terça-feira, 7 de março de 2023

[#1064][Mai/97] D-XHIRD


Em 1997, as coisas não estavam faceis para o Sega Saturn. Tirando os jogos de luta 2D onde o hardware do Saturn era perfeito pra isso (e com efeito tinha versões muito melhores do que para o Playstation), em todos os outros ramos de jogos o pau tava cantando bonito na Casa de Noca.

Como todo mundo sabe, e se não sabia tá sabendo agora, programar para o Saturn era uma desgraça pq a Sega colocou outro processador de ultima hora quando viu que o PS1 era superior a ele... e ficou uma estrovenga que ninguém tinha muita certeza de como fazer um conversar com o outro. O resultado é que ou os jogos usavam apenas um dos processadores do Saturn, ou o programador perdia sua sanidade tentando fazer os dois funcionarem juntos.

A intenção de fazer uma abertura cantada é louvavel, mas pegaram a rapa do tacho do J-Pop pra cantar isso...

Algumas pessoas (não muitas) dentro da Sega sabiam como fazer isso funcionar (especialmente Yu Suzuki, o mago dos arcades da Sega que fez jogos como VIRTUA FIGHTER e DAYTONA USA), mas da porta da empresa pra fora era um barata voa que deus me livre.

Adicione a isso que a Sony tinha dinheiro a dar com pau para contratos de exclusividade e o resultado dessa soma era que os jogos grandes bem depois para o Saturn (RESIDENT EVIL e CASTLEVANIA: Symphony of the Night sairam quase um ano depois para Saturn), ou não saiam at all (como Tomb Raider 2, por exemplo). Logo, a coisa tava bem feia.



E para piorar ainda mais o desespero que vem machucando o coração eu me entrego por inteiro esperando o seu perdão, a grande empresa quente no momento nos jogos de luta 3D era ninguém menos que senão a rival da Sega na disputa pelos arcades (o que sempre foi a area forte da empresa no Japão), ninguém menos do que a Namco.

SOUL EDGE  e TEKKEN 3 eram o fino da rapadura na questão "jogo de luta 3D", e estavam sob pesados contratos de exclusividade com o Playstation. E mesmo que não estivessem, a relação da Sega com a Namco era basicamente:

"Fico muito triste com uma notícia dessas, espero que piore" - Co, Nam.

Ou seja, as coisas voltaram a ser exatamente como eram nos tempos do Master System e do começo do Mega Drive, a Sega dependia só dos jogos dela, era ela contra o mundo... e isso era a ultima coisa que eles queriam pq isso é uma puta duma luta inglória morro acima.

Mas... o que fazer então? Bem, cooptar trouxas interessados em desenvolver para o Saturn seria um começo, de fato. Por exemplo, a Takara fez o primeiro jogo de luta do Playstation (e um dos primeiros jogos at all do PS1), BATTLE ARENA TOSHINDEN. Não é algo que se diga "minha noooossa que franquia que apavora chora Namco", mas era um nome com algum peso na época (peso por falta de opção? Provavelmente, mas era)


Então a Sega colou na Takara e pediu "ô tio faz um BATTLE ARENA TOSHINDEN exclusivo ae pa nóiz, nunca te pedi nada, na brotheragem, faz ae!". Não que ter um novo Toshinden era o sonho molhado de alguém, mas na situação que o Saturn tava a essa altura a Sega realmente não estava em posição de escolher.

A Takara então respondeu que sim, que faria um jogo exclusivo para o Saturn com a condição que eles pudessem escolher o pior nome do mundo. Pq na moral, nada mais explica o jogo se chamar "D-Xhird". Como é que se pronuncia essa bagaça? T-Shirt? Di-Zird? Ti-Shit? 


Pq sério, imagina chegar na locadora e pedir "tio, boa um DIXIRDI ae!". Não dá vei, simplesmente não dá. Pra adicionar ofensa a injúria, o narrador do jogo pronuncia "D-Third". O que eu desconfio que foi intencional, pq esse é o terceiro jogo da Takara para consoles da Sega (o primeiro foi o port de BATTLE ARENA TOSHINDEN e o segundo seu patch de update, BATTLE ARENA TOSHINDEN URA), então é muita cara de que eles não sabiam que nome colocar no jogo e chamaram só de "The Third" mesmo com a grafia mais louca que eles puderam juntar. Começamo TOPE, eu te digo.

Mais TOPE que isso, só a história do jogo. O que rola aqui é essencialmente o plot de Supernatural: nosso herói é um chosen one com o poder capetidico dentro dele, então o capeta mata a mãe dele quando criança e anos depois a namorada dele. Agora nosso herói vai em busca de vingança carry on my wayward son encontrando as pessoas mais bonitas do interior dos EUA ou algo assim, vc sabe como é.


TÁ, MAS ESSE NÃO É UM PLOT TÃO TERRÍVEL ASSIM...

É quando eu te disser que o nome do protagonista é Boy. Sério, ele literalmente se chama Boy. E o poder capetidico dentro dele se chama Shadow Boy. Shadow. Boy. Uau, é realmente impressionante que alguém que recebe salários para isso falou essas ideias em voz alta, minha teoria favorita é que eles apenas alguém a beira do coma alcoolico caído na rua e pediram pro pudim de cachaça dizer um nome. Faz muito mais sentido.

E não me pergunte pq os outros lutadores tão nessa quizomba, pelo que eu entendi eles querem... eu não consigo dizer isso sério... usar os poderes do SHADOW BOY para o bem ou para o mal, ou algo assim. esse é um jogo que nunca saiu do Japão então essa história é tudo que teremos. Aprenda a parar enquanto está ganhando, é o que eu sempre digo.


VC NUNCA DISSE ISSO UMA ÚNICA VEZ NA SUA VIDA

Facto. A boa noticia, no entanto, é que pelo menos o gameplay não é tão ruim quanto o nome do jogo ou do protagonista, parece que o problema da Takara era só com nomes mesmos. A noticia não tão boa é que enquanto o jogo não é catastrófico... ele é meio que só uma versão piorada de BATTLE ARENA TOSHINDEN.

VC SABE QUE SER A VERSÃO PIORADA DE UM JOGO QUE JÁ É BEM MEDÍOCRE NÃO É ALGO DO QUAL ALGUÉM POSSA SE ORGULHAR, NÉ?

Eu sei, mas eu também sei que já vi piores do que isso. BEM piores, diga-se de passagem, piores do tipo que eu acordo gritando encharcado de suor a noite lembrando terrores que eu passei que nenhum ser humano ou macacão bonobo deveria passar na vida. Exceto quem ouve música no onibus com caixa de som JBL, esse tipo de gente merece. Então parabéns a Takara por ser vagamente acima disso... embora não tanto assim.

Eu não tanko SHADOW BOY, não dá...

Seja como for, dizia eu a respeito do jogo em si que esse é um jogo baseado em armas para Saturn, pq é o que todos garotos descolados do quarteirão estavam fazendo após o sucesso de SOUL EDGE. A apresentação do menu é okay, não tem nenhum tema em particular mas não é ruim ... apenas não empolga e honestamente é tão blé que o menu e a apresentação do jogo poderiam ter sido uma tela em branco que teria o mesmo resultado. Lembre-se dessa definição, pq ela será a tonica do jogo daqui pra frente.

Os gráficos são surpreendentemente complexos para o Saturn, com os personagens tendo camadas de roupas como em SOUL EDGE , porém só que como a Takara não é lá essa maravilha isso vem ao custo ao custo de que a animação e a movimentação é bem travada e ruim.


Alias não apenas a animação é grosseira, a detecção de colisão é muito pobre (o que é sempre algo "yay" em um jogo de luta, não é mesmo?) e é muito dificil dizer quando um personagem é acertado pq as reações não parecem certas. É quase como se os desenvolvedores desenvolveram o hit como uma mecanica separada do resto do jogo, a coisa toda parece muito desarticulada e realmente não é nada satisfatório.

Ou seja, é um jogo de luta que bater não é satisfatório, a receita de um jogão em uma casca de noz. Por outro lado, é verdade que o jogo não faz nada muito agravantemente ruim para além do fato dos personagens parecem pesar 8x mais e os hits não serem interessantes, o que coloca esse jogo no espectro de "ruim, mas existem coisas piores no mundo".

Curiosamente, apesar do jogo ser ruim borderline/meh, o review da Gamespost é surpreendetemente apaixonado sobre o quanto eles odiaram esse jogo. Seguem as palavras de Ryan Mac Donald, o homem que por alguma razão odeia Didird com todas as forças do seu coração:

"By far, the worst fighter I've ever played. When someone gets hit, it sounds like a water bottle being dropped on the ground. Plus, nearly every second of play is plagued by the annoying sound of weapons clashing. It pains me just to think about it. How could a company release a game like D-Xhird with a clear conscience? They had to know that the game they were working on was devoid of value. Saturn owners waiting for another good 3-D fighting game can just keep on waiting. This one isn't worth the CD it's burned on"

O jogo recebeu nota 1.4/10, e enquanto eu pessoalmente sempre curto zoar as coisas que acontecem no quintal da Sega tanto quanto qualquer cidadão de bem, tenho que admitir que é um tanto exagerado. Quer dizer, D-Bird é ruim e esquecível, mas não é TÃO ruim assim, obviamente esse cara nunca jogou coisas como ADVANCED DUNGEONS AND DRAGONS: IRON AND BLOOD: WARRIORS OF RAVENLOFT para entender o que é um jogo de luta ruim de verdade. 


Pra não dizer que o jogo não faz nada de diferente é que é só um Toshidenden do homem pobre, as que podem ser derrubadas e pegas de volta. Quando você faz um adversário ficar sem arma, ele fica limitado a alguns combos de soco/chute. Os personagens são muito dependentes de armas neste jogo, talvez se eles dessem a cada lutador um estilo de luta próprio essa parte poderia ter sido algo. As armas também tem medidores de vida próprios e teoricamente podem ser destruídas quando a barra de vida da arma se esgotar, mas pessoalmente eu não vi isso acontecer - a vida do personagem sempre acaba antes.

Enfim, definitivamente D-Didiê é mais esquecível do que ruim realmente, e por essa razão na obscuridade deverá permanecer até que o Sol se expanda e engula a todos nós antes do seu fim cósmico, pondo fim a aventura humana e dos jogos de luta 3D bosta na Terra. Amém.

MATÉRIA NA GAMERS
Edição 020 (Julho de 1997)