A primeira vez que eu ouvi falar de Wild 9, foi quando esse jogo saiu como preview na Super Game Power em janeiro de 1997, com a previsão que o jogo estava pronto e antes da metade daquele ano (ou seja, nos próximos meses). Passado um ano, nada do jogo. Mais de um ano e meio depois, ainda nada do jogo. Wild 9 veio a ser lançado apenas um ano e nove meses depois do preview de quando ele supostamente já deveria estar pronto.
Agora, em todos esses anos nessa indústria vital, isso obviamente grita que tem uma história complicada de desenvolvimento por trás, adiamentos e todo velho ruguru das coisas não saindo como deveriam ser com muito drama no meio - bastante o que aconteceu na história de AZEL: PANZER DRAGOON RPG (ou "Panzer Dragoon Saga" no ocidente), certo?
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Vou te dizer que passei mais tempo do que eu tenho orgulho em admitir achando que a capa japonesa era sobre nosso herói fugindo de uma mascara de gás verde com boina branca |
Então, não.
A história de desenvolvimento de Wild 9 é bem menos dramática do que um jogo com data de lançamento para um ano e meio antes do seu lançamento dá a entender. Na verdade, ele é bem simples: em 1996, a Shiny Enterteinment estava toda e não estava prosa. Lançado no final de 1995, EARTHWORM JIM 2 foi um sucesso pangalactico hipermucenico e embora eu tenha algumas questões a respeito do gameplay em si e em especial a dificuldade (como eu apontei naquele texto), até hoje reconheço que é um dos jogos mais criativos que eu já vi na vida.
EARTHWORM JIM 2 não apenas vendeu pra caceta como botou pra rodar toda uma franquia com histórias em quadrinhos e até uma série de desenho animado pra televisão, então como eu disse dinheiro não era problema na Shiny naquela época. E sendo o sucesso que foram as segundas aventuras do Tiago Minhoca, é óbvio que coisa louca e incrível eles fariam a seguir.
Pois muito que bem, após o enorme infindo sucesso de EARTHWORM JIM 2, o próximo jogo da Shiny... também foi outro enorme infindo sucesso! Lançado antes da metade de maio de 97, MDK foi o primeiro grande hit de tiro em terceira pessoa e especialmente nos computadores foi o sucesso sucessante do pew pew pow pow. Tiro, porrada e malucos com roupas de dominatrix, all the good stuff. E assim como o jogo do minhocão do posto tá maluco tá doidão, eu tenho várias questões contra a jogabilidade de MDK, porém não sou louco de não reconhecer a criatividade e o sucesso que a coisa toda fez.
Agora quando vc junta as duas coisas, fica mais fácil entender pq Wild 9 foi adiado e readiado: a Shiny estava forrada de grana, e eles podiam se dar ao luxo de apenas empurrar o lançamento do jogo até quando eles achassem que estava pronto. Sem drama, sem histórias de "o que poderia ter sido e jamais teremos", nada do seu rugaru habitual que eu gosto de contar aqui.
Isso sendo posto, que tipo de jogo Selvagem Nove é realmente? Bem, a resposta curta é que ele é um jogo Shiny dos anos 90: ou seja, várias ideias criativas fora da caixa, uma execução gameplayzisticamente bem... eh. Ideias nota 10, execução nota "eh".
Aqui vemos isso já antes da largada, e por isso que a campanha de marketing já mostra que esse é indiscutivelmente um jogo com o selo Shiny de "cês fumaram, né mano?"
Todo o tema do jogo é baseado no prceito de "torture seus inimigos", tanto que eles colocaram na capa do jogo. O que faz dessa a proposta mais edgelord dark sinistrona na decada dos edgelords dark sinistrões, onde até mesmo a porra do amigão da vizinhança Homem-Aranha era darqui, trevoso e du mau.
Então, é, sim, um jogo construído sobre o conceito de "torture seus inimigos" - que não de modo nada discreto está também na capa do jogo - é algo que realmente chama muita atenção aqui! Mas... e aí, a Shiny entrega a tal da torturesson? Hã... então... quanto a isso... vamos colocar assim: a propaganda de Wild 9 incluíam a frase: “Quem irritou os caras do Shiny?” A implicação do marketing era que a Shiny, depois dos jogos engraçadalhos do Jaime Minhoca, decidiu fazer um jogo de plataforma muito mais sombrio e malicioso com Wild 9 do que a empresa já havia produzido antes.
O que é essencialmente bullshit. Mas vamos começar do começo.
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Eu juro pra vcs que esses são os piores controles de balançar em alguma coisa que eu já vi na minha vida
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Basicamente, a história é a seguinte: um Robô Alienígena Maligno do Mal que Odeia o Bem devastou a galáxia. Apenas nove rebeldes em todo o universo têm o poder de detê-lo... ou teriam, não tivesse sido o fato que oito dos nove selvagens foram capturados pelo inimigo. Cabe agora ao nosso herói, Major Wex resgatar seus colegas e salvar a galaxia de destinos galaxiosos nefastos.
Essa história bastante simples não está em momento algum do jogo (nem em cutscenes, sequer na intro), é apenas contada em seu manual. E holly guacamoly, o manual do jogo dedica uma novela inteira a contar isso que nem no jogo está. Sério, é uma quantidade de trabalho descomunal para algo que o próprio jogo dá tão pouca importancia:
Uau, Shiny sendo Shiny, eu suponho?
Anyway, esse pequeno compilado de Irmãos Karamazov no manul a parte, sobre o jogo em si o que diferencia Wild 9 de outros jogos de plataforma de ação é a arma principal de Wex, o RiG, e os puzzles oriundos dessa mecanica.
Essencialmente, o RiG é uma espécie de laço de laser: imagine algo tipo a arma de protons que captura coisas que os
GHOSTBUSTERS usam. Com isso vc pode agarrar inimigos (e outros objetos, mas inimigos principalmente) existem várias maneiras de matar usando o RiG: você pode bater os inimigos contra o chão ou a parede até que ele quebre, você pode jogá-los em um ventilador em movimento, você pode jogá-los no fogo, você pode pode até usar eles como uma espécie de escudo humano para defender os tiros que vem na sua direção.
Isso tudo é feito, saiba você, de uma forma muito mais cartunesca do que violenta realmente e com certeza a descrição de empalar seus inimigos em espinhos para usar eles como plataformas soa muito mais pesada do que o jogo é na prática.
E é essa coisa que o marketing chama de "torture seus inimigos". Não apenas é bem mais bobinho do que o marketing tenta te vender, como o jogo sequer pegou uma classificação etária 18+. Eu sei que golpe de marketing e anos 90 são coisas indissociaveis, porém vou te dizer que esse aqui não pega nem top 10 dos maiores golpes de marketing dos games - sendo que as primeiras 5 posições são da Sega, obviamente, né Activator?
Enquanto eu não particularmente me importo com as papagaiadas do marketing, até acho pitoresco, o que eu realmente me importo é o quão bem isso acaba sendo implementado na prática... e como tudo que a Shiny faz, a versão curta é que na prática a teoria é outra.
Vamos colocar assim: vc controla o laço energetico E a movimentação do personagem com o mesmo botão - o que, colocando no papel, soa exatamente como a receita de um acidente de trem vindo na sua direção. A boa noticia, entretanto, é que essa coisa de andar e controlar o laço no mesmo botão acaba funcionando melhor do que vc esperaria. A noticia ruim é que ser melhor do que vc espera ainda não é bom o bastante, temo dizer.
Honestamente o jogo não teria sido muito dificil dar um botão pra vc travar o personagem no lugar e controlar exclusivamente o laser, não muito diferente do que
SUPER METROID já tinha naileado 4 anos antes. Alguns puzzles teriam que ser refeitos, mas nem tantos assim e certamente funcionaria infindamente melhor.
Eu já disse, mas vou repetir porque esse é o ponto realmente importante: andar e controlar o laço no mesmo botão não funciona de forma tão fantabulosa assim. Não é nada que caga o jogo nem nada assim, dá pra fazer, mas se tem algo que impede esse jogo de ser uma obra prima é isso. O que é uma pena, pq de modo geral eu gostei da implementação da coisa em especial nos puzzles é bastante interessante.
Se deparou com uma piscina de veneno que você não consegue atravessar? Basta pegar alguns caras maus com o RiG, jogar ele no liquido, esperar ele morrer e ta-da, criou uma ponte humana. Precisa parar aquele ventilador enorme girando para passar sem ser cortado em pedacinhos? Agarre um inimigo, jogue ele no ventilador e repita com mais inimigos até os corpos fazerem a coisa emperrar. Existem muitos puzzles legais quebra-cabeças como esse ao longo do jogo – e, ocasionalmente, as lutas contra chefes também exigem o uso do RiG.
Não é limitado só aos puzzles entretanto, vc pode usar o RiG para apenas tirar os inimigos do seu caminho e foda-se. Tem um inimigo na sua frente que precisa de três ou quatro batidas no chão pra matar ele? Foda-se essa merda, só agarra ele e bota num buraco, tchau e bença. Ou só tira ele da frente, serve também (embora bem menos divertido).
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Suponho que não seria um jogo da Shiny sem suas famosas fases de tunel |
Eu gostaria que o jogo tivesse mais armas no cenário para se livrar dos inimigos - não que jogar eles em fios desencapados ou em ventiladores no teto não seja legal, mas não são tantos assim. Por outro lado, ao menos o jogo compensa isso tentando adicionar alguma variedade no gameplay: cada um dos 8 membros do Wild 9 que você resgata tem uma mecanica única, meio que como os companheiros animais de
DONKEY KONG COUNTRY só que sem repetir em nenhuma fase.
Nitro, por exemplo, é o seu parsa com a habilidade de se explodir repetidamente sempre que vc não estiver segurando ele com o RiG, e vc usa isso para matar inimigos e abrir paredes. Crystal é sua companheira (e obrigatória "mulher fatal sequici" que os anos 90 tanto adoravam) que só anda se tiver luz sobre ela, então vc tem que fazer umas paradinhas pra manter ela iluminada. E por aí vai. Novamente, não é nada que não vimos (melhor) em
DONKEY KONG COUNTRY, mas não deixa de ser interessantezinho e dá um certo sabor ao jogo, não dá pra tirar isso dele.
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Um dos seus aliados, por exemplo, te dá a habilidade temporária do TREZOITÃO |
O que, no fim do dia, é uma pena realmente. Pq adicione a coisa do controle ser nhamnhamnham que Wild 9 é um jogo feio mesmo para sua época - os personagens são em blocos, as texturas são turvas e é extremamente difícil diferenciar um inimigo do outro, ou mesmo o que sequer são os inimigos - quando o PS1 mesmo já fazia bem melhor com jogos como
SPYRO THE DRAGON ou
BRAVE FENCER MUSASHI, e temos um jogo que compreensivelmente passou batido.
Eu de modo geral gostei deste jogo, mesmo que tenha começado a arrastar um pouco no final, mas é bom. A ideia da arma é divertida, não com esses controles, mas divertida. Os puzzles são bons, e eu sou muito fã de qualquer jogo que permita vc usar o cenário para despachar inimigos. No geral, apenas um jogo de plataforma sólido, nada mais, mas então é o que vc pode esperar de jogos da Shiny: ideias excelentes, uma execução que te deixa meio "nham, né...?". Shiny em seu Shiniest.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 134 (Dezembro de 1998)
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 034 (Janeiro de 1997)
EDIÇÃO 046 (Janeiro de 1998)
EDIÇÃO 056 (Novembro de 1998)
MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 036 (Dezembro de 1998)