos, mas é esse tipo de jogo que QUAKE é.
Então o que nós temos é uma versão 3D de DOOM, mas só o corpo e não o espirito. Não tem a mesma energia, não tem o mesmo pé na porta e soco na fuça de cramuião na cara, não tem o mesmo tesão. E enquanto pode parecer reclamar de um FPS não ter história ou atmosfera, eu vou repetir algo que eu sempre digo aqui: o jogo não é o que vc joga com seus dedos, o jogo que importa é o que acontece dentro da sua cabeça.
VOCÊ NUNC... NÃO, ESPERA, ISSO VC DIZ FREQUENTEMENTE MESMO, OLHA SÓ.
Veja, eu não estou pedindo para um FPS ser literatura russa com roteiros de 3478 páginas, e sim que dê algo para os jogadores se sentirem cool e badasses, que de algo para dizer "isso é foda pacaraí". Tecnicamente, não faz nenhuma diferença entre atirar em gelecas azuis em um labirinto sem texturas, mas EMOCIONALMENTE faz toda diferença atirar em demonios no fucking inferno. É sobre isso.
E essa é a parte que eu digo que os desenvolvedores da ID Software entenderam o meu ponto. Se QUAKE é tão "taca qualquer coisa aí, ninguém liga" que mal da pra saber contra o que você está lutando, em que diabos vc está atirando, a primeira coisa que eles fizeram em Quake 2 foi garantir que o jogador se sentisse alguém muito foda fazendo algo muito foda.
Pra começar, o jogo simplesmente joga fora a "história" não existente do primeiro jogo. Nah, aquela sopa de hospital não serviria mais então o que rola aqui é que a Terra está guerra contra uma raça alienígena conhecida como Strogg. Você é um fuzileiro naval chamado Bitterman e participa de uma missão conhecida como “Operação Alien Overlord”. A missão é impedir uma invasão Strogg da Terra, lançando um ataque preventivo contra seu planeta natal, Stroggos.
O que, no melhor espirito Tropas Estelares, termina tão bem quanto a premissa soa e os humanos são abatidos como moscas antes de conseguirem sequer pousar no planeta. Exceto, é claro, pelo nosso herói (até pq senão não tinha jogo) que toma um totozinho logo na saída e sua nave cai fora da landing zone - que é o que o faz escapar do moedor de carne e sobreviver. Saindo de sua cápsula, você é o único marine que sobrou e vai ter que avançar em linha reta pela citadela Strogg para concluir sua missão, com o blaster na mão, ódio na outra.
Então aqui você tem um objetivo claro, não apenas conceitualmente mas no próprio level design: uma estrutura de níveis progressiva, você sente que está indo de um lugar ao outro e abrindo seu caminho no tiro, porrada e bomba. E é desse tipo de coisa que eu estou falando quando digo que isso faltava no jogo anterior, sai a coisa de "tanto faz, qualquer coisa é qualquer coisa" e entra um objetivo bem definido com mapinha e tudo para mostrar o seu progresso tacando terror nas linhas de defesa stroggloditas.
Falando neles, os Strogg aqyu são uma mistura de monstruosidades biomecânicas que coletam soldados humanos para transforma-los em zumbis-ciborgues e aumentar suas próprias fileiras, o que novamente um conceito no qual eu consigo me pilhar pra meter pipoco. Zumbis ciborgues é algo no qual dá graça atirar, e é com isso que a gente vai.
Só o que torna os stroggs legais aqui não é apenas o conceito - estamos falando da ID Software e John Carmack, esperamos nada menos que maravilhas tecnicas! Então juntamente com sua aparência formidável, foram os pequenos detalhes adicionados ao Strogg que deram a Quake II muito mais apelo.
Pra começar, cada tipo de inimigo tem diferentes tendências e padrões de IA, o que fez com que alguns Strogg fossem capazes de se esquivar de seus tiros ou correr e se esconder para se reagrupar, eles também tinham animações exclusivas quando estavam feridos ou marcas de tiros personalizadas dependendo de onde vc o acertou.
Isso pode parecer basico em 2023, mas em 1997 um inimigo tomar um tiro na perna e ficar com a perna ferida era o estado-da-arte das novidades FPSsisticas. E de modo geral, Quake 2 tem uma variedade de inimigos maior até que os demonios de DOOM, onde não é raro os ciborgues-mutantes dos Strogg terem visuais únicos como mecanicas únicas. Por exemplo, o Parasita anexa uma “língua” em você e começa a drenar sua energia, e não a solta até que você o mate. Ou o Berserker que sempre parecia estar posicionado atrás de portas para te surpreender, gritando “Invasor!” antes de correr atrás de você incansavelmente para tentar esfaqueá-lo e martelá-lo até a morte - o que pode ser usado contra ele, já que ele sempre segue que nem um boi brabo pra cima de vc mesmo em buracos e beiradas.
Para adicionar um toque ainda mais único a cada tipo de Strogg, agora os inimigos tinham uma animação única quando estavam morrendo - como um Guarda disparando alguns tiros contra você antes de desabar, ou o minotauro que perde a cabeça e ainda dá uns tiros no modo "galinha sem cabeça" antes de ir jogar no Vasco. O que poderia ser resolvido transformando os inimigos em poças sangrentas antes que eles tivessem a chance, o que é algo extremamente satisfatório pra caceta, passa muito a sensação que você está tocando o terror no meio da base dos Strogg e o negócio aqui é dedo no Strogg e gritaria!
Obviamente, todas melhorias na engine que faziam o jogador dizer "puta merda, isso é muito maneiro" foram graças a John Carmack, que mais uma vez provou ser um gênio. A engine de Quake 2 é tão otimizada que não apenas conseguia colocar uma quantidade pornográfica de poligonos sem você precisar comprar um PC termonuclear da NASA, como ele foi além e fez mil e uma gambiarras programativas para ter Ray Tracing no jogo. Em 1997.
Tá, não era Ray Tracing de verdade (que é a coisa do jogo calcular o comportamento real da luz, algo que como você pode imaginar demanda MUITO poder de processamento já que - como o nome diz - envolve calcular o traçado de raios de luz), mas o jogo tem uma iluminação dinamica que deixou todo mundo e a mãe de todo mundo com o queixo no chão em 1997. Sério.
Coisas como a iluminação acompanhar os seus tiros...
Eu sei que vc já viu esse meme, mas o ponto que Quake 2 começou a implementar melhorou EXPONENCIALMENTE os FPS ao limar as partes chatas e deixar um jogo 100% focado no que interessa. |
"Ok, peguei a chave vermelha, onde diabos está a porta? Eu já estava lá embaixo? Droga, é melhor verificar novamente, talvez eu tenha perdido alguma coisa. Lá não... encontrei uma armadura e uma sala secreta que esqueci , ainda bem que verifiquei. O que eu estava fazendo? Chave vermelha, certo. Talvez esteja de volta ao início, porra, é uma longa caminhada... espere, o que aquele botão fez antes que eu apertei? Isso está relacionado?"
Edição 125 (Março de 1998)
Edição 048 (Março de 1998)