Não é segredo pra ninguém dizer que o 32X foi um fracasso. Não é um segredo pra vc, não é segredo pra mim, não era segredo sequer pra gente nos anos 90. Nós eramos burros, mas não TÃO burros de modo que mesmo nessa época nós sabiamos que essa barca era furada. A Tec Toy podia comprar toda “boa vontade” da Ação Games com anuncios até cair a bunda, mas não tinha como esconder que isso não ia dar certo - como não deu.
Os desenvolvedores que trabalharam com o 32X sabiam disso, eles sabia que além de fazer um bom jogo seu primeiro objetivo era vender a bagaça em primeiro lugar. O primeiro já é muito dificil, o segundo beira o impossíve. Alguns dias atrás eu faleei de METAL HEADque era uma demo tecnica para mostrar o que o 32X era capaz de fazer em gráficos 3D. O que meio que era tudo que ele era, mais uma demo do que um jogo realmente.
Eu não faço ideia do pq a capa brasileira achou que precisava editar os óculos escuros do personagem da capa americana |
Tempo é mais ou menos a mesma proposta, já que ele foi feito muito mais para ostentar as capacidades tecnicas do 32X - só que aqui é demonstrar o que ele pode fazer por um jogo 2D.
O resultado é que Tempo é o jogo de plataforma 2D mais bonito e bem animado que eu consigo lembrar em muito, muito tempo (trocadilho não intencional). As animações são fluídas a um ponto que não deve muito para os videogames 32 bits de verdade, as cores vibrantes fazem você esquecer completamente que está jogando um Mega Drive com acessório e o jogo usa cada gota de potencia do hardware para colocar o máximo de elementos vibrantes e psicodélicos na tela que eles podia colocar. O que é bastante coisa.
Embora apenas a capa japonesa passe uma ideia real do jogo, como de costume |
A animação do nosso herói dançando ao final da fase é algo que parece até mesmo impossível que esteja rodando em um Mega Drive, como eu disse é a versão 2D plataforma para o que METAL HEAD tentou fazer com o 3D.
Porém não são apenas as capacidades tecnicas desse jogo que tem ser elogiadas, as escolhas artisticas também são muito, muito felizes. A começar pelo protagonista do jogo que é genuinamente legal. Eu sou testeminha que os anos 90 viraram mundos e fundos tentando fazer seus protagonistas parecerem cool e cheios de ATITUDE, e é justamente onde tantos Bubsys e Aero Acro-bast falharam: eles tentam demais. Tempo não, ele não parece tentar demais, ele apenas parece legal.
Yo homies, Tempo is in the house tonight!
No começo de RADICAL REX o jogo abre com o protagonista dançando ao som de rap e isso é uma das coisas mais cringe ever. O começo de Tempo é bem parecido, exceto que você não deseja que um novo tipo de metal ultra duro seja inventado para você esmagar a cara desse grilo. Como eu disse, ele é legal sem tentar demais. Qual a diferença?
A diferença é a atitude do personagem, mas não a ATITUDE ANOS 90 SEU COROA, e sim o sentido real da palavra: ao ver Tempo passar pelos níveis, você tem a sensação de que ele está realmente se divertindo em estar aqui. Quando ele dança, parece mais que ele apenas está no clima e menos que é algo que um comite de executivos decidiu que seria legal após ver pesquisas de mercado. As animações reforçam esse sentimento: os movimentos soltos e elásticos do Tempo fazem ele parecer ser um carinha muito maneiro.
Do mesmo modo, você consegue sentir o quanto os desenvolvedores estavam se divertindo fazendo esse jogo e ele passa essa aura de legal no design também. Por exemplo, o power up de invencibilidade em jogos de plataforma é marcado por uma musiquinha diferente tocar enquanto dura a invencibilidade desde os tempos do tantantantaramtantanta do Super Mario Bros.
Aqui Tempo começa a cantar iodelei enquanto vacas chovem na tela. Pq?
Pq é divertido, simples assim. E isso é algo que dá pra sentir, faz diferença para o consumidor (mesmo que ele não saiba que faz).
Então nos aspectos tecnicos e visuais esse jogo é absolutamente delicioso. A única coisa que realmente atrapalha esse jogo é que, bem, ele é um jogo... e nisso ele não é muito bom realmente.
Pra começar, apesar do tema músical e de ritmo, no jogo Tempo se com a velocidade de uma lesma agorafobica. Embora você possa dar três toques para frente (pq não dois?) para correr, raramente existe espaço para tal nas plataforams com a velocidade que os controles respondem. Então Tempo é um jogo bem, beeeem lento de uma forma totalmente dissociativa do tema do jogo.
Uhu, oh yeah, vai Tempo, vai Tempo, vai Tempo!
Um jogo com o tema de tempo seria melhor, não, ele exige um gameplay a altura. Um level design com fluxo e ritmo, que mantivesse o jogo indo no groove e na balada. Tempo, o jogo, não poderia ser mais longe disso. Adicione a isso que o level design é todo troncho e parece saído de um dos infindos jogos de Amiga portados para o Mega Drive. Infelizmente o posicionamento das plataformas nesse jogo e o design geral dos níveis lembra muito, muito mesmo WAYNE'S WORLD e isso acende todo tipo de sinal de alerta.
A coisa só não é tão ruim quanto poderia ser porque o jogo tem setas apontando a direção que você tem que ir. Claro, um jogo que precisa colocar setas apontando o caminho ao invés do caminho ser algo organico e intuitivo ao jogador não é algo que eu posso chamar de bom level design, mas ao menos o jogo pode ser jogado. Não é o ideal, mas funciona.
Ao menos “funciona” é mais do que pode ser dito da hit detection desse jogo, porque eu não vou nem começar a tentar entender o que esse jogo considera como pular na cabeça do inimigo (que é a sua principal forma de ataque) e apenas tocar no corpo dele e levar o hit.
Em contrapartida, a contagem de pontos desse jogo é o som mais irritante que eu só ouvi em toda minha vida de videogames. O chip de som do Mega Drive já é ruim, mas usar as capacidades do 32X pra transformar ele em arma viola a convenção de Genebra!
Eu até entendo o personagem ser bem floaty pq ele é um grilo, e ajuda que tenha um botão para você flutuar no ar para manobrar os seus pulos, mas essa disposição de plataformas, detecção de hit pavorosa e personagem flutuante nos saltos tem muito cara de jogo de Amiga no Mega Drive (sendo que jogos de Amiga são tipo 78,34% da biblioteca do console da Sega). Um jogo de Amiga super colorido e bem animado, mas não menos Amiga por causa disso.
Mas tudo isso eu poderia relevar em prol do carisma do jogo, não fosse o fato que, bem, o jogo definitivamente não se ajuda MESMO. Isso porque a coisa que mais pega, o problema pelo qual Tempo é mais lembrado - e as reviews da época já apontavam isso - é que o jogo não tem absolutamente nenhuma mecanica única.
Um botão ele pula, outro ele chuta (com um alcance bem merda e uma detecção de hit bem fraca, como já foi discutido) e o terceiro botão é um ataque que paralisa os inimigos. O que é basicamente o mesmo setup de RADICAL REX. E em 1995 isso já havia sido feito a exaustão, de modo que não tem nada particularmente interessante no gameplay desse jogo.
Muitas coisas voando no background ao mesmo tempo é meio confuso, mas... frutas com boca dançando? A mescalina vai bem, né? |
Enfim, Tempo tem uma animação foi suave, expressiva, nítida e clara. Os backgrounds são uma confusão surreal, inconstante e saltitante de camadas coloridas. Tudo sobre o visual desse jogo é inegavelmente descolado e colorido, mas não tem como esconder o fato que o jogo é bastante simplista, um pouco repetitivo e um produto da última leva de um genero que na geração seguinte se tornaria moribundo.
O que é uma pena, eu realmente queria gostar desse jogo mais do que eu gostei. O personagem, a arte, a animação e o estranho senso de humor proporcionam são uma experiência memorável, pena que não tenha um jogo incrível por trás para sustentar isso.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 083
Edição 083