Quando eu escrevi sobre MYST, eu não fiz exatamente questão de ser criptico sobre o quanto o jogo falhou em me impressionar (o que é uma forma gentil de dizer que achei tenebrosamente ruim). Mas por mais que eu não tenha gostado do jogo em si, eu não tenho como negar o seu impacto cultural na época. Quer dizer, até tenho, mas estaria errado.
MYST passou a ser distribuído como um "jogo para quem não joga videogames", meio que um tataravô da ideia do Wii se preferir, e de fato muita gente que nunca tinha prestado atenção em videogames passou a faze-lo. Como Robert de Niro.
Bem, mais ou menos.
Embora frequentemente seja dito na internet que Robert De Niro seja o produtor desse jogo, não foi beeeeeem isso que aconteceu. O que acontecia é que em 1993 nosso motorista de taxi maluco favorito era dono de uma rede de restaurantes (e ainda é), a Tribecca Grill. Como o negócio deu bom, Robertão da massa expandiu seu branding para outras areas como o Tribecca Hotel ou uma empresa de mídia digital - a Tribecca Interactive. Oh, a proposito o nome Tribecca se refere a uma região de Manhattan, e significa "TRIangle BElow CANal Street".
E foi esse ramo, a Tribecca Interactive que viu o sucesso de Myst e pensou "hã, eu posso fazer isso só que melhor!". Só que diferente da Brodderbund com seu MYST (olha o dedo maligno de Jordan Mechner aí, meu mais antigo inimigo), a Tribecca Interactive tinha não apenas dinheiro como o nome de uma grande estrela do cinema por trás.
O que isso quer dizer? Quer dizer, na prática, que foram convidados para esse projeto alguns nomes de peso que nunca antes consideraram participar de um videogame. Isso culminou que a página do jogo no IMDB tem mais nomes de peso que vários filmes da época e eu não estou exagerando:
O jogo conta com a dublagem de James Belushi, Cher, o superhomão Christopher Reeve, Ellen Degeneres e do Aerosmith participam Joe Perry e Steven Tyler. Quando eu disse que vários filmes da época não tinham nomes de peso assim, não era hiperbole.
Mas isso não é tudo: para fazer os cenários do jogo (que em MYST são fotos CGs renderizadas) foram encomendadas 1200 pinturas a oleo do artista surrealista Mark Ryden, uma das maiores figuras da cena artistica de Nova York. O que significa que esse jogo é muito bonito no sentido artistico e conceitual da palavra e tal qual o velhinho do Jurassic Park, o jogo não poupou despesas.
"GIRL EATEN BY A TREE", um quadro de Mark Ryden |
Trabalhando com personagens que Ryden criou, o jogo gira em torno de um resort hotel decadente e seus estranhos habitantes. O jogador começa o jogo tendo herdado The Last Resort de seu falecido tio Thurston Last (Christopher Reeve). À medida que o jogador explora o hotel e resolve seus puzzles, ele descobre que o The Last Resort já foi um lugar onde os artistas que se hospedavam lá prosperaram graças a inspiração das nove musas que habitavam suas pares.
Só que isso se perdeu quando dois inquilinos malignos chamados The Toxic Twins (o papel de Steven Tyler e Joe Perry do Aerosmith) roubaram as musas para si. O jogador então tem que se mover pelo hotel e encontrar uma maneira de recuperar as musas e lidar com os gemeos. Eles são ajudados ao longo do caminho por um homenzinho comedor de cigarros em um avião de brinquedo, tio Salty (Jim Belushi). É um jogo muito estranho.
Infelizmente todos esses bons predicados, tanto nas celebridades quanto na produção, se perdem no ato de jogar o jogo. O jogo em si é bastamte semelhante a MYST e isso não é algo bom a ser dito. E por isso eu quero dizer que as telas são estáticas com breves transições entre elas.
Porém o problema mesmo é que os quebra-cabeças também tiram uma folha do trabalho da Brodderbund: eles são enigmáticos, confusos e frequentemente não fazem sentido nenhum. Não ajuda que os mais difíceis giram em torno de entender sobre música - no sentido de saber escalas e ler partitudes. Ou então o jogo apenas manda tudo isso pro espaço e passa longas horas apenas sendo um jogo de memória glorificado com várias dezenas de pares que precisam ser encontrados.
Meia hora de um jogo da memória com sons, yay |
Para tornar sua vida ainda mais desconfortavel, você só pode carregar um item de cada vez, então se você precisar de várias peças para completar um quebra-cabeça prepare-se para quantidades inenarraveis de backtracking pela mansão. Uau, simplesmente genial. Um bloco de notas para lembrar onde vc viu os itens que vai precisar usar é indispensável e não é algo que eu tendo a gostar quando os jogos não tem ferramentas internas para você se organizar.
Então para quem esse jogo foi feito é que é a real questão aqui. Conceitualmente o jogo parece tentar alcançar jogadores casuais (repetindo o sucesso de MYST), com o boost do star power de seu elenco... mas eu definitivamente não vejo o publico casual lidando com o ritmo lento dos quebra-cabeças onde você deve resolver puzzles que mesmo com um walkthrough na mao são dificeis de entender
E mesmo gamers mais experientes não vão ficar muito mais felizes que isso pq você não sabe para que lado virar na maior parte do tempo. Adicione a isso alguns puzzles que conseguem ser mais vagos que os de MYST, outros simples mas que exigem começar tudo de novo em uma sequencia longa de tentativa e erro... bem, vamos dizer que não é realmente surpresa que esse é o único jogo lançado pela Tribecca Interactive.
Na verdade antes mesmo de lançar o jogo a equipe já sabia disso, eles apenas viram o que tinham feito - e o quanto gastaram para faze-lo - e apenas disseram:
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 110 (Dezembro de 1996)
Edição 110 (Dezembro de 1996)