Quando eu falei sobre MARVEL VS CAPCOM: Clash of Superheroes (uau, já faz quase dois anos, o tempo voa quando estamos nos divertindo, huh?), eu disse que o maior destaque daquele crossover caótico não eram as figurinhas carimbadas da Marvel como Wolverine ou Ciclope — muitos deles ainda ostentando sprites reciclados de dois ou três jogos atrás —, mas o novo elenco da Capcom. Não apenas os queridinhos habituais dos jogos de luta, a Capcom realmente raspou o fundo do tacho para nos trazer personagens não antes imaginados em um jogo de luta como Mega Man, Capitão Commando, Jin Saotome (o piloto que só aparecia nas cutscenes, não o mecha de CYBERBOTS: Fullmetal Madness) e, claro... Strider Hiryu.
Agora, é praticamente uma verdade universal que Strider Hiryu é um dos personagens mais estilosos de todo o lineup da Capcom. E como poderia não ser? Ele é um ninja do futuro com mascotes robóticos e um cachecol mais longo do que as aspirações de carreira da maioria das pessoas. Projetado com aquele toque inconfundível por Harumaru — a misterioso artista da Capcom responsável pelo visual iconico da empresa entre 1998 e 2000, tendo sua assinatura visual em jogos como de STREET FIGHTER ALPHA 3, STREET FIGHTER 3: 3rd Strike - Fight for the Future e CAPCOM VS SNK: Millenium Battle 2000. Ninguém sabe quem ela realmente é pq, como é tradicional no Japão sua identidade é mantida em segredo.
Mas então uma pergunta começou a ecoar pelas salas de estar e pelos fliperamas: "Ok, esse cara é muito maneiro, mas... da onde saiu isso?". A resposta para essa pergunta é... complicada. Tecnicamente, Strider Hiryu supostamente seria o mesmo cara do clássico STRIDER do arcade de 1988 (sim, TRINTA E SETE anos atrás, estamos irremediavelmente velhos mesmo), mas com um design tão dramaticamente atualizado — e, sejamos honestos, muito mais legal — que ninguém em sã consciência faria a conexão.
Então, o que é isso? Um redesign? Um reboot? Um novo Hiryu em uma longa linhagem de ninjas cibernéticos com cachecóis vermelhos? Ou a Capcom simplesmente esqueceu sua própria história e decidiu improvisar?
Para responder a tudo isso — e, mais importante, para lucrar com a repentina superpopularidade de sua misteriosa e incrível participação especial no crossover — a Capcom decidiu trazer o cyber-ninja de volta aos holofotes com Strider 2!
ESPERE, ESPERE, ESPERA AÍ — JÁ EXISTE UM TEM UM STRIDER 2 (OU JOURNEY FROM DARKNESS: STRIDER RETURNS NA VERSÃO PARA MEGA DRIVE)
Bem... sim. Mas tem dois problemas com isso.
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Foi o pior dos tempos, foi... é, só o pior dos tempos mesmo |
Problema nº 1: A Capcom não fez esse jogo. Uma empresa chamada Tiertex fez. Eles tinham os direitos para portar o Strider original para os consoles da Sega e, através de alguma brecha legal o contrato deles não proibia de fazer uma "sequência" completamente nova por conta própria. E a Capcom apenas deu de ombros, era o começo dos anos 90 e eles estavam ocupados demais ganhando dinheiro por cima e por baixo com suas outras franquias, então danesse.
Problema nº 2: Esse jogo é mais ruim que encoxar a vó no tanque. É um lixo desajeitado, feio e impossível de jogar. Até os dinossauros se sentiriam insultados se você comparasse isso à extinção deles. É tão ruim que a Capcom decidiu fingir que nunca aconteceu — e nem um único ser humano na face do planeta Terra protestou contra esse ato de amnésia deliberada.
Seja como for, eis aqui nossa história: Strider original é baseado em um manga dos anos 80, que se passa no (então) futurista ano de 1998 e fala sobre uma força tarefa de cyber ninjas que resolvem embroglios diplomáticos e outras situações de tensão entre os Estados Unidos e a Russia sem que os dois países precisem começar uma guerra nuclear no processo. Você precisa que alguém seja resgatado das garras do governo russo mas não pode mandar seus soldados porque isso começaria uma guerra? Striders servem para isso!
Enfim, por volta do ano 2000 um vilão maligno do mal que odeia o bem chamado literalmente Grão-Mestre — porque "sutileza" não passou da fase de arte conceitual — tentou dominar o mundo, espalhando ódio, destruição e vilania generalizada. Mas então um lendário Strider chamado Hiryu interveio e o impediu, porque é claro que ele o fez.
Corte rápido para dois mil anos no futuro, estamos agora no ano 4078, ou algo igualmente ridículo. O Grão-Mestre de alguma forma retorna! É. Eles meteram um Palpatine — ele está de volta, sem explicação, sem perguntas, apenas escrita preguiçosa. A Capcom fez isso primeiro, e sem dúvida melhor, porque pelo menos não virou um meme como "Somehow, GrandMaster returned".
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Essa frase é tão ruim que eu não tinha como não colocar aqui |
Mas ei, a organização Strider estava preparada. Aparentemente, eles tinham um freezer cheio de clones de Hiryu de prontidão só para casos de magos espaciais cartunescamente malignos aparecerem novamente. Então, descongelaram um, deram a ele uma roupa nova e incrível (daí a diferença em relação à versão de arcade de 1989 — é a 4077 Fashion Week, meu chapa) e o colocaram em ação sem nem um tutorial.
É profundo? Não. É literatura russa? Absolutamente não. Mas, sendo sincero, ninguém — incluindo a Capcom — esperava um Dostoiévski com wall jumping. Ação primeiro, história depois. Ou, neste caso: história nunca.
Então, vamos falar de gameplay porque Strider 2 é, quando você tira toda a bobagem de clonagem de ninjas no século 41, um dos últimos — senão o último — run'n gun mainstream a ganhar algum orçamento de um grande desenvolvedora. Hoje em dia, o gênero sobrevive na cena indie com jogos que tem o orçamento de dois Toblerones sabor maçã e uma bala Xaxá, mas naquela época ainda acontecia de uma empresa gigante como a Capcom ainda estar disposta a investir na nobre arte de correr e atirar.
Então, o que você realmente faz aqui? Você corre. E você atira... bem, corta coisas. Muito. Strider 2 é basicamente Speedrun: The Videogame. Se você ficar parado, está jogando errado. Hiryu não apenas corre do ponto A ao B — ele gira, desliza, pula em paredes e dá cambalhotas pela tela toda armado com uma espada de plasma.
O combate é bastante simples: você ataca com sua espada, as coisas morrem com um golpe (exceto chefes) e é isso. Você está cortando ciborgues, gorilas mutantes, robôs voadores e qualquer sonho febril que os artistas da Capcom inventaram às 3 da manhã. Os inimigos explodem em chuvas de faíscas pixeladas, e a tela raramente passa mais de dois segundos sem que algo exploda dramaticamente.
É cinético, fluido e nunca para de se mover. Cada fase é uma corrida rápida por uma pista de obstáculos sci-fi projetada por alguém que claramente não acreditava em passar em inspeções da CIPA
Então, sim — a Capcom claramente investiu tudo em estilo para deixar Strider com um visual maneiro. E ele parece maneiro. O design já impecável de Marvel vs. Capcom assume o controle total da tela aqui: Hiryu dá pulos duplos, corre no ar, muda de trajetória no ar (diametralmente opostos aos saltos travados pelo qual STRIDER ficou marcado), escala paredes, tetos e até mesmo sobe nos inimigos como o melhor Spider-Man Simulator 4099™ — um borrão roxo imparável de cachecol, aço e arrogância de um cyber-ninja. O importante é parecer bacana. E sim — ele parece bacana.
Mas Hiryu também joga bacana? Bem... sua experiência pode variar.
Veja, Strider 2 é essencialmente "Speedrun: The Game" (jogo que corre rápido), e nesse sentido entrega velocidade — mas eu diria que o ritmo é um pouco desequilibrado. O que quero dizer é: a maioria dos inimigos são mais cenográficos do que objetos do jogo realmente. Você pode simplesmente passar por eles, quase sem interagir, porque você é rápido demais para ser tocado e ocupado demais parecendo incrível para se importar. Há estilo de sobra, mas não muita substância por trás dos cortes.
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Após terminar o jogo, você desbloqueia Strider Hien - cujo ataque de projeteis funciona diferente |
Eu entendo o que a Capcom tentou fazer aqui — é o mesmo ethos de level design que eles usaram em DISNEY'S ALADDIN para SNES. Aquele jogo é uma aula de como fazer um speedrun divertido, onde as plataformas e o posicionamento dos inimigos fluíam juntos para te tornar uma máquina de parkour jogável. Você podia pular nos inimigos, emendar pulos, se pendurar nas plataformas e manter esse movimento fluído e zaz.
Strider 2 quer atingir isso... mas não exatamente consegue. Os inimigos não importam muito, e o level design dos níveis se resume principalmente a correr para a direita e pular ocasionalmente. Não é ruim, mas falta aquela camada extra de desafio ou tensão que poderia ter feito o movimento parecer significativo em vez de apenas parecer maneiro.
E é isso: Strider 2 não é ruim de jeito nenhum — só não é tão satisfatório de jogar quanto de assistir. Parece o jogo mais legal do planeta, mas quando você pega o controle, a empolgação cai para... "bom o suficiente, eu acho". E "bom o suficiente, eu acho" bate um pouco mais forte quando você está pilotando o que deveria ser o clone ninja mais foda do século 41.
O outro grande problema com Strider 2 é que ele não tem apenas o estilo de um jogo de arcade — é um jogo de arcade. Literalmente. Foi lançado nos fliperamas japoneses antes de chegar ao PS1. Mas é aqui que as coisas ficam estranhas: para uma versão de arcade, a Capcom diminuiu bastante a dificuldade para o lançamento doméstico. Bastante. Sério, bastante, bastante.
Strider 2 pode ser um dos jogos de ação mais fáceis de todos os tempos, e isso se deve a dois fatores principais. Primeiro: é incrivelmente personalizável. Quer dizer, essa coisa tem mais opções de acessibilidade do que um jogo de plataforma indie moderno. Você pode escolher se os ataques são ativados macetando ou apenas segurando um botão, quantos golpes sua barra de saúde aguenta, quão generosos são os power-ups.
Segundo: continues infinitos. Não apenas continues infinitos, mas respawn instantâneo exatamente onde você morreu continua. Então, a morte não significa absolutamente nada. Sem checkpoint. Sem reset. Apenas "Ah, não, você morreu — aqui está um Hiryu com vida cheia dois pixels à esquerda do seu cadáver. Go nuts".
E tem também a duração. Você consegue terminar o jogo inteiro em cerca de 45 minutos. Isso é bom para um arcade — ótimo, até. Mas como um lançamento de preço cheio para PS1? Um dos jogos mais fáceis já feitos que também é mais curto do que um episódio de Família Soprano? É um preço um pouco salgado para quem espera algo mais substancial pelo seu dinheiro.
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As cutscenes entre as fases são bonitas para um senhor caradoalho, isso tem que ser dado a eles |
Até a Capcom deve ter percebido que estavam pedindo o preço integral por tão pouco conteúdo, porque no lançamento para PS1 fizeram um pacote de dois discos, o segundo CD tendo a original do STRIDER de 1988. O que é legal, para ser sincero. É por isso que o lançamento de PS1 se chama Strider 1 & 2 — uma jogada de marketing inteligente para garantir que ninguém pesquisasse pelos jogos antigos por conta própria e fosse direcionado para a abominação da Tiertex.
Então, no fim das contas, Strider 2 é elegante, barulhento, estiloso pra caramba — mas, quando termina, você não tem certeza se algo substancial realmente aconteceu, mas, caramba, parece incrível. Sim, é superficial. Sim, é curto. Sim, tem o nível de desafio de descascar uma banana com um manual de instruções. Mas, por 45 minutos gloriosos, você pode fazer cosplay do clone ciberninja mais maneiro que o ano 4000 tem a oferecer. Você navegará por estações espaciais, fatiará gorilas cromados e escalará paredes por cenários infernais de neon — tudo isso parecendo que acabou de sair da arte conceitual de uma abertura de anime da era do PS1 que nunca existiu.
Strider 2 não é uma obra-prima. É um clima. Uma vibe. Um cachecol roxo balançando ao vento enquanto algo explode atrás de você em 2D pixelado. E, às vezes, isso basta. E se não bastar, azar o seu, pq o jogo não oferece mais que isso.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMESEDIÇÃO 151 (Maio de 2000)
EDIÇÃO 071 (Fevereiro de 2000)