domingo, 4 de agosto de 2024

[#1278][Nov/98] GLOVER


É o natal de 1998 e você tem apenas dez anos. Todo natal, você ganhava um novo jogo de Nintendo 64 para adicionar à sua modesta coleção - e como jogos de N64 eram caros, esse é o jogo que você ganhará e era isso. Então você vai e ansiosamente pega o pacote brilhantemente embrulhado. Era isso. Este era o novo jogo de Nintendo 64 que você jogaria nos próximos meses. Tinha que ser THE LEGEND OF ZELDA: Ocarina of Time. Tinha acabado de ser lançado, tinha que ser isso. Você rasga o embrulho de presente como um cortador de grama na grama seca do verão.

Não era THE LEGEND OF ZELDA: Ocarina of Time.

"O que diabos é isso?", você se pergunta confuso.

Era Glover. Feliz natal.


Mas vamos começar do começo: a Hasbro é uma empresa mais conhecida por fazer os brinquedos e jogos de tabuleiro - menos conhecida por ser a dona da marca Dungeons and Dragons e menos ainda por uma breve febre de verão nos anos noventa em que a Hasbro teve uma divisão inteira dedicada ao desenvolvimento de videogames - um projeto que durou cinco anos antes de uma inevitável venda para alguem mais insano ainda, a francesa Infogramas que já tinha adquirido o que sobrou da Atari. 

Majoritariamente, a Hasbro Interactive se contentava em publicar jogos - a maioria muitos dos quais eram ports de videogames dos seus jogos de tabuleiro como MONOPOLY ou CLUE, ou então remakes de jogos inofensivos de arcades antigos como MS. PAC-MAN ou SPACE INVADERS. No entanto, na lista de jogos publicados por esta obscura editora, um deles ecoa diferente e ainda ressoa até hoje como um dos títulos mais... diferentes não apenas desta editora, mas de fato na plataforma Nintendo 64 como um todo. O que não é necessariamente uma coisa boa, e esse jogo foi Glover.


A história de Glover faz tanto sentido quanto a Nintendo ter dado a Phillips os direitos de fazer jogos de Mario e Zelda no infame CDI de Phillips no início dos anos 90: o jogo começa com um mago, que é simplesmente conhecido como "O Mago", cozinhando uma poção estranha em seu caldeirão no último andar de seu castelo. 

O que é estranho, embora não tão estranho quanto alguem cozinhar meninas perfeitas no seu porão... o que o plot de Meninas Superpoderosas é bem estranho quando você pensa sobre isso. Mas divago, eu dizia que "O Mago" pega mais ingredientes para colocar em seu caldeirão e quando os coloca, uma explosão acontece. O mago se transforma em pedra e cai pelo chão do castelo em um poço aparentemente sem fim. Antes de se transformar em pedra, suas luvas voam de suas mãos. Uma luva cai na mistura misteriosa do mago, e a outra sai pela janela e cai no chão. Essa luva é nosso herói Glover. 


Assim que ele se levanta, os sete cristais no topo do castelo caem. Para evitar que quebrem, Glover transforma os cristais em bolas de borracha vermelhas e amarelas, o que pareceu uma boa ideia na hora... exceto que seis bolas passam por portais. Agora você precisa recuperar as bolas para... não vou dizer que tenho lá taaaaanta certeza de para que, mas enfim vc precisa pegar os cristais que viraram bolas.

Porém isso não é tudo: a outra luva sai do caldeirão do mago, onde carbonizada no caldeirão de fogo. Ele é apresentado como Cross-Stitch, e é o inimigo de Glover. Cross-Stitch solta uma risada maníaca que me assombrará até o fim dos meus dias, e o jogo começa.


Bem, falando do jogo em si, entender Glover é bastante simples: você controla a luva-título e as bolas tem a sua própria física... o que me imediatamente me deu flashbacks do Vietnã com THE ADVENTURES OF KID KLEETS. Sim, lembra daquele jogo de plataforma em que você tem que controlar uma bola que supostamente deveria ter uma física própria? Provavelmente não, apenas eu carrego essa mácula eternamente no que restou da minha alma.

Seja como for, o que eu posso dizer é que poucas coisas nessa vida me geram menos interesse em jogar uma versão plataforma 3D de THE ADVENTURES OF KID KLEETS. E as coisas ficam menos interessantes ainda a cada minuto:


Oh good god... esse vai ser um dia daqueles, né?

Bem, surpreendentemente, a boa notícia é que não. Glover não é nem de perto o acidente de trem que eu esperaria que ele fosse. A noticia não tão boa assim é que não vai muito alem disso tambem. Mas eu não estou realmente reclamando muito, cavalo dado...



O que essencialmente faz esse jogo funcionar é que embora a bola tenha de facto sua fisica própria, o jogo percebeu que fazer dela uma coisa solta só daria outro THE ADVENTURES OF KID KLEETS em nossas mãos. Assim sendo a bola cola facilmente na luva e você tem um bom controle dela. Controle o suficiente? Não o suficiente pro jogo ser bom boooooooom, mas ainda sim o suficiente pra ele não ser um desastre.

Eu diria que o maior problema nem é realmente que os controles ou a fisica da bolosa são o maior problema, esse realmente sendo o level design. A melhor forma de descrever Glover é o jogo é essencialmente uma longa missão de escolta: não é realmente dificil você chegar com sua luva onde vc quer chegar em especial devido ao pulo duplo que a luva tem quando está agarrada na bola (lá ele). Já fazer a bola chegar lá... abrir um caminho para a bola é o desafio do jogo em si.


E o melhor jogo do mundo que seja uma missão de escolta, ainda será uma missão de escolta no fim do dia. E acredite que carregar uma bola por plataformas moveis é tão divertido quanto a proposta soa. Por melhor que o jogo execute isso (e ele nem é realmente espetacular, apenas competente), ainda sim ele está tentando executar uma coisa merda.

Porém se desconsiderarmos que o que o jogo tenta fazer é meio merda, Glover é um jogo de plataforma 3D razoavel. A bola tem quatro formas que implicam em pesos e fisicas diferente: bola de borracha, bola de boliche, bola de tenis e cristal, o que possibilita puzzles variados (sendo que o cristal serve para duplicar os pontos que você pega para ganhar vidas extras, com a penalidade de que ele é quebravel), assim como ele é capaz de usar poções para estender seu inventário de habilidades ainda mais: força, velocidade, voo, transformação de inimigos em sapos e muito mais.


E suas habilidades extras serão necessárias, pq uma coisa que eu garanto é que você vai morrer. E morrer. E morrer. O jogo está cheio de vidas extras, mas elas vão bem rápido especialmente depois do segundo mundo: plataformas moveis com uma camera que não exatamente ajuda, alienígenas roubam sua bola, transformam ela em um cristal e a jogam no ar (se você não pegar ela quando cai, ela quebra e você perde a vida), robôs vão te agarra e ter jogar para fora da fase e a maioria das fases finais são inteiramente no ar. Os inimigos ficam difíceis de matar, e as plataformas móveis estão por todo o lugar. E tudo isso tendo que passar a bola por isso. Yeah.

Então Glover é o tipo de jogo de Nintendo 64 que todo já ouviu falar, mas muito poucos cresceram jogando. Voce sabe por cima que o jogo da luva existe e meio que é isso, até porque a coisa saiu uma semana antes de THE LEGEND OF ZELDA: Ocarina of Time, duas semanas depois de F-ZERO X e três semanas antes de STAR WARS: Rogue Squadron. Digamos que, para um garoto em 1998 que tinha um console rodando em cartuchos estupidamente caros, Glover não era nem perto de ser uma prioridade na aquisição. Ou mesmo para alugar no fim de semana.


E essa não seria uma escolha errada porque ele fica ao lado de GEX 64: Enter the GeckoCHAMALEON TWIST e muitos outros jogos de plataforma 3D que entram na categoria de "esse é um dos jogos já feitos". Nem todo jogo de plataforma 3D para o Nintendo 64 pode ser um BANJO-KAZOOIE ou um SUPER MARIO 64, mas aparentemente muitos e muitos podem sim ser um Glover da vida.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 135 (Janeiro de 1998)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 055 (Outubro de 1998)