sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

[#1366][Set/1999] WILD ARMS 2 (ou "Wild Arms: 2nd Ignition" no Japão)

 
Oieeeeeee...


OH NÃO, ESSE SORRISO, ESSE MALDITO SORRISO...

Oh sim, Jorge! Pq hoje é dia de um tipo de review muito especial, o meu tipo favorito de review: a review "C estava certo o tempo todo!". Você não adora quando isso acontece?

NÃO, NÃO POSSO DIZER QUE SEJA MEU MOMENTO FAVORITO DO DIA

Mas é o meu, Jorge, porque essa é a continuação de um jogo que os próprios desenvolvedores leram minha review e concordaram com tudo que eu disse nela. Com efeito, todos os principais pontos que eu aderecei que eram negativos no jogo original foram particularmente retrabalhados na continuação, o que prova que os próprios devs do jogo concordam comigo!

ISSO NÃO FAZ NÃO FAZ O MENOR SENTIDO CRONOLOGICO! E MUITO MENOS LÓGICO!

Balela, balela, fogo na guela. O que eu posso dizer, de fato, é que dentre todos os milhares de jogo analisados nesse blog, poucos me decepcionaram mais do que o WILD ARMS original. Nem tanto pq o jogo é ruim, mas eu tinha grandes expectativas para ele depois de me apaixonar pela melhor abertura de um jogo de PS1... apenas para descobrir que o jogo é bem NHÉ.


NHÉ?

Nhé.

ESTAMOS CADA VEZ MAIS TECNICOS NESSE BLOG, PELO QUE EU VEJO.

Mas é, Jorge, quando você procura a definição de "RPG Genérico" no dicionário, o qeu você encontra uma foto do primeiro WILD ARMS. É um RPG de fantasia medieval (e não com temática de western, é bem fácil descobrir quem realmente jogou o jogo e quem só ouviu a música de abertura e viu a primeira tela do jogo) tão genérico quanto genérico pode ser. 

O que alias já era uma opinião das analises da época, saiba você:


Cientes disso, os desenvolvedores da Media.Vision se debruçaram sobre os problemas do jogo original e adereçaram eles. O resultado é que Wild Arms 2 pode ter seus defeitos, mas ninguém mais pode chamar ele de um RPG genérico e sem alma... ou até pode, mas estaria errado.

Então vamos começar do começo: a primeira coisa que foi drasticamente alterada aqui é o sistema de combate. Isso é a coisa mais chamativa, pq WA passou de um sistema tão básico quanto básico pode ser (ataque, magia, itens) para um sistema que eu nunca tinha visto antes na vida!


A abertura de WA2 não é tão lendária quanto a original, pq honestamente não acho que isso seria possível, mas ainda sim é bastante boa!

Funciona assim: você começa a luta sem mana, conforme seus bonecos atacam ou apanham eles ganham pontos de FP que são usados para ativar as magias e ARMs dos personagens. Isso quer dizer que existe uma escolha interessante aqui a ser feita: em dadas situações você tem que escolher castar as magias que você tem disponíveis, ou então aguentar mais um turno com ataque básico para aumentar o seu FP - isso se vc não tiver que parar para resolver BOs com itens de cura ou curar status.

Uma vez que você ganha um numero de FP você não perde mais ele (tipo se você chegar a 70 de FP, vc liberou todos seus poderes que custam de 70 pra baixo), embora você possa sacrificar 25, 50, 75 ou 100 dos seus FPs (que vão até 100) para usar habilidades únicas de cada personagem.


Não satisfeita em ter uma, na verdade esse jogo encomendou a Production IG (mais conhecido hoje por Psycho Pass e Haikyuu) uma abertura para cada CD - esta sendo a do segundo CD

O nosso herói Ashley, por exemplo, pode queimar 100 FP para ativar sua habilidade de virar o supercapetajin e ir full Kamen Rider com sua forma transformada. Brad pode queimar 25 FP para dar 100% de acerto no seu próximo ataque com ARMs, e por aí vai.

Esses dois fatores juntos criam um sistema de combate interessante que valoriza as habilidades pessoais de cada personagem, e mais ainda pq esse é um dos raros RPGs que permitem você trocar os personagens no começo de cada turno sem nenhum custo ao jogador - o que permite coisas como você colocar um healer dedicado apenas quando necessário, embora é claro que personagens na reserva não ganham FP, então não é essa putaria toda. 

Não é algo que se diga "minha noooossa, que sistema viciante e repleto de nuances", mas não deixa de ser um sistema original que mantém as lutas interessantes, especialmente as lutas contra chefes.

ESTAVA PENSANDO NISSO, TÁ, OKAY, REALMENTE EU ENTENDO COMO ISSO DÁ UMA DINAMICA PARA AS LUTAS CONTRA CHEFES, MAS AS LUTAS COMUNS DO DIA-A-DIA DO JOGO, NÃO FICAM UM SACO COMEÇAR SEM HABILIDADES?

Então, eles pensaram nisso. Você não começa com zero de FP, você começa com um valor de FP igual ao nível do personagem - o que quer dizer que um personagem no nível 15 começa toda luta com 15 FP, o que já é suficiente para ativar as habilidades/magias mais básicas e se virar no basicão. Funciona, posso dizer isso.


Outra coisa que era ultra mal utilizada no jogo anterior e agora os devs colocaram algum real carinho na ideia foi que cada personagem tem até três habilidades especiais para usar fora de combate e que servem exclusivamente para solucionar puzzles. Assim um personagem tem bombas que quebram paredes, outro tinha hookshot e por aí vai, meio que um Zeldinha do homem pobre.

O que é legal, o que é menos legal é que o primeiro WA nunca realmente explora todas as possibilidades disso e, mais especificamente, o que eu disse naquela review foi:

Embora eu goste dessa ideia de ganhar habilidades que permitem exploração maior, eu sinto que frequentemente o jogo parece esquecer que essas coisas existem, que o sistema não foi usado em todo o seu potencial. Eu não estou cobrando puzzles do nível ALUNDRA de explorar toda "física" do jogo, mas... c'mon guys, dava pra ter se esforçado um pouquiiiiinhozinho mais do que ISSO:

APOSTO QUE VC PEGOU UMA DUNGEON DO COMEÇO DO JOGO QUE SERVE COMO TUTORIAL SÓ PRA TIRAR DE CONTEXTO E ILUSTRAR O SEU PONTO

Então, não. Eis aqui um "puzzle" da última dungeon do jogo, a título de comparação:

Considerando como os puzzles são insípidos neste jogo, teria sido fantástico o jogo te exigir trocar personagens com habilidades únicas a cada um. O que parece ser algo que os desenvolvedores tinham mais intenções de usar, mas no final das contas não o fizeram.

Bem, a boa noticia é que dessa vez eles o fizeram. Os puzzles das dungeons envolvem usar as habilidades especiais dos seis personagens, e quanto mais personagens e quanto mais habilidades vc tem, mais vc tem que pensar um pouco para resolver como avançar. 

Novamente, tal qual o combate, não é uma coisa que se diga "minha nossa, entreguem os GOTYs, o papa-taças chegou", mas explorar as dungeons é divertido. Não são as dungeons chocolatantes de THE LEGEND OF ZELDA: Ocarina of Time, isso é certo, mas funciona ao que propõe a fazer e certamente é um passo além das dungeons sopa de chuchu que o jogo anterior oferecia.


Falando em "oferecer", o jogo realmente deu uma engordada no que ele oferece e agora finalmente Wild Arms parece um jogo da quinta geração e não um mero jogo de Super Nintendo impresso em CD. Digo isso pq agora temos dungeons extrar, chefes opcionais, skills de personagem que podem ser caçadas em monstros pelo mundo (como as blue magic de FINAL FANTASY 6e até mesmo um personagem secreto - mas que tem suas próprias cutscenes e dialogos. 

Claro, nada do que o jogo oferece é assim um FINAL FANTASY 7 de conteúdo extra... mas então, novamente, de RPG mais genérico do mundo para o FINAL FANTASY 7 do homem pobre a evolução é nada senão notável.


Porém de todas as coisas que davam o ar de genérico do jogo anterior e que agora foram resolvidas é que, acredite ou não, agora Wild Arms 2 tem um tema. O jogo quer falar sobre um assunto e enquanto o sucesso disso ser debatível, o fato que a narrativa ter um ponto que não "fantasia genérica #4879", novamente, é digno de nota.

 E o tema do jogo é "heroismo". Mais especificamente, o que significa ser um "herói"? Wild ARMs 2 é um jogo que se preocupa com a natureza e o papel dos heróis no mundo, e cada um dos membros do elenco explora uma faceta diferente de como alguém se torna um herói, o que os motiva e as realidades desse caminho de heroísmo.


O personagem do seu grupo Tim,  por exemplo, é originário da Vila Baskar, que mantém os costumes e ritos dos espíritos da natureza de Filgaia, os Guardiões. Os aldeões imediatamente o reconhecem como tendo a capacidade de se tornar um Pilar, um elo vivo entre os Guardiões e o mundo material. Essa característica é compartilhada por outra pessoa na vila, uma garota da idade de Tim chamada Collette, por quem ele, sem surpresa, fica imediatamente apaixonado. 

Porém o trabalho de um Pilar é ser sacrificado aos Guardiões e devido às visões do desastre que se aproxima. Como ele tem pouco conhecimento de sua herança ou habilidades, Tim hesita brevemente, levando o ancião da aldeia a dizer imediatamente que eles terão que retornar ao plano original e fazer com que Collette passe pelo julgamento. Tim rapidamente se oferece como voluntário. 


Naquela noite,  Tim ouve o ancião da aldeia e parece a mãe de Tim deixou a aldeia para evitar que ele se tornasse o Pilar, para que ele não fosse sacrificado, já que os videntes haviam predito que seus filhos seriam o próximo Pilar. Tim fica abalado com isso e o Ancião faz um breve discurso.

“Há pessoas que você quer proteger neste mundo, certo? Esta é a única maneira. Há momentos em que ALGUÉM deve ser sacrificado! Por favor, entenda Tim… você tem que morrer por Filgaia.”


E outros aldeões imediatamente começam a culpá-lo por um egoísmo que ele não expressou, para, por favor, pensar em suas famílias. Devo enfatizar que Tim tem 12 anos e, com base nas reações dos moradores até agora, se sua mãe não tivesse ido embora com ele quando ele era criança, ele teria sido sacrificado anos atrás.

Então... Tim deveria ser um herói e sacrificar para salvar o mundo e aqueles que ele ama? É isso fazem heróis serem heróis? Esse é um angulo que o jogo aborda.


Outra personagem do seu grupo, Kanon, é descendente direta da Espachim-Maga, a heroína que salvou o mundo de um terrível demonio várias gerações atrás. A coisa é que apesar da relação de sangue, Kanon não possui nenhuma habilidade em particular nem nada, e ainda sim o seu nome carrega o peso e a responsabilidade da maior heroína de todas. Então para Kanon, o que é heroísmo? É uma responsabilidade herdada? É um fardo que o seu sangue carrega? Esse é um angulo que o jogo aborda.

Alias em dado momento você até mesmo conversa com o espirito da própria Espadachim-Maga das lendas, e - no melhor dialogo do jogo - ela conta que ela mesma não queria nada disso. Ela não queria ser uma heroina, ela queria ser apenas uma garota e mais importante que isso, ela não queria ter morrido salvando o mundo. Ela queria viver, comer coisas gostosas, conversar com seus amigos, se apaixonar... se sacrificar para ser "a maior heroína de todos os tempos" nunca foi o plano, e muito menos algo que ela quis.




Ashley é um herói. Brad é um veterano de guerra que é aclamado como um herói, embora ele não se sinta um. Tim deve se tornar um herói pelo sacrificio, e Kanon acredita que é sua responsabilidade ser uma heroína a tal ponto que dita toda a sua existência e até mesmo o seu corpo

A única exceção do grupo é Lilka, e esse é outro angulo que o jogo aborda sobre o heroísmo. Lilka não consegue sequer fingir ser uma heroína, sua irmã deveria ser a a grande heroína e até ela falhou. Lilka não é o único mago em nosso grupo e, do ponto de vista do jogo, a estatística SOR de Tim descarta completamente a dela - indicando sua capacidade mágica inata muito maior (com seu HP mais baixo provavelmente ligado a ser tão jovem). Ela é uma aluna okay, mas sempre se atrapalha nos exames práticos - ela não consegue nem acertar a magia básica de teletransporte, além de ser socialmente desajeitada como o inferno.


E esse é o angulo debatido aqui: pode alguém "comum" ser um herói também? Alguem que não é de uma linhagem nobre, tem um super poder inato ou nasceu um gênio, uma pessoa meramente comum pode ser um herói?

Mas então, novamente, o que é ser um herói? É alguém que se sacrifica enquanto todos os outros ficam de braços cruzados apenas torcendo para que esse "herói" resolva os problemas deles sem eles fazerem nada? Qual é o custo de ser um herói? Qual é o caminho para ser um herói? É possível ser um herói se tornando um vilão? Todas essas consequencias, discussões e abordagens são sobre o que Wild Arms 2 é.


Ou ao menos na teoria, pq na prática eu não vou negar que a qualidade da escrita - ou da tradução, para ser mais honesto - é bem abaixo do que poderia ser. Isso quer dizer que o tema de WA2 soa muito melhor quando proposto do que quando executado, infelizmente. 

O jogo tem muito o que mastigar porque você consegue sentir que os devs realmente estão tentando, genuinamente, fazer algo com significado e abordar várias coisas, mas não tem como tirar do caminho que ele tropeça nas próprias pernas por causa da execução brega ou  da tradução que beira o nonsense. - se ao menos eu finalmente soubesse do que se tratava aquele negócio de 'Lago Congelado do Inferno' da Caina... na verdade, se eu soubesse entender a maioria das coisas que Caina diz, pq com essa tradução pelamor...

QUE?!?


Enfim, para mim WA2 ocupa um lugar semelhante ao primeiro Suikoden: um jogo amplamente ambiocioso, muito além do seu pálido orçamento - tanto que esse jogo sequer tem cutscenes, nem em CG nem em anime, as cenas chave são ilustradas por... pinturas paradas. Mas ainda sim dá pra dizer que lançaram algo que vc consegue sentir que eles estavam tentando... Nem sempre dá pra dizer que O QUE eles estavam tentando, mas estavam. Provavelmente.

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 068 (Novembro de 1999)


MATÉRIA NA GAMERS
Edição 041 (Junho de 1999)


EDIÇÃO 042 (Julho de 1999)


EDIÇÃO 045 (Outubro de 1999)


EDIÇÃO 068 (Junho de 2000 - Semana 2)