Imagine, apenas por um momento, que estamos no meio dos anos 80.
HÃ, ESSE É UM BLOG ESCRITO EM 2022 SOBRE JOGOS DOS ANOS 90 QUE SE IMAGINAM NOS ANOS 80?
Timey-wimey big ball of stuff, Jorge. Seja como for, então estamos no meio dos anos 80. Aí eu te pergunto: como um filme de ação parece, exatamente? E eu mesmo te respondo: você tem um homão da porra com um corpo incompreensível para os meros mortais fazendo coisas fodas com armas fodas e sempre parecendo foda o tempo todo. Nada sobre ele é outra coisa senão foda. Ele não sua, ele não tem desafios, ele não se machuca - no máximo tem um cortezinho justamente pra mostrar o quão foda ele é ao sair com uma risada de algo que teria esfacelado qualquer outro homem.
Era uma era em que metade do personagem eram musculos, outra metade eram frases de efeito.
Hoje, é claro, não se faz mais as coisas assim - a menos que você queira intencionalmente fazer uma paródia ou algo do tipo. Os heróis de hoje são homens vulneraveis que precisam justificar a origem das suas habilidades, e demonstrar que dominam 15 tipos diferentes de artes marciais e expertise em armas de fogo. Ainda sim, é algo alcançavel. Eu nunca vou ser o John Wick, obvio, mas krav-maga e aprender a atirar é algo que eu poderia fazer se quisesse.
Mas mais importante que isso, os heróis são seres humanos com vulnerabilidades, duvidas e limites. Claro, ainda são filmes de açãoNão montanhas de musculos que patrolam tudo em seu caminho just because. É assim que os filmes são feitos hoje, certo, mas... quando foi que isso começou a mudar?
Em que ponto passamos de Mary Sues inspirados pelo sempre perfeito e invencível James Bond (que por sua vez era inspirado pelo mais invencível e mais sempre perfeito ainda Sherlock Holmes) e passamos a ter caras mortais em situações extremas?
Bem, tudo começou com um livro de 1979 chamado "Nada Dura para Sempre". Ou, mais precisamente, com a adaptação cinematográfica dele. A coisa de NDS é que ele não é sobre um super homão da porra fazendo superhomices, ele é sobre um mané bem aleatório na real.
Joseph Leland é um policial de meia idade que nunca foi grande coisa na vida, está saindo de um casamento merda onde ele levou um pé na bunda por ser um zé merda sem futuro e não tem grandes pretensões na vida além de se aposentar para continuar sendo um merda em tempo integral. Conan, o destruídor, ele não é.
Aí um dia ele está visitando o arranha-céus onde sua filha trabalha quando o lugar é tomado por terroristas. Por uma cagada do destino ele acaba escapando do controle dos terroristas - que não realmente se importam com ele, pq iriam? - e então nas entranhas do edificio começa a enfrentar os terroristas um por um para salvar sua filha.
Só que, lembrem, ele não é um giga astro dos filmes de ação, ele é só um policial meio merda. Isso quer dizer que ele se machuca, ele vence as vezes na sorte, ele reclama o tempo todo que ele é um policial meio merda e que não devia estar tendo que resolver aquilo sozinho, você sabe, apenas um cara normal se virando para salvar a filha.
O que, hoje, é visto como uma ideia interessante, fato. Em 1988, entretanto... a produção do filme teve bastante dificuldade em escalar uma estrela para o filme. Primeiro eles tentaram Arnold Schwarzenegger. Negativo. Então eles foram para Stalonne, que também recusou. Richard Gere - recusou. James Caan - recusou. Burt Reynolds, nada. E todas essas pessoas rejeitaram porque, lembre-se, estamos falando de gravações em 1987. Era uma época de filmes de ação tipo Rambo, Commando, Predator e, então diante de tudo isso, eles diziam que o herói era uma maricona. Frequentemente com essas palavras, pq lembre-se que estamos nos anos 80.
Em desespero, eles acabaram recorrendo a um ator que na época era mais famoso por comédias romanticas. Com efeito, nessa época ele já estava a três anos no ar com a série A Gata e o Rato. E foi a escolha perfeita para a ideia, Bruce Willis tem um ar meio loser de quem tá de saco cheio dessa merda toda que não realmente conversava com o tom dos filmes de ação da época, mas era perfeito para a ideia de "Nada Dura para Sempre".
Tem uma cena, logo no começo do filme, em que ele desce do avião e está caminhando no aeroporto quando essa super modelo dos anos 80 vem correndo na direção dele com roupa de academia. Ela então passa por ele e vai abraçar um outro cara no fundo, a mensagem é clara: esse não é o tipo de herói que esse cara ele é. Ele não é o cara super foda que fica com a super modelo, ele é o cara que viajou metade do país para ir numa festa de natal na empresa da ex-esposa... o que é bem loser, na verdade.
John McLanne enfrenta seu maior inimigo: executivos da indústria de video games
Com efeito, os maiores obstáculos enfrentados pelo nosso herói (no filme renomeado para John McLane pq esse é um nome bem mais legal) são: Discórdia conjugal, antipatia por Los Angeles, medo de voar em aviões, aversão por limusines, desaprovação do cuzão corporativo cheirando cocaína que continua dando em cima de sua ex-esposa – que mudou seu nome para o nome de solteira. Medo de altura. Estar sem sapatos. Um chefe de policia arrogante. Agentes especiais do FBI pessimamente treinados. Um repórter de TV desprezível. Estar sem sapatos. Não, sério: você não quer fazer isso sem sapatos.
Ajuda muito também que Alan Rickmann foi escalado como o vilão do filme e ao ler o script que lhe foi dado não conseguiu evitar soltar um "minha nossa senhora da Escócia molhada, isso é uma bosta". Ter as cenas do vilão reescritas com sugestões de alguém com classe como o professor Snape sempre é um bonus bem vindo que faz qualquer filme funcionar.
Enfim, a coisa sobre Die Hard (como "Nada Dura para Sempre" foi renomeado, pq é um nome muito melhor realmente) que o tornou um filme tão clássico foi que, na época em que foi lançado não havia nada como ele no cinema de ação.
Os personagens tinham preocupações mundanas, a situação era crível e você realmente via os danos e ferimentos no herói. Uma das minhas cenas favoritas em todo o filme é a cena em que McClane está no banheiro falando no rádio - essa foi uma cena que teve que ser defendida pelo diretor, pois o estúdio não queria ver seu herói quebrando.
McClane pede a Powell, que é seu único aliado no filme, que quando estiver tudo acabado, que ele encontre Holly e diga a ela que ele pediu desculpas. Neste momento você pode ouvir na voz de McClane que ele não acha que vai sobreviver a essa situação. É um momento muito poderoso porque em filmes de ação antes disso você não tinha dúvidas de que o herói sobreviveria, mas aqui há uma dúvida genuína se McClane sobreviverá ou não. Tão relevante quanto isso, é um herói que ele próprio não tem certeza que ele vai vencer sem o menor esforço.
Tá, tem que ser dito que as continuações não se mantiveram muito fieis a essa ideia...
Esse é o verdadeiro legado de Die Hard, não é a história de um herói perfeito que salvará o dia, mas um personagem falho que é colocado em uma situação em que não tem escolha a não ser tentar salvar o dia. Embora o Bruce Willis dizendo "yippie kay yay motherfucker" seja o elemento mais lembrado do filme, o elemento que realmente entrou pra história e define o gênero é a maneira como ele mudou os heróis de filmes de ação de super-homens invencíveis para pessoas comuns como você e eu.
E, claro, foi um sucesso tão grande que não pode deixar de gerar continuações... que não são tão historicamente relevantes, para dizer o minimo... e eventualmente essa trilogia virou um videogame. Tipo como ALIEN TRILOGY... mas não exatamente. Na verdade nada como isso.
Isso pq enquanto ALIEN TRILOGY é um jogo (um FPS, no caso) que apenas os cenários mudam conforme o tema dos filmes, aqui cada filme tem um gameplay inteiramente diferente. São três jogos com generos inteiramente diferentes, o que não é algo que eu lembro de ter visto antes, ou mesmo depois, isso há de ser dito.
Die Hard, o primeiro jogo, é essencialmente um remake em 3D do Die Hard para Nintendinho. Ou, se quisermos ficar com algo abordado nesse blog, algo aos moldes de TRUE LIES - apenas usando controles de tanque da era pré-analógica. Essa jogabilidade aos moldes de RESIDENT EVIL não exatamente envelheceu bem para um jogo de ação, mas é o que tinha para a época.
Enfim, o ponto do jogo aqui é que metralhadoras (Ho! Ho! Ho!), granadas e granadas de fumaça para ajudá-lo a derrotar Hans Gruber e seus amigos enquanto tenta salvar e proteger os reféns em cada andar do Nakatomi Plaza. Salvar os refens não é realmente obrigatório, entretanto.
O que É obrigatório é que em cada nível você deve despachar a quantidade de terroristas solicitada em seu HUD antes de precisar chegar ao elevador onde uma bomba está esperando para ser desarmada em 30 segundos ou você morrerá e terá que reiniciar o nível.
Não é um jogo particularmente especial, mas também não é particularmente terrível e depois de se acostumar com os controles, o jogo pode ser uma boa diversão apesar de ser MUITO difícil. Verdade que Die Hard é muito mais longo do que precisa ser, mas não é um jogo ruim. Apenas a duração faz com que se torne muito repetitivo.
Die Harder (ou "Duro de Matar 2" no Brasil) é radicalmente diferente do primeiro jogo: é um On-Rails Shooter com um diferencial para outros jogos do genero: praticamente tudo no jogo é destruível, desde janelas e placas aos proprios refens.
Fora isso o jogo não faz nada que outrous rail shooters não façam, mas para quem gosta do genero (o que não é o meu caso) sua compatibilidade com light guns é algo que sempre pode ser apreciada. Jogo sólido no que se propõe a fazer.
Die Hard... with a vengeance (ou "Duro de Matar 3" no Brasil) sempre foi o meu favorito dos três: existe uma cidade em 3D e vc tem que sentar o pau descendo o morro da vó salvelina para chegar até as bombas antes que o timer acabe.
Na época, nos anos 90, eu era apaixonado por essa ideia de jogo e com certeza eu não era o único. Essencialmente esse jogo é é um avô dos jogos da série Driver que posteriormente se tornaram o esqueleto dos jogos de GTA. Então a primeira vez que o mundo teve contato com o que viria a se tornar GTA foi aqui, e isso é alguma coisa.
Agora, por mais que eu tenha memórias nostalgicas dessa sessão em particular... eu não posso mentir e dizer que ela não é a que mais tem problemas dos três. Os controles neste jogo são muito ruins, especialmente dado o limite de tempo apertado que você tem. Um toque mais forte no controle faz vc enroscar no cenário e é isso, essa é toda chance que vc tem dentro do tempo que você tem - o que torna o jogo bem menos divertido do que ele poderia ser. Ser um pouco mais generoso com o tempo permitiria ter pelo menos um erro em um jogo de uma hora. É, uma hora dando gas sem poder errar não é exatamente diversão... mas poderia ser.
Uma curiosidade que eu tenho que mencionar aqui é que a dublagem nesse aqui é terrível. Enquanto a dublagem do McClane é passável, o resto do jogo é terrível - tipo o cara que dublou Zeus em vez de soar como Samuel L. Jackson soa mais como se estivesse fazendo uma imitação de Chris Rock. E o sotaque que Simon Gruber dá ao dizer o nome de McClane me faz ter certeza que eles usaram o unico take que eles gravaram.
No geral, Die Hard Trilogy oferece uma variedade bastante decente com seus jogos medíocres. Há um pouco de diversão, mas não muito. Principalmente, cada jogo não oferece variedade suficiente por conta própria, e nenhum deles envelheceu bem. Enquanto Die Hard Trilogy vendeu o suficiente para ganhar uma sequência, provavelmente um dos mais (senão "O" mais) influente filme de ação de todos os tempos merecia melhor do que isso.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES Edição 110 (Dezembro de 1996)
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER Edição 033 (Dezembro de 1996)