quarta-feira, 25 de agosto de 2021

[MEGA] EXOSQUAD (Maio de 1995) [#752]


Como eu já comentei algumas vezes aqui, da passagem dos anos 80 para os anos 90 houve uma grande mudança no paradigma da animação ocidental. Por uma mudança de legislação o modelo de negócios dos cartoons mudou, passando dos tenebrosos comerciais de brinquedos dos anos 80 para projetos mais autorais nos anos 90. O que foi uma indescritível evolução.

Isso quer dizer que eles acertavam sempre? Eu não diria que eles sequer acertavam na maior parte das vezes, mas ao menos eles tentavam. Como videogames e desenhos animados eram intimamente ligados nessa época, já houveram diversas oportunidades que eu falei desse tema.

Isso nos leva a uma pergunta bastante pertinente: o que foi feito desse pessoal dos cartoons-comerciais de brinquedo? Eles viraram espuma do mar? Se mudaram para a Noruega e estão vendendo casas pré-montadas? Bem, não. Eles continuaram nesse negócio e se adaptaram aos novos tempos.


Mas... como você vende brinquedos através de um projeto com concepções artisticas que faça as crianças legitimamente quererem os brinquedos por consequencia do quanto elas gostam do programa? Ora, super simples, sequer um inconivente: é algo que o Japão faz em base diaria a... o que? Pelo menos 50 anos já.

Existem, saiba você, basicamente três formas pela qual um anime se paga. A primeira é através da venda de DVDs (e mais recentemente de streaming), a segunda é que o anime foi feito para promover as vendas de um manga/light novel (frequentemente esses tem uma temporada e são abandonados, pois já fizeram a sua função de propaganda) e por fim tem os que são para vender brinquedos.

Nessa categoria eu não acho que preciso me aprofundar porque o Brasil teve um crash course nisso durante os anos 90:


Eu sei que pode parecer estranho a uma primeira vista, mas essas marcas criadas para vender brinquedo são tratadas com bastante carinho por seus desenvolvedores para que o publico continue se importando ao longo dos anos. Tanto que Kamen Rider continua aí vendendo brinquedos firme e forte desde os anos 70, e nesse filão talvez nenhum anime seja tão iconico da cultura japonesa quanto Gundam. De 1979 pra cá existem 40 séries e filmes diferentes de Gundam, todos sempre associados a vender linhas de brinquedos colecionaveis, e sem nenhum sinal de parar.

Nas Olimpiadas agora de 2021, a prova de escalada foi realizada sob o jugo Gundam Unicorn (da série de 2010)

Gundam é um caso particularmente curioso, porque geralmente são histórias sobre guerra (bem, uma guerra futurista travada na base de robozões gigantes, mas não menos guerra por conta disso) e o Japão não é exatamente confortável para falar sobre guerras - por razões que são bastante óbvias e que eu também já discuti aqui outras vezes.

O resultado é que diferente das obras americanas onde a guerra é geralmente glorificada e exaltada como algo badass, em Gundam a guerra é uma tragédia que nenhum lado realmente vence no fim - o que é um visão bem mais japonesa da coisa. Claro, sendo japonês as vezes isso é feito de forma excessivamente brega, mas raramente é leviano e apenas pew-pew-pew robozões pshhhhhhuuuuuahh kabuuuuum. Gundam pode ser brega, e frequentemente o é, mas raramente é leviano.

Alias atualmente eu estou assistindo Mobile Suit Gundam: Blood Iron Orphans e está se tornando um dos meus animes favoritos de todos os tempos.

Tá, mas porque eu estou falando de Gundam aqui? Bem, porque Gundam (e Macross, que não vai numa pegada tão diferente assim) foi a grande inspiração do produtor Jeff Segal. Ele pensou "hey, se eles estão fazendo isso no Japão a 50 anos e vendendo brinquedos desse jeito, acho que não custa tentar fazer isso aqui também, né?".

Então Exosquad (que até onde eu sei nunca passou no Brasil) é um cartoon de 1993 que é mais ou menos a interpretação americana de animes como Gundam e Macross.

Vc fez um inimigo neste dia, BBC

A  história de Exosquad parece simples a principio: o Exosquad é uma força de defesa da Terra no ano 2119 que lida com ameaças globais, especialmente dos malignos mutantes Neosapiens - que agem como piratas espaciais e terroristas atacando as coisas dos humaninhos.

NÃO PARECE REALMENTE COMPLEXO COLOCANDO ASSIM, SABE. BASICAMENTE É UMA ORGANIZAÇÃO DO MAL QUE O ODEIA O BEM POR MOTIVO NENHUM QUE SENÃO SER MAL, IGUAL A TODO E QUALQUER CARTOON DOS ANOS 80

Então... não é exatamente isso, porque é importante entender quem são os "Neosapiens". Veja, a história de passa no ano 2119 e nos últimos cem anos a raça humana explorou os recursos do sistema solar - especialmente as colonias mineradoras em Venus e Marte. Só que a raça humana não simplesmente terraformou esses planetas para poder trabalhar lá pq eles não tem esse tipo de tecnologia nesse universo.

Ao invés disso uma variação de seres humanos mutantes foi desenvolvida em laboratório para sobreviver as intempéries do espaço e servir como força de trabalho não-voluntária.

ENTÃO OS NEOSAPIENS FORAM CRIADOS PARA SEREM ESCRAVOS DOS HUMANOS.

Basicamente isso. Ao longo do último século as revoltas dos Neosapiens (sempre massacradas graças a tecnologia das exoarmaduras dos humanos) fizeram com que os humanos concluíssem que não valia mais o custo e deixassem isso pra lá, mas também não é como se os Neosapiens tivessem sido integrados a sociedade com direitos plenos. Ufa, ainda bem que nada parecido nunca aconteceu no nosso mundo, já imaginou que horrível seria?



... pois é. Isso se torna mais abrasivo ainda quando o desenho abre seu backstory dizendo "foi a era dourada da humanidade, usando incriveis exo-esqueletos chamados E-Frames, nós colonizamos Venus e marte com sucesso". Hã, criar uma raça de seres conscientes com o puro proposito de escravidão para trabalhos forçados ... onde esta a "era dourada" mesmo?

ENTÃO BASICAMENTE, OS HUMANOS SÃO OS VILÕES DA HISTÓRIA?


Então... não é tão simples assim também. Verdade que os Neosapiens não estão errados em seus motivos, mas a forma que eles tentam alcançar isso são menos do que ideais. Terrorismo e guerra, basicamente, o que sempre envolve uma caralhada de gente morrendo que não tem nada haver com a história e que nunca fez nada contra os Neosapiens.

Cara, é complicado. E o show aborda as coisas dessa maneira, ele apresenta uma visão realista da guerra: muitos personagens morrem em combate, as operações militares são cuidadosamente planejadas e é feito reconhecimento com antecedência e os efeitos psicológicos da guerra são explorados. Por exemplo, alguns episódios se passam detalhando  o reconhecimento de Vênus pelo Exofleet antes de sua recaptura, a liberação real e a defesa da primeira tentativa de reconquista dos Neosapiens. Além disso, mesmo após Vênus ser retomada pelos humanos, vários episódios lidam com a resistência venusiana remanescente e as forças Neosapien que se esconderam em Vênus, recusando-se a se render enquanto praticam atos de terrorismo aguardando reforços.

Como dizer que você está assistindo um cartoon da primeira metade dos anos 90 sem mencionar que você está assistindo um cartoon da primeira metade dos anos 90? Dica: mullets.


Não apenas a relação da guerra entre os humanos e os neosapiens é complexa, mas a própria relação entre os próprios humanos. A rivalidade dentro do próprio Exofleet é retratada no episódio da segunda temporada, The Last Man, quando tropas de salto expressam irritação com os pilotos de e-frame que são vistos como tendo tratamento preferencial e por consequencias são arrogantes. A resistência humana em está ressentida por ter sido abandonada pelo Exofleet - que fugiu quando os Neosapiens tomaram o planeta - e coopera de má vontade quando o Esquadrão Able se infiltra na Terra ocupada e em Vênus.

À medida que a série continua, o líder dos Neosapiens, Phaeton, degenera física e mentalmente devido a uma doença, e suas tendências autodestrutivas e egoístas vêm à tona conforme ele desliza para o que em mãos inferiores pode ser a comida padrão do vilão de desenho animado: a vingança pessoal obstinada contra o herói principal e, eventualmente, um desejo de destruir seu futuro em vez de conquistá-lo. Mas no Exosquad isso se torna uma espiral descendente assustadora, com os Neosapiens se tornando mais violentos e extremos ainda.

Não me segura que eu vou lá dar na cara daquela desqualificada!


Claro, tem que realmente ser considerado que o Japão faz isso a meio século e os americanos estavam nas primeiras tentativas de fazer animação mais profunda, então o resultado final é meio... duro. Os personagens não são taaaaaaao bem escritos assim, os dialogos as vezes lembram GI Joe e... bem, não tem como dizer isso, a animação é feia. Cartoons dos anos 90 frequentemente não são esteticamente agradaveis de se olhar e Exosquad não é exceção. 

Nem vou entrar no mérito dos personagens que são anos 90 pra caralho (não em um bom sentido), mas basta ver o próprio brinquedo que é vendido - as armaduras Exo. Porra, olha só os bonecos de Gundam são lindos, chocolatantes, eu quero um Gundam Barbatos de Olinda gigante pra chamar de meu!


... já o Exosquad... pra o que eu to olhando, exatamente? Parece que eu to vendo um piratex do paraguai do power lifter de Alien 2!


Que design feio da porra!

Então, é, Exosquad tem fundamentos muito bem intencionados, mas a execução ... é o que vc esperaria de algo feito por quem não tem experiencia nenhuma com a coisa. É o caso que se pode dizer que eles estavam tentando fazer uma coisa nova mas só conheciam ferramentas velhas, então eu não acho errado a tentativa em si, todo mundo tem que começar de algum lugar.

Até porque é injusto comparar uma industria que estava a recem tentando sua primeira animação mais madura com outra que já faz isso a vinte anos e que no mesmissimo ano de 1995 estava lançando Neon Genesis Evangelion. A tentativa foi totalmente válida, eu só não posso mentir e dizer que foi perfeito.


Agora falando em perfeito... pefeição não tem nada haver com a virá a seguir, pq é claro que um cartoon dos anos 90 teria o seu jogo correspodente caça-níqueis e esse jogo de Mega Drive é uma coisinha a parte, viu.


A história do jogo é... bem, ela foi feita por alguém que com certeza nunca assistiu um episódio da série. Porque o plot do jogo é que os Neosapiens voltaram no tempo 70 anos para tentar vencer a primeira rebelião. O problema é que não tem nada de viagens no tempo no cartoon, então eles meio que meteram um plot de Timecop que se encaixa em absolutamente qualquer coisa. Eu não faço ideia do porque ExoSquad virou Timecop, mas as coisas são como elas são.

O jogo se divide em três modos de jogo diferentes, que se alteram entre si - e como você pode esperar, nem todos tem o mesmo nível de qualidade. Ou jogabilidade, para esse proposito.


Você começa com um shmup que melhor pode ser definido como "segure B e torça pelo melhor". O jogo é basicamente uma versão do homem pobre de Space Harrier - que já nos anos 80 não era um jogo muito interessante. Você tem que basicamente sobreviver as ondas de coisas que são atiradas na sua cara, com seu tiro (daí o botão B) fazendo bem pouco para ajudar a diminuir a pressão.

É frustrante e quase não é um jogo - é o tipo de coisa que você esperaria encontrar naqueles minigames da Tiger Eletronics - e eu tenho que me perguntar não apenas por que um título que fez tanto com batalhas aéreas mecânicas teve um problema aqui, como porque eles decidiram abrir o jogo com a sua pior parte.


O segundo tipo de fase que tem nesse jogo são as fases de ... eu ia dizer "plataforma", mas não tem realmente nenhum pulo. Eu também pensei em dizer "Run'n gun", mas vc não corre realmente... então é um "walk'n gun", eu acho?

Bem, de qualquer maneira a boa noticia é que isso é melhor que a fase de tiro acima, a noticia ruim é que isso não quer dizer muita coisa realmente. E por "não muita coisa", eu estou falando literalmente isso:


Uau, eles levaram no máximo uns 15 minutos bolando esse jogo, heim?

O terceiro modo de jogo é o melhor dos três (não que isso seja muito dificil) e o que mais parece um jogo de verdade: é um bom e velho modulo de violencia 1x1. Embora não seja nenhum KILLER INSTINCT, definitivamente é um jogo de luta razoavel, os golpes especiais disparam misseis e serras com uma certa confiabilidade. A fisica é lenta, mas sensação de peso é satisfatória para armor suits.


O que é estranho é que esse jogo tem um modo versus em que dá pra jogar as fases de luta, mas por algum motivo isso está escondido dentro do menu de opções. E de qualquer forma não ajuda muito no jogo em si, o problema é que essa fase só surge com quase uma hora de jogo (que dura uma hora e meia para terminar) e tem apenas duas ou três lutas. Então definitivamente não é algo que salva o jogo.

Sabe o que esse jogo para Mega Drive parece? Aqueles trocendos jogos que eram só uma coleção de minigames colados juntos que abarrotaram o inicio da vida do 3DO. E isso não é algo bom a se dizer sobre um jogo, suponho que eu não preciso te dizer isso.

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