quarta-feira, 14 de setembro de 2022

[#973][Set/96] 9: The Last Resort



Quando eu escrevi sobre MYST, eu não fiz exatamente questão de ser criptico sobre o quanto o jogo falhou em me impressionar (o que é uma forma gentil de dizer que achei tenebrosamente ruim). Mas por mais que eu não tenha gostado do jogo em si, eu não tenho como negar o seu impacto cultural na época. Quer dizer, até tenho, mas estaria errado.

MYST passou a ser distribuído como um "jogo para quem não joga videogames", meio que um tataravô da ideia do Wii se preferir, e de fato muita gente que nunca tinha prestado atenção em videogames passou a faze-lo. Como Robert de Niro.


Bem, mais ou menos.

Embora frequentemente seja dito na internet que Robert De Niro seja o produtor desse jogo, não foi beeeeeem isso que aconteceu. O que acontecia é que em 1993 nosso motorista de taxi maluco favorito era dono de uma rede de restaurantes (e ainda é), a Tribecca Grill. Como o negócio deu bom, Robertão da massa expandiu seu branding para outras areas como o Tribecca Hotel ou uma empresa de mídia digital - a Tribecca Interactive.  Oh, a proposito o nome Tribecca se refere a uma região de Manhattan, e significa "TRIangle BElow CANal Street".



E foi esse ramo, a Tribecca Interactive que viu o sucesso de Myst e pensou "hã, eu posso fazer isso só que melhor!". Só que diferente da Brodderbund com seu MYST (olha o dedo maligno de Jordan Mechner aí, meu mais antigo inimigo), a Tribecca Interactive tinha não apenas dinheiro como o nome de uma grande estrela do cinema por trás.

O que isso quer dizer? Quer dizer, na prática, que foram convidados para esse projeto alguns nomes de peso que nunca antes consideraram participar de um videogame. Isso culminou que a página do jogo no IMDB tem mais nomes de peso que vários filmes da época e eu não estou exagerando:



O jogo conta com a dublagem de James Belushi, Cher, o superhomão Christopher Reeve, Ellen Degeneres e do Aerosmith participam Joe Perry e Steven Tyler. Quando eu disse que vários filmes da época não tinham nomes de peso assim, não era hiperbole.

Mas isso não é tudo: para fazer os cenários do jogo (que em MYST são fotos CGs renderizadas) foram encomendadas 1200 pinturas a oleo do artista surrealista Mark Ryden, uma das maiores figuras da cena artistica de Nova York. O que significa que esse jogo é muito bonito no sentido artistico e conceitual da palavra e tal qual o velhinho do Jurassic Park, o jogo não poupou despesas.

"GIRL EATEN BY A TREE", um quadro de Mark Ryden

Trabalhando com personagens que Ryden criou, o jogo gira em torno de um resort hotel decadente e seus estranhos habitantes. O jogador começa o jogo tendo herdado The Last Resort de seu falecido tio Thurston Last (Christopher Reeve). À medida que o jogador explora o hotel e resolve seus puzzles, ele descobre que o The Last Resort já foi um lugar onde os artistas que se hospedavam lá prosperaram graças a inspiração das nove musas que habitavam suas pares. 

Só que isso se perdeu quando dois inquilinos malignos chamados The Toxic Twins (o papel de Steven Tyler e Joe Perry do Aerosmith) roubaram as musas para si. O jogador então tem que se mover pelo hotel e encontrar uma maneira de recuperar as musas e lidar com os gemeos. Eles são ajudados ao longo do caminho por um homenzinho comedor de cigarros em um avião de brinquedo, tio Salty (Jim Belushi). É um jogo muito estranho.


Infelizmente todos esses bons predicados, tanto nas celebridades quanto na produção, se perdem no ato de jogar o jogo. O jogo em si é bastamte semelhante a MYST e isso não é algo bom a ser dito. E por isso eu quero dizer que as telas são estáticas com breves transições entre elas. 

Porém o problema mesmo é que os quebra-cabeças também tiram uma folha do trabalho da Brodderbund: eles são enigmáticos, confusos e frequentemente não fazem sentido nenhum. Não ajuda que os mais difíceis giram em torno de entender sobre música - no sentido de saber escalas e ler partitudes. Ou então o jogo apenas manda tudo isso pro espaço e passa longas horas apenas sendo um jogo de memória glorificado com várias dezenas de pares que precisam ser encontrados.

Meia hora de um jogo da memória com sons, yay

Para tornar sua vida ainda mais desconfortavel, você só pode carregar um item de cada vez, então se você precisar de várias peças para completar um quebra-cabeça prepare-se para quantidades inenarraveis de backtracking pela mansão. Uau, simplesmente genial. Um bloco de notas para lembrar onde vc viu os itens que vai precisar usar é indispensável e não é algo que eu tendo a gostar quando os jogos não tem ferramentas internas para você se organizar. 

Então para quem esse jogo foi feito é que é a real questão aqui. Conceitualmente o jogo parece tentar alcançar jogadores casuais (repetindo o sucesso de MYST), com o boost do star power de seu elenco... mas eu definitivamente não vejo o publico casual lidando com o ritmo lento dos quebra-cabeças onde você deve resolver puzzles que mesmo com um walkthrough na mao são dificeis de entender


E mesmo gamers mais experientes não vão ficar muito mais felizes que isso pq você não sabe para que lado virar na maior parte do tempo. Adicione a isso alguns puzzles que conseguem ser mais vagos que os de MYST, outros simples mas que exigem começar tudo de novo em uma sequencia longa de tentativa e erro... bem, vamos dizer que não é realmente surpresa que esse é o único jogo lançado pela Tribecca Interactive.

Na verdade antes mesmo de lançar o jogo a equipe já sabia disso, eles apenas viram o que tinham feito - e o quanto gastaram para faze-lo - e apenas disseram:


MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 110 (Dezembro de 1996)