A série de jogos "Ganbare Goemon" é, sem sombra de dúvidas, a coisa mais japonesa de todos os tempos. Bem, talvez ao lado de Yakuza e certamente atrás de Mister Mosquitto já que nenhum outro lugar do mundo teria um simulador de mosquito repleto de fanservice (sim, eu to falando sério), mas você pegou a ideia da coisa.
O quão japonês são esses jogos, você me pergunta? Eu não sei, me diga você quantos jogos você conhece que as plataformas são literalmente sushi?
Ou que os inimigos são ... monges Komuso (aqueles com cesto na cabeça que tocam flauta) em um pula-pula...
... ou que os chefes são pescadores com roupas tradicionais dos pescadores de Nagarawa e mascaras Hyotoko... que andam em barcos com as próprias pernas e... jogam bombas?
... ok, isso realmente está muito, muito estranho e muito, muito japonês mesmo. O que falta eles colocarem agora pra isso ficar MAIS japonês? Depois da luta contra o chefe ele se torna um monstro gigante e você entra em um mecha para enfrentar ele?
Tá, e daí? Grande coisa um robozão gigante, certo? Então... cabe lembrar que esse jogo foi lançado em 1993, quando a gigantesca maioria dos americanos jamais sonhava que algo como Tokusatsu sequer existia.
O que hoje seria apenas um "ok, entendi a referencia" em 1993 era mais um "WHAT THE ACTUAL FUCK?!?" do porque eles estavam entrando em um robo gigante com a forma de uma pessoa e pilotando ele juntos.
Enfim, eu poderia passar um bom tempo dando exemplos do porque esse é o jogo mais japonês ever, mas suponho que você tenha pego a ideia da coisa a este ponto. Com efeito, eu tenho dificuldade em imaginar como esse jogo poderia ser MAIS japonês do que ele de fato é...
ARA ARA INTENSIFIES |
... err, pensando bem, deixa pra lá. Você entendeu que essa série é JAPONESAÇA PRA CARALHO e isso é o que importa.
Tão japonesa, de fato, que ao total existem ao todo 30 jogos dessa franquia feitos entre 1986 e 2005, e apenas 4 foram lançados no ocidente. Quatro de trinta, isso é o quanto essa série trabalha com referencias que beiram o indecifrável para o publico ocidental ao ponto que nem valeria o esforço.
O próprio protagonista da série, por exemplo, Ishikawa Goemon é uma figura folclórica muito conhecida no Japão ao passo que no ocidente só se ouviu falar dele por causa dos videogames baseados na sua persona (como por exemplo, ele ser a Persona do Yusuke em Persona 5)
Então a pergunta que cabe ser feita nesse momento é pq, entre os trinta jogos de Goemon lançados no ocidete, a Nintendo escolheu publicar justamente esse como dos mero quatro escolhidos?
Bem, três motivos básicamente: primeiro que o Nintendo 64 estava MUITO atrás do Playstation em jogos lançados. Verdade que uma boa parte dos poucos jogos lançados para N64 era só tijolaço, como SUPER MARIO 64 e GOLDENEYE 007, mas ainda sim a contagem tava muito feia contra a Nintendo. Pra ter uma ideia, nesse momento estamos cobrindo as revistas de outubro de 1997 e a contagem está 180 jogos de PS1 até aqui, e apenas 24 jogos de Nintendo 64.
Então a Nintendo não recusaria um jogo perfeitamente funcional se tivesse como vende-lo no ocidente (o que não é o caso de jogos como WONDER PROJECT J2, que realmente não tinha como vender no ocidente um raising sim, não naquela época pelo menos).
O segundo motivo é que esse é o jogo menos japonês de todos Goemon que eu já joguei. Isso pq esse jogo foi feito mais como um beta teste do hardware do Nintendo 64 - não tanto tempo depois assim, essa engine seria usada para lançar Castlevania 64, por exemplo - e por isso mesmo ele é bastante simples. Existem poucos modelos de inimigos, os cenários são bem básicos, bem coisa de quem está testando a ferramenta ainda.
Sim, é claro que o jogo tem seus momentos "dafuq, man..." de japonesice, mas não nada perto dos outros jogos da série. Então se tem um jogo que faz sentido tentar empurrar para o publico ocidental, seria esse.
Terceiro motivo, e talvez o mais importante, é que esse é um jogo da Konami (no tempo que esse nome valia coisa pra caralho) e que pode ser descrito essencialmente como THE LEGEND OF ZELDA: A LINK TO THE PAST feito usando a engine de SUPER MARIO 64. E porra, se isso não chamou sua atenção então nada mais chamará e vc está morto por dentro. E tem cara de mamão.
E ainda tem essa abertura cantada por Ichiro Mizuki, o homem, o mito, a lenda dos tokusatsu
Então, vamos começar por essa parte: o jogo segue essencialmente a estrutura já testada e aprovada por THE LEGEND OF ZELDA: A LINK TO THE PAST: voce tem um overworld e nele existem X dungeons. Em cada dungeon voce ganha uma arma ou item novo que te confere uma nova habilidade, e que entre uma dungeon e outra pode ser usada para explorar segredos no cenário do mundo. Tá, Goemon não é 100% assim (várias habilidades vc pega do lado de fora da dungeon), mas é essencialmente isso.
Só que como isso é executado em uma engine 3D, o jogo é essencialmente a Konami tentando fazer sua versão de SUPER MARIO 64 - só que com uma camera melhorada porque ela se autocentra nas costas do personagem após alguns segundos parados. O que quer dizer que se vc estiver com problemas de camera é só se afastar da parede e esperar alguns instantes que o jogo corrige pra vc, e isso é algo valiosissimo em jogos dessa época com o que MUITOS jogos de PS1 tem problemas terríveis... né não, THE CROW: City of Angels?
Então para um jogo de 1997 era REALMENTE impressionante pq até então nenhum jogo tinha tentado um mundo aberto em 3D tão grande assim. Sim, é verdade que em SUPER MARIO 64 as fases tem muito mais detalhes e parecem menos "vazias" que o mundo de Goemon, mas então elas são pequenas caixas fechadas em si mesmas, nenhum jogo havia tentado algo tão grande em um mundo conectado.
Então esse jogo é essencialmente um Zeldinha em 3D, com as ferramentas de design que a Konami conhecia na época - adicionados muitos segredos para descobrir no mundo e até mesmo cidades críveis habitadas por NPCs interessantes e um mundo coeso. Claro, alguns meses depois disso sairia um Zelda DE VERDADE, Ocarina of Time, e mostraria o que REALMENTE dava pra fazer com essa engine, fazendo Goemon parecer vazio e amador em comparação.
Mas eu sempre insisto nesse blog que as coisas tem que ser analisadas pela perspectiva da época, e Goemon foi criado em um mundo onde Ocarina of Time ainda não existia. Com efeito, nenhum action RPG em 3D assim existia, de modo que a Konami realmente pode se orgulhar de dizer que quando chegou aqui era tudo mato.
Uma coisa que ajuda muito esse jogo é que ele é exclusivo do Nintendo 64, então não tendo que se preocupar com ports para o PS1 ou Saturn ele pode utilizar em todo o potencial as capacidades tecnicas superiores do console da Nintendo - que é o que justamente permitia o jogo ter espaços tão maiores, com toda RAM extra e várias outras coisas extras que isso implicava já que - e isso é fácil esquecer, todas as coisas consideradas - o N64 era o console mais poderoso dessa geração, afinal.
Repleto de segredos, habilidades e com 4 personagens para alternar (cada um suas próprias qualidades para superar os puzzles), Goemon 64 é visualmente mais bonito e com mais senso de humor que SUPER MARIO 64, Goemon definitivamente merece seu próprio lugar entre os grandes nomes do Nintendo 64.
ESPERA, PARA, PARA, TEMPO, TEMPO. TEM UMA COISA QUE NÃO ESTÁ BATENDO AQUI.
E o que seria isso, Jorge?
DO JEITO QUE VC DESCREVE ESSE JOGO PARECE TODO INCRÍVEL E COISAS MIL...
Bem, esse meio que é o ponto, sim.
... ENTÃO COMO VOCE EXPLICA ISSO:
... bem, eu, veja bem...
E ISSO:
SE ESSE JOGO É TÃO TUBULAR ASSIM, ENTÃO PQ QUASE NINGUÉM DEU MAIS QUE NOTA 7 PRA ELE? COM EFEITO, ESTOU VENDO NAS TAGS QUE SEQUER VOCÊ DEU UM "THE BEST OF" PRA ELE! O QUE É QUE VOCÊ NÃO ESTÁ NOS DIZENDO?!
É, err... então... bem, vamos lá. Eu realmente queria ter gostado desse jogo mais do que eu gostei pq no fundo eu ainda sou um otaku safado em meu coração, e não vou mentir pra vocês que meu olho encheu d'água que esse jogo tem uma música cantada por ninguém menos que a absoluta lenda do tokusatsu, Ichiro Mizuki!
Quem não arrepia até a alma ouvindo o mestre (que nos deixou em 2022, alias) já está morto por dentro, não tem outra explicação. Mas sim, eu dizia que eu realmente queria gostar desse jogo mais do que eu gostei, só que tem duas coisas que em impedem.
A primeira é um tanto subjetiva, mas não posso dizer que não me incomodou: como eu disse antes, ele é o menos estranho dos jogos de Goemon. Sim, eu entendo que a Konami ainda estava aprendendo a mexer no brinquedo e não podia fazer todas as loucuras que fazia nos jogos 2D (como uma fase em que as serras são atores kabuki girando seus cabelos), mas ele é bem comportado nesse sentido... com exceção da dungeon que é um submarino que também é uma fabrica de sushi because Japan, eu gostaria que o jogo tivesse mais essa pegada.
Mas como eu disse, isso é subjetivo ao meu gosto. O problema, o REAL problema desse jogo é que, bem, ele é um DAQUELES jogos...
TEMO QUE VOCÊ TERÁ QUE SER MAIS ESPECIFICO DO QUE ISSO
... você sabe, AQUELES jogos...
NÃO, EU NÃO SEI. O QUE SERIA UM JOGO "DAQUELES"?
Um jogo que foi feito para vender detonados na Nintendo Power, pq é impossível jogar ele sem um walkthrough. Pronto, falei. Infelizmente isso não é algo tão raro assim em jogos exclusivos de consoles da Nintendo (né ZODA'S REVENGE: StarTropics 2?), e esse é um jogo desses.
Isso quer dizer que o mapa do jogo é muito grande, e mais frequentemente o jogo apenas te dá um pé na bunda para te dizer onde ir a seguir. Não é que eu queira uma setinha na tela ou algo do tipo, mas um NPC dando algum tipo de dica ajudaria... mas esse jogo não faz isso. Você termina uma dungeon, o jogo te coloca no mapa e onde ir a seguir te vira mermão... pow véi, me ajuda a te ajudar!
Uma das habilidades exclusivas de Yae, por exemplo, é invocar um dragão que te leva a qualquer cidade ou coffe shop já visitado antes |
Todas as orientações nesse jogo variam entre o criptico e o inexistente, e isso não é legal. Pior ainda é que isso não é apenas minha opinião, a própria Konami percebeu que eles fizeram merda porque adicionaram um NPC "oráculo" que dá dicas de onde ir a seguir por 10 pila. É uma solução pouco elegante e claramente adicionada de ultima hora pra remediar a merda, e de toda forma as dicas são bem vagas como todo o resto então ele ajuda bem pouco - apesar da sua voz de professor Mic do Boku no Hero Academy ser bem maneira, PURASMAAAAAAAAAAAA.
Isso, infelizmente, torna o jogo bem menos divertido de explorar do que ele poderia ser e ter que jogar o tempo todo empacando pq vc não consegue adivinhar que tinha que voltar na cidade 3 para falar com o NPC 17 não é o ideal. Vende revistas muito bem, mas definitivamente não é o ideal. Não é sequer bom.
Pra vc ter uma ideia, a certa altura o jogo até solicita que você visite o oráculo para te dizer o que fazer, como se alguém tivesse esquecido de inserir um evento de interligação e essa era a forma mais fácil de inserir na programação de última hora. Em outros casos, apenas um popup aparece na tela ou vc encontrará uma placa apenas informando a solução.
Por que não dar uma dica e depois dar a você a chance de descobrir por si mesmo? Isso é level design ruim, simplesmente. Não tem meias palavras a respeito disso. Eu desconfio, embora não possa provar, que a maior parte dessa culpa vem da localização, que é muito, muito ruim.
Eu sei que o jogo é para ser estranho e japonês, mas essa versão ocidental apenas tem muitos diálogos repletos de palavras estranhas que não encaixam, a coisa claramente foi traduzida com a bunda. O que é pior, as cutscenes do jogo são pontuadas com uma track de risadas nas punchlines das "piadas", mas o problema é que o riso raramente parece se alinhar com os chamados momentos engraçados.
Humor y Piadas |
Muito possivelmente no original em japonês seja um trocadilho ou uma piada realmente engraçada, mas eu não tenho como saber isso. O que eu tenho como saber é que o jogo é repleto de momentos que soltam risadas do Chaves no meio de frases absolutamente comuns e isso não parece certo.
E é por isso que esse jogo raramente teve uma nota maior que 7, o que eu não posso dizer que é injusto. Por mais que eu queira gostar dele, não tem como ignorar que os seus problemas diretamente atrapalham a diversão do jogo. E se a série jogo mais japonesa ever não é sobre diversão, bem, alguma coisa você está fazendo errado então.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 120 (Outubro de 1997)
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 042 (Outubro de 1997)
MATÉRIA NA GAMERS
Edição 012 (Outubro de 1996)
Edição 014 (Janeiro de 1997)
Edição 023 (Outubro de 1997)