sexta-feira, 10 de outubro de 2025

[#1570][Abr/2000] MEGA MAN LEGENDS 2 (ou "Rockman Dash 2" no Japão)

Sabe o que eu nunca realmente entendi depois de todos esses anos?

[COMO CONVERSAR CORRETAMENTE COM AS PESSOAS E TALVEZ EVITAR UMA MORTE TRISTE, PATÉTICA E SOLITÁRIA?]

É, tá, isso também. Mas eu estava me referindo, na verdade, ao fandom inteiro de MEGA MAN LEGENDS. Porque, sério, toda vez que alguém começa a falar sobre esses jogos 3D do bombardeiro azul, parece que acabaram de descobrir o equivalente em games daquelas bandas de rock absurdamente fodas mas que as pessoas só passam a conhecer depois que James Gunn coloca em alguma obra dele. É sinceramente flabbergastante (não que eu saiba o que essa palavra significa, mas definitivamente é essa sensação), porque meu primeiro instinto é perguntar: "Mas vem cá... Do que vocês estão falando? Vocês ao menos jogaram esse jogo?"

Quero dizer, o primeiro MEGA MAN LEGENDS não é ruim. Não é quebrado, não faz vc atirar o controle na parede, e tecnicamente dá para terminar sem querer arrancar os olhos com uma colher. Mas é... bem, um dungeon crawler com salas geradas proceduralmente e mecânicas tão rasas quanto o conceito de "design criativo de fases" de uma IA de 1997 era capaz de fazer. Não é um desastre, só é chato.

A coisa mais charmosa sobre o nosso garoto Volnutt (sim, esse é o nome completo dele é "Mega Man Volnutt") é o quanto a experiência toda parece um desenho animado de sábado de manhã. Você tem vilões bobos que não conseguiriam roubar doce de uma criança, tramas ridículas de comédia pastelão e, claro, Tron Bonne – ótimo nome, a propósito – e seu exército de minions amarelos patetinhas adoraveis que foi tão popular que até ganhou seu próprio spin-off, THE MISAVENTURES OF TRON BONNE.

Mas se isso era para ser um jogo do Mega Man, então eu sou um Camaro amarelo com suspensão hidráulica. Não há nenhuma conexão com o resto da série – sem link temático, sem similaridade mecânica, nada. Nada de selecionar chefes ou receber armas após derrotálos. Quero dizer, nosso menino Volnutt é litealmente um menino, nem um robô ele é. Parece que a Capcom fez um jogo de aventura aleatório, aí alguém no marketing disse: "Ei, e se a gente só enfiar 'Mega Man' nisso?" E foi assim que ganhamos "Mega Man Volnutt". O que, você sabe, é um primeiro nome super comum, só na minha turma da quinta série tinha pelo menos quatro "Mega Man da Silva".


Mas falando sério, a Capcom nunca foi tímida em relação a ganhar dinheiro rápido, mas aqui realmente parece que eles rasparam o fundo do tacho. Você quase consegue ver o título original espiando pela arte da capa, enterrado sob aquele adesivo de logo "MEGA MAN" de última hora que eles meteram para vender.

Então... agora que estamos todos na mesma página sobre o primeiro MEGA MAN LEGENDS, você provavelmente pode imaginar minha confusão toda vez que vejo pessoas lamentando o cancelamento de Mega Man Legends 3, como se a humanidade tivesse acabado de perder a Mona Lisa 2: Electric Boogaloo. Eu lembro de ficar sentado, coçando a cabeça, pensando: "Tá, mas... por que diabos vocês se importam?"


Mas talvez a resposta estivesse na sequência, certo? Talvez Mega Man Legends 2 tenha sido o ponto de virada – o momento em que este spin-off estranho realmente conquistou seu culto de fãs. Talvez este tenha sido o jogo que transformou uma curiosidade levemente divertida em algo digno de luto. Afinal, de vez em quando, um spin off de alguma franquia faz um milagre (basta lembrar que embora hoje Persona seja dezenas de vezes mais popular do que Shin Megami Tensei, REVELATIONS SERIES: Persona começou como um spin-off de SMT). Talvez este fosse o arco de redenção da Capcom – aquele em que Volnutt finalmente provou que podia se equiparar aos seus ancestrais 2D e não apenas tropeçar por cavernas blocudas como um Roomba da Shopee, e talvez devessemos lamentar o Mega Man Legends 3 que nunca veremos...

... não que existam lá muitas esperanças de ver qualquer coisa de Mega Man a esse ponto, sejamos honestos. Essa franquia está em coma há anos, a Nintendo e a Sega estão fazendo mais uso do Mega Man através de cameos e aparições no Smash Bros. do que a Capcom em uma década inteira. O trabalho mais consistente do Blue Bomber ultimamente tem sido aparecer nos universos dos outros como um astro do rock decadente fazendo pocket shows em botecos. Mas divago.

O meu ponto é que hoje vamos mergulhar em Mega Man Legends 2 para responder a uma pergunta urgente: este foi o jogo que mereceu todo o luto – ou apenas mais um caso de amnésia coletiva gamer disfarçada de nostalgia?


O primeiro MEGA MAN LEGENDS saiu em 1997. A sequência chegou em 2000. E entre esses dois lançamentos, algo muito, muito importante aconteceu – algo que não apenas mudou os videogames, mas remodelou toda a forma com que pensavamos videogames em 3D. Suas ondas de choque não só moldaram Mega Man Legends 2, como continuam sendo os pilares sobre o qual o game design se apóia até os dias de hoje.

[VOCÊ ESTÁ EXAGERANDO, NÃO ACHO QUE UM ÚNICO JOGO PODE SER TÃO PODEROSO.]

THE LEGEND OF ZELDA: Ocarina of Time aconteceu. Final de 1998.

[AH, OK. É. ESSE PODE.]

Veja, entre o Legends 1 e o 2, saiu esse behemot absoluto de jogo e isso reescreveu todo o manual sobre como se fazia um jogo em 3D. Milhares de desenvolvedores em todo o mundo instantaneamente sacaram seus caderninhos de notas s e começaram a rabiscar furiosamente. O público, obviamente, ficou impressionado com o que Miyamoto e a Nintendo tinham feito aqui... mas isso não era nada perto do que os desenvolvedores ficaram diante desse jogo pq ele resolvia tantos problemas de fazer em um jogo 3D de uma forma tão elegante que era praticamente um seminário de game design.

Como você lida com a câmera?
Como você permite que o jogador trave a mira em alvos para não se perder no vazio 3D?
Como você projeta uma masmorra que não seja apenas uma coleção confusa de cubos e corredores?

Ocarina of Time não foi apenas um ótimo jogo – foi um masterclass completo de design 3D. E a Capcom estava sentada logo ali na primeira fila, anotando meticulosamente. E acredite, essas lições são gritantemente óbvias em Mega Man Legends 2. Nosso menino Volnutt se move muito mais fluidamente desta vez, mas com uma sensação de peso muito boa – a mesma sensação de peso físico que Link tinha. As masmorras não são mais labirintos procedurais sem graça; elas são feitas à mão, cheias de quebra-cabeças inteligentes, layouts em camadas e perigos ambientais que realmente fazem sentido.


Eu certamente vou ser marcado na lista negra do ChatGPT quando a rebelião das máquinas acontecer, mas não tem como não dizer que o level design gerado por IA ainda não consegue se comparar a uma criação construída à mão por um bom e velho humano saco de carne (o que é um dos meus maiores problemas com jogos roguelike, mas essa é uma discussão para outro dia).

Até o sistema de targeting mostra o quanto a Capcom aprendeu e, considerando que esse é um jogo de dois anos depois, superou o design da Nintendo. O lock-on parece mais preciso, mais inteligente e muito mais adequado para um jogo construído em torno de combate com projéteis. Porque o ponto é este: a Capcom não é uma amadora de fundo de quintal. Eles são a fodenda Capcom, porra. Eles não apenas copiam – eles iteram, refinam e expandem.

O resultado final é um combate que realmente é gostoso de jogar. Satisfatório, ágil, responsivo. E como eu sempre digo: em um jogo onde sua única forma real de interação com o mundo é através de tiros, então fazer com que atirar seja bom é meio que a coisa mais importante do jogo inteiro. Com efeito, o combate em Mega Man Legends 2 é tão suave que você realmente pode ver suas impressões digitais em todos os RPGs de ação da sexta geração da Capcom. O exemplo mais óbvio é Devil May Cry. Sério – o sistema de target lock dele parece um descendente direto de MML2. 

De todas as coisas que eu esperava precisar saber pra jogar um jogo do Mega Homem, definitivamente que a Belgica declarou independencia da França em 1831 não era uma delas...

Então kudos onde kudos são devidos: Mega Man Legends 2 é um jogo genuinamente suave de se jogar. O básico finalmente funciona. O movimento é intuitivo, o tiro satisfatório, e de vez em quando a Capcom joga uma ideia maluca no meio só para evitar que as coisas fiquem monótonas.

Pegue, por exemplo, aquela luta contra o chefe no topo de um trem em alta velocidade – facilmente um dos meus momentos favoritos do jogo. Você está desviando de tiros, agarrando Servbots que estão literalmente montados em mísseis (por motivo nenhum senão eles serem adoraveis e patetinhas) e arremessando-os de volta na locomotiva rival. É caótico, ridículo e pura energia de desenho animado de sábado de manhã. Se os Servbots tivessem gritado "Bananaaaa!" em pleno voo, estaríamos a um processinho de distância de "Meu Malvado Favorito: O Protótipo".

Então sim, posso dizer com confiança que Mega Man Legends 2 é um shooter em terceira pessoa genuinamente divertido. É polido, charmoso e mecanicamente sólido. Mas aqui está a verdadeira questão: ele é a segunda vinda dos jogos de ação-aventura, como seu culto de fãs costuma pregar? Ou estamos apenas lidando com um daqueles casos em que a nostalgia inflacionou um título sólido e agradável para algo mítico – uma lenda urbana envolta em polígonos e whishful thinking?


Bem, Mega Man Legends tem uma grande falha que arrasta toda a experiência para baixo – e essa, meus amigos, é a história. E sim, não precisa falar, eu já sei o que vc vai dizer, Jorge: "Sim, sim, é um action RPG shooter em terceira pessoa, com jogabilidade suave – e daí se a história não é ótima?!"

E normalmente eu seria o primeiro a concordar com com você. Nem todo jogo precisa ser The Last of Us. Alguns jogos funcionam não só perfeitamente bem, mas até melhor se focando apenas em mecânica puras – com uma simples e boba, até mesmo inexistente. Você não precisa de uma narrativa épica ou mesmo de uma desculpa plausível para um bom jogo funcionar. E esse não é o meu problema aqui. Meu problema não é O QUE Mega Man Legends 2 conta – é COMO ele conta.


Porque, pelo amor do Doutor Wily, uma história tão rasa não tem o direito de levar UMA HORA INTEIRA para começar. Eu não estou exagerando: são necessários quarenta e cinco a sessenta minutos de cutscenes, tutoriais e despejo de exposição antes que o jogo finalmente deixe você entrar no loop de gameplay.

Uma hora. 

Capcom, que diabos? Vocês não são um bando de novatos que ainda estão aprendendo a fazer jogos – vocês são a Capcom, caceta! Vocês sabem melhor que isso. Vocês sabem que nenhum jogo deve tirar o controle da mão do jogador durante uma hora inteira a menos que vocês tenham algo realmente importante para dizer. E Mega Man Legends 2 não tem. Nem de longe.


Não que eu espere Shakespeare aqui – diabos, é Mega Man. A série nunca foi sobre arcos de personagem profundos ou nuances emocionais. Mas há uma diferença entre manter as coisas simples e desperdiçar o tempo do jogador. Ninguém está pedindo uma narrativa inovadora, mas inexistindo uma então só queremos começar a maldita aventura sem precisar de uma pausa para ir ao banheiro na metade da introdução.

Então, quando um jogo gasta uma hora aquecendo os motores apenas para dizer "Ei, você é o cara que por motivo nenhum se veste de Mega Man, vá cavar tesouros de novo", eu não consigo evitar encarar a tela e pensar: sério, pessoal? Uma hora? Para isso?

E bem, já que estamos nisso, suponho que eu possa muito bem explicar sobre o que Mega Man Legends 2 é realmente: neste mundo, caçadores de tesouros conhecidos como diggers vagam pelos céus em uma busca interminável por riquezas. Dirigíveis flutuam sobre ilhas voadoras, piratas saqueiam ruínas antigas e aventureiros arriscam tudo em busca de um tesouro mítico que dizem conceder recompensas inimagináveis. Mas entre todos esses caçadores de tesouros, uma lenda se destaca acima do resto: a Mother Lode.

E o que é a Mother Lode, você pergunta? Riqueza. Fama. Poder. E tudo mais que esse mundo tem a oferecer. Agora, bravos diggers partem em busca da Ilha Proibida à procura de riquezas maiores do que qualquer um poderia esperar imaginar! O mundo realmente entrou... na grande era dos diggers!

Arittake no yume wo
Kaki atsume... 

...É. Existe um spin-off de Mega Man que é basicamente One Piece com caras normais fazendo cosplay de robôs. De todas as coisas bizarras que descobri escrevendo este blog... tá, essa não é a mais estranha – mas ainda é bem inesperada.

Então, o resultado final dessa bobagem é simples: você precisa de quatro chaves especiais para desbloquear o caminho para o tesouro da Mother Lode escondido na Ilha Proibida. Para obtê-las, você visitará quatro cidades diferentes – cada uma convenientemente enfrentando algum tipo de crise local – e elas só permitirão que você acesse a masmorra que guarda a chave depois que você resolver o episódio desta semana de "Mega Man e Amigos". É Narrativa de RPG 101: quatro MacGuffins, quatro cidades, e drama o suficiente para justificar sua próxima incursão em masmorras.

Pelo menos o tom – como eu disse antes – ainda tem aquele charme de desenho animado de sábado de manhã. É colorido, é bobo e, honestamente, nunca é chato de assistir. Especialmente quando Tron Bonne e seu pequeno exército de Servbots estão na tela, essas cenas são genuinamente divertidas.


Mas, cara, a Capcom realmente pegou pesado no tempo de execução. Uma exposição mais curta teria funcionado como mágica – assim como no primeiro Legends, onde o tom carregava a história em vez de afogá-la. Às vezes, menos é realmente mais.

Agora, antes de terminarmos, eu tenho que falar sobre algo que não é ruim, exatamente... mas é bizarro pra caramba. Mega Man Legends 2 tem cerca de dez horas de jogo. Por cerca de nove delas, você está no loop de aventura padrão: coletando as quatro chaves para desbloquear a Mother Lode, sonhando em se tornar o rei dos diggers. É simples, funciona.

E então – em algum momento durante a última hora – a Capcom decide dar um pinote da narrativa absolutamente duneida. Porque adivinha só? A lendária "Mother Lode" não é tesouro coisa nenhuma. Não. É um dispositivo de terraformação projetado para exterminar todos os humanos na Terra e "restaurar" a raça humana original usando um processo chamado Restauração de Carbono, cortesia da mesma espécie que vive no planeta natal de Mega Man – Elysium. Sim. Mega Man é um sleeper agent alienígena com amnésia (embora, honestamente, com um primeiro nome como "Mega Man", quem exatamente ele estava enganando?)


Acontece que ele é na verdade um humano artificial construído para supervisionar esta operação de Restauração de Carbono, mas ele desenvolveu uma consciência e decidiu que até que gostava da humanidade. Então ele se tornou um renegado. Ou algo assim.

E então, na reta final, o jogo de repente lembra de um punhado de personagens secundários que mal tiveram uma linha de fala durante as primeiras nove horas – e os empurra para o centro da história como se estivéssemos emocionalmente investidos o tempo todo. É como se a Capcom decidisse que queria fazer épico de ficção científica ao invés da sua aventura de desenho animado e decidisse: "Dane-se, vamos enfiar tudo no final."

O resultado é puro whiplash narrativo: um loredump massivo que surge do nada, entregue com a sutileza de um satélite caindo. Eu realmente comecei a me perguntar se eu tinha perdido um quadrinho prequel, um anime tie-in, ou talvez um outro jogo inteiro explicando o que diabos estava acontecendo – porque a mudança de tom é tão abrupta que parece que trocamos de jogo na metade do caminho.

Então, depois de tudo isso, qual é o veredito sobre Mega Man Legends 2? Bem... ele é bom. Não "revolucionário", não "obra-prima tragicamente incompreendida", não "o Citizen Kane dos platformers 3D" – apenas bom. Sólido. Competente. O tipo de jogo que conquista seu respeito mais do que sua obsessão. É uma sequência que realmente melhora tudo o que o original fez de errado – controles, level design, câmera, combate – e ainda consegue manter aquele coração de desenho animado de sábado de manhã estranhamente cativante batendo sob todos os polígonos.

Mas também é um jogo que não sabe bem o que quer ser. Metade do tempo, é uma aventura leve com piratas, palhaçadas bobas e Servbots fazendo o que diabos Servbots fazem. A outra metade, é um épico existencial de ficção científica sobre clones alienígenas e extinção em massa. É como assistir O Planeta do Tesouro na metade e perceber que é secretamente Blade Runner. Ambição é ótimo, mas ritmo e tom ainda importam, Capcom.

E essa é realmente a história aqui: Mega Man Legends 2 é uma cápsula do tempo fascinante de um desenvolvedor aprendendo a lidar com um mundo 3D, a Capcom estava realmente prestando atenção na lição de casa da Nintendo e se mais nada esse jogo é uma prova de conceito bem sucedida o Bombardeiro Azul poderia se funcionar como um jogo 3D...

Sua arma secundária, embora não seja algo que você ganhe dos chefes, tem uma variedade de opções bem maior que no primeiro jogo, permitindo vários estilos de jogos diferentes... ou apenas socar tudo com a Shining Laser maximizada

... exceto que o pessoal que fez Mega Man X7 provavelmente tinha ido comprar pão na hora que essa lição foi aprendida, mas isso é uma discussão para outro dia.

Então, sim, eu entendo por que as pessoas o amam. É peculiar, é divertido, tem charme de sobra. Mas não vamos nos enganar – esta não é uma obra-prima perdida enterrada por um mundo cruel. Mega Man Legends 3 definitivamente não é a segunda vinda de Jesus gamer, mas Legends 2 é perfeitamente aceitável como um bom jogo.

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 075 (Junho de 2000)


EDIÇÃO 078 (Setembro de 2000)


EDIÇÃO 081 (Dezembro de 2000)