A primeira vez que eu ouvi falar de Clock Tower, nas curtas palavras da Ação Games, o jogo me impressionou muito e fez com que eu até hoje lembrasse dele com curiosidade. Quer dizer, um point'n click de terror? Uau, isso é completamente diferente de QUALQUER outra coisa que eu já joguei na vida!
Porém, isso sendo dito, aquilo foi a decadas atrás. Hoje, um mestre supremo dos games adulto e calejado pelos golpes que os jogos dão, eu entendo o quão idiota é essa premissa. Quer dizer, é um point'n click, pelo amor de Vixisgrostolv, o quão assustador pode ser jog...
HOLY PUTA QUE PARIU É O TESOURÃO! CORRE MULHER! MEXE ESSAS PERNAS LOUCAS O TESOURÃO VAI TE PEGAR! CORRA POR SUA VIDA! CORREEEEE BERGUEEEEE!
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MEU DEUS DO CÉU CORRE BERGUE, O TESOURÃO TÁ VINDO CORRE BERGUE! |
Tá, okay, tenho que conceder que esse jogo é SIM interessante...
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Considerando que o jogo original para SNES nunca foi lançado fora do Japão, obviamente no Japão esse jogo se chama Clock Tower 2. Isso leva a uma confusão onde existem dois jogos chamados Clock Tower (o original de SNES no Japão e a continuação de PS1), e dois jogos chamados Clock Tower 2 (esse aqui que se chama CT2 no Japão, e o terceiro jogo da série que se chama Clock Tower 2 no ocidente). Que?! |
... mas então, tenho que dar a Human Entertainment que conceitos únicos é a coisa deles, afinal. SOS é um simulador de Titanic (faça o que quiser com essa informação) e THE FIREMEN é o único jogo de Super Nintendo (e um dos poucos na vida) que eu conheço sobre ser um bombeiro. Então dar experiencias únicas é algo dentro da praia da Human, tanto que quando a empresa faliu em 2000 vários de seus funcionários sairam para formar a própria empresa (que viria a ser a Grasshopper Manufacture), sendo o mais famoso deles o lendário Suda 51.
Você sabe que pode esperar grandes coisas dele quando o nome artistico dele tem o número de cachaça.
Yeah, a Human tinha umas figurinhas únicas, não tinha? Mas então, Torre do Relógio.
Em primeiro lugar, eu quero dizer que a edição de som desse jogo é realmente espetacular. RESIDENT EVIL e RESIDENT EVIL 2 acertam bastante ao criar um ambiente tenso com suas músicas minimalistas e sons de passos ecoando, porém Clock Tower vai um passo além adicionando a essa formula a coisa que você está esperando ser atacado por um serial killer a qualquer momento. Mais sobre isso daqui a pouco.
Mas meu ponto é, Imagine-se caminhando por um corredor silencioso, talvez pensando no fora que tomou da morena, talvez pensando nos boletos, quando um som simples quebra o de passos silêncio, arrancando você de seu devaneio - shing... shing... shing... - e você pensa: "Que porra é isso?". O som vai ficando mais alto e mais frequente, shing... shing... shing... então para.
Inbuído por uma falsa sensação de segurança, você se aproxima da porta mais próxima que se abre de supetão, revelando um homem cifótico com um rosto desfigurado que se aproxima de você com uma gigantesca tesoura de jardinagem. De todas as ferramentas domésticas, eu acho poucas coisas mais assutadoras que tesouras de jardinagem pq é incrivelmente fácil se mutilar com um negócio desses.
Agora, a coisa mais aterrorizante (e por consequencia a que melhor funciona) é que seu personagem não é um policial treinado com o dedo no gatilho como em
RESIDENT EVIL. Ou Alan Wake, pq por alguma razão escritores do interior dos EUA são altamente treinados com armas de fogo because America Fuck Yeah. Pelo contrário, seu personagem (que varia conforme o jogo progride) usualmente é uma pessoa comum sem acesso a armas para se defender.
Isso não é algo apenas conceitual, e sim traduzido na sua mecanica: o fato de você ter apenas controle parcial do personagem (é um point'n click, afinal) aumenta a tensão da coisa toda. Tudo que você pode fazer é clicar desesperadamente no que você ACHA que é o lugar certo que vai salvar a sua vida, e então torcer para que o esmilinguido se salve do FILHO DA PUTA DO TESOURÃO QUE TÁ VINDO!
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Abre porta! Abre que o tesourão tá vindo! |
Sério, poucos jogos tentaram (e menos ainda conseguiram) emular a sensação de ser a vitima em um slasher movie, e é exatamente isso que Clock Tower tenta (e eu senti que consegue) entregar aqui. Então ao invés de puxar seu trezoitão e encher o safado de pipoco, como você poderia esperar em um videogame, tudo que você pode fazer é se esconder e torcer para ele não te achar, ou usar uma arma improvisada do cenário que vai funcionar apenas uma vez.
E quando eu digo "armas improvisadas", eu estou falando muito sério. Não tem uma marreta de construção espalhada aleatoriamente aqui para se defender, nem armas com caixas de balas convenientemente colocadas em lugares onde não fariam sentido elas estarem (talvez se o jogo se passasse nos Estados Unidos e não na Noruega, faria mais sentido ter uma caixa de munição de espingarda em cima da mesa do escritório, because America Fuck Yeah!), nem mesmo uma picareta ou sequer uma lanterna. Em vez disso, seus meios alternativos de defesa são muito mais fracos e não tão reconfortantes. Por exemplo, algumas salas contêm como produtos químicos como um latão de inseticida ou itens que podem ser derrubados (como uma prateleira) que podem atordoar o corcunda do inferno por um momento, mas não muito mais que isso.
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Clock Tower é inspirado no filme "Phenomena" de 1985, reutilizando vários conceitos e o visual da protagonista. E olha, se você baseia seu jogo em um filme de uma das mulheres mais lindas da história da humanidade - a.k.a Jennifer Connely - já começou bem |
Porém esses itens, como eu disse, são de uso único, de modo que na maior parte do tempo sua escolha recorrente vai ser mesmo se esconder e torcer pelo melhor. E quando eu digo "torcer" aqui, estou falando literalmente já que o jogo tem uma programação de aleatoriedade que trás tensão ao jogo. Não existem lugares pre-scriptados onde o Scissorman vai spawnar, então mesmo que você jogue com um detonado embaixo do braço ainda sim sempre tem uma incerteza no ar.
Se aproximar de uma porta ou um armario... ou uma caixa, o Scissorman não é muito grande afinal... pode sempre resultar no bicho saltando atrás de você ou não, você nunca sabe. Você abre um armário e o Scissorman está dentro dele. Você investiga uma sala e o Scissorman está esperando por você lá dentro. Você caminha por um corredor aparentemente seguro, o Scissorman está atrás de você.
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Julius Tesourão Pai do Chris, CIRCA 1997 |
O mesmo vale para os locais de esconderijo: cada cenário tem alguns lugares que você pode se esconder e torcer para o TESOURÃO não te achar e apenas ir embora, mas você nunca pode te achar ou pode não achar. Agora, e essa parte é muito importante, tem um truque aqui: a aleatoriedade não é inteiramente aleatória.
Enquanto é, sim, possível que o TESOURÃO te encontre em um esconderijo de primeira, isso é altamente improvavel de acontecer. Até pode, mas é muito raro. Porém usar o mesmo esconderijo repetidas vezes aumenta essa chance. A mesma coisa para ele saltar de algum lugar e perseguir sua bunda pelo cenário: enquanto ele PODE spawnar de primeira na primeira porta que você abrir, isso é altamente improvavel. Porém se você ficar mosqueando e gastando tempo no lugar, as chances disso acontecer aumentam dramaticamente.
Então o que eu estou dizendo aqui é que a programação desse jogo é muito casada com o que ele se propõe a fazer: sempre existe a chance de dar merda, você nunca está realmente seguro, porém as chances aumentam conforme você repete ações ou gasta tempo - o que vai te empurrando em uma espiral de ansiedade e tensão.
"Eu já passei tempo demais nesse prédio? O suficiente pra ele surgir na próxima porta? E eu tenho um caminho até um lugar que eu ACHO que dá pra se esconder? E será que vai funcionar?" são todas coisas que você se preocupa enquanto joga o jogo... e É algo que você deveria se preocupar enquanto foge de um serial killer com um fucking TESOURÃO, afinal. Isso tudo sem o jogo ser mecanicamente injusto, o que foi uma sacada de programação brilhante.
Existe ainda mais uma mecânica que adiciona tensão ao jogo, que é o "botão de pânico" (normalmente quadrado na configuração original). Agora, você pode apertar o "Botão do Pânico" para acelerar sua fuga, mas ao custo de stamina, e se a sua stamina estiver baixa, você não ter chance de tentar escapar do TESOURÃO em um minigame caso ele te ache. Se o Scissorman pegar você com sua stamina baixa, ambas as lâminas de seu tesourão do inferno encontrarão seu caminho através de seu esterno. Game Over. Não que estar com a stamina cheia garanta alguma coisa, incerteza é o nome do jogo aqui, lembra?
Agora, eis novamente o truque da Human Entertainment aqui: você não vê a sua barra de stamina! Então você nunca tem certeza se pode correr, se existe uma chance de sobreviver se o TESOURÃO te pegar, você nunca está seguro de nada. O que, novamente, é EXATAMENTE a sensação que você quer evocar no jogador em um jogo de terror. Bravo, senhores, brav-ô!
Nossa história aqui se passa dois anos após o jogo anterior de Super Nintendo, sendo que esse daqui foi o primeiro jogo da franquia a ser lançado no ocidente. Ainda sim, o jogo recapitula os eventos anteriores para você não perder completamente.
Existe na Noruega uma mansão que é assombrada por um serial killer deformado e, de acordo com o relato da sobrevivente, aparentemente imortal. Pense em Mike Myers só que com escoliose. Após ser a única sobrevivente do massacre da mansão Barrows no jogo anterior, Jennifer foge para Oslo, a cidade populosa mais próxima. Obviamente que conta para as pessoas sobre o massacre a que ela acabou de sobreviver, então mais obviamente a polícia e os noticiários começam a entrar na mansão. Ninguém retorna.
Isso cria toda uma comoção na mídia: “Os Assassinatos do Homem-Tesoura” estampam as capas dos tabloides. Embora ninguém dispute que existe um serial killer na região, também é fato que pouca gente realmente acredita no depoimento de Jennifer que o assassino é essencialmente um vilão de slasher movie.
O que inclui o renomado professor Samuel Barton da universidade de Oslo e seu assistente Harris Chapman. Juntos, eles estão ficando cada vez mais obcecados não apenas com os assassinatos, mas também com o modus operandi do Homem da Tesoura, mantendo até mesmo uma réplica perigosamente real da lendária tesoura que ele usou para matar suas vítimas. Oh geez, o que POSSIVELMENTE poderia dar errado...
Sendo caçada pelo monstro em um cenário urbano, Jennifer e um elenco diverso de personagens que estão envolvido com o caso (como o policial Stan Gotts ou o jornalista sensacionalista Noel Campbell) acabam sendo envolvidos mais uma vez pelo PESADELO DO TESOURÃO NERVOSO.
Agora, esse elenco de personagens que eu mencionei é importante não apenas pq, bem, alguém tem que morrer nessa história né, que tipo de slasher movie seria se não morresse uma pá de personagens que foram introduzidos ao jogador... mas não apenas isso.
Durante o gameplay, o jogo vai te pedir pra fazer certas escolhas que fazem você vivenciar o jogo sob a perspectiva de diversos personagens. Com efeito, existem duas campanhas possíveis (Jennifer Simpson ou Helen Maxwell) com eventos diferentes, e mesmo entre essas cada uma tem 5 finais possiveis. Então esse jogo tem 10 finais possíveis dependendo das coisas que você faz ou deixa de fazer.
E então, como cereja do bolo, temos uma das melhores coisas desse jogo que é a sua dublagem totalmente abismal. Sério, eu realmente achei que esse jogo era algum tipo de propaganda para algum antidepressivo, pq os dubladores claramente injetaram um frasco de fluoxetina na retina antes de gravar.
Sério, a dublagem desse jogo LÊ. AS. FRASES. PALAVRA. POR. PALAVRA. SEM. QUALQUER. EXPRESSÃO. E enquanto eu entendo que a maior parte das pessoas vai se sentir incomodada com a atuação TERRIVELMENTE HORRENDA nesse jogo, porém, todavia, contudo, entretanto, se você for uma das pessoas escolhidas que são apaixonadas por trasheiras sem fim e se o seu olho brilha com a possibilidade de jogar um b-movie interativo... então essa dublagem terrível é apenas deliciosa.
Quero dizer, pense nisso: conceito semi-explorador (o antagonista é uma pessoa com deformidades), vítimas femininas indefesas, um enredo bobo de filme de terror dos anos 80 e atuação terrível. Tudo o que falta é só "dirigido por Tobe Hooper" no final.
A Torre do Relógio não é isenta de falhas, entretanto. Existem alguns interlúdios desinteressantes em que você fala com vários personagens em Oslo, na Noruega, para coletar informações sobre o Scissorman. Na maioria das vezes, essas sequências atrapalham o que deveria ser uma aventura de terror crescente, mas não o suficiente para afundar o jogo completamente.
Existem também alguns pontos frustrantes, especialmente no ato final, onde você esgotará todas as opções e clicará em qualquer coisa, por mais ambígua que seja, para avançar. Algumas das soluções para alguns dos finais são bastante obtusos, o tipo de coisa que torna impossível chegar ao final "verdadeiro" sem um detonado. Clássico problema de point'n click, porém como não impede de você jogar o jogo (apenas bloqueia alguns dos finais), não é algo que me faça ter particularmente ódio. Sério, estou acostumado a MUITO pior que isso. Mas tipo MUITO mesmo, né não
SAM & MAX HIT THE ROAD?
Isso tudo faz da Torre do Relógio ser essencialmente o jogo no qual Until Dawn se basearia anos e anos depois: uma grande homenagem aos slasher movies com um grande elenco do qual você não pode esperar que todos sobrevivam até o fim do jogo. Adicione a isso usar as mecanicas de um point'n click de forma inteligente para fazer um crescendo de tensão e temos um jogo realmente único aqui.
Eu posso te dizer que não existe nessa época (e raramente depois dela) outra experiência aterrorizante em que você é a presa indefesa de um slasher movie. Se é isso que você quer, é isso que Clock Tower entrega.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 122 (Dezembro de 1997)
MATÉRIA NA GAMERS
Edição 025 (Dezembro de 1997)