sexta-feira, 20 de setembro de 2024

[#1302][Nov/98] HERETIC 2


Essa é a história de um homem profano, um homem herege que não tinha respeito algum pelo sagrado. Essa é a história do homem que colocava arroz em cima do feijão, HEREGE 2!

... tá, não, momento tiozão do pavê a parte, vamos falar sério e abrir dizendo que Herege 2 é um jogo muito estranho e isso por vários motivos. Pra começar. Herege 2, apesar do nome, é na verdade o quarto jogo da franquia.


Isso pq o primeiro jogo foi Heretic, um FPS baseado em DOOM que foi lançado em 1994. HEXEN: Beyond Heretic é um jogo do final de 1995, também um um FPS baseado em DOOM, que conta uma história paralela ao jogo original ambientada no mesmo universo. Por fim, em 1997 foi lançado HEXEN 2 - o primeiro jogo 3D da série sendo este um FPS usando a engine de QUAKE.

Como dá pra ver, a sua produtora Raven Software sempre teve uma relação muito próxima com a produtora de DOOM - a ID Software - no sentido que não apenas todos os jogos foram publicados pela ID, todos os jogos usam a engine atual da ID na época do lançamento, como até mesmo alguns níveis de HEXEN: Beyond Heretic foram desenhados pelo homem, o mito, a lenda, John Romero.


Com isso sendo dito, é meio que esperado que o quarto jogo do Heregeverso seria também um FPS provavelmente usando a engine de QUAKE, não? Então, não. Herege 2 - que é o quarto jogo - na verdade é um jogo de tiro em terceira pessoa/hack'n slash que mais parece com TOMB RAIDER do que com QUAKE realmente.

Essa mudança de genero do jogo pegou todo mundo de surpresa, e somado ao fato que os fãs da série esperavam que o jogo se chamasse Hexen 3 ou algo assim, resultou num publico confuso e publico confuso significa vendas baixas. E por isso eu quero dizer realmente baixas, o jogo vendeu menos de 30 mil unidades em 1999.

Mas... isso é justo? O jogo merece ser esse fracasso comercial, ou apenas foi por causa da bagunça do marketing e pq o publico é cricri com a mudança de genero? É o que veremos a seguir.

A história do Heregeverso é que um dia chegaram três Senhores do Mal que Odeiam o Bem, chamados de "Cavaleiros Serpente". Os Cavaleiros Serpente logo se colocaram como deuses para os pobres mortais que não tinham poder para enfrenta-los e assim foi feito, com exceção dos elfos que mandaram aquele papo de divindade tomar onde o Sol não bate.

Assim, os elfos foram considerados hereges e uma inquisição começou. O que é uma forma elegante de dizer que eles mataram a torto e a direito os elfos pq foda-se. O primeiro jogo é um elfo chamado Corvus que não deixou barato e foi atrás dos cabras, ao que obteve sucesso.

O segundo jogo, HEXEN: Beyond Heretic, é um spin-off que mostra o que aconteceu com os Cavaleiros Serpentes que sobreviveram depois que Corvus correu com eles. Mais especificamente, Hexen, o segundo jogo da série, é sobre o que aconteceu com o segundo Cavaleiro Serpente, Korax.

Pois muito que bem, agora no quarto jogo da franquia a história volta para Corvus que regressou para suas terras elficas depois de botar os caras pra correr... apenas para descobrir que não apenas suas terras estão infectadas com uma praga virulenta e poderosa, como ele próprio pegou a catiça e não tem mais muito tempo de vida. Pq é tudo que alguém quer depois de quase morrer enfrentando uma invasão de overlords do mal, claro, ter que lidar com a COVID-28. Tem dia que é noite, sabe?

Enfim, os Cavaleiros Serpentes não são os vilões aqui, sendo este cargo nas mãos deum sujeito chamado Morcalavin que criou a praga que está devastando a terra natal do nosso herói. Antes de alcançá-lo, Corvus lutará contra uma série bastante padrão de inimigos de Dark Fantasy, de ratos a harpias e galinhas. E os infectados - já que a infecção causa insanidade - incluindo os próprios irmãos de Corvus, são inimigos, pois sua busca para libertar seu povo da praga não exclui o massacre em massa daqueles que ele está buscando uma cura.

Mas lembra que eu disse que Heretic 2 é um jogo estranho lá no começo, e citei alguns motivos? Então, tem mais um: apesar desse jogo ser de tiro em terceira pessoa/hack'n slash (tanto as armas de fogo , que aqui são magias mas dá na mesma, quanto as armas melee tem igual papel no jogo) que flerta bastante com plataforma, ele na verdade roda na engine de QUAKE 2.

Vc poderia pensar que pegar a engine de um FPS e fazer um FPS seria a escolha obvia, mas por alguma razão os caras da Raven decidiram que iam fazer era o primo brucutu de TOMB RAIDER, e foi o que eles fizeram. Infelizmente, isso não funciona tão bem assim... 

O jogo deixa claro desde cedo que a engine de QUAKE 2 não foi feita para plataformas, ele é rigido e instável para esse tipo de experiencia, sem espaço para navegação fina e precisa. Se você der um toque no botão de pulo ele dá um saltinho, mas se você segurar ele dá um salto mortal que vai um pouco mais longe e mais alto. De qualquer forma, ambos parecem ter uma trajetória predefinida que você não pode realmente influenciar, o que para plataformas - especialmente as plataformas moveis - acaba sendo uma pilha dolorosa de lixo. A maior parte das suas mortes em Heretic 2 acontece por causa dessas sessões, e por consequencia muito do seu tempo é gasto errando saltos e caindo toscamente das plataformas.

A boa notícia é que o combate em Heretic 2 se sai muito melhor do que a plataforma, devido à longa experiência da Raven Software no campo. Seu arsenal de armas é único, pois cerca de metade delas são magias. Você começa com uma bola de fogo fraca que ainda é eficaz contra monstros iniciais, um tiro espalhado estilo espingarda, uma parede de chamas, uma explosão fragmentária e uma bomba espiritual que precisa ser carregada. 

Além disso, você tem algumas armas que não usam mana, mas exigem sua própria munição. Isso inclui um cajado metralhadora, um arco e flecha explosivos (que funciona como um tipo de rocket launcher) e um arco de tempestade que literalmente faz chover em uma pequena área ao redor de onde a flecha cai. 


Honestamente, eu achei todos esses ataques decentemente divertidos de usar e gosto de como o arco de tempestade em particular introduz ataques de area no jogo para inimigos atirando atrás de coberturas, taí  uma coisa maneira realmente. A única coisa que não gosto é que alternar entre armas demora muito.

Você também tem magias defensivas que usam um conjunto separado de mana, mas infelizmente a maioria delas é inútil. Algumas poucas tem utilidade, como a magia meteoro que causa dano ao seu redor, ou o escudo de raios que causa dano a qualquer inimigo que se aproxime de você.

O combate corpo a corpo é uma experiência mista. Seus ataques com o cajado estão longe de parecerem fluídos e tem potencial zero de combos. Você basicamente tem apenas um punhado de ataques pré-programados. No início do jogo, usar o cajado parece suicídio pq a velocidade de ataque do Corvus é lenta e a detecção de colisão é... vamos dizer que é menos do que ideal. Entrar em distância corpo a corpo e esperar pelas animações lentas parece uma aposta bem ruim, sua variedade de ataques úteis à distância é apenas uma escolha melhor.

A boa noticia é que em algum ponto do jogo isso meio que muda, não sei dizer exatamente quando mas conforme vc vai upgradeando seu cajado ele se torna tão absurdamente poderoso que quebra o jogo. Nos níveis finais, meu cajado estava destruindo tudo com um hit e cada ataque que colocava em chamas quem sobrevivia de alguma forma. 

Se você segurar o botão de correr, o botão de avançar e o botão do mouse ao mesmo tempo, Corvus vau dar piruetas infinitas e destruirá coisas como o Diabo da Tasmânia ou alguma coisa assim. Se você combinar isso com o escudo de raios, os inimigos ficarão atordoados e incapazes de te atacar (provavelmente em choque pelo seu comportamento socialmente inadequado). Mas falando sério, é possível vencer toda a última área do jogo e a luta de chefe apenas segurando esses três botões e girando como um louco.

Mas, verdade seja dita, quando seu ataque corpo-a-corpo é uma merda as magias dão conta do recado e é divertido quando vc se torna a morte em pessoa com seus ataques melee quebrados, o combate realmente não é o problema aqui. O level design repleto de momentos "foda-se, instadeath" somada as plataformas pavorosas de navegar tornam esse jogo bem menos divertido do que ele poderia ser.

Olha só, um jogo baseado na engine do FPS mais popular da época funciona nas partes de tiro e combate de um hit, mas a engine do FPS não funciona em um combate fisico mais prolongado (como é no começo do jogo) e definitivamente não funciona nas sessões de plataforma. Uau, quem poderia prever isso, huh?

E mesmo que não fosse a coisa da engine não ter sido feita pra isso, ainda tem a coisa do level design pq o jogo começa Heretic ll é um discipulo da velha escola de FPS de "encontre a chave no labirinto, abra a porta". Isso funcionava nos dias de QUAKE e DOOM, mas em um mundo onde já existiam jogos como GOLDENEYE 007 e HALF-LIFE, nós já podiamos esperar mais do level design. No mínimo, isso impede Heretic 2 de ser um jogo de ação e aventura brilhante e o rebaixa a um jogo de tiro em terceira pessoa okay-ish.

Ou, como a Next Generation em sua edição 51 bem disse (que eu já mencionei aqui que em todos esses anos nesse blog acabou se tornando minha revista gringa favorita):

Heretic ll has a lot going for it. It easily earns it space on the shelf with the heavy hitters this season, but it also serves as a reminder to all that every aspect of game design needs to be pushed if you want your project to truly stand out.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 137 (Março de 1999)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 060 (Março de 1999)