quarta-feira, 27 de maio de 2020

[AÇÃO GAMES 047] GUNSTAR HEROES (Mega Drive, 1993) [#383]




Essa semana mesmo eu joguei Dinosaurs for Hire e comentei que era um run’n gun que pega uma ideia interessante (DINOSSEROS merceários - ou mafioso, para a Ação Games é a mesma coisa) e consegue transformar isso na coisa menos criativa e mais genérica ever. E nem é um genérico decente, é um genérico com uma pilha de problemas. Pois bem, não é que hoje eu vou falar de um jogo que faz justamente o contrário? Pega uma ideia absolutamente genérica e faz o melhor que pode para ser criativa com ela?

Por isso, vamos começar do começo.





Nas celebres palavras da filosofa moderna Ivete Sangalo, “Meu amor, olha só hoje o sol não apareceu: é o fim da aventura humana na Terra”. O mundo estava chegando ao fim. Uma organização maligna criou a arma definitiva, uma inteligencia artificial conhecida como Prata Dourada, também chamado de “o Deus da Ruína” pelos íntimos, para destruir as cidades da Terra a partir da lua. Os defensores da Terra, os Gunstars (vermelho, azul, verde e amarelo) vendo a Terra se transformar em um inferno de chamas e oferecedores de cartão Renner lutaram alimentados pelo poder da fúria justa tokusatsuniana em uma batalha sem esperança contra o  invencível Prata Dourada.

Depois de uma longa e árdua batalha e de muitas frases de efeito, os Gunstar derrotaram o maligno Deus da Ruína. Para garantir que ele nunca ressuscitasse, eles selaram seu corpo na lua e pegaram as quatro jóias que o alimentavam e as jogaram em locais diferentes na Terra. Podiam aproveitar que eles estavam no espaço e só jogado ela na direção do Sol? Podiam, mas aí não ia ter jogo também né.

Enfim, os Gunstars gravemente feridos não tem mais forças, os Gunstars venceram, mas ao custo de quase perderem suas próprias vidas no processo. Sem forças, eles entraram em sono criogenico deixando o futuro da Terra com nada senão a esperança de que a próxima geração fosse menos mocoronga do que criar uma IA do mal. Séculos se passaram e a batalha dos Gunstars contra o Deus da Destruição que reside na Lua se tornou uma lenda, e depois de quase um milenio já era uma profecia: “Reviva o Deus que dorme na lua, e ele guiará as pessoas justas à utopia."

Hã, não era beeeeem essa a mensagem gente, mas ainda tá melhor do que os cristãos entenderam da Biblia né...

Golden Silver be like "nah nah nanaaa". Real mature.
O general Gray, comandante da ditadura que se autodenominava "Império", acreditou nesta profecia e tentou cumpri-la porque afinal todo ditador acredita que eles são os justos da história. Para isso, ele enviou uma expedição para a lua em uma nave de guerra chamada "Arca". O objetivo da expedição era procurar as jóias que despertariam Deus e todos seriam felizes para sempre. Foi então que o líder da expedição o Dr. Brown, encontrou as capsulas onde os Gunstars estavam tendo seu sono criogênico.

Uma vez que acordaram, os Gunstar souberam do plano do Império de reviver a Prata Dourada. Entretanto, seu companheiro Gunstar Green, havia perdido suas memórias anteriores e ... de alguma forma isso fez ele ajudar o império Império no renascimento do Deus da Ruína... because... hã... veja é que... look, I'm gonna need you to get all the way off my back on this one!


Seja como for, os quatro três dois Gunstars remanescentes (já que a amarela é sequestrada) decidem não permitir que a tragédia se repita e partem para a Terra para recuperar as jóias do infinito antes que Prata Dourada seja ressuscitado... o que já começou, na verdade. O resto da expedição conseguiu reativar parcialmente o Prata Dourada e ele disse onde encontrar as gemas. Eu não sei como ele sabia onde elas estão, se os Gunstars contaram antes de selar ele ou se ele sente onde as jóias do infinito estão, eu sei lá.

O plano agora é encher os capangas do general Gray de porrada e recuperar as jóias antes que ela despertem o capiroto. O que todo mundo sabe que vai acontecer e eles vão ter que lutar com ele de novo. Sempre que um poder ancestral do mal está para ser desperado novamente, não existe nenhuma possibilidade dessa ressureição ser evitada e a consequente batalha final... a menos que seja um livro do Lovecraft pq aí é GG game over automaticamente. Ah, e a Gunstar Amarela também foi sequestrada porque esse é um jogo dos anos 90 e eles tem uma cota legal de mocinhas indefesas a serem salvas para cumprir.

Bem, essa é a história de Gunstar Heroes. Ou ao menos é no Japão, onde o game foi criado. Isso porque ao portar o jogo para os Estados Unidos, a Sega da América apenas olhou isso e disse:


Temendo a possibilidade de que alguma de suas crianças efetivamente olhasse o manual e depois os pais tivessem que ouvir perguntas constrangedoras como “Papai, o que é Tokusatsu? E porque você não toma banho de banheira com o seu chefe como os Changeman fazem?”, decidiu reescrever a história para uma versão mais ... chata? Sei lá, tem uma demanda por isso ou alguma coisa assim? Enfim, é assim que a América rola eu suponho, nada de batalhas a beira da morte para você...

Na versão americana, a dinastia Gunstar tem sido a protetora do planeta Gunstar 9 por gerações. Na juventude, o professor White Gunstar (no original o professor era Brown, eu vi o que você fez aqui América) derrotou o Golden Silver, um androide maligno que viajou milhões de quilômetros para sugar o G9 de todos os seus recursos. Não pergunte como. O professor White conseguiu extrair as quatro famosas gemas místicas que eram a fonte de energia do robô, e o prendeu em uma das luas do planeta G-9.

O primeiro chefe do jogo é uma pilha de caixas 3D because... excuse me what the fuck?!
Anos depois, uma nova ameaça surge. O coronel Red, um ditador cruel (ao contrário dos outros, né), descobriu que os Gunstars conheciam a localização das Gemas Místicas. Um dia, assim como quem não quer nada, o coronel Red sequestrou o irmão mais velho dos gêmeos Gunstar, Green, e usou um dispositivo de controle mental para fazer Green obedecer suas ordens. Com a ajuda de Green, o Coronel Red pegou todas as quatro Gemas Místicas, transformou os dróides pacíficos de Gunstar 9 em ameaças mortais e agora está se preparando para partir para a lua de Gunstar 9 reativar o Prata Dourada.

Bleh, bem menos maneiro SEU COROA!!!

E logo depois do pilha de caixas você luta contra o terrível... Papaya Dance! Uau, dorgas mais de 8 mil!
E, apenas a titulo de curiosidade, na capa brasileira os Gunstar viraram uma familia muito unida e também muito ouriçada, brigam por qualquer razão mas acabam pedindo perdão.

De qualquer forma, vamos falar do jogo então. Heróis da Estrela Arma é um run’n gun não conceitualmente diferente de Dinosaurs for Hire: vá para direita, atire, enxague e repita. A grande diferença aqui é que a Treasure (MCDONALD'S TREASURE LAND ADVENTURE), ao invés de apenas entregar um jogo genérico fez o melhor que podia para colocar esforços para tornar o jogo mais interessante onde fosse possível.

Vamos começar então pelo que Gunstar Heroes é mais conhecido: o seu sistema de armas. Enquanto Dinosaurs for Hire conseguiu a façanha de ter menos opções de tiro que um jogo do Nintendinho de cinco anos antes, Gunstar Heroes foi na direção oposta. Existem quatro armas nesse jogo, sendo que você pode carregar até duas de cada vez: lança-chamas, metralhadora, tiro teleguiado e laser. Ok, já é melhor que o jogo dos DINOSSEROS, mas não é tão impressionante assim ter 4 armas. É apenas normal.



A grande sacada no entanto é que você pode combinar as duas armas para criar um tiro exclusivo. Assim você pode ter uma metralhadora de lança-chamas, lasers teleguiados, etc. Se você juntar dois tiros do mesmo tipo, terá uma versão melhorada dele. Isso dá um total de oito, doze... hã... um número de combinações que... bem, certamente é um número. Podemos afirmar isso com certeza.

Mais do que isso, no começo do jogo você pode escolher não apenas com que tipo de tiro você começa, como se o personagem atira enquanto anda ou ele fica grudado no chão. Isso é importante porque atirar para as diagonais é sempre dificil em um jogo do genero onde cada pixel na tela conta e você não pode sair andando por ai. No Super Nintendo, a Konami resolveu isso usando os botões L e R para travar o personagem e você poder apertar as diagonais sem sair andando por aí. O Mega Drive não tem botões para isso, de modo que deixar escolher o tipo de jogo no começo é o melhor que eles puderam fazer.

Na pratica isso não funciona tão bem por outras razões e você TEM que jogar com o movimento livre, mas o que vale é a intenção, eu suponho.

E quem pode esquecer do inesquecível chefe "Pão Melão"? Sério, esses safados tavam muito doido de larica eu te digo...

E boas intenções é o que não falta nesse jogo, porque apesar de possuir apenas 5 fases (ou 6, contar fases é uma das raras coisas que eu não sou incrivel), cada fase foi colocado um verdadeiro esforço para que ela fosse alguma coisa única de alguma forma. Em alguns casos são realmente únicos, já que eu nunca tinha visto nada assim antes em nenhum jogo.

Uma das fases (você pode escolher a ordem) é sobre andar em carrinhos de mina, o que já foi feito um milhão de vezes em videogames, mas aqui você alterna entre o chão e o teto, e conforme a fase prossegue anda pelas paredes alterando de uma para a outra - dando um dinamismo de gravidade inédito em um jogo desse genero.



Outra fase bastante criativa é uma em que o grande grosso da fase se passa em um boardgame, e você tem que jogar um dado: cada casa que cair acontece uma luta contra um subchefe (raramente você ganha itens) até o boss da fase.

FUN FACT: Eu levei "algum" tempo tentando entender como esse dado funcionava, porque eu estava olhando o numero de cima dele e não o lado virado para a tela. Ou eu ou os programadores desse jogo não sabem como um dado funciona, eu te digo.

Ou ainda a fase shmup em que um jogador controla a nave e outro atira. Então, é, realmente dá pra dizer que eles estavam tentando alguma coisa aqui (mais uma vez, o completo oposto de Dinosaurs for Hire).


Em todos estes anos na industria vital de videogames, eu nunca tinha visto um chefe que é um monte de bolas de arvore de natal largando na pernada dentro de uma centrifuga gigante para tentar de alcançar. São níveis de dorgas que ultrapassam toda física conhecida pelo homem. I like it.
Talvez a única coisa no mesmo nível seja a criatividade dos inimigos desse jogo. Especialmente os chefes, mas mesmo os inimigos comuns são frequentemente... alguma coisa.

Estou aqui eu e meu brother cuidando das nossas vidas como quem não quer nada... QUANDO UM CARA SURFANDO UMA SERPENTE DE ASTEROIDES SELVAGENS APARECE!!!
Os gráficos são bastante bons também, na verdade topo de linha para o que o Mega Drive pode fazer. Ironicamente, existe uma entrevista com o produtor do jogo que diz que a Sega quase decidiu não publicar o jogo porque ele foi testado por 12 pessoas e todos concordavam que um jogo bom tem que ter bonecos grandes na tela - agora quando você ver aqueles jogos de Mega Drive com a camera enfiada no toba do personagem e o jogo todo é uma putaria de saltos de fé porque não dá pra ver pra onde você tá indo, saiba que é porque a Sega achava que isso era bonito.


Foi aqui que pediram uma luta contra um homemzinho da altura do seu joelho que pode se multiplicar? Pois é, eu achei que fosse.

De qualquer forma, apenas o último (Mac Senour) viu que apesar de cometer o crime indisivel de você poder ver para onde estar indo e ter espaço na tela para tentar desviar da balas, esse jogo era bom.

Bem, esse jogo é um bom jogo, eu não tenho como tirar isso dele. É um bom jogo...

... MAS?


Então, Gunstar Heroes é um jogo criativo, tem um sistema de power ups bem sacado e é bonito dentro do que dá pra fazer no Mega Drive. Porém, o jogo tem dois problemas e não coisas pequenas.

Um é objetivo, o outro é subjetivo. O primeiro é que ele é um jogo de Mega Drive. O que significa que ele roda no Mega Drive.

UAU, TEMOS UM XEROX ROLMES AQUI, HEIM?

Bem, sim. O que eu quero dizer mais especificamente é que ele roda no chip de som do Mega Drive. Enquanto a composição das músicas não é terrível, sua execução é algo que seria melhor descrito como “uma hora de alguém surdo tentando afinar um xilofone usando um gato dentro de um tonel de zinco”

SUAS OFENSAS AO CHIP DE SOM DO MEGA DRIVE ESTÃO CADA VEZ MAIS ELABORADAS, TENHO QUE LHE DAR ISSO

Obrigado, é uma skill adquirida. Bem, esse é um problema objetivo com o jogo. Já no campo da interpretação, o grande problema do jogo é a dificuldade. Gunstar Heroes pode ser bonito, criativo e ver mecanicas bem executadas, mas o jogo simplesmente não é divertido de jogar quando inimigos spawnam infinitamente em uma velocidade alucinada e o jogo todo é um grande exercicio de decorar em qual dos três pixels da tela você pode estar para não ser atingido.



Verdade, não é o nível de dificuldade injusta de Dinosaurs for Hire em que o jogo é dificil porque VOCÊ NÃO TEM COMO DESVIAR. Aqui as ferramentas para desviar das coisas existem, apenas que existem muitas e muitas e muitas coisas para serem desviadas ao mesmo tempo, e mais entrando na tela a cada momento ao ponto que dá slowdown no Mega Drive - algo bem raro de acontecer. 

Eu entendo que para algumas pessoas isso não é um problema, mas eu realmente não consigo me divertir sem um tempo para organizar os pensamentos. Não fosse esse problema, seria material de “The Best Of” sem duvida. Chegou bem perto realmente, só não é o meu copo de chá.



MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 064 (Julho de 1999)