domingo, 27 de junho de 2021

[MEGA DRIVE] BEYOND OASIS, ou "The Story of Thor" no Japão/Europa (Dezembro de 1994) [#714]

Sega CD. 32X. Sega CD 32X. Game Gear. Activator. Sega Channel. Mega Drive 2. Mega Drive 3. SONIC & KNUCKLES com encaixe para retrocompatibilidade. Blast Processing. Bits. Nomad. Netuno. CDX. 

O que separou a Nintendo da SEGA em meados dos anos 90? Bem, além do fato de Mega Dive se parecer com um monstro de Frankenstein, era porque a Nintendo tinha foco e visão. O SNES apenas tratava dos negócios, não precisava de truques ou add-ons. Sente a bunda a na porcaria da cadeira e não saia daí enquanto não fizer um jogo bom, é isso que a Nintendo fazia e é isso que fazia as crianças quererem videogames.

Como de costume, a capa japonesa bem menos DARQUI TREVOSA DUMAUU que a americana...

Enquanto isso a Sega tentava reinventar a roda, fazendo tudo concebível pelo homem exceto por uma coisa: focar em fazer ÓTIMOS jogos. Quando você domina o mercado com mais de 90% do market share, como era o caso do SNES no Japão, você pode se dar ao luxo de tirar tempo e recursos para diversificar e tentar novas coisas - como foi o Satella View do SNES, e ainda sim só no Japão. Porém todo seu império se constrói sobre marketing sem sustentação, você deveria primeiro fazer o básico do básico antes de tentar vender "a próxima grande moda" e a Sega falhava em ver isso.

Eis aqui um dado interessante pra vocês: NUNCA, e eu disse NUNCA o console mais poderoso de uma geração liderou em vendas. O Nintendinho era inferior ao TurboGrafx-16, o SNES era inferior ao Neo Geo e ao Megazord Sega CD 32X, o Playstation era inferior ao Nintendo 64, o PS2 era inferior ao Gamecube e ao Xbox, o PS3 e o Xbox 360 tomaram de relho do Wii, e o PS4 tinha menos especificações que o Xbox Chosen One of Doom (embora essa geração em diante não conte muito porque a Microsoft mudou o foco e ela não está mais preocupada em vender consoles, mas isso é uma longa discussão para outro dia). Como eu disse, NUNCA isso funcionou e não acho que mudará algum dia.

... e por fim a inevitavel capa europeia because ART!

O que faz um console ter sucesso é uma combinação de jogos e preço, é simples assim realmente. E frequentemente para seres humanos, nada é mais complicado do que apenas fazer o simples. Especialmente para a Sega.

Mas e se não fosse assim, e se a Sega tentasse vencer essa guerra apenas sentando a porcaria da bunda na cadeira e fazendo jogos, simples assim? Beyond Oasis é um vislumbre de como as coisas poderiam ter sido para a Sega.


Beyond Oasis é um Action RPG feito pelo time de Yuzo Koshiro dentro da Sega, o Ancient e que é mais famoso por STREETS OF RAGE 2 e STREETS OF RAGE 3 - embora eu vos adianto que ninguém levará uma rabonetada de canguru na cara durante esse jogo, infelizmente.

Sob muitos aspectos, é provavelmente a mais bem-sucedida das MUITAS tentativas da SEGA de preencher o buraco em forma de Zelda em seu line-up, e consegue isso basicamente não tentando imitar Zelda e sim fazendo a sua própria coisa. Uau, que ideia louca, quem poderia imaginar que você apenas fazer o seu jogo honestamente sem pensar em nenhum truque ou campanha de marketing primeiro daria certo, quem poderia imaginar...


Principe Ali (é esse aqui), guerreiro, arqueólogo e loiro, segue a convenção oficial das princesas Disney de 1991 e portanto odiava a rotina enfadonha de vida real. Você sabe, essa coisa de ter três refeições por dia e saneamento básico ao contrário de 95% da população da época (ou 100% se você for a Jasmine em seu palácio literalmente feito de ouro enquanto as crianças literalmente passam fome do outro lado do muro do castelo). 

Para escapar do tédio, o principe Ali (reina aqui) costumava explorar em busca de tesouros. Não porque ele precisava, apenas pra passar o tempo mesmo. Em uma dessas escavações arqueológicas, ele tropeçou em um achado muito incomum. Em meio a uma pilha de joias e ouro, ele encontrou um bracelete estranho.

O quão estranho, você pergunta?


Okay, isso é realmente estranho. E imagino que todo mundo sabe que sair por aí equipando qualquer objeto provevalmente amaldiçoado que apenas decidiu falar com você pode não ser a melhor das ideias. Felizmente nosso herói é mais esperto que isso e não vai sair por aí metendo a mão em...


... você não é o biscoitinho mais esperto do pacote, é meu jovem?

Mas okay, o que possivelmente de pior pode acontecer por meter a mão em um objeto que pode ou não ser amaldiçoado?


É, bem, tem isso. Mas será esse o destino de nosso herói... ou será algo pior ainda?


Algo pior ainda, é claro. Dentro do bracelete vive o espírito de um véio matungueiro que lhe diz que existe um outro bracelete, de prata, e que dentro dele vive um espirito maligno que tentará destruir o mundo caso alguém seja burro o suficiente para sair metendo a mão em braceletes falantes. 

Como isso parece ser algum tipo de esporte olímpico por essas bandas, vamos apenas assumir que isso já aconteceu.


E então o espirito do bracelete te começa a contar a história dele, porque se tem um véio pafungueiro uma história será contada queira você, quer não. Especialmente se não quiser. Bem, saiba você que a muito tempo atrás dois magos chamados Reharl e Agito tiveram a excelente ideia de sair metendo a mão em braceletes mágicos exatamente como nosso herói está fazendo agora.

A batalha entre eles os destruiu e suas almas ficaram presas nos braceletes, e agora Agito quer sua vingaaaaaaaaança contra... hã, bem, ele não pode se vingar da sua própria burrice eu suponho, então destruir o mundo é a segunda melhor coisa que ele conseguiu pensar. Seja como for, você ainda mora nesse mundo até a última vez que foi checado então podemos assumir que a destruição dele é diretamente contra os seus interesses imediatos.

Então certo, temos um mundo para salvar. E como isso funciona na prática?


A primeira comparação que as pessoas fazem desse jogo é com Legend of Zelda, e é fácil ver o porque já que é um Action RPG com essa camera de cima. Porém jogando o jogo, o que menos pessoas fazem, você vê que isso não é exatamente acurado. Beyond Oasis esta mais para um beat'm up com visão de cima, o que dado sua equipe ter sido responsável pelos dois últimos Streets of Rage não é realmente surpreendente.

Isso quer dizer que seu herói, o Principe Ali (fabulous he) anda por aí metendo combos de socos e/ou facadas em transeuntes desavisados, essa é a essencia principal do jogo. E dado o histórico já citado da equipe em fazer bons beat'm ups, essa parte é bastante satisfatória. A detecção de colisão é boa, os efeitos sonoros de porradas é gratificante e apenas meter o pau em monstros com alpargatas nos pés é algo que sempre podemos contar para animar o nosso dia. 

Esse jogo também pega umas aulas dos populares jogos de luta da época, dando ao Príncipe Ali (handsome is he) movimentos especiais que podem ser executados com a combinação certa de botões e comandos direcionais. Ao contrário do que é comum no genero, Ali pode usar esses movimentos desde o início do jogo e não através de pegar nenhum power up nem nada, você só precisa saber os comandos corretos para fazer uso deles.

Ai corre bergueeeee


Então no que essencialmente esse jogo se propõe a fazer ele funciona bem e isso é uma coisa positiva - o que você pode tomar por garantido, mas então é um jogo da Sega, acontece menos do que você esperaria... né SONIC THE HEDGEHOG?

Em adição as sequencias de soquinhos e facadinhas que você pode dar beat'mupinicamente, nosso Ali magia também pode pegar com alcance e de dano maior, porém limitadas. Eu não sei porque diabos a ESPADA FLAMEJANTE DA MORTE quebra depois de ser usada 10 vezes mas a adaguinha com que nosso herói começa o jogo é indestrutível. Tungstênio, eu suponho.

O curioso é que embora esse jogo seja frequentemente comparado por Legend of Zelda, muito anos depois o próprio Zelda que incorporou essa mecanica de armas descartáveis em Legend of Zelda - O Bafo do Selvagem.



Outra coisa que o Zelda de quase vinte e cinco anos depois incorporou desse Beyond Oasis é aquilo que é a maior qualidade desse jogo: o uso de habilidades aliado ao level design. Explico: sua manopla do infinito do homem pobre nesse jogo te dá a habilidade de controlar 4 espiritos, cada um desbloqueado após sua respectiva dungeon.

Então tem o espirito da água, do fogo, das sombras e das plantas, que quando summonados ficam andando pela tela e concedem certas habilidades especiais ao herói. A coisa é que essas habilidades são a chave para resolução dos puzzles das dungeons: tipo tem uma barreira de fogo que te impede de avançar, então você precisa que o espirito da água dispare agua para apaga-la. Ou tem um item que você precisa pegar mas não alcança, então você precisa que o espirito das sombras se estique para pegar pra vc.

Claro, os espiritos ainda tem habilidades de combate (o espirito da água cura, o do fogo da soco, o das plantas ataca tudo que estiver na sua area de ação e o das sombras gasta sua mana quando você for atingido ao invés de vc perder HP), mas o interessante mesmo são suas habilidades para avançar na dungeon porque não é apenas abrir o menu e selecionar o poder, não, é bem mais interessante que isso.

Aqui é que você summona os espiritos usando o poder do bracelete em ambientes do cenário. Vc tem que usar em uma planta para summonar o espirito planta, ou na agua, fogo ou em uma superficie reflexiva para summonar o espirito das sombras (um espelho, cristal ou algo que o valha). O que isso tem de especial é que o jogo usa isso de forma inteligente e você precisa pensar um tanto quanto fora da caixa para summonar os espiritos.

Por exemplo, tem uma parte que você precisa do espirito do fogo para avançar mas não tem nenhuma fonte de fogo por perto. Ora, ninguém disse que você não pode criar o seu próprio fogo atirando bombas, flechas explosivas ou usar uma espada flamejante em tochas apagadas - ou mesmo em um inimigo, taque o safado em chamas e use-o para summonar o espirito, pq não?

Graças aos gráficos avançados de Beyond Oasis, este é o mais realista... hã, seja lá o que isso for, que já vimos em um jogo!

Da mesma forma o jogo te recompensa por ser esperto pensando em formas criativas de encontrar corpos d'água ou superficies reflexivas para summonar os outros espiritos e isso resulta num level design de dungeons muito bom, que você realmente se diverte explorando como você pode usar seus poderes de forma inteligente para avançar. 

Esse é o ponto que eu me referia que o Bafo do Selvagem usou tão bem anos depois, o não tem um script de como ativar as coisas e sim um conjunto de regras fisicas que funcionam naquele mundo e você pode cortar caminho sendo esperto a respeito disso (tipo largando suas espadas de metal no chão alinhadas para conduzir eletricidade em uma parte que de outra forma vc teria que dar uma puta volta para faze-lo). Beyond Oasis faz uma versão prototipo disso, e eu realmente tenho que dizer que em diverti pra caralho com o level design das dungeons desse jogo.

É disso que eu estou falando, Sega! É assim que você vence, fazendo bons jogos com ideias criativas! Um beat'm up com masmorras Zelda-like e uso inteligente do cenário para ativar seus poderes? Sim, eu quero!

We don't take kindkly to your types in here!

Adicione a isso gráficos estupendamente bonitos com personagens bem grandes na tela (que não atrapalha o gameplay, essa parte é importante e frequentemente esquecida  nos jogos da Sega) e temos algo que você poderia visualizar quando pensa no Mega Drive dando perto de 100% da sua capacidade. Considerando que esse jogo foi feito no ultimo do Mega Drive, eu diria que visualmente ele entrega aquil que se espera de um console em fim de ciclo.

OLHA SÓ, ENTÃO ESSE JOGO É UM THE BEST OF FÁCIL, NÃO É?

Então... não, não é.

Veja, eu não-ironicamente aprecio tudo que a Sega fez aqui e o que esse jogo poderia ter sido. Esse é um jogo que eu realmente queria gostar dele, e eu gosto dele, mas então antes de encerrar eu realmente preciso falar sobre as outras decisões de design que arrastam a qualidade do jogo para baixo e impedem que ele chegue a um nível ímpar de excelencia.

Infelizmente Beyond Oasis tem várias coisinhas que impedem que a experiencia de jogar esse jogo fosse tão divertida quanto suas premissas permitiriam que ele o fosse, e não são problemas pequenos.

Apesar do jogo tecnicamente ser um Action RPG isso é mais por mecanica do que por espirito, porque esse jogo mal tem dialogos nele ou qualquer elemento narrativo que o seja

Em primeiro lugar, a Sega decidiu que seria uma boa, ótima ideia adicionar um limite de tempo ao jogo. Pois é. Porque funciona assim: quando você summona um espírito ele começa a consumir sua barra de mana apenas por existir e se você usar algum dos poderes dele consome mais mana ainda. Sem mana você não pode summonar o espírito e sem o espírito você não pode passar do puzzle.

Então na prática isso é um limite de tempo e eu não preciso dizer o quanto isso diminui a experiencia de explorar uma dungeon. Verdade, você pode dispensar o espírito a qualquer momento para economizar mana, mas como você não pode summonar ele em qualquer lugar então isso mais atrapalha que ajuda. 

Esse espírito-planta atacando todo mundo dentro da area de ataque dela é bastante simpática

Para recuperar mana você tem que grindar inimigos para que eles dropem itens que recuperam SP, e a última coisa que eu penso quando imagino um jogo de ação sobre exploração é ter que farmar itens com um drop rate menor do que o bom senso recomendaria que fosse. Alias por falar em grindar, o método do jogo para aumentar a barra de HP de Ali também é irritante porque depende de corações dropados por inimigos que desaparecem após alguns segundos. O que tem de errado com passagens secretas, itens escondidos que aumentam o HP e coisas assim? Alias o jogo TEM passagens secretas e salas extras nas dungeons, pq não apenas colocar os power ups nesses lugares?

Sério mesmo que colocar como drop grindável itens colecionaveis foi o melhor que vocês conseguiram pensar? Sério mesmo?



Por falar em falta de bom senso, tem também que faltam botões no controle do Mega Drive. Claro, posteriormente a Sega percebeu a merda que fez lançando um controle de 3 botões e lançou um controle de 6 botões, mas a verdade é que os jogos não podem se fiar muito nisso sob o risco de alienar boa parte do potencial publico que não adquiriu (mais esse) acessório necessário para jogar os jogos da Sega. Isso quer dizer que na grande maioria dos jogos os três botões adicionais do controle alternativo do Mega Drive são usados apenas para coisas acessórias de modo que você possa conseguir jogar o jogo mesmo com apenas 3 botões. 

O que nesse caso quer dizer que uma das esquisitices deste jogo é que você usa o mesmo botão para se agachar e para pular. Você precisa pressionar e segurar o botão para se agachar e ou apertar uma vez rapidamente para pular. Suponho que não precise dizer o quanto torna o timing de seus saltos complicados, com você se agachando quando queria pular e vice-versa. Esse problema fica pior quando o jogo começa a realmente colocar sequencias de saltos dificeis mais pra frente de modo que qualquer sequencia de salto em BO não é nada senão sofrimento e dor. Sofrimento e dor, eu te digo.

Se precisar alcançar algum lugar distante, É COM VOCê SOMBRA

Para adicionar ofensa a injúria, muitos inimigos que exigem que você se agache e ataque - o que torna trechos do combate bastante irritantes também. Some a isso que o controle do Mega Drive é bem pouco ergonomico e definitivamente não foi feito para serem apertados dois botões ao mesmo tempo e tá feita a merda.

E por fim, mas não menos importante, esse jogo é definitivamente mais dificil do que ele precisaria ser. A Sega da América tinha essa política de fazer os jogos mais dificeis para as crianças não terminarem ele em um fim de semana alugado e se forçarem a comprar eles, e esse é mais uma vitima junto com DYNAMITE HEADDY e STREETS OF RAGE 3.

A coisa do jogo é que ele é uma batalha de atrição entre seus inimigos e os seus recursos, e mais cedo do que tarde você vai ver que não tem recursos suficientes para enfrentar as salas cheias de inimigos e especialmente os chefes que atacam quase a tela toda que esse jogo manda. A unica forma de ter mana, itens de cura e armas (já que elas gastam nesse jogo) suficientes é ter que de tempos em tempos parar e ficar grindando tipo uma meia hora para encher seus recursos - e mesmo assim é bastante dificil.


Essa é uma ofensa tão séria ao fluxo do jogo que ele só não estraga a porra toda porque ao menos você pode salvar em quase qualquer lugar, então uma vez que você encheu seus recursos pode salvar e tentar mais uma run na dungeon. Imagine se você tivesse que grindar após CADA tentativa, aí seria para atirar esse cartucho na parede, na moral.

Enfim, esse jogo chegou muito,  muito perto de ser uma obra-prima. Faltou foco, bom senso e um tadinho de sorte (se não tivesse sido lançado em um sistema que disputava espaço com outros seis sistemas diferentes na mesma empresa, por exemplo)

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