Então, o jogo de hoje Nightmare Creatures é... meu deus... mais uma tentativa de fazer um beat'm up 3D usando a engine de tanque de TOMB RAIDER. Ao que, obviamente, minha reação foi:
Sério caras, eu não aguento mais. Eu já sofri com TIME COMMANDO, PERFECT WEAPON e especialmente THE CROW: City of Angels. Até RESIDENT EVIL 2 começou a ser feito nessa pegada e foi cancelado e refeito faltando 2 meses para o lançamento pq tava ó, uma bosta (como eu contei naquele jogo). Olha, gente, eu entendo. Vocês querem fazer um jogo de bater em coisas 3D. Eu entendo, de verdade.
Apenas... POR FAVOR PAREM DE TENTAR, ESSE NÃO É O CAMINHO! Apenas parem, eu não aguento mais!!!
Agora, essa capa japonesa é muito mais maneira ou o que? |
Ao que, a Kalisto Entertainment respondeu:
ESPERA, A KALISTO ENTERTEINMENT? OS CARAS QUE FIZERAM PAC IN TIME?
Eu estou tão tão surpreso quanto você, Jorge, que de todas as pessoas do mundo quem entenderia que essa porra não tá funcionando são justamente os caras que conseguiram a façanha, a proeza, a magnicencia de fazer um dos piores jogos de plataforma do Super Nintendo entre os milhares de jogos de plataforma do Super Nintendo.
Sério, eu não poderia sentir nada senão a mais pura ojeriza a PAC IN TIME, e ainda sim... os caras da Kalisto entenderam o problema.
O elenco do jogo é repleto de monstros clássicos como o Were Wolf, Pepys e o lendário José Manuel. Espera, o que? |
Então ao invés de tentar fazer um beat'm up 3D - o que CLARAMENTE não estava funcionando - eles tentaram algo novo: E SE, veja bem, E SE a gente pegasse o conceito do beat'm up mas colocasse no esqueleto de um jogo de plataforma 3D?
Você sabe, você ainda tem que bater nos coleguinhas com seus punhos, espadas ou legos vitrificados ou algo assim, mas a estrutura do jogo tem mais em comum com TOMB RAIDER do que com FINAL FIGHT.
Então eis como as coisas vão funcionar: tal como TOMB RAIDER, a camera segue as costas do personagem, o level design não é mais linear do tipo "detone todo mundo e espere a mensagem de GO (ou similar) aparecer para ir para próxima tela". Agora o jogo tem portas, alavancas a serem descobertas, é possível se perder no mapa e todo o pacote completo oriundo dos jogos de plataforma 3D.
Ou seja, inadvertidamente a Kalisto tentando não incorrer nos erros que levaram as rotundas bombas citadas anteriormente acabou criando um genero inteiramente novo: o hack'n slash, esse hibrido entre o beat'm up e a plataforma 3D. Que alias é um genero que existe até hoje com jogos REALMENTE bons, como Nier: Automata...
Então é realmente uma das maiores surpresas que eu tive na vida ao descobrir que um dos generos mais populares da atualidade (o que inclui alguns dos meus jogos favoritos da vida) começou com ... a fucking Kalisto Enterteinment... meu deus, os caras de PAC IN TIME, não vai ser fácil assimilar essa...
Mas então, isso sendo colocado, vamos ver como essa coisa de "criaturas dos pesadelos" funciona mais de perto, sim?
Nadia decepou o tronco do cidadão ao meio com um chute, pernas fortes moça |
Nossa história começa em 1666, e as noites de Londres estão abarrotadas de rumores sobre avistamentos de monstros, pessoas se transformando em criaturas e os mortos andando. Então o jogo já abre ganhando um biscoitinho pela escolha de ambientação, são poucos os jogos que se passam no mundo real nesse blog e menos ainda os que escolheram a Londres vitoriana como cenário. Como eu li em um comentário no youtube, Nightmare Creatures andou para que Bloodborne pudesse correr.
Seja como for, essas questões podem estar ligadas a um antigo culto conhecido como Irmandade de Hecate. A Irmandade tentou criar um Elixir que lhes daria poderes sobre-humanos, mas - pouco surpreendentemente - a coisa não deu muito certo e eles acabaram descobrindo algo que transforma as pessoas em monstros. Eu realmente não vejo como alguém consegue ir de fazer um Elixir para ganhar superforça ou soltar raios anais... e acaba virando monstros clássicos do folclore como Lobis Homens (por algum motivo é escrito assim) ou o José Manual. Mas então alquimia não é muito o meu forté.
NEM DA IRMANDADE DE HECATE, AO QUE PARECE.
Ponto válido. Porém se a vida te der limões chame seus cientistas e mande eles fazerem um combustível de limão incendeie a casa dela faça a vida se arrepender do dia que achou que podia dar limões a Cave Johnson, faça uma limonada. A Irmandade decidiu então usar os monstros para dominar o mundo... o que eu não faço a mais remota ideia de como a logistica disso funcionaria. Verdade seja dita, a imensa maioria dos vilões da ficção nunca para pra pensar como o seu plano vai funcionar na prática.
Agora, como funciona dominar o mundo soltando demonios é algo que jamais saberemos, já que a Irmandade foi destruída quando um dos seus seguidores decidiu que eles tavam mais loucos que o Batman de triciclo e incendiou seu prédio - também iniciando o Grande Incêndio de Londres.
O Grande Incendio de Londres de 1666, saiba você, foi um evento real do nosso mundo: destruiu 13200 casas, 87 igrejas, a Catedral de St. Paul e 44 prédios públicos. Os registros da época computaram um total de 100 mil desabrigados e apenas nove óbitos registrados - obviamente esse número está errado, mas o que rolava é que pessoas mais pobres e da classe média não eram mantidas nos registros. Então estimasse que milhares de pessoas morreram no incendio.
Mas hey, esse blog tb é cultura ou o que?
Enfim, quase duzentos anos depois (nos levando agora sim ao ano de 1864), um caboclo chamado Adam Crowley achou que era uma boa continuar de onde a ordem de Hecate parou. Afinal o que possivelmente poderia dar errado, não é verdade?
Vou ser bem honesto com vc, Adão, eu não entendi qual é exatamente o seu endgame aqui. Okay, vc tem "poder", mas ao custo de parecer esse treco aí. Não sei se é jogo não. |
Cabe então apenas ao caçador de monstros Ignatius Blackward ou Nadia Franciscus (que não é caçadora de nada, apenas seu pai foi assassinado tentando impedir Crowley) podem detê-lo. Pq aparentemente mais ninguém no Reino Unido inteiro se preocupa com monstros correndo pelas ruas.
VOCÊ SAIRIA NA RUA PRA LUTAR AO VER ESSA COISA ANDANDO POR AÍ?
Bem, é uma mulher que pode arrancar seu tronco com um chute, então é um ponto justo, Jorge. Seja como for, kudos a Kalisto pela ambientação: frequentemente esse jogo é chamado de "survival horror" e enquanto mecanicamente isso não poderia ser mais longe da verdade, bem, o clima realmente é de acordo.
Quer dizer, olha essa abertura em FMV que vende a ideia mais de um jogo de terror do que aÇãO uLtRaMaNeIrA dUd!
Com efeito, o jogo usa as limitações do PS1 a seu favor para construir o ambiente do jogo: como o console tem pouca memória RAM (ou seja, ele não aguenta muitas coisas na tela ao mesmo tempo), o jogo tem um campo de visão bem curto. O que combina bastante com o feeling de nunca saber o que vai pular em cima de você de um beco escuro de Londres.
Claro, a Kalisto não foi a única a perceber o potencial dessa limitação do PS1 para o terror e poucos anos mais pra frente a Konami esbagaçaria o mundo com seu Silent Hill usando a mesma estratégia. Mas como estamos aqui e agora, tenho que dizer que a ambientação desse jogo é 10/10 e com certeza pelo que esse jogo é melhor lembrado.
Porém as limitações técnicas do PS1 não é tudo que esse jogo aproveita do 3D, e sim ele usa a engine tridimensional a seu favor quando coloca que as partes dos inimigos são cortaveis. Então se você chegar chegando e acertar uma lapada que encaixa, pode arrancar a cabeça do oponente com um golpe bem dado de espada.
Ou arrancar um braço do inimigo (especialmente se ele estiver com o braço esticado pra frente, como os zumbis normalmente ficam) e ele continua lutando sem braço. Vou te dizer que é incrivelmente satisfatório essa mecanica quando você arranca um braço de um ogro e ele tenta te acertar com o cotoco e erra pq ele não tem mais o braço. São as pequenas coisas, sabe?
Então a Kalisto não apenas criou uma atmosfera bastante interessante para o jogo como eles pensaram no que poderiam fazer para tornar o combate mais interessante, hey, legal da parte de vocês caras. Ainda durmo com a luz acesa devido ao terror de vcs terem me feito jogar PAC IN TIME, mas sem ressentimentos.
ENTÃO A KALISTO SE REDIMIU E ENTREGOU UM JOGO QUE É EFETIVAMENTE BOM?
Hã... então, calma lá também. Criaturas dos Pesadelos não é sem sua cota de defeitos, e alguns deles realmente conseguiram me derrubar os butiás do bolso. Claro, nada tão catastrófico quanto PAC IN TIME... mas o que mais seria?
ESTOU COMEÇANDO A DESCONFIAR QUE VOCÊ REALMENTE NÃO SUPORTA PAC IN TIME...
O que te deu essa impressão? Bem, seja como for, eis a coisa que mais me incomoda nesse jogo: ele tem um limite de tempo. Mais ou menos. Mas yeah, eu detesto jogos com limite de tempo e esse é um desses. O que rola aqui é o seguinte: Adam Crowley, o alquimista do capeta, espalhou um gás em Londres que transforma as pessoas em demonio. O que te mantem são é o rush de adrenalina, e se ela acabar você vai pra berinjela.
Claro, vc pode argumentar que não é exatamente o plano mais brilhante do mundo tentar dominar o mundo com algo que pode ser neutralizado por algo tão simples como adrenalina, mas então talvez eu esteja subestimando o sedentarismo londrino. O que realmente importa é que em termos de mecanica, isso quer dizer que tem uma barra azul no lado esquerdo da tela que vai se esgotando e ela é recarregada sempre que você mata um monstro. Se ela acabar você começa a perder energia.
Ou seja, vc tem que estar sempre na violencia pra não perder vida e isso é algo que eu entenderia em um beat'm up (não amo, mas entenderia), mas em um jogo maior com fases que são labirintos e os mapas parecem saídos de fucking DOOM?
Bem menos cool, man. Tá, eu entendo que a ideia era gerar tensão e pressa, mas então esse é um jogo que os inimigos não respawnam (o que é bom) e se você se perder já era (o que é ruim). Agora isso em um jogo escuro em que a draw distance é bem baixa (você não consegue ver muito a frente) e muitos cenários parecem iguais... não parece uma receita para a felicidade, né?
Então esse jogo tem essa ideia de limite de tempo que totalmente diminui muito a diversão do jogo pra mim. Porém mesmo sem isso, NC ainda sim não passaria de um "é, okay" pra mim devido ao fato que o jogo não ajuda muito.
Pra começar, tem o controle de tanque que, enquanto é verdade que ele é mais rápido do que qualquer outro jogo que usa essa engine 3D (felizmente não é nenhum PERFECT WEAPON, glória), ainda sim não é rápido o suficiente pra o que o jogo exige de você.
Parece simples no papel - pra cima avança, pra baixo recua, esquerda, direita, um golpe de arma, um chute e um salto - mas você rapidamente ficará com inveja de seus oponentes pelo quão rápido eles conseguem se mover pelo cenário. Ao contrário deles, a SUA rotação é dolorosamente lenta, some a isso que as criaturas inimigas têm uma tendência bastante inteligente de flanquear você... yeah, você vê como isso pode ficar injusto bem rápido, né?
A detecção de colisão também é altamente questionável e mais frequentemente do que a sanidade recomenda, você se perguntará o que o atingiu ou, pior ainda, por que seu ataque errou o alvo. E não queira saber sobre as partes de plataforma, vamos apenas dizer que esse jogo totalmente NÃO foi feito para isso... exceto que ele te cobra isso. Geez, como os pulos são ruins nesse jogo...
Eu não realmente acho que a lingua portuguesa possui adjetivos para descrever o quão travados e ruins são esses pulos |
E mesmo que você consiga lidar com os controles implacáveis e lentos, a verdade é que mais cedo do que tarde você inevitavelmente se cansará de Nightmare Creatures. Existe uma variedade muito baixa de inimigo ou coisas para se fazer para manter o jogo interessante.
Embora Ignatius e Nadia tenham alguns combos bastante difíceis, na prática você vai estar repetindo a mesma ação durante o jogo todo. Tipo literalmente a mesma, o jogo não oferece nenhuma recompensa mecanica por tentar variação de combos, de modo que o mais eficiente (e vc PRECISA do mais eficiente dado a dificuldade do jogo arrancar o seu couro) é apenas ficar com o combo básico mesmo. E embora existam áreas secretas, power-ups e armas mais poderosas para serem encontradas conforme você avança, elas não são suficientes para combater a monotonia da ação.
Nightmare é uma ideia sólida com uma ambientação memorável e tem alguns bons momentos enquanto jogo, mas a experiencia geral é prejudicada por uma mecânica de jogo desnecessária e controles altamente questionáveis. Eu vou dar um passe para a Kalisto aqui pq eles eram um estúdio de qualidade extremamente limitada tentando fazer algo inteiramente novo, e no longo prazo o genero que eles inauguraram acabou se tornando uma das maiores coisas da história dos videogames.
No curto prazo, entretanto, Nightmare Creatures tem intenções boas o suficiente para ser passavel, e uma execução que dificilmente seria classificada como "boa o suficiente".
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 122 (Dezembro de 1997)
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Edição 140 (Junho de 1999)
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 036 (Março de 1997)
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Edição 045 (Dezembro de 1997)
Edição 056 (Novembro de 1997)
MATÉRIA NA GAMERS
Edição 025 (Dezembro de 1997)
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Edição 037 (Janeiro de 1999)