Shadow of Destiny (ou "Shadow of Memories" na versão chá com crumpets) é um jogo esquisito, e eu digo isso por duas razões totalmente diferentes. Em primeiro lugar, a melhor forma que consigo descrever esse jogo é a seguinte: imagine THE LEGEND OF ZELDA: Majora's Mask... mas você fica só em Termina Town. Sem masmorras. Sem combate. Sem itens. Sem segredos escondidos atrás de quebra-cabeças inteligentes. Apenas andando por aí, conversando com NPCs e ocasionalmente retrocedendo no tempo.
E antes que você pergunte — não, não é como THE LEGEND OF ZELDA: Majora's Mask, onde cada personagem tem sua própria missão secundária ou rotina diária para você desvendar. Em Shadow of Memories, você está preso nessa cidadezinha europeia aconchegante com uma — e apenas uma — missão principal. Sem caminhos alternativos, sem mistérios opcionais, sem histórias pessoais ramificadas nas quais você pode tropeçar por acidente. Não parece muito emocionante, hein?
Bem, é aqui que entra a segunda razão pelo qual esse jogo é estranho: apesar de parecer uma versão da shopee e com zero orçamento de THE LEGEND OF ZELDA: Majora's Mask, Shadow of Memories não é realmente um jogo terrível. Até certo ponto. Chamá-lo de "bom" é meio que forçar a amizade, mas é inegavelmente interessante, um pequeno experimento curioso que, à sua própria maneira estranha, desengonçada e típica do início da era do PS2, ele meio que funciona. Mais ou menos.
Vamos ver o porquê disso.
Então, Eike Kusch está tendo um dia difícil. Você pode achar que sua segunda-feira foi ruim — daquelas em que seu despertador não toca, você sai atrasado, seu carro quebra e você é demitido antes do almoço — mas, acredite, o dia do Eike está sendo pior. Porque ele acaba de ser nas costas e morreu. É uma forma de começar a semana. Realmente dá o tom.
Mas o lado bom é que este evento infeliz não é o fim da história — porque se fosse, não teríamos um jogo, teríamos? Para sorte de Eike, uma espécie de divindade trickster conhecida como Homunculus decide intervir. E isso é ótimo por dois motivos muito importantes.
Primeiro — e o mais importante — Homunculus é dublado por Charles Martinet. Sim, aquele Charles Martinet. A voz do Mario. O cara do "Let's-a go!". O maestro do "Yippee!". A lenda do "It's-a me!". De posse dessa informação, eu me recuso categoricamente a classificar Shadow of Destiny totalmente como ficção, porque eu genuinamente gosto da ideia de que quando eu morrer poderei ser recebido pelo próprio Mario no pós-vida. Existem destinos muito piores para a vida após a morte.
Mas fora isso, o segundo motivo (e menos importante) é que esse estranho cósmico dublado pelo Mario entrega a Eike um dispositivo de viagem no tempo e basicamente diz a ele: "Vá consertar o seu dia, moleque". Normalmente, esse deveria ser o momento da manchete, mas qualé — estamos falando do Sir Charles aqui. O homem merece reverência.
Então lá vai você, armado com seu PSP mágico vindo direto do inferno, pronto para reviver seu dia desastroso na esperança de impedir seu assassinato, guiado por uma divindade que parece estar a um passo de pedir espaguete.
Enfim, a ideia da coisa é que Eike está agora preso em um tipo de loop Premonição, onde é repetidamente morto e então jogado de volta no tempo para evitar qualquer coisa ridícula que o matou desta vez. Peguemos sua morte original, por exemplo: Eike é esfaqueado nas costas. Então você retrocede para mais cedo naquele dia e elabora um plano brilhante: convencer um monte de moradores aleatórios para ficarem de bobeira no local onde você deveria morrer. Dessa forma, o assassino não pode te esfaquear sem testemunhas e desiste. Afinal, o esfaqueamento no meio da multidão no estilo Assassin's Creed só seria inventado dali a seis anos.
Mas é claro, isso é só o tutorial. O implacável assassino de Eike não desiste, e as formas como você deve evitar suas mortes se tornam cada vez mais complicadas. E quando eu digo "complicadas", quero dizer esdruxulas. Eike é esfaqueado, empurrado de uma torre, baleado, envenenado, atropelado, cai um vaso de plantas na cabeça dele... é metade um filme de Premonição, metade um desenho do Pateta.
O detalhe interessante aqui é como a viagem no tempo se integra na prevenção de cada novo assassinato — algo que eu sinceramente espero que vire a premissa de Premonição 7. Digamos que você foi envenenado. Você capota. Muito desagradável. Então você rebobina o dia e descobre que foi assassinado usando toxina de lesma-do-mar fêmea. Sim, sério. Um veneno tão específico que parece que os desenvolvedores tiraram da seção "Curiosidades Inúteis" de uma enciclopédia de 2001.
Naturalmente, seu próximo passo é ir até a biblioteca, onde você descobre que havia um antídoto... exceto que a criatura que o produz está extinta há séculos. Oh noes! Mas sem problemas, você tem uma máquina do tempo. É só voltar para a Idade Média, fuçar pela Alemanha medieval, fazer algumas fetch quests obrigatórias (porque Deus sabe que este jogo não iria bater sua cota de duração sem elas) e pegar o antídoto para você. Easy-peezy lemon squeezy.
Claro, provavelmente seria muito mais fácil simplesmente reiniciar o dia e, você sabe, não comer a sopa suspeita que te envenenou. Mas suponho que haja algum tipo de "estrutura de evento canônico timey-wimey" acontecendo aqui... Ou talvez apenas Eike não seja o lápis mais bem apontado do estojo. O seu palpite é tão bom quanto o meu.
Enfim, o ponto é: um capítulo faz você impedir que uma árvore seja plantada no século XVI, o que garante que, quando você voltar ao presente, seu suposto assassino não tenha mais onde se esconder. Outro capítulo exige que você fique espreitando nas sombras para dar um susto e garantir que seu eu do passado não seja esmagado por um vaso caindo de uma janela. E as soluções só ficam mais complicadas e patetas daí em diante.
Agora que você entendeu a jogabilidade básica, deve estar se perguntando: quem está tão desesperadamente empenhado em matar Eike? E, honestamente, eu não culpo quem quer que seja. Eike se parece suspeitamente com Johan de Monster, e quando alguém se parece com Johan, "melhor prevenir do que remediar" é uma abordagem totalmente válida. Mas suponho que alguma investigação seja devida: o que exatamente está acontecendo aqui, e por que Homunculus está se divertindo horrores, te dando este Sheikah Slate de viagem no tempo e te colocando num Dia da Marmota infinito?
O verdadeiro apelo de Shadow of Destiny não são os puzzles onde você repetidamente salva a vida de Eike de maneiras cada vez mais ridículas através de viagem no tempo. São os fios narrativos entrelaçados que se estendem por diferentes eras, cada um alimentando com pistas o mistério central — e às vezes até afetando uns aos outros de maneiras inteligentes. O jogo não te dá uma tonelada de escolhas, mas quando o faz, elas realmente importam, ramificando-se em oito finais diferentes dependendo de como você navega pela linha do tempo.
E embora eu esteja genuinamente investido no mistério — que, sim, flerta com os níveis de tolices com homúnculos de Fullmetal Alchemist (o que é bem legal na real) — estou ainda mais apaixonado por quão maravilhosamente brega a coisa toda é. Mesmo que você de alguma forma esqueça que o mestre dos fantoches por trás de tudo é o próprio Mario Mario (e você pode, já que Sir Charles tem na verdade uma versatilidade surpreendente), é muito mais difícil ignorar a atuação nível Troll 2 acontecendo em todo o resto. E certamente o roteiro não faz nenhum favor ao jogo. Não é hilariamente ruim, mas é definitivamente vergonhosamente ruim — e, honestamente, eu gosto disso. Eu prefiro um roteiro e uma atuação ruins do que um roteiro e uma atuação esquecíveis em qualquer dia da semana.
Então, no final, Shadow of Destiny é um daqueles jogos esquisitos do PS2, esse insistindo que pode misturar alquimia e viagem no tempo na mesma história, e de uma forma bem pateta meio que consegue. É desastrado, é melodramático, é atuado com a nuance emocional de uma novela mexicana — mas também não deixa de ser ousado, ambicioso e absolutamente sem vergonha nenhuma do seu próprio nonsense.
E a parte mais louca é: meio que funciona. Não porque o roteiro é bom (não é), não porque a atuação carrega o jogo (realmente não carrega), mas porque há um coração genuíno por baixo de toda essa tolice. Eu não posso dizer com certeza que entendi o que SoM tenta fazer, mas posso dizer que ele acredita 100% nisso... seja lá o que for.
Então sim — o dia de Eike é horrível, a viagem no tempo não faz sentido nenhum, e Mario Mario é um deus trapaceiro cósmico. Mas cáspita se isso não torna a coisa toda ao menos memorável.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMESEDIÇÃO 155 (Setembro de 2000)
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EDIÇÃO 074 (Julho de 2000 - Semana 4)




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