Era uma vez, em uma terra distante e mistica chamada Inglaterra, uma pequena empresa de jogos chamada Horrorsoft. Ano após ano, Horrorsoft trabalhou duro em pequenos jogos de adventure que ficaram relativamente conhecidos no Reino Unido mas não muito além disso. Na verdade nada além disso, é o tipo de coisa que os locais cresceram com ele mas os estrangeiros provavelmente nunca ouviram falar - tipo a Turma da Monica.
Estou falando de jogos do calibre de Elvira 1 e 2, Waxworks e Personal Nightmare. Como eu disse, não se sinta mal se você nunca ouviu falar deles. Os invernos vieram e passaram, e a pequena Horrorsoft em seu feudo local, sem medo dos poderosos juggernauts americanos do genero como os point'n click da LucasArts ou da Sierra On-Line. Mas um dia a pequena Horrorsoft se tornou ambiciosa, cansou do conforto oferecido pelo pequeno mercado local e passou a ansiar por algo novo para seu povo, um jogo com coragem, engenhosidade e resiliencia suficientes para sair por aí e conquistar o mundo.
Alguns jogos já nascem clássicos, já diria a Ação Games |
Então ela mudou seu nome para Adventuresoft, licenciou a “SCUMM engine” da LucasArts e passaram a trabalhar no que até hoje é provavelmente o point'n click mais britânico que você verá em sua vida (exceto talvez se um dia você ver um chamado "Doctor Who and the bloody crumpets"). Seja como for, foi assim que Simão, o Feiticeiro, nasceu ...
... e como você imaginar, não, ele não conquistou o mundo. Ou até sim, mais ou menos... porque enquanto é verdade que seria muito difícil encontrar um jogador de point'n clicks que nunca ouviu falar do filho pródigo de Adventuresoft... vamos dizer que esse jogo não ficou famoso pelos motivos que a empresa gostaria.
É bastante seguro dizer que Simon, o Feiticeiro, alcançou um status infame na comunidade de jogos graças a seus puzzles sem sentido, protagonista bem desagradável e humor que ... hã, vamos apenas dizer que nem todos os britanicos são o Monthy Python ou o Terry Pratchet, okay?
Mas antes de começar a julgar este jogo, eu tenho que dizer que ele tem algumas coisas a seu favor:
Do ponto de vista tecnico, o jogo não tem nenhum problema realmente - especialmente porque ele usa a engine dos jogos da LucasArts, então tudo funciona como deveria funcionar da forma como deveria funcionar. Mesmo os itens nos quais você precisa clicar nesse jogo não são muito dificeis de identificar no background porque esse é bem desenhado, ele é bem animado.
Não é como se você tivesse que aleatoriamente clicar no pixel 145a de uma tela escura, e o jogo é bonito (os gráficos parecem uma versão do homem pobre de THE SECRET OF MONKEY ISLAND. Não é "minha noooooossa que obra prima", mas para um jogo de um estúdio pequeno de um lugar que não é um polo dos videogames, okay, é bom o bastante.
Então os aspectos tecnicos definitivamente não são o problema aqui. O problema não é que eles não consigam fazer o jogo funcionar, isso eles conseguem muito bem, e sim o que eles decidiram colocar dentro do jogo uma vez que ele começou.
Claro, como eu disse o jogo parece bonito e tem sprites de primeira linha para um pequeno estúdio britanico. Claro, o jogo tem muita, muita dublagem (horas de dialogo falado, na verdade). E claro, existem dezenas de itens que você precisa combinar de várias maneiras para progredir. Parece bom, certo?
Então... não. Pra começar, a dublagem é irritante, leva uma eternidade para chegar ao ponto e se esforça tanto para ser engraçado que consegue ser genuinamente irritante. Olha caras, eu entendo. A comédia britanica tem uma grande reputação, mas as coisas são um pouquinho mais complicadas do que apenas falar com sotaque e ser cinico de uma forma obvia. Eu sei que não parece, mas tem.
Entretanto, essa é toda a concepção de humor aqui e... bem, esse não é um jogo divertido realmente. Quer dizer, eu entendo que as referencias a Senhor dos Anéis devem ter feito a alegria de nerds britanicos em 1994, mas como eu disse nascer na Inglaterra não quer dizer que você é o Terry Pratchet. Ou mesmo bom, e esse é o caso aqui.
Mas okay, o jogo poderia viver mesmo com o humor não funcionando se os puzzles fosse bons, mas... holy shit, que bagunça que isso é também. O grande número de itens colecionaveis apenas piora um defeito comum dos point'n clicks da época que é de basear em saltos de lógica que não fazem o menor sentido, se desviando tanto de qualquer coisa que se aproxime da realidade observável ou mesmo da lógica de desenho animado que o jogo não pode ser jogado sem um walkthrough.
Pra que três telas de itens, meu deus... |
Se fosse um jogo com menos itens até você poderia tentar "usar todos os itens em todos os lugares", o que por si só já seria uma merda, mas fica pior quando a lista de itens é bem grande. Então você não pode avançar no jogo por dedução porque a solução dos puzzles não faz sentido (o que seria o ideal), e nem pela tentativa e erro. E um point'n click que precisa de um detonado para ser jogado é um jogo ruim no meu livro.
Por exemplo, em um ponto, um troll bloqueia uma ponte e a solução é usar um apito que você ganhou antes para convocar alguém para movê-lo. O problema é que você não pode simplesmente usar o apito. Você tem que primeiro entrar em uma conversa , e então entrar em uma tree de dialogo especifica - uma a qual você já deve ter passado antes - para só então no dialogo especifico usar o apito, e é um dialogo bem aleatório, não é uma "deixa" nem nada.
Então mesmo que você saiba que o apito derrota o troll, ainda tem que adivinhar em qual linha de dialogo vai usar o item que você não sabia que precisava usar. Não tem lógica por trás de nada. Falando nisso, que tal a parte do jogo em que você usa balas de menta para cuspir fogo e derreter um boneco de neve mágico bloqueando o caminho? Ou usar um ímã para coletar um item de ouro, sendo que ouro não é magnético? Ou jogar uma melancia em um saxo para ganhar o sax e usar ele para fazer um gigante adormecido derrubar uma árvore? Apesar de todo o ódio que SAM & MAX HIT THE ROAD merece por seus puzzles aleatórios, nem eles são TÃO aleatórios
MAS BEM, O "HUMOR" É TERRÍVEL, OS PUZZLES SÃO TÃO ALEATÓRIOS QUE VOCÊ VAI TER MELHOR SORTE BATENDO A CEBEÇA NO TECLADO... MAS PELO MENOS A HISTÓRIA ENTÃO É INTERESSANTE, NÉ?
Então... não é ruim.
UFA, PELO MENOS ISSO!
Sim, pq pra história ser "ruim" teria que pelo menos ter uma! Simão o bruxão não tem história alguma, não tem senso de progressão, não tem nada. Você encontra NPCs e resolve qualquer coisa que precisa que se resolva (naquele metodo DILIÇA que eu descrevi antes), o que te permite avançar um pouco até o próximo NPC e resolver a proxima treta. Mas não tem um proposito nenhum no jogo, não tem um objetivo, nada. Você apenas vai.
Se você achou esse minuto e pouco chato, bem vindo as ultimas quatro horas da minha vida
Enquanto isso é possível de ser feito, um jogo pode - tecnicamente - ser estripado apenas a sua mecanica nua e crua e apenas jogar quests porque sim, bem, você pode reparar que ninguém faz isso, nem mesmo os jogos mais preguiçosos de porcos de Amiga, mesmo os jogos da Ocean tentam providenciar um contexto, uma razão de você estar fazendo o que faz. Uma razão porca, sim. Uma tentativa falha, certamente. Mas eles ao menos tentam, porque isso é importante e até a Ocean sabe disso!
O jogo que você joga na sua cabeça é mais importante que o jogo que você joga nos seus dedos, é realmente empalicedor que um point'n click, de todos os generos, falhe em perceber isso. Sério gente, isso é o básico do básico!
Por causa de jogos como esse, é por isso! |
De modo geral é impressionante o quão pouco esse jogo consegue acertar em tudo. E ainda sim tudo que o jogo acerta basicamente veio pronto dos jogos das LucasArts. Mas fora a parte mecanica e tecnica esse point'n click consegue fracassar em tudo: dialogos, design dos puzzles e mesmo ter ao menos qualquer proposito geral.
Não é surpresa que esse jogo jamais tenha feito sucesso fora da Inglaterra, mais impressionante que isso é que esse jogo tenha feito sucesso na Inglaterra em primeiro lugar. Mas até então, eu já vi temporadas ruins o suficiente de Doctor Who que decisões ruins é meio que uma ciência na Inglaterra.
MATÉRIA NA GAMERS
Edição 003