domingo, 17 de maio de 2020

[AÇÃO GAMES 050] ACTRAISER 2 (SNES, 1993) [#373]




Desde os primordios da sua incepção, os videojogos sofrem de uma grande divisão cultural no amago da sua criação: ocidente vs oriente. Isso porque existe uma divisão muito grande entre o que os jogadores esperam e acham divertido em um jogo. No Japão são muito populares os RPGs, jogos de estratégia, jogos que envolvem grindind ou comem uma quantidade enorme de tempo. De modo geral, os japoneses dos anos 80/90 acreditavm que os videogames deveriam ser jogados com a cabeça.

Já nos US and A, os americanos tem uma visão diferente do que faz um jogo divertido. Para esses lados, é tiro, porrada e bomba. Jogos de esporte e jogos de ação são a regra para esses lados, a ideia é que jogos devem ser jogados com os dedos. Por isso mesmo, jogos de estratégia e RPGs eram e ainda são até hoje uma coisa bem de nicho no ocidente. Por melhor que seja um RPG (como Persona 5, por exemplo), ele nunca vai ter os numeros de venda do FIFA do ano, ou do Call of Duty genérico lançado esse ano.




Essa divisão brutal no entendimento do que um videojogo deve ser pode ser vista frequentemente nas capas dos jogos, quando a capa americana do jogo tenta DEMAIS ser radical, edgy, maneira e descolada porque totalmente é uma coisa irada e não de criança. Ou seja, um banho de insegurança. No Japão eles não tem esse problema, exatamente. Tem outros, mas não esse.


Alisia Dragoon, por exemplo, tem uma arte de capa lindissima no Japão. No ocidente acharam que precisaria de mais RADICAL POWER BROOOO

Não é incomum vermos esse efeito na adaptação de jogos para o ocidente, e até mesmo na forma que jogos são feitos: visando o (bem maior) mercado ocidental, muitos elementos são feitos de maneira não tão ao gosto dos japoneses. E talvez nenhum exemplo mais clássico disso seja ActRiser e sua continuação.

ActRiser foi um dos jogos da lineup lançamento do Super Nintendo, e um bem diferente na verdade. Ele é metade administração de cidades/recursos, jogo de plataforma. Você sabe, se você sempre achou que Sim City seria MAIS LEGAL se o prefeito saísse na porrada com demonios de tempos em tempos, ActRiser provavelmente é o seu jogo.

Isso porque nesse jogo você joga como DEUS (chamado apenas de “The Master” na tradução por causa da politica da Nintendo de não envolver elementos religiosos nos jogos, sendo a versão japonesa ok com isso apenas porque o Japão está cagando para as religiões Abrahamicas), e deve ajudar o desenvolvimento do seu povo concedendo uma benção aqui, fazendo uma chuvinha ali, coisas normais na vida de Deus, sacumé.



Só que de tempos em tempos o CAPIROTO e seus minions trevosos aprontam umas tretas e você tem que descer na Terra para sentar o laço na gangue do INIMIGO, porque é assim que Deus rola. Então esse é ActRaiser, metade Sim City, metade jogo de plataforma.

Então para sua continuação, você poderia imaginar que a Enix (hoje parte da Square-Enix) trabalharia nesse conceito e refinaria a formula, certo? Bem, é, sobre isso...

A capa japonesa do jogo foca menos em que você vai jogar com um avatar divino marombão e sim apenas no cenário. Lame, nii-chan.


Visando abocanhar um publico maior no ocidente, a Enix abandonou complemente essa coisa careta e lame de estratégia e ter que pensar porque iuuck, WE DON’T TAKE YOUR KINDLY YOUR TYPES HERE! Como eu disse no começo do texto, esses elementos não eram exatamente popular com as crianças ocidentais na época. O resultado é que ActRiser 2 abandonou inteiramente seus elementos de gerenciamento de recursos e se focou 100% na coisa do jogo de plataforma porque não queremos isso de pensar, queremos homões de tanguinha besuntados em suor! Isso sim que é a nossa geração sexualmente insegura exige!

Mas bem, além do foco inteiro nos abs do avatar de Deus que controlamos nesse jogo, o que mais ele oferece?



No papel, ActRiser 2 parece o jogo perfeito.

Imagine o seguinte: você está andando por uma cidade submersa situada nas costas de uma tartaruga gigantesca. Recentemente, os infelizes moradores se transformaram em pedra pela mão cruel dos seguidores do capiroto dispostos a ressucita-lo (após sua vitória sobre ele no jogo anterior) - seus corpos espalhados pelas ruas, braços erguidos em uma oração final pela salvação. 

Somente você pode ser o anjo vingador deles - aquele que os libertará de um destino cruel e dara vida a essas pessoas novamente. Cortando seu caminho através de demonios em um campo de batalha de fogo. Ao longe, passando por um batalhão de navios voadores, fica uma gigantesca fortaleza. Você deve chegar ao topo e entrar em um combate mortal com o rei de uma cidade próxima - um gigante vestido com armadura e possuído por um demônio. Ao entrar na mente de outro rei controlado por demônios, você é forçado a pegar em armas contra alucinações vis e pesadelos tomados formas. Sobreviva a todos os obstáculos macabros criados pelo poder horrível das trevas e você poderá almejar libertar aquela região do jugo do mal.



E isso não é nem um terço das maravilhas exibidas em ActRaiser 2. Treze níveis, com cenários maravilhosamente desenhados, altamente criativos, todos adequados para batalhas épicas entre o bem e o mal, criando o que facilmente poderia ser considerado o jogo mais bonito lançado em qualquer um dos sistemas de 16 bits até então.

Sério, eu não tenho uma única reclamação contra a apresentação estética do ActRaiser 2 - de fato, é um jogo que figura fácil em qualquer lista de jogo mais bonito do Super Nintendo. É um jogo tão bonito, de fato, que uma parte de mim realmente gostaria que eu pudesse simplesmente fechar essa review agora dizendo: “Este jogo é maravilhoso e você tem que jogar isso!"


A sua plataforma te ataca enquanto espinhos caem do teto porque foda-se você!

Embora eu possa, de fato, fazer isso não mudaria o fato que seria uma tremenda fodenda mentira porque a beleza deste jogo é apenas superficial. Tirando a aparência espetacular e o que resta é um dos jogos de plataforma mais falhos e frustrantes que já tive a fortuna não tão boa de experimentar.

ActRaiser 2 se passa logo após os eventos do primeiro jogo. Os generais do demônio caído Tanzra devastaram a terra para trazer seu mestre de volta. Você deve embarcar em uma turnê mundial para salvar as pessoas desse ataque demoníaco indesejado antes que sua conspiração diabólica se concretize. O que é mais fácil falar do que fazer: você logo vai perceber que esse é um jogo difícil.



Quero dizer, insamente dificil: o nível de dificuldade “Fácil” é mais difícil que a maioria do modo dificl dos outros jogos, e os níveis “Normal” e “Difícil” são capazes de fazer os jogadores mais experientes largarem os videogames e assinarem a revista Marie Claire. 

Ah, e caso você tenha a pachorra de jogar no fácil, a Enix ainda te manda tomar na raba ao você não lutar contra o verdadeiro chefe final e apenas é instruído a tomar uma dose de vergonha na cara e jogar o jogo normalmente quando tiver tomado jeito de homem. Pessoalmente eu seria um pouco mais aberto a essa sugestão se a dificuldade do jogo não fosse artificialmente inflada por um controle de personagem ruim, além de uma série de inimigos baratos.



Vamos falar do gameplay então. Para as partes do jogo que envolvem você se mover para a esquerda ou direita e atacar inimigos na sua frente ou usar algumas das magias mais simples, as coisas fluem razoavelmente bem. Mas quando o jogo exige você fazer várias coisas ao mesmo tempo, tudo desmorona. Por exemplo, para saltar com sucesso de uma plataforma para outra, é provável que você precise utilizar o salto duplo do Mestre. O problema é que o comando do pulo duplo é praticamente o mesmo do salto planando que é dificil de controlar, então um virar o outro é muito fácil. E, se de alguma forma você realmente fizer um pouso bem-sucedido, você ainda vai deslizar e provavelmente errar a plataforma de qualquer jeito.

Agora, pense no quão cansativo isso é quando um salto duplo absolutamente perfeito tem que ser executado. No início do jogo, esse problema tende a surgir apenas em situações opcionais nas quais você pode obter um item de energia restauração de mana - mas, à medida que avança, esses saltos são obrigatórios. Falha resultando em morte instantanea. E, à medida que o jogo avança mais, você se vê obrigado a dar mais e mais saltos duplos enquanto as plataformas diminuem constantemente de tamanho - o que fez com que meu nível de frustração subisse a um ponto que não deve ser saudável. Ah, e “quase” não conta em ActRaiser 2. Não posso citar o número de vezes que senti que consegui dar um salto dificil apenas para assistir o Mestre encostar o pixel do pé na borda e depois despencar até a morte. Realmente faz você se perguntar como esse animal se tornou uma figura divina para os habitantes deste mundo...



Com tudo isso contra você, a última coisa que você precisaria é que o jogo coloque constantemente monstros nos lugares mais atrapalhantes possíveis, mas é isso que você encontrará em praticamente todos os níveis. Você pode contar com muitos desses saltos difíceis para serem ainda mais difíceis devido à presença de um inimigo estratégicamente colocado - ou, à medida que avança no jogo, que se materializa enquanto você está no ar, dando a você pouca (quando alguma) chance de escapar ileso.

E se os inimigos colocados nos piores lugares possíveis não acabarem com o seu dia, a quantidade massiva de inimigos nesse jogo por si só o fará. Veja, não tem nada errado atulhar a tela com inimigos, desde que você dê ferramentas ao jogador para lutar de volta. Certamente vocês não fizeram o personagem do jogador extremamente lento em comparação a tudo que se move na tela, ou então precisar de um milhão de hits para matar um simples inimigo, não é, Enix? ENIX?!



E então, se você tiver sorte o suficiente para sobreviver a todos esses saltos e inimigos inconvenientemente posicionados, este jogo tem toneladas de lutas contra chefes que servem para ilustrar o quão bom o ActRaiser 2 poderia ter sido com um pouco mais de esforço. Embora pareçam visualmente incriveis, simplesmente não tem equilíbrio nessas lutas. Você massacra um oponente infeliz com um punhado de ataques mágicos ou assiste o Mestre ter sua bunda divina chutada pela combinação de um inimigo quase indestrutível que não dá intervalo nos ataques com controles ruins.

Por exemplo, para vencer o demônio de fogo do nível vulcânico, você deve atacar cuidadosamente seu escudo de fogo sem encostar nele (o alcance do seu ataque não é muito longo, apenas para ajudar) e, em seguida, causar o máximo de dano possível antes que a proteção seja reformada .... enquanto salta de uma pedra caindo para a seguinte porque a tela vai descendo. Esta poderia ter sido uma luta divertida e inovadora, mas é impossível com os controles ruins e o seu personagem lento. Cês fazem umas coisas de fuder mesmo, pqp...



Com ótimos gráficos, ótimo som e aprimorando o gameplay criativo do primeiro jogo, essa continuação realmente tinha o potencial de ser uma ótima sequência. Mas a tentativa de agradar o publico americano nos brindou com controles frustrantes, inimigos baratos e dificuldade infernal, todo o potencial para este jogo e a franquia Actraiser morreu em uma tacada só. Parabens a todos os envolvidos!

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 050



Edição 134 (Dezembro de 1998)




MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 055 (Outubro de 1998)