terça-feira, 19 de maio de 2020

[AÇÃO GAMES 046] SENGOKU DENSHOU (Arcade, 1991) [#375]




Nos anos 90, havia uma guerra declara pelo controle dos arcades. Considerando que eram locais de pura zona de bocada insalubre a vida humana, não seria exagero imaginar que era uma guerra literal com pipoco de bala e corpos cobrindo o chão.

Felizmente era uma guerra apenas simbólica, e os participantes desta disputa eram os titãs dos arcades Capcom e SNK. A SNK foi a única verdadeira competição da Capcom no gênero de jogos de luta (com exceção de Mortal Kombat, porém este só era popular no ocidente).



O jogo acabou não sendo lançado nos Estados Unidos, mas julgando que essa seria a capa, eu diria que foi para o melhor. Quer dizer, eu entendo que colocar o jovem Trump e o jovem Datena tem o seu público, mas ainda sim...
Todos os jogos que a Capcom fazia, a SNK criava sua própria versão desse jogo ou vice-versa. A Capcom fez Street Fighter, SNK fez Fatal Fury. A Capcom fez shmup de segunda guerra mundial, 1943, a SNK fez Ghost Pilots. A SNK fez Kizuna Encounter, que introduziu o combate entre equipes nos jogos de luta, a Capcom fez os jogos da série Marvel Vs.

E assim foi até a segunda metade da decada, quando os arcades começaram a perder popularidade no ocidente - o que demorou bastante, dado o golpe que arcades são contra o jogador. Só por curiosidade, no Japão arcades ainda são bastante populares mas mais porque eles fornecem qualidades que não podem ser reproduzidas por consoles domésticos - tipo misturar jogo de luta com card game, aí você pode montar seu “baralho de luta” e usar no scanner da máquina para ganhar nível, golpes ou personagens, por exemplo.


Fliperamas, um lugar tão boca brava que nem COVID-19 se criava lá.

Mas voltando a Capcom vs SNK (ironicamente, em 1999 saiu um jogo com esse nome em uma parceria das duas para tentar reavivar a industria dos arcades que definhava no ocidente), esses jogos normalmente eram mais ou menos de nível similar. Eu pessoalmente gosto mais de Street Fighter do que Fatal Fury, mas não acho que seja nenhum absurdo quem prefere o jogo da SNK.

Eles eram mais ou menos equivalentes, com uma exceção. Só teve uma área em que a SNK simplesmente não conseguiu chegar perto da Capcom, apesar de todas as suas tentativas, e essa foi no campo dos beat-em-ups. A primeira tentativa da SNK no Neo Geo, Burning Fight, foi um péssimo ripoff de Final Fight, e logo ao lado de Legend of Success Joe como um dos piores jogos de Neo Geo que a SNK já produziu. Enquanto isso, a Capcom estava desenvolvendo jogos incríveis como Final Fight, Captain Commando, Alien vs Predador e The Punisher.

E a segunda tentativa da SNK de emplacar um beat’m up foi justamente esse Sengoku - chamado de Sengoky Denshou no port para SNES.




Nossa história começa há 400 anos, quando havia um poderoso senhor da guerra que amava destruição. Sério, a introdução não diz que ele queria dominar o mundo nem nada, ele só queria era foder com a porra toda mesmo. Aparentemente, destruir a porra toda não era grande coisa porque apenas 2 samurais foram contra ele para deter seus planos malignos. Ou o cara era um mocorongo e dois samurais mais do que sobrava, jamais saberemos.

Antes de morrer, entretanto, ele proferiu suas palavras finais. Que na verdade era um spell de ressurreição, o que deve ter feito os samurais se sentirem como idiotas. De qualquer forma, o vilão vilanico do mal setou que ele regressaria em 400 anos e com ajuda do Louco (o jogo não faz nenhuma outra menção a ele, imagino que seja o da Turma da Monica) ele concretizaria seu plano de tocar terror nas bacurinhas.


Castelão do mal voando e tocando o terror. Ou como eles chamam no Japão, terça-feira.

Bem, 400 anos se passaram e a profecia se tornou realidade. O tal voltou tocando terror... e novamente ninguém ligou para um castelo flutuante soltando raios da morte, porque no Japão isso deve ser só terça-feira. Mais uma vez, apenas dois homens tomaram para si a missão de socar o FDP de volta para o além, preferencialmente sem deixar ele dizer nenhuma últimas palavras dessa vez.

Estes bravos heróis são ninguém menos que Ninja Dave e Cowboy Kev. Sim, esses são os nomes deles, e de fato são nomes tão bobocas que na versão de SNES mudaram os nomes para Dan e Bill.

Sabe, agora que me ocorreu que o nome desse vil vilão não é mencionado em lugar nenhum, em momento algum. Uau, você tá botando vontade pra caralho nesse jogo heim SNK, puta merda... Não é atoa que só alguém do calibre de Ninja Dave e Cowboy Kev se disporiam a tretar com um sacripantas sem nome como você!


De longe a melhor coisa do jogo, a risada do vilão chapado é aquelas que ecoa gostosa no arcade no ultimo volume e você podia dizer que tinha um fliperama do outro lado do continente. É um som bem característico de arcade daquela época, tão nostalgico

Em teoria, Sengoku é bastante do seu beat’m up tradicional: você anda para a direita e soca inimigos tematicamente japoneses, porém a SNK tentou adicionar um tempero nesse feijão e criou um sistema de Orbs e transformações. Porque maldito seja o dia que um japones não adorar alguma coisa que alguém diz HENSHIN, eu te digo!
ORB PIC

As orbes são dropadas pelos inimigos e são o único item que existe nesse jogo já que elas servem desde energia (ainda prefiro o frangão no tonel, se quer saber) até armas, podendo dar uma katana, duas ou a espada do He-Man.




A parte da transformação foi um pouco mais elaborada que isso: alguns inimigos derrotados concedem “espiritos” que podem ser incorporados durante um minuto (o tempo para de contar quando seu personagem morre e mesmo quando você precisa colocar outra ficha, a transformação não é “comida” - pelo menos isso).

A grande diferença é que na forma transformada você não ganha espadas das orbes, e sim magias. E jogar um beat’m com um personagem que dá ataque a distancia sempre é uma vantagem que não pode ser tomada levianamente.

Então, na teoria, essa coisa das transformações não é ruim e dá um mojo interessante ao jogo.




Na prática, a teoria é outra.

Apesar de toda a boa intenção da sua originalidade, Sengoku não consegue escapar ao fato que é um jogo bastante medíocre com grandes falhas em quase todas as camadas de seu design. O mais proeminente (e mais importante para um beat’m up) é o seu sistema de combate.

Embora as armas e os personagens alternativos sejam legais no papel, simplesmente não funciona como beat’m up. Você não pode acertar um combo de golpes nos seus inimigos como em qualquer outro jogo do genero. Isso porque aqui cada soco empurra o adversário para trás, o que não é problema com os muitos inimigos que morrem com um golpe só, mas a coisa degringola quando surgem inimigos com mais HP porque o combate consiste basicamente em acertar alguém uma vez, ir atras dele e depois atingi-lo novamente depois de alguns momentos. Tudo isso torna o ritmo do jogo beeeeem lento e arrastado, de modo que Sengoku tem quase o dobro de duração do que deveria ter se fosse um beat’m um de ritmo normal.




Os gráficos também são bastante fracos para um arcade de 1991, mesmo naquele ano os fliperamas já faziam BEM melhor que isso. Os gráficos são com cores desbotadas e os sprites dos personagens, principalmente os dos jogadores, são rígidos e desajeitados, com enormes torsos superiores e pernas minúsculas. Parece um arcade dos anos 80 isso. O único efeito legal no jogo é quando você corta os inimigos com a espada, eles voam para trás com um corte enorme no peito e isso é visualmente legal. Discutivelmente, a única coisa visualmente legal no jogo.

Como já dá para esperar, a detecção de hit é tosca e o alcance dos personagens questionável - a exceção do cachorro, que fica com um alcance de ataque injogavel a menos que você encha o rabo dele de magias.


Embora os gráficos caídaços, ao menos o design dos chefes é bastante criativo. De um jeito muito japones, claro.

No geral, a SNK não parece ter colocado muito esforço nesse primeiro Sengoku. O jogo ainda teve duas continuações que supostamente são mais inspiradas, porque eu não vejo como poderiam ser menos. Quer dizer, é jogavel na melhor das hipóteses, mas simplesmente não segura uma vela para nenhum de seus contemporâneos da Capcom ou Konami, o que realmente é uma pena, pois apresenta muitas idéias legais e originais ao gênero.

Esse jogo ainda foi portado para o Sega CD apenas no Japão, e é um port bastante preciso, embora os gráficos tenham ainda menos cores por causa da limitação de hardware do Mega Drive e os tempos de loading quando você troca de plano no meio da fase (vai da Terra para o mundo espiritual e o cenário muda inteiramente, isso acontece frequentemente) sejam irritantes.




Mas ainda é ok. O mesmo não pode ser dito, no entanto, do port para Super Famicom (o jogo nunca foi lançado no ocidente) da Data East que é absolutamente péssimo. É menos um port e mais um jogo programado do zero tentando imitar Final Fight e gráficos com alguma inspiração no jogo original.

O sistema de orbes para power-up e transformações foram simplificados numa coisa só, todos os gráficos foram completamente redesenhados e, de alguma forma, parecem muito piores. Se o jogo já parecia datado em 91 quando saiu no arcade, quando saiu para SNES em 93 com gráficos piores é doloroso de se assistir. Como dá pra ver na imagem acima, o jogo tenta imitar muito Final Fight e agora os inimigos têm barras de vida e levam alguns hits para matar, mas é mais um primo de Chernobyl do jogo da Capcom para SNES que já não é essas coisas - um exemplo de como o jogo pisa no tomate é que existem apenas QUATRO tipos de inimigos o jogo inteiro. Quatro. Pra vc ver o tamanho do ferro.

O que já não era lá essas coisas ficou ó, uma bosta.

PREVIEW NA EDIÇÃO 055
(sim, a Ação Games esqueceu que já tinha feito matéria sobre esse jogo quase um ano antes)