sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

[#1370][Nov/1999] CHRONO CROSS


A coisa que eu mais gosto da Squaresoft no final dos anos 90 é que eles estavam indo tão bem, acertando tantas coisas que a esse ponto eles apenas não sabiam mais o que fazer com tanto dinheiro. Quero dizer, quando você tem dois dos cinco jogos mais vendidos da história do console mais vendido de todos os tempos até aquele ponto então você tem dinheiro para uma senhora caceta subaquática.

E isso é uma coisa boa pq com o pão garantido na mesa, eles podiam se permitir investir em projetos mais autorais e menos comerciais - da mesma forma que hoje os blockbusters garantem o estofo de dinheiro para os estúdios financiarem pequenos projetos independentes. Nenhuma outra soma de condições permitiria, por exemplo, o lançamento de um jogo tão autoral e tão esquisito como VAGRANT STORY.

Mas se eu achei VAGRANT STORY um jogo esquisito e tão autoral que mais frequentemente sim do que não faltou alguém ir lá dar um tapa na cara do Yasumi Matsuno, acredite em mim, aquilo é o nerd escoteiro mais bem comportado da história das salas de aula hipotéticas perto desse bad boy aqui. "Esquisito" sequer começa a descrever Chrono Cross, e mesmo após ter jogado 50 horas disso eu ainda estou com algumas dúvidas se esse jogo realmente existe ou é um delírio febril de um sonho de uma noite de verão em que você comeu 25 quilos de maionese vencida.

E honestamente, enquanto eu estou aqui escrevendo esse texto, eu meio que tendo a acreditar mais na hipotese da maionese estragada do que Chrono Cross realmente existir. Vamos a isso então.

Em 1995 a Nintendo lançou exclusivamente no Japão um acessório/serviço de assinatura para o Super Nintendo chamado "Satella View", que basicamente hoje pode ser descrito como um streaming de conteúdo via satélite. Certos jogos seriam disponibilizados para downloads durante certos horários conforme uma grade de programação, as vezes tinha programas com dicas e anuncios da Nintendo, enfim um meio que um canal de TV a cabo mas para videogames - você poderia jogar pistas extras de F-ZERO por exemplo durante o "horário" daquele conteúdo.


Isso é importante explicar pq entre o conteúdo que estava disponível no Satella View estava um spin-off de CHRONO TRIGGER. Sim, um spin-off do jRPG mais aclamado da quarta geração, o lendário jogo nascido da parceria do time dos sonhos: design de Hironobu Sakaguchi (o pai de Final Fantasy), direção de Yoshinori Kitase (diretor de  Final Fantasy 7músicas do homem, da lenda, do mito e gênio absoluto Nobuo Uematsu e character design de ninguém menos que Akira Toriyama. Mas tá, eu escrevi todo um especial de aniversário desse blog sobre CHRONO TRIGGER, o que importa agora é que CT é uma senhora de uma coisa.

Então, como exatamente é o spin-off disso? 


Bem, essencialmente Radical Dreamers é uma visual novel de Schalla e seu irmão Magus em mundo paralelo onde eles estão sem memórias e são membro de uma gangue de ladrões chamada Radical Dreamers, e acabam se envolvendo em roubar uma relíquia chamada Frozen Flame que na verdade é um resquício de Lavos que se perdeu no multiverso, o que deflagra um cenário que torna uma simples invasão a uma mansão e um heist em um cenário lovecraftiano de horror que questiona toda a realidade e a sanidade de seus protagonistas

APENAS... QUE?!?

Eu juro que não estou inventando isso, Jorge. Eu não tenho nenhuma grande explicação de porque um jogo redondinho e razoavelmente otimista teve um spin-off pesado que flerta com o horror e a insanidade, mas então suponho que é apenas assim que a mente dos artistas funciona.

O que importa para nossa história, no entanto, é que Radical Dreamers teve um remake... mas que ao mesmo tempo é um reboot e coexiste com o original... para PS1 na forma de um jRPG completo. E esse viria a ser Chrono Cross.

ENTÃO CHRONO CROSS É UM REMAKE MAS QUE AO MESMO TEMPO COEXISTE COM O ORIGINAL DE UM SPIN-OFF ESQUISITO DE CHRONO TRIGGER LANÇADO PARA UM SERVIÇO DE ASSINATURA QUE SÓ EXISTIU NO JAPÃO?

O que eu posso dizer? Os anos 90 eram esquisitos assim. Com efeito, após o fenomeno que foi Neon Genesis Evangelion na TV japonesa, todo final daquela decada foi lavada por essa moda de histórias profundamente conceituais que não realmente pode ser entendido ou ter muita certeza do que você estava vendo na tela. Estou falando de animes que realmente parecem um sonho febril de verão, como Paranoia Agent, Serial Experiment Lain ou The Big O - e Chrono Cross incorpora muito dessa estética dessa época, dessa coisa pós-Evangelion de você não ter exatamente certeza do que está acontecendo ou pq.

ESSA É... UMA ESCOLHA ESTRANHA PARA FAZER, ESPECIALMENTE COMO SPIN-OFF DE UM JRPG QUE NÃO APENAS É TUDO MENOS ISSO, TODO REDONDINHO E POSITIVO. MAS TUDO BEM, É APENAS UM REMAKE/REBOOT DE UM SPIN-OFF E TENHO CERTEZA QUE TODO MUNDO FOI AVISADO DISSO. 

Como assim?

UÉ, IMAGINA SE AS PESSOAS FOSSEM JOGAR CHRONO CROSS SEM SABER DESSE CONTEXTO TODO E APENAS ESPERASSEM QUE ELE FOSSE CHRONO TRIGGER 2?

Haaaaaam... pois é... então... a respeito disso, como eu posso te colocar... 

MEU PAI AMADO... ELES REALMENTE VENDERAM ESSE SPIN-OFF ESQUISITO COMO CHRONO TRIGGER 2, NÉ?

Temo que sim. E até hoje essa consta como uma das piores decisões de uma empresa conhecida por suas decisões ruins, pq o publico foi nesse jogo babando para encontrar CT2 e o que eles encontraram foi... olha, eu joguei 50 horas disso com a mente mais aberta possível, e não posso dizer que tenho muita certeza do que as pessoas encontraram aqui.

O melhor que eu posso dizer é que CC é o equivalente em jRPG daqueles animes cabeçudos intelectuais do final dos anos 90, e essa é a ultima coisa que alguém que veio estalando para jogar Chrono Trigger 2 esperava encontrar. O resultado disso é que, bem, boa sorte em encontrar uma opinião que NÃO comece com o desapontamento de que esse jogo não é Chrono Trigger 2 e frequentemente a analise termina por aí. Parabéns Square, vocês mataram a boa vontade do público com a sua obra antes mesmo dela ser lançada, genial, tacada de mestre, troféu joinha pra vocês, joinha with flames.

MAS TÁ, DEIXANDO DE LADO A FRUSTRAÇÃO QUE ESSE JOGO NÃO É CHRONO TRIGGER 2 E NUNCA TENTOU SER, SE ANALISARMOS APENAS CHRONO CROSS PELO QUE ELE É, SEM PRÉ-CONCEPÇÃO NENHUMA... QUE TIPO DE JOGO CHRONO CROSS É POR SEUS PRÓPRIOS MÉRITOS, AFINAL?

Então, essa é a outra parte do problema. Como eu disse, eu joguei 50 horas desse negócio e até agora não tenho lá muita certeza que posso afirmar o que esse jogo é, ou ao menos o que ele queria ser. E não acho que ninguém nesse mundo tenha, muito menos seus criadores. O melhor que eu posso dizer é que Chrono Cross é uma puta de uma algazarra, é isso que ele é.


Vamos lá então: como eu disse, Chrono Cross é um jRPG excêntrico que sumariza todas as tendencias narrativas japonesas do final dos anos 90/inicio de 2000. O que quer dizer que é uma brilhante, chamativa, colorido e introspectivo que faz muitas perguntas, mas não fornece muitas respostas. Com efeito, eu diria que mesmo seus criadores não tem lá tanta certeza assim das respostas para as perguntas que fazia apenas pq é assim que 1999/2000 rolava na cultura japonesa.

Olha, eu vou dizer pra vocês que eu sou macaco velho em Japão. Eu cresci nos anos 90 e já vi todo tipo de merda desconexa que você pode imaginar, se você acha que Neon Genesis Evangelion tem um final vago e sem nexo demais, eu digo a vocês que eu já assisti Revolutionary Girl Utena - isso é o quão acostumado com esses shenanigans eu estou.


Estou mostrando de onde eu venho para que você entenda quando eu digo que minha nossa senhora do tungalacatunga subaquático, eu nunca tinha visto uma história tão enrolada, confusa e mal contada em um jogo quanto esse. E olha que eu sei explicar toda a história de XENOGEARS (embora, é claro, eu ainda não cheguei em Kingdom Hearts). Mas vamos começar do começo.

Cruz do Tempo é sobre um jovem pescador chamado Serge que um dia vai parar em uma dimensão paralela onde, neste mundo, o pequeno Serge se afogou quando criança. Neste estranho mundo novo, ele é arrastado em uma caçada por ele mesmo, que vira uma caçada por um artefato alienígena e é antagonizado por um furry - a história mais antiga do mundo, saiba você. 

Ao contrário de CHRONO TRIGGER, então, o tema aqui não é tempo e sim dimensões paralelas: em sua jornada, Serge vai ficar saltando entre dois universos. Pessoas amigáveis ​​em um mundo podem ser estranhas para você em outro. Mortas aqui, mas vivas em outro lugar. Sentado em uma mansão ou dormindo na miséria. Eu, por exemplo, gostaria de viver no universo paralelo onde eu seria popular e estivesse escolhendo contatinhos ao invés de escrever sobre jogos de 25 anos atrás que ninguém se importa. Mas divago. 

Bela tentativa, FBI

Antes de eu me aprofundar ainda mais na história e nos seus problemas narrativos, suponho que ue deva dar uma rápida pincelada no sistema de combate antes de ser sugado pelo buraco negro que é o lore de CC e como ele faz as coisas.

Aqui, a mecanica de combate gira em torno de "elementos", que são similares as matérias de FINAL FANTASY 7: além do ataque básico, vc só pode lançar as magias que estão equipadas no seu grid - o que inclui magias de dano, cura e buff/debuffs.

Só que tem um ponto muito importante aqui que é o sistema de cores: cada elemento tem uma cor (fogo é vermelho, agua é azul, luz é branco e etc) e cada personagem tem uma cor inata. Então um elemento é forte contra uma cor inata e fraco contra ela ao mesmo tempo: branco é forte contra inato preto, mas ataque preto tambem é forte contra inato branco. Azul contra vermelho e vice-versa, amarelo e verde.


Claro que os personagens de dada cor inata também tem vantagem usando aquele elemento - Serge é branco, por exemplo, então suas magias brancas tem 1.5x eficiencia. Não é um sistema terrivelmente complexo, mas o jogo sabe brincar com isso os suficiente pra ser interessante. Esse Pokémon da Shopee é um sistema de combate sólido e bom, isso não pode ser tirado dele.

O que PODE ser tirado dele, entretanto, é que organizar os elementos na grid do seu personagem logo se torna um saco (itens consumíveis também ocupam slot de magias na grid), pq o nível da magia no grid importa (magias no slot nível 5 são mais fortes que no slot nível 3, obviamente) e a cor também.

NÃO PARECE TÃO RUIM ASSIM, PODE DAR TRABALHO MAS NÃO É COMO SE VOCÊ PRECISASSE FICAR MEXENDO NISSO TODA HORA

Seria. Não fosse que existem 44 personagens jogáveis por motivo nenhum que foda-se você, apenas por isso. 

ACHO QUE VOCÊ DIGITOU ERRADO, MAS SIM, 14 É BASTANTE GENTE MESMO

Eu não digitei errado. São QUARENTA E QUATRO mesmo. QUARENTA. E. QUATRO. MAS PUTA QUE PAREIO, ATREIO! Sério, imagine uma aventura de mesa onde um grupo de heróis se encontra em uma pousada. Digamos que há um cara healer ansioso que acabou de sair do seminário. Ele se junta a uma equipe liderada por uma guerreira Orc cansada. Ela só quer fazer missões e ser paga, pois tem dívidas para pagar em casa. Trabalhando para ela, uma bruxa louca por fogo e um ladrão que costumava ser advogado até que ele decidiu fazer um trabalho mais honesto. Esses quatro heróis aprendem com o estalajadeiro sobre um Lorde das Trevas que está com uma joia inestimável que pertence ao herdeiro legítimo que estaria disposto a pagar por sua devolução.

Alguém realmente colocou na ponta do lápis, e Chrono Cross tem mesmo mais personagens jogáveis que NPCs

Os quatro partem em sua jornada, junto com o estalajadeiro e o cara que varre o chão. Os seis então contratam um barqueiro para levá-los através de um rio que é perigoso devido às sereias. O barqueiro não tem mais nada para fazer depois do divórcio, e uma das sereias é bem tranquila, então eles vão junto depois da viagem. Você resgata uma mulher e uma criança de serem comidas por uma árvore agressiva, e em gratidão tanto a mãe quanto seu filho de sete anos pegam em armas e lutam por você. O grupo entra em conflito com um grupo rival de aventureiros várias vezes, até que ambos os líderes percebem que estão perdendo tempo quando deveriam estar trabalhando para o mesmo objetivo.

Nossas três dúzias de heróis confrontam o Lorde das Trevas e o espancam apenas para você descobrir que ele estava tentando proteger o mundo da entidade maligna que habita a joia roubada. O Lorde das Trevas se junta ao seu esquadrão, assim como a árvore comedora de crianças mencionada anteriormente, e então todos se unem para blá blá blá.

Você pegou a ideia de como é jogar Chrono Cross. O resultado disso é que existem muito poucos NPCs em Cross porque quase todos os personagens com um retrato se juntam à sua equipe, alguns com requisitos bem especificos de recrutamento (tipo vc fez escolha X, participou da luta Y usando personagem Z no seu grupo equipado com a arma W, coisas assim). Não que tenha alguma coisa de errado ter esses "colecionaveis" como conteúdo extra, não é bem esse o problema.

Aparentemente os temas do jogo são misantropia e gadice. Ou seja, é o Twitter basicamente

O problema mesmo é que você só pode trazer três personagens para uma batalha e um deles tem que ser o personagem principal. E provavalmente você também vai querer manter  o Freddy Mercury por perto, pois apenas ele e Kid podem roubar itens raros de chefes e Kid fica indisponível 85% do jogo. Então na prática na prática mesmo, vc tem 44 personagens e só vai usar 1, no máximo 2.

O que é uma decisão de design que eu realmente não consigo entender. Tipo, não é uma coisa ruim ou que te atrapalha no jogo nem nada, apenas... pra que? Tipo, programar um personagem para ser um personagem jogável com seus proprios parametros, atributos e slots é uma coisa que dá trabalho, console tempo (o que quer dizer que gasta dinheiro), e tudo isso a troco de que?

Um jogo como Suikoden ou SHINING FORCE: The Legacy of Great Intention ao menos aceita que você está literalmente montando um exército e acomoda seu enorme elenco dando a eles algo para fazer após o recrutamento, sendo que alguns personagens podem ser uteis para você passar por arcos especificos no jogo, e ter o recrutamento de novos personagens como uma forma de acrescentar mecanicas novas para manter as coisas frescas e interessantes.


Já Chrono Cross simplesmente nunca dá uma boa razão pela qual esta história não poderia ser ancorada em seis ou sete personagens jogáveis - com efeito, ela funcionaria melhor com seis ou sete personagens principais, mas já chego nisso. O resultado disso é que CC lembra muito o musical CATS, que puniu o mundo com uma versão cinematográfica onde cada novo personagem/felino tem uma música e dança quando aparece, apenas para passar o resto do filme meio que apenas existindo

Eu disse que gostaria que o jogo tivesse uns 6 personagens, mas a grande verdade sobre Chono Cross é que ele mal tem dois, já que os dois personagens principais mal aparecem neste jogo. O problema aqui é que como sua party pode ser qualquer coisa, ele não pode se apegar a ninguém então qualquer personagem que entre no seu grupo é apenas um placeholder genérico sem relevancia pra história.

Existem apenas dois personagens que são narrativamente fundamentais... e ainda sim mesmo eles mal aparecem. A história é claramente dividida em três atos e eu diria que em termos percentuais eles são 20:60:20. Serge é o personagem principal, mas no fim do primeiro ato ele troca de corpo com o vilão e você passa o segundo ato inteiro correndo atrás de desfazer isso, colocando toda narrativa em pausa. Levando em conta toda essa sidequest, você termina o jogo sabendo bem pouco sobre Serge enquanto personagem.

Considerando todo o puta rolo incompreensível que tu fez nesse jogo ao invés de só bater um fio pro teu parsa Chrono resolver as coisas, eu duvidaria muito dessa afirmação, Balthy

A outra personagem que teoricamente é relevante pra história é Kid, mas ela mal está no jogo ralmente. Ela tem uma cena importante no início dedicada a explicar sua motivação, no entanto, esse momento é completamente imperceptível. Assim como em FINAL FANTASY 8, muito contexto e foreshadowing são perdidos porque estão escondidos em cenas opcionais ou diluidos em uma imensidão de filler quando deveriam ter sido cutscenes de destaque.

Kid desaparece completamente no segundo ato e não pode ser recrutada novamente até pouco antes da masmorra final, onde ela é mais uma vez opcional. Tenho a sensação de que um dos desenvolvedores realmente deve ter odiado seus peitos australianos, dado o nível de abuso que ela sofre. Esfaqueada, envenenada, lavagem cerebral, e assim por diante. Eu diria que o flashback jogável da infancia de Kid no orfanato de Lucca perto do final é o ponto alto emocional do jogo... de uma personagem que não está no jogo em 85% dele! Vocês estão começando a entender o quão bagunçada é essa estrutura?

Então... por mais que eu tenha enrolado, suponho que está na hora de falar da história de Chrono Cross. Que todos os deuses antigos e os novos me ajudem.

A FATE ENCONTROU UMA FORMA DE TRANSFORMAR O PAI DE SERGE EM UM FURRY  POR MOTIVO NENHUM, E SERGE MATOU SEU PAI SEM SABER... mas confie em mim, esta é a parte "mais fácil" do loredump para digerir.

Vamos lá: XENOGEARS é um jogo da mesma era que esmaga todos os tropos e convenções de anime possíveis em um jRPG. Ele tinha robôs gigantes, imagens judaico-cristãs, temas junguianos, um mascote de pelúcia desagradável e uma história que não dava a mínima para o elenco jogável quando os vilões eram tão mais interessantes. Após o monstruoso primeiro disco de 50 horas, os desenvolvedores ficaram sem tempo porque eram ansiosos demais, inexperientes demais e morderam mais do que podiam mastigar. O segundo disco é literalmente um slideshow contando como deveria ter sido a história que um vilão que transforma a maior parte da humanidade em KFC cru - mas em sua defesa, ele se sente um pouco mal com seus genocídios antes de ascender à divindade.

Estou lembrando de XENOGEARS pq em comparação, acredito que Chrono Cross consegue ser pior ainda. Não, não tem um slideshow resumindo a história, mas ao menos XENOGEARS sabia que história queria contar desde o começo. Em Chrono Cross, existem pelo menos três histórias quase completamente separadas que são despejadas nas duas últimas masmorras e antes do chefe final. Essas revelações teriam sido devastadoras se não tivessem sido entregues horas depois de serem relevantes. 

Imagine se Aeris simplesmente desaparecesse no meio de FINAL FANTASY 7 e, mais tarde, Sephiroth mencionasse casualmente que "ah, sim, eu matei ela fora da tela... ah, e tambem tem um meteoro vindo, acho que vocês deviam saber disso", enquanto tudo que você fez no jogo foi correr atrás de uma sidequest para curar o vampirismo/licantropia/sei lá que porra ele tem do Vincent por 40 horas.


Chrono Cross é tipo isso, puta merda que narrativa mais mal estruturada, vc passa 40 horas correndo atrás de sidequests que nem são tão importantes assim, para no final o jogo vomitar de uma batelada só uma das histórias mais complexas e confusas já contadas em um jRPG. Ahtomano cu, rapá!

VOCÊ NÃO ESTÁ EXAGERANDO UM POUCO? QUER DIZER, O QUÃO COMPLICADO PODE REALMENTE SER?

Vamos lá então... Lembra de Belthasar, um dos três sábios de Zeal que foi transportado para o futuro pós-apocalíptico durante o incidente do Ocean Palace em CHRONO TRIGGER? Bem, graças aos esforços de Crono, Lucca, Frog e companhia, Lavos foi destruído, todos viveram felizes para sempre, fim.


Exceto que Belthasar usou a tecnologia avançada à sua disposição para descobrir que Lavos não foi realmente destruído, apenas banida para o nada além do fluxo do tempo. Schala, a princesa de Zeal e irmã mais velha/mais nova de Magus, foi sugada para esse mesmo nada, e logo Lavos começou a "se fundir" com ela, de alguma forma criando o "Time Devourer", uma criatura capaz de devorar o espaço-tempo.

Para tentar derrotar Lavos de uma vez por todas, Belthasar criou um arquipélago artificial chamado El Nido, com um instituto tecnológico chamado Chronopolis no centro. Esse arquipelado foi projetado para criar uma "quebra do tempo" em 2400 d.C. que o levaria para 1020 d.C. - como isso ajudaria a derrotar o Lavos devorador do espaço-tempo eu não sei, ou o jogo diz e eu perdi  num dos paredões de texto da dungeon final.

Seja como for, a quebra do tempo propulsionou El Nido e Chronopolis de volta no tempo para 12.000 a.C., a época de Zeal, tudo com a intenção de, por volta de 1020 d.C., capacitar o personagem principal de Chrono Cross, Serge, a libertar Schala das garras de Lavos. Mas o planeta — ou Lavos, não sei — trouxe Dinopolis, uma cidade alternativa Dragoniona — os Dragonions sendo descendentes de Reptite em uma realidade alternativa onde Azala venceu — para a "realidade regular" para agir como NÃO AGUENTO MAIS PARE COM ISSO AAAARGH MEU CÉREBRO, DEUS.


Narrativa 101: menos é mais. Ambiguidade mal aplicada e complexidade desnecessária só serve para alienar o espectador. Quando usada corretamente (veja: A Origem), a ambiguidade dá corpo a uma narrativa, adicionando intriga e promovendo uma interpretação cuidadosa. Quando usado incorretamente, como é o caso em Chrono Cross, serve apenas para mascarar a incapacidade de um escritor de formar personagens e cenários coerentes e atraentes.

Chrono Cross continua. Tudo sobre a história deste jogo é sobre Masami Kato - que escreveu a parte de Zeal de CHRONO TRIGGER - dizendo que Zeal era a parte mais importante do jogo ao ponto que no fim Chrono Cross de Masami Kato APAGA toda a história de CHRONO TRIGGER e só a personagem que ele criou, Schalla, permanece.

Veja, eu não estou dizendo que as IDEIAS de Chrno Cross são ruins per se, como o final que imagina que o mundo de Chrono Trigger se Lavos nunca tivesse existido seria o nosso mundo, mas puta merda, vão aprender a contar uma história, pelamor...

O que por si só ainda poderia funcionar... se o conceito fosse entregue a alguém com uma ideia muito melhor de como escrever e implementar esse tipo de história, e tivesse liberdade para cortar o inchaço abundante. Novamente: 44 membros do grupo, apenas dois importantes para a história, e desses dois, um passa mais da metade do jogo no corpo do vilão principal e o outro está apenas ausente.

E não ajuda muito que as sidequests com que vc se ocupa em 3/4 do jogo beiram o nonsense. Um problema recorrente das sidequests é que os problemas que o jogo tenta focar, como racismo, simplesmente degeneram em discursos tipo: "Todos os humanos são culpados por tudo!" e meio que é até onde vai, não tem mais do que isso. Nenhuma explicação de por que, como ou o que os humanos fizeram para justificar tal hostilidade - na verdade, os humanos que você conhece vivem em harmonia com a natureza em cidades bucólicas litoraneas. 

Nesses quase 1400 jogos no blog eu já tinha visto muita coisa, mas um jogo que se resenha sozinho é a primeira vez

A única explicação que você tem é: "Tudo no mundo inteiro é culpa de toda a raça humana!" como se fosse dado, o que faz menos sentido ainda quando seu grupo, incluindo seu herói humano, interrompe uma limpeza étnica da população de fadas cometida por anões mecânicos cuspidores de fogo (sim, sério, anões mecânicos cuspidores de fogo) e de alguma forma os humanos são culpados por causar toda a bagunça. Tanto os anões quanto as fadas culpam seu grupo porque você é humano, com a única explicação sendo "Os humanos são culpados por tudo!". Suponho que um dos temas do jogo é misantropia, porém uma das piores escritas que eu já vi na vida.

E para coroar a cereja do bolo, a trilha sonora é a coisa mais esquisofrenica que eu já vi na vida. Isso pq nesse trabalho, Yasunori Mitsuda conseguiu superar o já excelente trabalho que ele tinha feito em XENOGEARS, o tema do world map é a sua verdadeira obra prima que carrega sozinho muito da atmosfera desse jogo nas costas:

Ah vai se foder no mertiolate, o maluco pediu pra ser gênio e entrou três vezes na fila! E a trilha sonora de CC é repleta de tijolaços assim, inclusive magnificas reedições dos temas de CT. O que é tudo muito bom, tudo muito lindo, não fosse o fato que a música de batalha então é... isso:

Jesus AM/PM Posto Ipiranga, Matsuda! Tu pensou que essa coisa aguda ia tocar durante umas 30 horas pelo menos durante o jogo? Claramente não. Pra que meu deus um tema de batalha com um violino tão agudo? Eu te fiz alguma coisa pra querer tanto que meus ouvidos sangrem? 

Enfim, Chrono Cross tem combate passavel, uma direção de arte forte, música excelente (exceto o tema de batalha, a música QUE MAIS TOCA NO JOGO INTEIRO) e um enredo que começa simples, mas se torna impenetrável antes da metade do caminho, especialmente devido a inexistencia de personagens. Porra, LEGEND OF MANA que é só uma coleção de sidequests consegue ter personagens recorrentes mais consistentes e até arco de personagens mais coerentes que isso. 

Eu não sei pq, exatamente, o objetivo era fazer o jRPG mais enrolado de todos os tempos que senão o fato que isso era chique na narrativa japonesa da época, ou pq de todas as coisas isso calhar de acontecer justo no spin-off de um RPG tão compreensível quanto CHRONO TRIGGER. O que eu sei é apenas que essa coroa dúbia é de Chrono Cross... até o lançamento de Kingdom Hearts, porém isso ainda permanece a ser visto nesse blog.

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