terça-feira, 30 de junho de 2020

[AÇÃO GAMES 052/ANTIGA GAMERS 001] GROUND ZERO TEXAS (Sega CD, 1994) [#419]



Matéria na AÇÃO GAMES
Matéria na GAMERS

Quando eu escrevi sobre Sonic CD, eu comentei sobre a estratégia bizarra da Sega de demorar quase um ano para começar a lançar jogos exclusivos para o Sega CD que justificassem a compra do acessório - sendo Sonic CD um desses jogos de peso que deveriam trazer jogadores ao sistema... e todo mundo viu no que deu isso. Mas essa não foi a primeira tentativa da Sega em chamar atenção ao seu periférico de CD, essa graça de ser o primeiro jogo de Sega CD cabe a Night Trap - que efetivamente é um jogo que precisa ser em CD para existir.

O resultado, embora nada do tipo MELDEWZZZZZ GAME FORMADOR DE CURRICULO GAMER EVAHHHH acabou sendo melhor do se poderia esperar, se mais nada um jogo que vale a pena ser conferido pela sua originalidade: controlar várias cameras na casa para ativar armadilhas contra ladrões que são vampiros, e tem uma festa do pijama rolando na casa enquanto isso because. É bem ruim, mas é o tipo de ruim que acaba sendo bom.

Vendo que Night Trap acabou dando mais certo que o esperado, obviamente que a Sega tratou de encomendar outro jogo nesse sentido só que com mais ação e mais gameplay. O que, afinal de contas, não é uma ideia ruim realmente - ainda mais dando o orçamento impensavel para um jogo desse tipo: dois milhões de dolares. A descrição da Gamers acaba sendo bem fiel ao que o jogo é: um jogo de tiro com elementos de Night Trap. Ok, isso pode dar certo.

Mas deu?



Capa europeia do jogo

Bem... então...

Em Ground Zero Texas você é novamente um operador de um grupo de operações especiais controlando cameras, só que dessa vez ao invés de ativar armadilhas você tem um bom e velho trabucão para atirar mesmo. O que será necessário, dado que na cidade de El Cadron, uma cidade fronteiriça do Texas com o México, muitas pessoas estão desaparecendo. Não porque elas estão sequestradas para a cidade ficar deserta e eles gravarem um reality show com qarenta crianças soltas sozinhas, mas porque aliens estão as abduzindo e as substituindo por agentes changelins infiltrados.

ESPERA, SE AS PESSOAS ESTÃO SENDO SUBSTITUÍDAS ENTÃO ELAS NÃO ESTÃO DESAPARECENDO. SE A INVASÃO DEU CERTO, NINGUÉM TEM COMO SABER QUE ACONTECEU QUALQUER COISA DE DIFERENTE NESSA CIDADE.

Você não está errado, Jorge. Felizmente para as forças especiais dos US and A os aliens são tão organizados quanto brasileiros fazendo quarentena e pegam mais pessoas do que eles substituem porque eles comem elas ou algo assim, e com efeito em determinado momento você encontra uma geladeira de gente seminua congelada. O que é mais tosco do que a descrição sugere, o objetivo desse jogo não é ser creep e sim... hã... eu não posso dizer que tenho certeza se existe um objetivo aqui, mas se existir certamente será um objetivo!

De qualquer jeito, o governo americano sabe disso e colocou a cidade em quarentena (o que não muda a rotina dos seus habitantes, esse jogo totalmente poderia se passar no Brasil) com a desculpa de algum tipo de desastre ambiental. Sua equipe é a última tentativa de limpar a cidade de aliens, caso contrário ela será nukeada - daí o nome “Ground Zero: Texas”.

O jogo segue algumas ideias de Night Trap no sentido de que eventos estão acontecendo na cidade em tempo real e você precisa trocar de cameras para estar sempre no local da ação. Você vê toda a experiência através de uma tela com aquela resolução lindérrima do Sega CD, e tem um painel de controle na parte inferior para trocar de camera. A diferença é que aqui existem apenas quatro câmeras, e não tem muita coisa acontecendo em cada area realmente.


O número estar piscando em vermelho significa que tem alguma coisa acontecendo naquela camera, então você tem que apertar A+direcional para ir até lá. Nesse caso, por exemplo, a camera estava no 1 e foi feita a transição para a 4 onde tava tendo treta

Com efeito, algumas cutscenes disparam em determinados momentos e você tem que acompanha-las para as sequencias de tiro. Não é como em Night Trap que sempre tem alguma coisa acontecendo em algum lugar da casa, mesmo que sejam coisas não relacionadas a capturar bandidos. Outra coisa que falta aqui é o senso espacial que Night Trap passa tão bem: você começa a ver uma cena por uma camera, e pode trocar para outra e ver outra parte da cena (por exemplo se as meninas vão da cozinha até o quarto passando pelo corredor, você pode ir trocando de camera para acompanhar isso). Isso passa a sensação de estar realmente monitorando cameras em tempo real e não apenas assistindo cutscenes que tocam aleatoriamente.

Ground Zero Texas nem de perto coloca tanto esforço nisso... ou esforço algum realmente. As cameras em locais diferentes da cidade em momento algum conversam entre si, não tem uma cena que começa em um e termina em outra, nada do tipo. A sensação que você tem é que realmente está apenas assistindo cutscenes aleatórias que tocam em momentos cronometrados.

Meu deus gente, Night Trap não é nenhuma obra prima, mas certamente vocês estão fazendo parecer ser em comparação!



Enfim, em troca esse jogo se foca mais na ação, e existem dois tipos de cena basicamente: as cenas de tiro que apenas aparecem aliens na tela e você atira neles, sem nada além disso, e as cenas que se passam na cidade com as pessoas levando suas vidas normais até do nada alguém se revelar um alien e atirar na tela - não se você atirar nele antes, isso é. As segundas são, de longe, as mais interessantes e nesse sentido a Ação Games passou uma boa ideia que ele lembra Mad Dog Mccree no sentido que não é apenas atirar, você tem que esperar o alien se revelar para só então atirar nele - atirar em três civis dá game over imediatamente.

Eu não tenho o menor gosto por shooters on rails, tanto que eu nem cubro esse tipo de jogo aqui, então minha opinião sobre a qualidade da execução dessas cenas de ação não acrescenta muita coisa. Mas entre os reviews que eu li de quem gosta desse gênero, o consenso é que execução dá errado por alguns motivos. A movimentação de um cursor pela tela como mira não é muito interessante, e teria sido mais proveitoso fazer do jogo compatível com o Menacer do Mega Drive. Eu desconfio que a ideia original era essa porque em alguns casos você tem que mirar precisamente em poucas frações de segundo, o que realmente não tem como ser feito usando o joystick pra mirar.

Claramente esse jogo foi feito para ser jogado com uma light gun, e se eu tivesse que chutar diria que o que aconteceu aqui foi que eles não conseguiram fazer a Menacer funcionar, ou apenas não quiseram ter o trabalho de programar isso. Eu sei lá, apenas tá estranho isso.


Como a maioria dos jogos de FMV da Digital Pictures, a atuação é ruim, como se espera que seja. Porém ela não é particularmente divertida pela ruindade, é apenas tosquinha mesmo. Curiosamente esse jogo foi dirigido por um diretor de cinema de verdade... mais ou menos, depende se você considera Halloween 4 como cinema... Pior ainda que não tem nada particularmente divertido ou tosco acontecendo, apenas cenas genéricas de faroeste misturadas com cenas bem fracas de cartel mexicano.

Em uma cena começa a briga de saloon mais sem tesão da história, com direito a garrafada na cabeça, e ... do nada um deles se revela um alien e começa a atirar em você. Na outra traficantes estão vendendo drogas quando recebem uma batida do FBI, e naquele enrosco todo... um deles se revela um alien e começa a atirar em você. E assim vai. O que até poderia ser engraçado, mas a execução é daqueles que é tão ruim que chega a ser divertido, é mais feito de qualquer jeito mesmo.


Aqui jogando uma bolinha, quando BAM, aliens motherfucker

Esse é o maior problema de GZT: o jogo tem MUITO uma cara que foi feito de qualquer jeito só para manter a onda de Night Trap. Enquanto isso não torna o jogo injogavel ou pavoroso, não tem como não tirar a impressão que o jogo foi feito na correria. Oh, espere, eu disse que esse é o maior problema do jogo?

Oh, silly silly me. Eu quis dizer que esse é o maior problema do primeiro CD do jogo, porque a partir do segundo CD (cerca de meia hora de jogo), a coisa degringola de uma forma que eu não via desde o segundo CD de Xenogears. Com a diferença que pelo menos a primeira parte de Xenogears é uma obra de arte e Ground Zero Texas é... bem, Ground Zero Texas.

A partir do segundo CD toca a mecânica que eu citei antes de “Pseudo Night Trap” é atirada pela janela e você apenas tem que atirar em aliens em cenas de galery shooting comuns. Depois que uma cena termina pisca a tela dizendo para qual tela você tem que mudar e... é isso. Dizer que é chato seria uma ofensa ao horário político na televisão, é uma das coisas mais chatas que eu já vi na minha vida.


E cenas assim go on and on and on...

Não é nem pela dificuldade, é tedioso de você olhar para o lado esperando essa desgraça terminar logo. E não termina. Sério, para um CD que dura cerca de meia hora, acho que foi a meia hora mais chata que eu já passei jogando videogame na minha vida. O jogo até tenta compensar aumentando a epicidade das cutscenes com batalhas contra os aliens repletas de explosões e tal... mas cara, nem que fosse John Wick 3 compensaria o tédio que é jogar esse jogo (Spoiler: as cenas de ação não são John Wick 3, acredite ou não)

Bom, pelo menos o jogo tem um orçamento, então você tem explosões reais de prédios, alienígenas que explodem ao levar tiro e efeitos especiais decentes para os lasers. O que não muda que você ainda está rodando entre quatro câmeras, fazendo exatamente a mesma coisa.

Para piorar, como se fosse necessário em um jogo que devia ser estudado em universidades de fisica porque prova como o tempo realmente se dilata eu nunca vi meia hora durar tanto, o jogo ainda tem escolhas de design hediondas que prejudicam mesmo as partes "boas" dos jogos.


... and on and on and on...

Isso porque o jogo adora uma filosofia de game design que é conhecida como "bola de neve": conforme você comete o primeiro erro o jogo vai ficando mais dificil por conta disso e assim num efeito retro alimentado de dor e sofrimento. Explico: ao tomar dano, sua camera é danificada. Primeiro, ela perde a capacidade de identificar os reticulanos (sim, esse é o nome dos aliens) e ao invés de ver reticulos marcando os reticulanos (não acredito que eu escrevi isso), você tem que esperar alguém sacar uma arma e só então reagir.

Se tomar mais dano, a imagem fica preto e branca - o que, com a resolução limitada do Sega CD, já é uma sentença de morte

Eu marquei com a setinha quem vai atirar em você, boa sorte tentando ver isso
E por fim ela fica pixelada ao ponto de ser injogavel. Ou seja, se você passar dos 5 hits - o que não é dificil, já que as vezes tem sequencias de tiro em dois lugares ao mesmo tempo e o jogo frequentemente exige uma precisão nos tiros que não pode ser alcançada com joystick mirando - o jogo vai pro buraco e dali não sai mais.

Para um jogo cujo feature mais memorável é ter a meia hora mais tediosa da história dos videogames, é forçar a amizade.



Esse não é o único exemplo de "perdeu preiboi" que o jogo aplica em você na sua primeira metade: ao passar algumas cutscenes, o jogo te dá parte de um password de quatro digitos que será necessário para destravar o segundo CD. Então você tem que ficar até o final de cada cena, porque você não tem como saber qual - é aleatório. O problema é que as cenas de tiro são sobrepostas, então enquanto você está esperando ver se vai ter uma parte do código ali, você está tomando dano em outro lugar.

Se você perder qualquer uma das quatro partes do código o jogo não passa para o segundo CD - apenas que ele não te diz isso e você continua jogando como um idiota.

Essa não é a coisa mais bizarra que o jogo faz para demonstrar seu ódio contra o jogador, entretanto. O premio vai para a interseção entre o primeiro e o segundo CD, onde o jogo te pede para escolher uma locação para visitar. O que isso tem de mais? Ora, apenas que o jogo apresenta os locais selecionaveis um a um, não te avisa quando você retomou o controle e pode escolher... E ENTÃO VOCÊ TEM UM SEGUNDO PARA ESCOLHER A FASE SENÃO É GAME OVER! Não, é menos que um segundo isso!

O tempo começa a contar quando aparece o cursor na bolinha do meio, e se aparecer o militar é porque você já tomou Game Over na fuça pra deixar de ser trouxa.
Sem mentira nenhuma, na metade do jogo o jogo joga um "pensá rápido, valendo, game over haha!" quando você nem sabia que estava controlando ou que tinha um limite de tempo. Algumas pessoas diriam que ter um Sega CD já é punição o suficiente para qualquer criança, mas a Digital Pictures tem como credo pessoal que sempre dá pra chutar um pouco mais qum já está caído. Impressionante.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES 

EDIÇÃO 052



MATÉRIA NA GAMERS

ANTIGA GAMERS 
EDIÇÃO 001